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Publicado em 03 de Janeiro às 14:40:43

Carta Macro (Dezembro/22)

Cenário Doméstico

Novo governo: PEC de Transição

Ao longo de dezembro, novidades sobre a nova equipe econômica foram responsáveis por uma escalada do risco fiscal devido a medidas que tendem e tornar esse cenário menos estável.  Foi aprovada a PEC de Transição com algumas mudanças em relação à proposta inicial, enviada para o Congresso e em relação ao que foi aprovado no Senado no começo do mês. Na Câmara dos Deputados foi mantido o valor do aumento do Teto de Gastos em R$ 145 bilhões, mas o período de validade desse aumento foi reduzido para um ano, enquanto os empréstimos de organismos internacionais voltaram para dentro do teto. A PEC de transição e seus penduricalhos apontam para uma expansão fiscal total de R$ 203,9 bilhões em 2023.

Do ponto de vista político, a redução do prazo do aumento do teto significa que o futuro governo terá que se empenhar nas negociações do novo regime fiscal, que precisa ser aprovado até agosto de 2023, o que deverá dar grande poder de barganha ao Legislativo no primeiro ano do futuro mandato.

Atividade Econômica: Resultados mistos já mostram certa desaceleração

O IBC-Br, que serve como uma proxy para o crescimento do PIB, acumulou uma alta de 3,4% em 2022 até outubro, na série sem ajuste sazonal. Apesar de ter decepcionado na última leitura, na qual registrou recuo de 0,05% m/m, o indicador se encontra no nível mais elevado para o mês de outubro desde 2014. Além disso, o carrego estatístico para o ano de 2022 é de 3,2%, em linha com a nossa projeção de PIB, de 3%.

De modo geral, o desempenho da economia foi mista no mês. Por um lado, a produção industrial registrou avanço de 0,3% m/m, em linha com o consenso de mercado, beneficiada pela expansão de 0,6% m/m da indústria extrativa e baixa difusão, sinalizando a perda de dinamismo do setor. Na mesma direção, o volume de vendas no setor varejista avançou 0,4% m/m, beneficiado pela apreciação do real no período e pela antecipação de descontos da Black Friday.

Em contrapartida, o setor de Serviços recuou 0,6% m/m, a primeira variação mensal negativa desde fevereiro deste ano. Este resultado refletiu a contração observada nos serviços de transportes (-1,8% m/m), com taxas negativas em todos os segmentos analisados; e serviços prestados às famílias (-1,5% m/m). Na nossa avaliação, a perda de tração de todos os grandes segmentos reflete os efeitos da política monetária contracionista sobre a economia brasileira. Acreditamos que esta tendência deve continuar sendo observada nos próximos meses, haja vista o encarecimento do custo de acesso ao crédito e a elevação do nível de inadimplência em um contexto de incertezas em torno da condução da pauta econômica durante o próximo governo.

No que diz respeito ao mercado de trabalho, o último Caged registrou mais um resultado abaixo das expectativas do mercado, com 135,5 mil postos de trabalho formal. No mesmo mês do ano passado, o saldo foi positivo em 313,8 mil vagas.  Vale destacar que a desaceleração pelo terceiro mês consecutivo do saldo líquido de vagas sinaliza a perda de dinâmica da atividade econômica brasileira frente ao ciclo de política monetária restritiva. Houve admissão de 1,75 milhões e demissão de 1,61 milhão de trabalhadores no período.

No acumulado em 12 meses, entre os maiores grupos econômicos, é possível perceber uma desaceleração disseminada no saldo acumulado de empregos formais. O setor industrial e o comércio já vêm apresentando perda de dinamismo há alguns meses, diante do contexto macroeconômico mais adverso e da normalização do perfil de consumo no pós-pandemia que beneficia o setor de serviços. Na mesma direção, o setor de serviços segue apresentando perda de tração, com seis recuos consecutivas na criação de vagas de emprego no acumulado em 12 meses, na passagem de outubro para novembro, esta queda foi de 7,1% m/m. Na nossa avaliação, esta desaceleração é natural, afinal o setor já se encontra próximo do nível mais elevado da série histórica e bem acima do patamar observado antes do início da pandemia.

