Após um agosto marcado por volatilidade e redefinições importantes no cenário macroeconômico, setembro se apresenta como um ponto de inflexão para os ativos brasileiros. A combinação de três vetores fundamentais, Fed iniciando ciclo de cortes, Brasil com valuations historicamente atrativos e fluxos globais retornando a emergentes, cria uma janela rara de oportunidades para realocação estratégica de portfólios.
Contexto Global: Pouso suave e cenário construtivo
Agosto foi o mês em que a narrativa global virou definitivamente a favor dos ativos de risco. O payroll americano de julho, com criação de apenas 73 mil vagas e revisões negativas de 258 mil nos meses anteriores, confirmou o que os indicadores antecedentes já sinalizavam: a economia americana está desacelerando de forma ordenada. Como destacado nas análises do mercado, a média móvel trimestral de criação de vagas em 35 mil expõe uma desaceleração estrutural, mas sem sinais de recessão profunda.
Jerome Powell, em Jackson Hole, selou o novo ciclo ao reconhecer explicitamente os riscos crescentes ao emprego, sinalizando que “com a política monetária em território restritivo, a mudança no equilíbrio de riscos pode justificar ajustes”. O mercado agora precifica com convicção o início dos cortes em setembro, com 60 basis points (bps) de redução até o final do ano.
Na Europa, o fiscal expansionista está efetivamente ajudando a recuperar a atividade – o índice IFO alemão apresentou recuperação consistente, reforçando a demanda global. Importante notar que, diferentemente de ciclos anteriores, não estamos vendo uma desaceleração sincronizada global, o que oferece suporte adicional aos mercados emergentes.
Brasil: Assimetria Escancarada
O Brasil apresenta hoje uma das maiores assimetrias risco-retorno entre os mercados emergentes. Três fatores fundamentais sustentam essa tese:
Primeiro, a trajetória de juros domésticos. O IPCA de julho surpreendeu positivamente ao registrar apenas 0,26% (esperava-se 0,36%), com os núcleos em trajetória de moderação. Como observado nas análises recentes, isso levou a pesquisa Focus a reduzir pela primeira vez em 2025 a projeção de inflação para abaixo de 5%. Com a Selic em 15%, o juro real brasileiro permanece entre os mais altos do mundo, criando espaço substantivo para cortes – o mercado já embute reduções a partir de dezembro.
Segundo, a bolsa brasileira em dólares está dramaticamente defasada. O Ibovespa medido em moeda americana ficou para trás em relação a outros emergentes durante o período de incertezas tarifárias. Com múltiplo P/L (preço/lucro) próximo de 7x, níveis não vistos desde a crise de 2008, e um Equity Risk Premium historicamente elevado, qualquer melhora marginal no cenário pode desencadear um movimento de re-rating significativo.
Terceiro, o fiscal não deve implodir. Apesar dos ruídos, o governo demonstra pragmatismo quando necessário. O próprio presidente Lula, em entrevista recente, afirmou que o processo de reciprocidade tarifária “é demorado” e que não tem “pressa de fazer qualquer coisa” , sinalizando cautela que o mercado interpretou positivamente.
Política e sentimento local
O cenário político apresentou desenvolvimentos cruciais em agosto. Pesquisas eleitorais mais recentes mostraram Tarcísio de Freitas à frente de Lula em um hipotético segundo turno, alimentando especulações sobre sua candidatura em 2026. Historicamente o mercado brasileiro antecipa mudanças políticas em 9-12 meses, sugerindo que estamos entrando na janela relevante para precificação eleitoral.
Adicionalmente, a aprovação do presidente Lula oscila em torno de 46%, com desaprovação em 51% – números que historicamente dificultam reeleições. O mercado interpreta esse cenário como favorável a uma migração ao centro do espectro político, tradicionalmente mais alinhado com políticas market-friendly.
Novos Gatilhos Globais para Emergentes
Três catalisadores globais devem impulsionar fluxos para emergentes nos próximos meses:
China-EUA: As negociações comerciais avançam, com Trump estendendo a pausa nas tarifas sobre a China por mais 90 dias. Um acordo definitivo pode ser o próximo grande gatilho positivo para toda a classe de ativos emergentes.
Rotação em bolsas americanas: Com o S&P 500 negociando a múltiplos elevados (as 10 maiores empresas representam 40% do índice), investidores naturalmente buscarão alternativas. Como destacado nas análises, essa concentração extrema favorece rotação para mercados com valuations mais atrativos.
Ouro como termômetro: O metal precioso acumula alta de 34% no ano, refletindo não apenas busca por proteção, mas também um ambiente de dólar estruturalmente mais fraco – cenário que historicamente beneficia emergentes.
Números que importam para setembro
Os dados concretos de agosto/setembro reforçam a tese de realocação:
- Ibovespa: +6% no mês, rompendo 142.600 pontos com volume robusto
- Dólar/Real: estabilização em R$ 5,43, com carry de 10% ao ano favorecendo o real
- Fluxo estrangeiro: Retorno positivo em agosto após saída de R$ 6 bilhões em julho
- NTN-B 2065: Prêmio real acima de 7% – nível de crise em país que não está em crise
- Temporada de resultados: 76% das empresas brasileiras superaram estimativas
Estratégia de Alocação Recomendada
Nossa recomendação para setembro é fundamentada em três pilares:
Equities/Ações: Reforçar posições em bolsa brasileira, com foco em setores domésticos sensíveis a juros (varejo, construção, financeiro). A combinação de valuations deprimidos com início de ciclo de corte de juros cria setup extremamente favorável.
Renda Fixa: Alongar duration em NTN-B 2065, capturando prêmio real de 7%+ em um cenário onde a inflação mostra sinais consistentes de convergência. Para investidores mais conservadores, manter exposição em crédito privado high grade com spreads ainda atrativos.
Proteção: Manter posição em ouro como hedge de cauda. Com volatilidades implícitas historicamente baixas, o custo de proteção via opções também se mostra atrativo para investidores mais sofisticados.
Conclusão: O Momento da Virada
Setembro de 2025 pode marcar o início de um novo ciclo para os ativos brasileiros, similar ao observado em 2002 e 2016. Com valuations assimétricos, Fed iniciando cortes, inflação doméstica cedendo e cenário político se definindo, o argumento para realocação “de volta para casa” é compelling.
O investidor estrangeiro, após meses de ausência, tende a redescobrir o Brasil, não por modismo, mas por fundamentals. Em um mundo onde o S&P 500 negocia a múltiplos recordes e treasuries rendem 4%, um mercado oferecendo retornos potenciais de 30-40% em moeda local, com carry positivo, torna-se impossível de ignorar.