O rendimento das “Treasuries”, títulos de 10 anos do Tesouro norte-americano, saltou cerca de 1,0 p.p. desde meados de maio (de 3,3% para 4,3%), retornando ao mesmo patamar da Crise de 2008 pela primeira vez nesse intermédio de tempo. Esse movimento não é resultado de um único fator, mas sim de um conjunto de ocorrências simultâneas.
Durante boa parte do primeiro semestre, o Tesouro dos EUA ficou impossibilitado de emitir títulos por conta de ter alcançado o limite de endividamento de US$ 31,4 trilhões. Em junho, após os Democratas e Republicanos finalmente chegarem a um acordo sobre a suspensão do teto da dívida até janeiro de 2025, a instituição anunciou o desejo de recompor o seu caixa, que havia caído abaixo de US$ 100 bilhões, para um patamar próximo a US$ 600 bilhões. Além disso, déficits correntes elevados nas contas do governo vem forçando o Tesouro a emitir ainda mais dívida, tudo isso concomitantemente a política monetária de “quantitative tightening” (QT) do banco central (Fed). Essa forte pressão vendedora não está encontrando respaldo pelo lado da demanda, pressionando o rendimento das Treasuries. Mais recentemente, as renovadas apostas com a necessidade de uma alta adicional de juros de 25 pontos-base em algum momento desse segundo semestre também passaram a se apresentar como mais uma fonte de pressão altista sobre as Treasuries.
No início do mês de agosto, a agência de classificação de risco Fitch rebaixou o “rating” soberano dos EUA de AAA para AA+ com perspectiva estável. A agência fez questão de ressaltar que o rebaixamento da nota soberana do país não se deu por uma deterioração na capacidade de pagamento e sim por uma piora na disposição a pagar em vista da forte polarização política.
O terceiro fator a impactar as Treasuries foi a decisão do Japão de flexibilizar a sua política de controle da curva de juros (YCC) dos papéis de 10 anos do governo (JGB) de um limite superior de 0,5% para 1,0%. Com o rendimento dos títulos japoneses ficando mais atrativos, os cerca de US$ 2 trilhões que os japoneses possuem em títulos soberanos de outros países, a maioria deles em Treasuries, passaram a sofrer resgastes num movimento de repatriação de recursos para o país asiático.
Olhando à frente, a Ata da reunião do Fed de julho destacou que a política de “quantitative tightening” (QT) não necessariamente precisa ser interrompida quando, eventualmente, os juros começarem a cair, o que contribuirá para um impulso menos intenso de afrouxamento monetário, configurando mais um fator de pressão sobre o rendimento das Treasuries no futuro.