Fiscal: Setor público consolidado apresenta pior déficit primário para o mês de novembro desde 2016

O resultado consolidado de novembro foi impactado positivamente pelos déficits do Governo Central (R$16,5 bilhões) e dos Governos Regionais (R$3,7 bilhões). Em contrapartida, as Empresas Estatais registraram superávit de R$145 milhões. O déficit primário de R$20,1 bilhões é o pior para o mês de novembro desde 2016. Vale ressaltar que os números apresentados apontam para a piora do resultado primário dos Entes Subnacionais, diante das reduções das alíquotas de ICMS resultante da aprovação da LC 194/2022 que estabeleceu o limite de 18% para as alíquotas de ICMS. Nos últimos 12 meses, o superávit do Governo Consolidado de R$137,9 bilhões se deve a combinação do resultado dos Entes Subnacionais, que acumularam resultado positivo de R$70,7 bilhões; do Governo Central, que acumula superávit de R$62,7 bilhões; e das Empresas Estatais que tiveram superávit de R$4,5 bilhões no período.

A dívida bruta recuou em novembro para 74,5% do PIB, reduzindo 0,5 p.p. no mês. Essa redução decorre do efeito da variação do PIB nominal (redução de 0,5 p.p.) e dos resgates líquidos da dívida (redução de 0,8 p.p.). Por outro lado, os juros nominais aumentaram o endividamento em 0,7 p.p. Como é possível perceber, a redução do endividamento bruto do governo decorre, principalmente, pela elevação do PIB nominal, que vem sendo influenciado por um nível de atividade mais robusto e pela inflação que segue elevada no acumulado em 12 meses.

Inflação: Indicadores de dezembro já apresentam altas

Em dezembro, o Índice Geral de Preços (IGP-M) avançou 0,45% m/m, sendo essa a primeira variação positiva do índice depois de quatro meses consecutivos de deflação. Novamente, o IGP-M teve como maior contribuição para a sua variação mensal o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA-M). Com esse número, o índice geral fechou o ano com alta acumulada de 5,45%, uma redução considerável em relação a 2021, quando o avanço foi de 17,78%.

Já para a prévia do IBGE, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 acumula no ano alta de 5,90%. Dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados, sete tiveram alta em dezembro. Os maiores impactos vieram de Transportes (0,85%) e Alimentação e bebidas (0,69%), com 0,17 p.p. e 0,15 p.p. respectivamente. A maior variação, por sua vez, ficou com Vestuário (1,16%), que acumulou alta de 18,39% no ano. O grupo dos Transportes acelerou de novembro (0,49%) para dezembro (0,85%), principalmente em função da alta nos preços das passagens aéreas (0,47%), que haviam recuado quase 10% no mês anterior. Os preços dos combustíveis (1,79%) seguiram em alta, embora com resultado menor que o de novembro (2,04%). A gasolina (1,52%) contribuiu com o maior impacto individual no índice do mês, 0,07 p.p.

Política Monetária: Selic segue em patamar elevado e mercado de crédito sinaliza consequências

O Banco Central (BCB) decidiu manter mais uma vez, de forma unânime, a taxa Selic em 13,75% a.a., permanecendo no patamar mais elevado desde dezembro de 2016. Apesar da manutenção, o comunicado enfatiza que seguirá vigilante, avaliando se a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período suficientemente prolongado será capaz de garantir a convergência da inflação no horizonte relevante, que engloba os anos de 2023 e 2024 na mesma magnitude.

Foi sinalizado que o Comitê acompanhará com especial atenção os desenvolvimentos futuros da política fiscal, sobretudo seus efeitos nos preços de ativos e expectativas de inflação, com potenciais impactos sobre a dinâmica da inflação prospectiva. Nesse contexto, o BC não hesitará em retomar o processo de elevação dos juros no futuro caso o processo de desinflação não ocorra como o esperado. No nosso cenário base, diante dos riscos assimétricos para cima, sobretudo no que diz respeito à trajetória da dívida/PIB e os seus potenciais impactos sobre a trajetória de desinflação da economia brasileira, acreditamos que o BCB elevará a taxa de juros, que deverá encerrar 2023 em 14,5% a.a.

