Cenário Doméstico
Atividade Econômica: mercado de trabalho segue surpreendendo positivamente.
Em relação à atividade econômica, observa-se a resiliência do consumo interno mesmo diante das persistentes pressões inflacionárias e das restrições ao crédito. Pode-se evidenciar tais afirmações por meio dos dados do comércio varejista, que apenas em março cresceram 1% no conceito restrito e 0,7% no ampliado, que inclui as categorias Veículos & Autopeças e Material de Construção. Acreditamos que os ganhos marginais no rendimento médio real habitualmente recebido e a queda na taxa de poupança privada são bons vetores explicativos para tal movimento – a composição do varejo mais elástico à renda apresenta um desempenho superior, em relação àquele mais sensível ao crédito.
Além disso, a recuperação do mercado de trabalho, evidenciada tanto pela Pnad Contínua quanto pelo Caged, reforça nossa visão positiva para a economia brasileira. Dados da Pnad referente ao trimestre móvel encerrado em abril mostra que a taxa de desocupação caiu 4,3 p.p. em relação ao mesmo período do ano passado, ficando em 10,5%. Isso corresponde a cerca de 10 milhões de pessoas a mais ocupadas e a um incremento de R$ 4,4 bilhões em salários. Este resultado, adiciona um viés positivo para o mercado de trabalho em 2022, aumentando significativamente a probabilidade de que a taxa de desemprego encerre o ano em um dígito. O setor de serviços, que abriga categorias muito sensíveis às restrições sociais e lockdowns, é o que mais emprega no país, contribuindo com mais de dois terços da criação líquida de empregos medida pelo Caged. Desse modo, nossa projeção para o crescimento do PIB neste ano é de 1,7%.
Inflação: conflito no leste europeu e políticas restritivas na China são fatores persistentes de pressão externa.
No que tange à inflação, o IPCA avançou 1,06% em abril em relação a março, mostrando-se levemente acima das expectativas de mercado. Desse modo, a inflação ao consumidor no Brasil acumula alta de 12,13% nos últimos 12 meses. Conforme mostra a pesquisa do IBGE, Alimentação & Bebidas e Transporte foram os grupos que mais contribuíram para o índice no mês – 0,43 p.p. e 0,42 p.p., respectivamente –, com destaque para a gasolina, que avançou 2,48% e impactou, sozinha, em 0,17 p.p. o índice cheio.
Contudo, deve-se destacar a desaceleração nos preços administrados, de 2,65% para 0,55% – muito embora tenham avançado 0,1 p.p. na comparação interanual, indo a 15% – devido à adoção da bandeira verde em meados do mês de abril. Além disso, enxergamos mais vetores para tal desaceleração, como o efeito de primeira ordem da redução da alíquota do ICMS – que ainda será votada no Senado – sobre a inflação, o qual estimamos em -120 bps.
Entretanto, a última leitura do IPCA-15, uma proxy para o IPCA, referente ao mês de maio apontou para uma leitura bastante preocupante do processo inflacionário brasileiro. Embora o indicador tenha apresentado significativa queda ao passar de 1,73% para 0,59%, esta decorreu principalmente do recuo acentuado dos preços administrados de 3,2% para -1,4%, com o fim da bandeira de escassez hídrica, não refletindo o diagnóstico negativo apontado pelos núcleos. A média dos núcleos de inflação acelerou para 1,1%, refletindo uma inflação estabilizada em um patamar elevado e de caráter bastante disseminado, adicionando um viés mais negativo para a trajetória de inflação ao longo do ano.
Assim sendo, dado o cenário externo ainda adverso explicado pela política de controle à Covid-19 da China e seus impactos sobre o comércio internacional, o conflito no Leste Europeu e a elevada disseminação da inflação doméstica, nossa projeção para o IPCA ao final do ano é de 9,3% no cenário base (ex-impacto do ICMS).
Política Monetária: continuidade do ciclo de alta de juros diante da persistência inflacionária
Diante de um quadro externo deteriorado, o Banco Central do Brasil elevou a Selic para 12,75% a.a., em linha com nossas expectativas. De acordo com a autoridade monetária, a atual dinâmica de preços segue surpreendendo a cada nova leitura e, portanto, exige a continuidade do ciclo de alta de juros a fim de impossibilitar a desancoragem das expectativas de inflação. Todavia, a decisão de novos aumentos será tomada a cada reunião do comitê com base nos dados disponíveis até então, principalmente das leituras do IPCA. Além disso, é importante pontuar que o BCB se encontra em um ambiente de elevada incerteza o que torna a tarefa de condução da política monetária mais árdua. Vale destacar que, no último comunicado, foi retirado o trecho que pontuava como assimétrico para cima o balanço de riscos do BCB, reforçando a visão de que o fim do ciclo de alta se aproxima. Dessa forma, acreditamos que o ciclo deve ser encerrado nas próximas duas reuniões com aumentos de 50 bps e outro de 25 bps, respectivamente, de modo que, a taxa Selic alcançará o patamar de 13,5% a.a. e permanecendo neste nível até o segundo trimestre de 2023.
