A primeira prévia do PIB americano do 1º trimestre de 2023 veio bem abaixo da mediana das projeções dos analistas de 1,9% t/t (Bloomberg) e avançou 1,1% t/t a uma taxa anualizada. Com esse resultado, o PIB americano se encontra 5,3 p.p. acima do nível pré-pandemia (4º tri de 2019). Esse é o terceiro cômputo trimestral positivo depois do quadro de recessão técnica visto nos dois primeiros trimestres de 2022. O número representa uma desaceleração considerável em relação ao trimestre imediatamente anterior, no qual foi observado um crescimento de 2,6% da economia americana. A maior contribuição positiva para esse resultado veio dos gastos com consumo pessoal (2,5 p.p.) que passaram de expansão de 1,0% no último trimestre do ano passado para uma alta de 3,7% agora. O destaque negativo foi para investimento privado (-12,5%), que apresentou contribuição negativa de -2,34 p.p., puxado principalmente pela variação de estoques (impacto de -2,26 p.p.).
Dentre os gastos com consumo pessoal, destaca-se o aumento no consumo de bens, que passou de contração de -0,1% para expansão de 6,5% no trimestre. Tal movimento ocorreu devido a movimentos similares tanto nos bens duráveis (16,9%, ante -1,3%) como nos bens não-duráveis (0,9%, ante 0,6%). Os gastos com serviços também apresentaram elevação no trimestre, saindo de 1,6% no final do ano passado para 2,3% no primeiro trimestre desse ano. Esse vigor do consumo continua a se beneficiar da redução abaixo da esperada do excesso de poupança das famílias (US$ 1,4 trilhão).
A formação de estoques privados foi o item que mais contribuiu negativamente para o resultado do PIB no 1º trimestre, retirando 2,26 p.p. O investimento fixo desacelerou a queda (saindo de -3,8% para -0,4%, o que impactou o PIB em -0,07 p.p. no período), puxado pela continuidade da queda, ainda que bem menos intensa, do investimento fixo residencial (-4,2%), que vem sofrendo com as altas taxas de juros que incidem sobre as hipotecas, e pela desaceleração no investimento fixo não residencial (0,7%, ante 4,0%). Este último, por sua vez, registrou arrefecimento em todas as suas três aberturas: estruturas (11,2%, ante 15,8%), equipamentos (-7,3%, ante -3,5%) e produtos de propriedade intelectual (3,8%, ante 6,2%).
Os gastos com consumo do governo continuam em trajetória de alta (4,7%, ante 3,8%), e foram puxados tanto pela esfera federal (7,8%, ante 5,8%) como pelas esferas estaduais e locais (2,9%, ante 2,6%). A aprovação de um novo pacote de ajuda financeira e militar para a Ucrânia e o acirramento de outras tensões gerou uma piora do ambiente geopolítico, que fez com que os gastos relacionados com defesa nacional saíssem de um crescimento de 2,3% no 4º trimestre de 2022 para 5,9% no 1º trimestre desse ano. Já as despesas não relacionadas com defesa diminuíram o ritmo de crescimento, embora tenham se mantido em patamar bem elevado, crescendo 10,3% agora, ante 10,6% no trimestre imediatamente anterior.
As importações, que entram como uma subtração no cálculo do PIB, reverteram as quedas dos trimestres anteriores, apresentando crescimento de 2,9% no primeiro trimestre deste ano. Já as exportações avançaram 4,8%, após um decrescimento de 3,7% no trimestre anterior. Com essa inversão, a contribuição das exportações para o PIB saiu de -0,44 p.p. para 0,54 p.p. na passagem do 4º trimestre de 2022 para o 1º trimestre de 2023. Em decorrência disso, as exportações líquidas pioraram substancialmente, mas ainda assim continuaram a apresentar contribuição positiva de 0,11 p.p. Esse crescimento no volume tanto das exportações como das importações é surpreendente dado o quadro de desaceleração não só da economia norte-americana como também da economia global. Ainda assim, a surpresa positiva com a reabertura economia chinesa pode explicar parte desse fenômeno, tendo impulsionado as exportações norte-americanas. O fim das restrições sanitárias melhorou o funcionamento das cadeias de suprimentos globais, o que permitiu o aumento das exportações chinesas e, consequentemente, o aumento das importações americanas.
Apesar dos desdobramentos da crise bancária recente, com a divulgação do Livro Bege mostrando uma atividade econômica praticamente estável, mas com os volumes e a demanda por empréstimos para pessoas físicas e jurídicas diminuindo de maneira geral a medida que os bancos apertaram os padrões de empréstimos, e de sinais mistos em diversos indicadores, o número abaixo das expectativas do PIB norte-americano do 1º trimestre não representa um número tão fraco como o resultado para o período parece indicar. Métricas de consumo fortes, tanto das famílias como do governo, aliadas a uma variação de estoques negativa devem pressionar a inflação. Um ponto positivo é que a recomposição desses estoques não deve enfrentar as mesmas dificuldades que enfrentou nos anos de pandemia devido ao fato das cadeias de suprimentos globais já terem se normalizado. Mesmo assim, existe grande chance que a próxima divulgação do índice de preços dos gastos de consumo pessoal (PCE price index) traga surpresas altistas tanto no índice cheio como no núcleo de inflação. Isso pode fazer com que o banco central norte-americano (Fed) tenha que continuar a elevar a taxa de juros em 25 pontos-base nas reuniões posteriores a de maio, na qual já é amplamente esperada uma alta de juros dessa magnitude. Outro ponto importante é se a queda nos impostos pessoais e o avanço dos salários vão permitir que a renda pessoal disponível continue em sua trajetória de alta, o que deve contribuir para dar uma sobrevida ao excesso de poupança das famílias e, consequentemente, ajudar a sustentar o consumo.