Diante do forte ciclo de aperto monetário desempenhado ao longo dos últimos meses, os dados do mercado de crédito apresentam sinais de desaceleração na margem, tanto para empresas quanto para as famílias. Apesar da resiliência da economia, com demanda ainda aquecida, o aumento generalizado da inadimplência é uma sinalização que merece atenção. Essa deterioração deve se agravar ao longo de 2023, refletindo os efeitos da política monetária contracionista e as incertezas em torno da política econômica do próximo governo. As taxas cobradas pelas instituições financeiras no crédito livre refletem os impactos do ciclo de alta de Selic, haja vista o avanço de 1,4 p.p. da taxa média cobrada pelas instituições financeiras em novembro. Nos últimos 12 meses, acumulou-se uma alta de 10,4 p.p., com destaque para a taxa cobrada para as famílias que atingiu 59,0% a.a. no mês.

No mesmo caminho, as taxas de inadimplência tiveram mais um mês de aceleração, com altas concentradas nas pessoas jurídicas. No crédito livre, a inadimplência das famílias ficou estável, entretanto, segue no patamar mais elevado (5,9%) desde maio/17. Já a inadimplência das pessoas jurídicas apresentou alta de 0,2 p.p. na margem, atingindo o nível de 2,2% em novembro. Mesmo que ainda em um patamar historicamente baixo, a inadimplência de pessoa jurídica já apresentou uma elevação de 0,6 p.p. esse ano. Já para as famílias, a alta é de 1,3 p.p. no ano.

No que diz respeito às concessões de crédito, ainda há impulso à expansão. No mês, o saldo das concessões de crédito avançou 1,0% m/m, totalizando R$ 5,3 trilhões no período, após ter apresentado expansão de 0,9% m/m em outubro. Este resultado decorreu da expansão de 0,9% m/m do saldo de crédito livre e de 1,3% m/m do crédito direcionado. Em nossa visão, a melhora no mercado de trabalho (queda do desemprego e aumento da massa salarial), em conjunto com políticas fiscais expansionistas, ajudam a explicar certa resiliência do mercado de crédito.

Cenário Externo

Estados Unidos

CPI desacelera para 7,1% a/a em novembro

O índice de preços ao consumidor (CPI) surpreendeu para baixo em novembro, avançando apenas 0,1% m/m quando as estimativas dos analistas eram de alta 0,3%. A surpresa na mesma direção se repetiu para o núcleo do CPI (que exclui alimentos e energia), que apresentou variação mensal de 0,2% quando era esperado 0,3%.

O grupo de habitação (shelter) continua a ser um dos maiores protagonistas do CPI, tendo sido o que mais contribuiu para a alta da inflação cheia no mês. A parcela representada por esse grupo mais do que compensou a queda nos preços de energia (-1,6%). Este último reflete a queda das commodities energéticas (-2,0%), representadas principalmente pela tendência de baixa do Brent nos mercados internacionais devido aos lockdowns na China na esteira da política de “covid-zero” que vigorou mais fortemente em novembro. Nessa mesma direção, os serviços de energia caíram 1,1%, puxados principalmente pelo recuo de 3,5% nos preços do gás natural em decorrência de um clima mais ameno do que o esperado no hemisfério norte para o período.

O setor de serviços continua a registrar alta nos preços na esteira do processo de reabertura econômica do pós-pandemia. Os componentes mais inerciais ligados a esse setor (que é mais intensivo em mão-de-obra) contribuem para ajudar a sustentar a inflação em doze meses em um patamar elevado por mais tempo.

Criação de vagas surpreende para cima em novembro (+263 mil)

A criação líquida de vagas em setores não-agrícolas nos EUA em novembro foi de 263 mil, surpreendendo os analistas que esperavam o preenchimento de 200 mil vagas. Esse resultado veio muito acima das 100 mil vagas que, segundo o presidente do Fed, Jerome Powell, é um número consistente com a taxa de crescimento populacional do país. Sob essa ótica, o mercado de trabalho norte-americano se mantém em desequilíbrio, com o número de empregos nos setores não-agrícolas se encontrando 1,04 milhão acima do patamar observado no período pré-pandemia (fev/20).