Fiscal: Contas públicas permanecem no verde, mas pressão por aumento de gastos eleva riscos do cenário
O setor público consolidado (Governo Central, estados, municípios e empresas estatais) apresentou superávit de R$ 38,9 bilhões em abril. Sendo o nono superávit primário consecutivo, em 12 meses já acumula R$ 137,4 bilhões, correspondendo a 1,52% do PIB. Esse resultado anual se deve principalmente ao desempenho dos entes subnacionais, que acumulam resultado positivo de R$126,6 bilhões. O governo central e as estatais, por sua vez, também apresentaram superávit de 3,3 bilhões e 7,4 bilhões, respectivamente.
Dados tais números, deve-se destacar que o desempenho das contas públicas tem se mostrado mais positivo do que as projeções feitas pelo mercado. A dívida bruta recuou em abril para 78,3% do PIB, ante 78,5% no mês anterior. Essa redução decorre do efeito da variação do PIB nominal e dos resgates líquidos da dívida. Por outro lado, a desvalorização cambial e os juros nominais aumentaram o endividamento em 0,2 e 0,8 p.p., respectivamente.
O desempenho recente das contas públicas advém de uma combinação de despesas controladas (via teto de gastos) e receitas aumentando significativamente com aumento da inflação, das commodities e da retomada de setores no pós pandemia. Apesar da melhora robusta do resultado primário, o resultado nominal apresentou reversão no último mês, em linha com o aumento do custo do endividamento público (piora dos indexadores da dívida – Selic e IPCA). Nesse sentido, o custo da dívida pública é e continuará sendo ainda mais um vetor para elevação do endividamento brasileiro, que nesse primeiro momento vem sendo compensado pelo aumento do PIB nominal.
Com a melhora significativa do quadro fiscal brasileiro, a pressão por mais gastos pode se intensificar. A pressão por reajuste dos servidores públicos federais permanece elevada, com a greve por parte dos servidores do BC persistindo há dois meses, além de movimentos de outras categorias.
Cenário Externo
Estados Unidos
Atividade: Revisão do PIB americano aumenta a queda do trimestre, passando de -1,4% para -1,5%
No último mês, foram divulgados os dados da segunda leitura do PIB 1T22 em que se observou um recuo de -1,5% à uma taxa anualizada. Apesar da contração expressa na leitura, os dados apontam para a manutenção do ritmo de consumo das famílias e investimentos por parte das empresas, mesmo em um ambiente de inflação elevada. Um dos principais componentes negativos foi o recorde no déficit comercial que impactou o PIB americano em -3,2 p.p., devido à forte demanda dos consumidores por bens importados, sobretudo não duráveis. Entre os pontos positivos, os gastos do consumidor foram revisados para cima, com um aumento de 3,1%, e os investimentos fixos apresentaram alta de 6,8% no mesmo período.
Ademais, os dados de atividade referentes a abril apontam para um desempenho misto da economia americana. Por um lado, o setor Industrial apresentou um desempenho robusto no mês ao avançar 1,1% m/m, melhor que o consenso de 0,5% m/m. O resultado marca o quarto mês consecutivo de ganhos, acelerando o ritmo em relação ao aumento anterior. Para maio, o PMI industrial recuou mais uma vez, alcançando o nível de 57,0, a leitura mais baixa em quatro meses. Embora apresente desaceleração em relação ao mês de abril, o número, ao ficar acima do nível neutro (50), aponta para uma expansão persistente do setor. Esse resultado é consequência de contínuos problemas nas cadeias produtivas globais, gerando um desequilíbrio entre oferta e demanda. Por sua vez, o indicador de confiança do consumidor da Universidade de Michigan recuou 6,8 pontos, mais uma grande queda após a melhora no mês anterior, refletindo o efeito generalizado do aumento das incertezas da conjuntura econômica, sobretudo no que diz respeito ao elevado processo inflacionário presente na economia americana.
Mercado de Trabalho: Taxa de desemprego permanece estável, mas a criação líquida de empregos surpreende positivamente em abril
Com criação líquida de 428 mil vagas de emprego em setores não agrícolas (Nonfarm Payroll), o mercado de trabalho americano teve um bom resultado, especialmente pelo caráter disseminado do crescimento. Além disso, por ser o décimo segundo mês consecutivo de criação de empregos acima de 400 mil vagas, o indicador demonstra que o mercado de trabalho americano segue bastante sólido com uma forte demanda por trabalhadores. Já a taxa de desemprego permaneceu no patamar de 3,6%, ainda acima do nível observado antes da pandemia de 3,5%. Por outro lado, o descasamento entre oferta e demanda por mão de obra tende a ser agravado pela leve queda na taxa de participação na passagem de março para abril. Este fato deve fazer aumentar a disputa entre os empregadores pela mão de obra disponível, mantendo a trajetória de alta do salário médio por hora nos próximos meses. Entretanto, vale destacar que, mesmo diante de uma elevação significativa no salário em 12 meses de 5,5%, este ainda se encontra abaixo da inflação americana, portanto, representando uma queda do salário em termos reais, corroendo o poder de compra do consumidor.
