Iniciamos 2023 com muitas incertezas, tanto para o cenário doméstico como para o internacional. Se, em 2022, os investidores estavam receosos quanto à inflação e às políticas monetárias contracionistas, para o próximo ano, o mercado irá acompanhar de perto o desempenho da economia global e, no Brasil, o futuro do orçamento e possíveis desequilíbrios nas contas públicas.
Como investir em ações em um cenário tão desafiador
Com taxas de juros elevadas em todo o mundo, acreditamos que, para aquele investidor mais conservador, o próximo ano deverá continuar com maior alocação em títulos de renda fixa, veja nossas recomendações. Contudo, independentemente do cenário, sempre poderá existir oportunidades de alocação em renda variável.
Para o investidor com disponibilidade para alocação em renda variável, recomendamos uma carteira bastante diversificada e com teses mais conservadoras. Exportadoras, consumo básico, setor elétrico e estatais ligadas a governos estaduais podem proporcionar boas oportunidades. Apesar de acreditarmos que 2023 será um ano desafiador em vários aspectos, também recomendamos uma pequena exposição a empresas ligadas à economia doméstica, pela atratividade dos preços.
Desafios para 2023 no âmbito econômico
O processo de desinflação irá persistir em economias desenvolvidas e no Brasil?
A inflação mais alta em 2022 resultou em um aperto monetário maior que o esperado nas principais economias globais. Se seguir em níveis altos e distante da meta, será necessário estabelecer juros mais altos, por mais tempo, o que é ruim para a economia global e para a expectativa de um pouso suave. Já temos sinais de que o pior pode ter ficado para trás, mas ainda não existe consenso sobre isso.
Qual serão as chances e o tamanho da recessão na Europa, EUA e Brasil?
A região que mais nos preocupa hoje é a Zona do Euro, sendo provável que já esteja passando por um processo de recessão. Nos EUA, os questionamentos que serão feitos recaem sobre a força da economia americana e quais os reais impactos que veremos diante da restrição das condições econômicas aplicadas em 2022. Os sinais são ambíguos e pelos últimos discursos dos membros do Fed as taxas de juros devem ficar entre 5% e 5,5% ao ano.
China voltará a crescer com consistência?
Após meses de políticas rígidas de combate à Covid-19 os impactos na economia chinesa foram inevitáveis. Sua matriz de crescimento também passou por uma desalavancagem ordenada do setor imobiliário, trazendo impactos significativos na demanda por commodities metálicas industriais. Acreditamos que a China está no inicio de um processo de melhora na economia e aumento da confiança da população e de investidores. Por outro lado, entendemos que assim como ocorreu no ocidente, o caminho para reabertura não deverá ser linear e deveremos ter volatilidade nos próximos meses.
Brasil e o compromisso fiscal
O Brasil foi um dos primeiros países a iniciar o processo de alta de juros, mas mesmo com a Selic em 13,75% e sinais de enfraquecimento econômico não foram o suficiente para que investidores acreditem que será possível reduzir os juros em 2023. Após as eleições houve uma mudança significativa para esse cenário após a sinalização de maiores gastos públicos e da indicação de políticas econômicas que visão estimular o crescimento com grande participação do governo. Nosso entendimento é que as escolhas que foram feitas devem gerar incerteza sobre a trajetória de queda da inflação e impactando o crescimento do PIB.
Cenário Brasil, o que esperar de 2023?
O ano de 2023 será desafiador não só pelo risco fiscal, mas pela expectativa de desaceleração sincronizada das principais economias globais, que estabelecerá ventos menos favoráveis para as exportações brasileiras. Nossa projeção para o próximo ano é de baixo crescimento do PIB, refletindo a elevação da taxa de juros para combater o processo inflacionário, que deve permanecer acima do teto da meta (4,75%), por conta da elevação do risco fiscal; retorno dos impostos federais sobre os combustíveis; e a aprovação de medidas de impulso para sustentar a demanda agregada em um ambiente de inflação de serviços pressionada.
