A renda pessoal (personal income) avançou 0,3% m/m em março, vindo levemente acima das expectativas de mercado (0,2% m/m, Bloomberg). Os gastos com consumo pessoal (personal consumption expenditures) assim como os gastos em termos reais (real personal consumption expenditures) permaneceram estáveis em março, ante expectativas de contração de 0,1% m/m. Por sua vez, a renda pessoal disponível (disposable personal income) avançou 0,4% m/m no mesmo período. Novamente, esse avanço da renda pessoal disponível acima da renda pessoal se deveu a queda nos impostos pessoais correntes (personal current taxes), que recuaram 0,1% m/m em março.
Em termos reais, a renda pessoal disponível registrou um avanço de 0,3% m/m em março, ante expansão mais modesta de 0,2% m/m em fevereiro. O consumo de bens aprofundou o recuo visto em fevereiro (-0,3% m/m) e retraiu 0,4% m/m em março. Já os gastos em serviços mostraram tendência oposta, deixando para trás a contração de 0,2% m/m vista em fevereiro e se expandindo 0,1% em março. A queda no consumo de bens foi devida tanto a continuidade da contração dos gastos no segmento de bens duráveis, que sofreram uma redução de 0,8% m/m em março, como aos bens não duráveis, que recuaram 0,1% m/m. Esse padrão visto nos gastos reais em bens está de acordo com a desaceleração da inflação de bens (de 0,1% m/m para -0,2% m/m). Por outro lado, a inflação de serviços desacelerou de 0,4% m/m em fevereiro para 0,2% m/m em março, indo na direção contrária dos gastos nesse segmento.
O índice de preços de gastos com consumo (PCE price index) veio de acordo com as expectativas e avançou 0,1% m/m em março. No acumulado dos últimos doze meses, os 5,1% registrados em fevereiro deram lugar a um avanço bem mais modesto de 4,2% em março, 0,1 p.p. acima da mediana das estimativas. O resultado foi reflexo da forte desaceleração vista nos preços dos bens (de 3,6% a/a para 1,6% a/a) e no segmento de bens não duráveis (de 5,4% a/a para 2,1% a/a). A inflação de serviços também arrefeceu na métrica de doze meses, ainda que em magnitude bem menor, saindo de 5,8% para 5,5%. Já os bens e serviços de energia aprofundaram a deflação na métrica mensal, saindo de -0,5% para -3,7%. Isso fez com esse grupo abandonasse uma inflação de 4,9% a/a, dando lugar a uma deflação de 9,8% a/a. Por sua vez, o núcleo (que exclui alimentos e energia) avançou 0,3% m/m, vindo em linha com o consenso de mercado. Em doze meses, o núcleo do PCE voltou a apresentar trajetória de queda e saiu de 4,7% para 4,6% na passagem de fevereiro para março. O grupo de alimentação saiu de uma inflação de 0,2% m/m em fevereiro para uma deflação de 0,2% m/m em março, fazendo com que a inflação de alimentos em doze meses caísse de 9,7% para 8,0%.
Apesar do arrefecimento das métricas de inflação de bens e serviços, o núcleo de inflação só se reduziu em 0,1 p.p, deixando a inflação em patamares que ainda não estão em consonância com a meta do banco central norte-americano (Fed) de 2,0% ao ano. Na divulgação da primeira prévia do PIB trimestral vimos que a combinação de dois fatores, consumo forte tanto do governo como das famílias aliado a uma formação de estoques negativa que contribuiu para retirar 2,26 p.p do PIB, colaborou para manter a inflação pressionada nesse primeiro trimestre do ano. Olhando à frente, um ponto positivo é que essa variação negativa de estoques não deve continuar pesando negativamente sobre a inflação nos próximos meses, visto que a recomposição desses estoques não deve enfrentar as mesmas barreiras de oferta que estavam presentes no período da pandemia. Ainda assim, esse cenário de inflação pode fazer com que o Fed eleve a taxa de juros em 25 pontos-base em reuniões subsequentes a de maio.
A poupança pessoal saltou de US$ 951,6 bilhões para US$ 1,0 trilhão na métrica mensal anualizada na passagem de fevereiro para março, de modo que a taxa de poupança pessoal como proporção da renda disponível subiu de 4,8% para 5,1% no mesmo período. O fato de a renda pessoal disponível avançar mais do que os gastos com consumo pessoal em termos reais permitiram com que a poupança pessoal continuasse a sua trajetória de elevação, que já se estende desde outubro. Isso ajuda a dar ainda mais sobrevida ao estoque de excesso de poupança das famílias acumulado na pandemia, que atualmente se encontra próximo de US$ 1,4 trilhão. Num cenário no qual os desdobramentos da crise bancária recente ainda são presentes, apesar de ela ter sido contida, essa queda mais lenta do que a anteriormente prevista do excesso de poupança das famílias parece ser o único fator a impedir que a economia norte-americana entre em um quadro de atividade baixa e inflação alta (estagflação).