Inflação: acumulado em 12 meses desacelera, mas segue próximo da maior variação anual em quarenta anos
Embora os principais indicadores inflacionários americanos tenham desacelerado na margem, o nível de preços segue sendo um fator de preocupação, principalmente em uma economia superaquecida. O índice de preços ao consumidor medido pelo CPI registrou alta de 0,3% m/m, ante avanço de 1,2% em março, de modo que, a taxa de inflação nos últimos 12 meses acumulou alta de 8,3%, vindo pior que o consenso de mercado que aguardava alta de 8,1% em abril. O diagnóstico do processo inflacionário nos EUA aponta para pressões altistas bastante disseminadas em toda a economia, sobretudo no grupo de Habitação que apresentou alta de 0,5% pelo terceiro mês consecutivo, sendo o principal responsável pela surpresa negativa do avanço do núcleo da inflação no mês. Vale destacar que este componente possui um elevado grau de persistência e nos próximos meses deve se manter pressionando a inflação americana. Já o índice de preços de gastos com consumo (PCE) apresentou desaceleração na margem ao avançar 0,2% m/m em abril. Seu núcleo se manteve estável ao apresentar alta de 0,3% na margem pelo terceiro mês consecutivo. Em 12 meses, o índice headline acumulou alta de 6,3%, com destaque para as altas de 30,4% nos preços da energia e 10,0% nos preços dos alimentos, já o núcleo do PCE acumulou alta de 4,9%.
Embora a inflação tenha se concentrado de maneira mais significativa nos componentes voláteis, a persistência desta em um patamar elevado, diante dos sucessivos choques e de uma economia superaquecida, deteriora as expectativas e exacerba o risco de desancoragem das mesmas. Isso pode ser observado nas expectativas de inflação para 12 meses à frente que se encontram substancialmente acima da meta de 2%, um sinal de que será uma dura tarefa para o Fed fazer com que a inflação convirja sem que haja uma significativa desaceleração econômica.
Dessa forma, acreditamos que este resultado reforça a necessidade de o Banco Central americano ajustar rapidamente a condução da política monetária, sobretudo no que diz respeito a levar a taxa de juros americana para o nível neutro (2,5%) antes do final de 2022 e encerrar o ano em território contracionista. Nesse sentido, mantemos nossa avaliação que o último aumento de 0,5 p.p. na Fed Funds rate será repetido nas próximas três reuniões do comitê, seguido por mais dois aumentos de 0,25 p.p., de modo que, a taxa de juros deva encerrar o ano em 3,0%.
China
Atividade: apesar da política de “Covid-zero”, governo implementa medidas para estimular a economia
Os dados referentes à atividade econômica na China, em abril, contribuíram para o crescimento de expectativas negativas a respeito do crescimento econômico do país. De acordo com dados do National Bureal of Statistics, as vendas no varejo, que já haviam declinado no mês anterior, caíram 11,1% em abril. Claramente os dados refletem a política de controle à Covid-19 no país, que tem obrigado seus residentes a permanecerem em casa a fim de evitar a disseminação do vírus. O PMI (Purchasing Manager Index) de serviços, diga-se de passagem, teve a pior leitura da série histórica – quando excluímos o auge da pandemia –, de 36,2 pontos.
Além disso, tais restrições têm impacto também sobre a atividade industrial, que caiu 2,9% no mesmo mês. O congestionamento no porto de Xangai – o maior do mundo – também é um driver negativo para o setor industrial e a economia chinesa como um todo. Vê-se elevada pressão sobre o produtor no que diz respeito aos custos de produção visto que o PPI (Purchasing Price Index) acumula alta de 10.8% em doze meses – com destaque para a abertura de Fuel & Power, com alta de 34,8%. Contudo, não se observa repasse de preços ao consumidor visto que o CPI (Consumer Price Index) em doze meses se encontra em apenas 2,1%.
Desse modo, acreditamos que a meta de crescimento definida por Pequim para este ano não se mostra condizente com a política de controle à Covid-19 e por isso esperamos um crescimento em torno de 3,0%. Cabe ressaltar, entretanto, os esforços de Pequim para reverter esse quadro. Isto é, diversas medidas de estímulos, tanto fiscais quanto monetários, como o incremento nos fundos que o PBoC (Popular Bank of China) concede aos bancos e a própria redução das taxas de empréstimo de longo prazo de modo a estimular o mercado imobiliário, têm sido adotadas nas últimas semanas. De todo modo, nossa ponderação faz creditar mais probabilidade a um menor crescimento.