A expansão fiscal em 2023, para acomodar as promessas eleitorais, não virá sem custos. A PEC da Transição propõe a expansão do Teto de Gastos em R$ 145 bilhões em 2023, além de permitir gastos extras que superam R$ 55 bilhões (R$ 23,9 bilhões referentes à receita extraordinária de 2022; R$ 24,6 bilhões para aumento de investimentos usando dinheiro do PIS/PASEP; despesas com programas socioambientais federais e com o combate às mudanças climáticas custeadas com doações; e despesas das instituições federais de ensino pagas com receitas próprias, de doações ou convênios estimadas em R$ 5 bilhões). A PEC de transição e seus penduricalhos apontam para uma expansão fiscal de R$ 203,9 bilhões em 2023.
Pelo lado das receitas, esperamos que a normalização da arrecadação com Dividendos e Participações e Exploração de Recursos Naturais seja responsável pela queda do total em cerca de R$ 100 bilhões. Além disso, a Lei Complementar 194/2022, que limita a cobrança do ICMS, impactará na arrecadação dos Estados e Municípios em cerca de R$ 90 bilhões em 2023. Por fim, considerando as incertezas em torno da manutenção da zeragem dos tributos federais sobre os combustíveis, há o risco de um impacto adicional de R$ 52,9 bilhões sobre o resultado primário do governo consolidado.
a taxa de câmbio deve encerrar o ano de 2023 em R$ 6,10, refletindo a fuga de capitais tanto pelo lado do aumento do risco fiscal quanto do temor pela reversão das reformas microeconômicas aprovadas nos últimos anos, o que viria a deteriorar o crescimento de longo prazo brasileiro. Neste cenário, as pressões inflacionárias serão amontoadas.
O cenário, portanto, se mostra nebuloso para o próximo ano. As incertezas em torno do arcabouço fiscal e sobre a sustentabilidade da dívida serão os principais drivers da economia no ano de 2023 em diante. Na nossa avaliação, a conjuntura se mostra adversa com uma clara assimetria no balanço de riscos inflacionários e fiscais, impondo um viés negativo para a trajetória das principais variáveis macroeconômicas brasileiras.
Impacto da Reforma Tributária
Com o agravante do cenário fiscal, enxergamos como provável o aumento de imposto nos próximos anos. A seguir fizemos um estudo sobre quais os setores seriam mais ou menos impactados.
Em linhas gerais, a proposta da maneira que está hoje beneficia setores que são mais voltados a consumo, crescimento ou que não precisam de capital para crescer. O maior impacto negativo ficaria em cases relacionados a setores de capital intensivo, que, por sua vez, se aproveitam do benefício do JCP com maior intensidade. Dentro do nosso universo de análise, os segmentos de energia elétrica e Fundos Imobiliários (FIIs) seriam aqueles que observamos como os mais afetados.
Impacto da Reforma Tributária: Separando o joio do trigo
Ações brasileiras estão baratas, oportunidade?
As ações brasileiras estão sendo negociadas a 9,5x P/L projetado de 12 meses ex-Petrobras e Vale, abaixo de sua média nos últimos 5 anos (de 13,5x). Incluindo Petrobras e Vale, o índice está sendo negociado a 6,6x , abaixo de sua média nos últimos 5 anos (de 10,8x)
Numa avaliação por múltiplos podemos concluir que a Bolsa Brasileira está em níveis atrativos de preços, porém, se a situação fiscal se deteriorar em linha com o cenário descrito anteriormente, acreditamos que as ações ligadas à economia doméstica apresentarão um desempenho abaixo de outras classes de ativos.
Ações e setores que gostamos para 2023
Esperamos um ano desafiador para ações brasileiras, que poderá ser bastante influenciado pela expansão fiscal, que, consequentemente pode pressionar a inflação, exigindo uma taxa de juros em patamar mais alto por mais tempo.
Porém, existem algumas temas que podem trazer oportunidade de alocação em renda variável: i) reabertura da economia chinesa ii) alta dos preços do commodities iii) Selic mais alta ao longo de 2023 iv) privatização de estatais ligadas à governos estaduais. v) infraestrutura contratada de R$ 900 bilhões.
