A renda pessoal (personal income) avançou 0,3% m/m em fevereiro, vindo levemente acima das expectativas de mercado (0,2% m/m, Bloomberg). Os gastos com consumo pessoal (personal consumption expenditures) assim como os gastos em termos reais (real personal consumption expenditures) apresentaram moderação expressiva em fevereiro depois da forte alta vista em janeiro, avançando 0,2% m/m e -0,1% m/m, respectivamente. Por sua vez, a renda pessoal disponível (disposable personal income) avançou 0,5% m/m no mesmo período. Novamente, esse avanço da renda pessoal disponível acima da renda pessoal se deveu a queda nos impostos pessoais correntes (personal current taxes), que recuaram 0,6% m/m em fevereiro.
Em termos reais, a renda pessoal disponível registrou um avanço modesto de 0,2% m/m em fevereiro, ante forte expansão de 1,5% m/m em janeiro. O consumo de bens voltou a apresentar recuo (-0,1% m/m) em fevereiro após registrar alta robusta de 3,0% m/m no primeiro mês de 2023, tendência que foi acompanhada pelo setor de serviços que recuou 0,1% m/m após alta de 0,7% m/m no mesmo período. Essa queda no consumo de bens foi liderada pelo segmento de bens duráveis, que sofreram uma redução de 1,2% m/m em fevereiro, mostrando que o arrefecimento esperado no consumo de bens foi retomado. Esse arrefecimento no consumo de bens e serviços está em consonância com a desaceleração tanto da inflação de bens (de 0,6%m/m para 0,2% m/m) como da inflação de serviços (de 0,6%m/m para 0,3% m/m).
O índice de preços de gastos com consumo (PCE price index) veio de acordo com as expectativas e avançou 0,3% m/m em fevereiro. No acumulado dos últimos doze meses, os 5,3% registrados em janeiro deram lugar a um avanço mais modesto de 5,0% em fevereiro, 0,1 p.p. abaixo da mediana das estimativas. O resultado foi reflexo da forte desaceleração vista nos preços dos bens (de 4,7% a/a para 3,6% a/a) e nas suas aberturas. Serviços, por outro lado, incorporou 0,1 p.p. de alta na métrica de doze meses, com a inflação saindo de 5,6% para 5,7%. Já os bens e serviços de energia registraram forte moderação na métrica mensal, saindo de 2,0% para -0,4%. Isso fez com que a inflação em doze meses para esse grupo se reduzisse consideravelmente, de 9,6% para 5,1%. Por sua vez, o núcleo (que exclui alimentos e energia) avançou 0,3% m/m, vindo abaixo do consenso de mercado (0,4% m/m). Em doze meses, o núcleo do PCE voltou a apresentar trajetória de queda e saiu de 4,7% para 4,6% na passagem de janeiro para fevereiro. O grupo de alimentação registrou avançou de 0,2% m/m no período, fazendo com que a inflação de alimentos em doze meses caísse de 11,1% para 9,7%.
Apesar do arrefecimento das métricas de inflação cheia e subjacente, a resiliência mostrada pela inflação de serviços, que acelerou na métrica anual em fevereiro, continua a impedir que um processo de desinflação mais abrangente ocorra, deixando a inflação em patamares que ainda não estão em consonância com a meta do banco central norte-americano (Fed) de 2,0% ao ano. Com a ocorrência da crise bancária recente, a trajetória futura das principais variáveis econômicas ficou ainda mais incerta. O nível de atividade econômica e, consequentemente, a realização do tão almejado “pouso suave” vai depender da intensidade da crise bancária e dos seus canais de transmissão (mais notadamente de uma possível desaceleração na concessão de crédito “credit crunch”). Uma desaceleração mais forte do PIB teria algum impacto baixista sobre a taxa de inflação, mas o fato da inflação nuclear, mais notadamente a de serviços ex-aluguéis, ter forte inércia e se demonstrado de difícil desinflação faz com que haja um piso para a queda de preços. Dado o cenário do setor bancário e a necessidade de zelar pela estabilidade financeira, em sua última reunião o Fed deixou de se comprometer com mais altas de juros, embora pelo menos mais uma alta de 25 pontos-base ainda seja extremamente provável. Com isso, retornamos para um cenário de juros parecido com o que vigorava antes da divulgação dos dados pujantes de emprego e atividade do início do ano, no qual a fed funds rate atingiria uma taxa terminal na faixa de 5,25%-5,50%.
A poupança pessoal saltou de US$ 866,6 bilhões para US$ 915,8 bilhões na métrica anualizada na passagem de janeiro para fevereiro, de modo que a taxa de poupança pessoal como proporção da renda disponível subiu de 4,4% para 4,6% no mesmo período. O fato de a renda pessoal disponível avançar mais do que os gastos com consumo pessoal em termos reais permitiram com que a poupança pessoal continuasse a sua trajetória de elevação, que já se estende desde setembro. Isso ajuda a dar ainda mais sobrevida ao estoque de excesso de poupança das famílias acumulado na pandemia, que atualmente se encontra próximo de US$ 1,4 trilhão. Apesar da crise bancária, esses fatores também ajudam a afastar as chances de uma recessão econômica, pelo menos nesse ano.