Já a taxa de desemprego veio em linha com o esperado, se mantendo em 3,7% da força de trabalho. Com isso, ela continua abaixo da taxa de desemprego natural (4,0%), confirmando que também por esse ângulo o mercado de trabalho segue em desequilíbrio. O descasamento entre oferta e demanda por mão-de-obra contribui para continuar gerando pressões sobre os preços e salários, dificultando o trabalho do Fed de levar a inflação para a meta de 2,0% ao ano.

Uma surpresa na direção contrária da esperada veio da taxa de participação, a qual saiu de 62,2% para 62,1% ao invés de se elevar para 62,3%. Essa queda de 0,1 p.p. fez com que novembro configurasse o terceiro mês seguido de recuo da taxa de participação. Por sua vez, a razão entre o total de empregados e a população em idade ativa (employment-population ratio) recuou 0,1 p.p. para 59,9%. Com estes resultados, ambas as medidas se encontram 1,3 p.p. abaixo do nível observado em fevereiro de 2020.

Federal Reserve reduz ritmo de alta de juros de 75 bps para 50 bps

Os dados de inflação de novembro (CPI e PCE) reforçaram a mensagem positiva de que, na margem, a inflação americana já começa a dar sinais concretos de desaceleração. Até no acumulado em doze meses os recuos vistos em novembro foram consideráveis. Como o Fed enfatizou várias vezes que seria altamente dependente dos dados, essas leituras recentes de inflação contribuíram para dar respaldo ao início do processo de redução do ritmo de ajuste da taxa básica de juros (fed funds rate).

Diante de já se encontrar na fase final do ciclo de aperto monetário é algo natural que um banco central reduza o ritmo de alta de juros, de modo que a alta de 50 pontos base na reunião de dezembro já era altamente esperada. Apesar dessa redução no ritmo, o Fed sinalizou que irá perseverar na estratégia de manter a taxa de juros alta por mais tempo (higher for longer). O mercado, por outro lado, escolheu dar mais ênfase a redução do ritmo de alta, interpretando isso como um sinal mais dovish da autoridade monetária, deixando de se atentar para as mensagens mais hawkish.

A avaliação dos participantes do FOMC sobre a condução apropriada da política monetária sugere que ainda deve haver novos aumentos na fed funds rate que adicionem 75 bps a mais na taxa de juros, levando a taxa terminal para o intervalo entre 5,0% e 5,25% a.a. Dada a incerteza que cerca o processo de desinflação nos EUA, a trajetória para se chegar a essa taxa de juros terminal esperada pelos membros do FOMC ainda é desconhecida, podendo se dar através de uma alta de 50 bps na reunião de fevereiro e 25 bps na de março, ou então de três altas de 25 bps seguidas.

Chamou atenção nas novas previsões dos membros do FOMC para a política monetária a alta dispersão das estimativas para a fed funds rate nos anos de 2024 e 2025. Isso mostra como o cenário futuro está coberto de incertezas, deixando a trajetória de médio prazo da taxa de juros da principal economia do mundo ainda desconhecida. Para ilustrar esse ponto, a estimativa mais baixa para 2024 é de 3,125%, enquanto a mais alta é de 5,625%. Já para 2025 a amplitude é ainda maior, com a mínima sendo de 2,375% e a máxima de 5,625%. Pesa sobre isso também a questão se um período de crescimento econômico abaixo do potencial que não resulte em recessão (pouso suave) será suficiente para corrigir os desequilíbrios no mercado de trabalho, aliviando as pressões inflacionárias.

Gastos com consumo avançam menos do que a renda pessoal

A perda de ímpeto dos gastos com consumo pessoal tanto em termos nominais como reais abriu espaço para que o avanço da renda fosse alocado mais para poupança do que para cobrir os gastos das famílias. Isso fez com que o estoque do excesso de poupança se mantivesse no patamar próximo de US$ 1 trilhão, o que deve continuar contribuindo positivamente para o consumo nos próximos meses. Ao mesmo tempo em que os indivíduos ficam mais receosos em investir e gastar em vista do risco crescente de recessão em 2023, a duração desse estoque de poupança por um período maior age na direção oposta, ajudando a sustentar o consumo das famílias.