Reabertura da economia chinesa
Esperamos que a reabertura da China seja benéfico para empresas exportadoras de commodities com mineradoras, siderúrgicas, petroleiras, papel e celulose, agrícolas e frigoríficos. Dentre esse setores, nossa preferencia se concentra em petroleiras (Prio e 3R) e agrícolas (SLC Agrícola).
Commodities em alta
Apesar de muitas commodities quase dobrar de preços até meados de 2022, o capex em todo o setor de produção e exploração foi decepcionante. Ou seja, pouco investimento foi feito pelo setor que optou por distribuir sua geração de caixa na forma de proventos para os seus acionistas. Dentro desse cenário acreditamos que os baixos investimentos feitos em capacidade produtiva nos últimos anos e aliados a reabertura da economia chinesa possam se sobressair aos efeitos de uma recessão econômica mundial.
Selic mais alta ao longo de 2023
Alguns setores se beneficiam de altas taxas de juros, já que suas receitas financeiras aumentam. É o caso das empresas de serviços financeiros, como bancos e seguradoras. Para 2023 gostamos mais das seguradoras (BB Seguridade/Porto Seguro) do que do setor bancário pelo nível de endividamento da população brasileira, que pode levar a um aumento significativo dos níveis de inadimplência, porém dentro os grandes bancos nossa preferência está em Itaú.
Com juros mais altos, setores como o de construção civil, varejo e small caps tendem a não ter boa performance, contudo, recomendamos algum percentual de exposição em algumas empresas que podem se destacar por sua qualidade ou preços extremamente atrativos. Gostamos de Assai e Carrefour que estão bem direcionados para os próximos anos dentro no seu plano de crescimento, setor de atuação e público-alvo. Apesar de ser um setor mais agressivo gostamos de ter uma exposição ao setor de construção civil com foco nos grupos de baixa renda (Cury e Direcional). O governo eleito em seus mandatos anteriores proporcionou incentivos (Minha Casa, Minha Vida) que foram importantes para o segmento na época.
Privatização de Estatais
Com cenário fiscal apertado, os governos brasileiros deverão buscar por alternativas para recomposição de suas receitas. Com a eleição de candidatos com visão liberal, existe uma maior probabilidade de privatizações ocorrem em Minas Gerais (Copasa, Cemig), São Paulo (Sabesp) e Paraná (Copel e Sanepar). Empresas de saneamento e setor elétrico devem entrar no radar dos investidores após as privatizações recentes da Eletrobras e da Corsan.
Infraestrutura
O Brasil tem um crescimento contratado na parte de infraestrutura para os próximos anos, cerca de R$ 900 bilhões em concessões e parcerias público-privados que foram feitas. Assim, acreditamos que empresas que atual com a parte de infraestrutura, logística e agronegócio devem apresentar resultados acima da média em 2023. Gostamos de nomes como o de Weg, Randon, Vamos e Movida, por participarem de maneira direta e indireta com esse processo.
Conclusão
Apesar das adversidades, acreditamos que 2023 pode ser um ano de grandes oportunidades. Esperamos um 1° semestre de bastante volatilidade e recomendamos uma postura conservadora, mas ao mesmo tempo vigilância para possíveis mudanças de cenário para o 2° semestre. Iremos buscar respostas sobre como as grandes economias globais irão se comportar e assim entender quais setores serão mais ou menos impactados. Diferente de 2022, acreditamos que poderá existir oportunidades em diversas classes de ativos, porém para os mais agressivos recomendamos ainda uma pequena exposição. Sobre a precificação das ações, entendemos que o efeito juros, em sua maior parte, já foi precificado, e agora precisaremos compreender o efeito nos resultados coporativos das empresas sobre a precificação das ações. Portanto, setores mais resilientes, empresas de valor (value), grandes geradoras de caixa, baixa alavancagem devem chamar a atenção dos investidores. E assim como em 2022, caso você investidor ou investidora não estiver confiante, não há problema, pois teremos uma renda fixa com ótimas taxas para lhe oferecer ótimos retornos.