Olhando para o consumo real podemos observar que finalmente começa a ocorrer o arrefecimento esperado no consumo de bens (principalmente no segmento de duráveis) na esteira da reversão do processo de desvio de demanda de serviços para bens que ocorreu durante a pandemia. Em novembro, o consumo real de bens recuou 0,6% m/m enquanto o consumo de serviços repetiu o número do mês anterior e avançou 0,3%.

O índice de preços de gastos com consumo (PCE price index) veio em linha com as expectativas e apresentou alta de 0,1% m/m em novembro. No acumulado dos últimos doze meses houve redução dos 6,1% a/a vistos em outubro para 5,5% a/a em novembro. Por sua vez, o núcleo (que exclui alimentos e energia) avançou 0,2% m/m, vindo de acordo com o consenso de mercado. Em 12 meses, o núcleo do PCE registrou avanço de 4,7% a/a, recuando 0,3 p.p. em relação ao número de outubro.

O arrefecimento dos dados de inflação na margem, assim como o fato da demanda das famílias ter apresentado alguma moderação justamente no período do ano no qual historicamente os gastos são mais elevados devido a temporada de compras (shopping season), resultou na elevação da poupança pessoal para US$ 461,2 bilhões em novembro na métrica anualizada e da taxa de poupança pessoal como proporção da renda disponível para 2,4%. Isso fez com que se reforçassem as apostas numa alta de juros de apenas 25 bps na próxima reunião do Fed em fevereiro, o que configuraria mais uma redução no ritmo de aperto monetário.

Europa

Zona do Euro: Inflação avança 10,1% a/a em novembro

Em novembro, o índice de preços ao consumidor apresentou variação de -0,1% m/m e 10,1% a/a, ao passo que o núcleo (que exclui energia, alimentos, álcool e tabaco) ficou estável na métrica mensal (0,0%) e avançou 5,0% na métrica anual. Durante o mês, a maior contribuição para o índice cheio veio dos preços de energia, contribuindo com 3,82 p.p.

Zona do Euro: Banco Central Europeu (BCE) eleva taxa de juros em 50 bps

O Conselho do Banco Central Europeu decidiu elevar a taxa básica de juros da Zona do Euro em 50 bps. Desse modo, as taxas de juros das operações principais de refinanciamento e de depósitos foram elevadas para 2,5% e 2,0%, respectivamente. O aperto monetário empreendido foi menor que o da última reunião (75 bps) e não se deu de forma unânime. Existia um racha interno no BCE entre as alas mais “hawkish” (a favor de repetir o aumento anterior de 75 bps) e mais “dovish” (a favor de alta de 50 bps ou menos). Esse fato vem ocorrendo devido à dificuldade de se conciliar realidades econômicas distintas pelas quais cada país da Zona do Euro passa, com a presidente do BCE, Christine Lagarde, expressando receio acerca de condições financeiras mais apertadas pressionarem os países da periferia, levando a instabilidades econômicas e políticas locais. Para as próximas reuniões o BCE espera repetir esse aumento de juros de 50 bps, visto que a inflação continua alta e deve permanecer acima da meta por um longo período. Assim sendo, projetam que a inflação média em 2022 será de 8,4% e em 2023, de 6,3%.

Quanto ao Programa de Compra de Ativos (APP) do BCE, foi sinalizado que o seu portfólio irá recuar em €15 bilhões por mês em média começando em março e se estendendo até o final do segundo trimestre de 2023, com o seu ritmo futuro sendo determinado posteriormente.

Reino Unido: Banco da Inglaterra (BoE) eleva taxa de juros em 50 bps

O Comitê de Política Monetária (MPC) decidiu, por 6 votos a 3, aumentar a taxa básica em 50 bps, para 3,50% a.a. Dentre os dissidentes, um voto foi por aumento de 75 bps e dois pela manutenção. Embora tenha reiterado que novas altas na taxa de juros possam vir a ser necessárias para garantir o retorno da inflação para a meta, o BoE expressou um cenário ruim para a atividade econômica, esperando que o PIB do Reino Unido recue 0,1% no quarto trimestre de 2022.

Esses movimentos por parte do BCE (descasamento entre o início da redução do portfólio do Programa de Compra de Ativos e o processo de alta de juros) e do BoE (grandes dissidências quanto a magnitude da alta de juros por parte dos membros do Comitê de Política Monetária) passam a impressão de que os bancos centrais na Europa estão sem um plano de voo claro para a implementação das suas respectivas políticas monetárias.

Japão

Banco central japonês surpreende com mudança no controle da curva de juros

Em uma decisão que pegou o mercado de surpresa, os diretores do Banco do Japão (BoJ) decidiram elevar a amplitude do intervalo de flutuação da taxa do título público local (JGB) de dez anos de -0,25% a +0,25% para -0,50% a +0,50%. Esse ajuste teve efeito imediato nos mercados, levando a uma correção dos juros, queda da bolsa de Tóquio e forte apreciação do iene frente ao dólar, uma vez que com a elevação do teto da banda o mercado, que antes trabalhava próximo da banda de 0,25%, passou a operar com o novo limite superior de 0,5%.

O presidente do BoJ, Haruhiko Kuroda, negou que o ajuste empreendido na curva de rendimentos (yield curve control) signifique um aumento de juros. Tal foi esse o caso que a taxa de depósito foi mantida em -0,1%, embora a inflação cheia, que atualmente se encontra em 3,8%, esteja consideravelmente acima da meta de 2,0% para padrões japoneses. Essa hesitação da autoridade monetária em alterar a sua política monetária se deve ao viés mais dovish da sua liderança e ao fato de que mais da metade da inflação ao consumidor é resultado de choques de energia e alimentos que irromperam devido a guerra na Ucrânia e a pandemia.

China

Flexibilização da política de covid-zero faz contágio disparar

No início de dezembro, autoridades chinesas decidiram por suspender as medidas mais duras da política de covid-zero, em vigor desde o início da pandemia. Com isso, uma explosão de contágio colocou o país em um dos seus piores momentos, com agências independentes estimando cerca de 9 mil mortes por dia na última semana do mês. Com a suspensão dos testes, os números oficiais pararam de registrar tanto os óbitos quanto as infecções, o que dificulta o acompanhamento da nova onda. Desde que as restrições foram levantadas, os hospitais chineses passaram a receber uma grande quantidade de doentes, a maioria idosos vulneráveis que não foram vacinados. Em muitas farmácias, os remédios contra a febre esgotaram. Apesar do retorno da epidemia, autoridades irão suspender em 8 de janeiro a quarentena obrigatória na chegada à China e permitir que os chineses viajem para o exterior, após três anos de fronteiras praticamente fechadas. No entanto, Reino Unido e França indicaram que irão exigir dos viajantes procedentes da China um teste de covid negativo antes da sua entrada. Outros testes aleatórios serão realizados na França após o pouso, e os testes positivos serão sequenciados.

Com o ano pautado pelo combate à pandemia, a economia da China cresceu cerca de 2%, abaixo da meta estabelecida por Pequim no começo do ano, que almejava alta de 5,5%. O número foi divulgado pelo Livro Bege Internacional, uma instituição independente que compila dados sobre a economia da China. Vale ressaltar que a crise no setor imobiliário, fundamental para a economia chinesa, foi mais um agravante a esse cenário recessivo, sendo que os indicadores caíram para patamares próximos das mínimas históricas. No quarto trimestre de 2022, o Livro Bege mostrou que os setores de serviços e atividade de produção do país tiveram quedas tanto em relação aos três meses anteriores quanto na comparação com o mesmo período do ano passado. Vale lembrar que os problemas gerados pela nova onda de covid ainda terão consequências paras os próximos dados. Antes da súbita reversão das políticas de “Covid-zero”, a atividade econômica chinesa enfrentou dificuldades devido a paralisações ao longo de novembro. Como consequência, dados do NBS mostraram que a produção industrial cresceu apenas 2,2% a/a, tendo uma grande desaceleração comparado ao avanço de 5,0% m/m de outubro e ficando abaixo da expectativa dos analistas (3,7% m/m). No mesmo sentido, as vendas do varejo chinês registraram queda de 5,9% a/a, bem maior que o declínio de 0,5% a/a de outubro.

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