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Publicado em 08 de Fevereiro às 11:12:44

Diminuir os impostos sobre combustíveis pode não resolver o problema do Brasil. Entenda

Após o fim do recesso parlamentar no início da semana passada, foram apresentadas duas Propostas de Emenda Constitucional (PEC), uma na Câmara e outra no Senado, mudando a tributação sobre os combustíveis. Em resumo, as propostas eximem os governos federal e estaduais de compensar uma possível redução dos impostos sobre combustíveis com aumento de outros impostos, como exige a Lei de Responsabilidade Fiscal. Ademais, o projeto no Senado, além de propor a desoneração dos combustíveis e da criação de um fundo de compensação para segurar a alta dos preços, também visa o pagamento de auxílio diesel de R$ 1.200,00 por mês a cada caminhoneiro autônomo e do repasse de R$ 5 bilhões aos estados e municípios afim de subsidiar o transporte público. Estas medidas ficariam fora do teto de gastos com vigência por dois anos, abrindo caminho para o governo gastar R$ 17,7 bilhões sem respeitar as principais regras de sustentabilidade da dívida pública.  Segundo os defensores destas propostas, o objetivo é reduzir os preços destes produtos, que são um importante determinante das taxas de inflação no país. Estima-se que o custo em termos de redução de arrecadação tributária seria entre R$ 57 bilhões e R$ 100 bilhões.

Nossas estimativas sugerem que o efeito direto sobre o IPCA, caso os impostos sejam zerados, seria da ordem de 1 ponto de porcentagem. Porém, existe um efeito indireto, via desvalorização cambial, que muito provavelmente vai mais que compensar este efeito direto. Com a aprovação da PEC, teremos um aumento de déficit primário do setor público e aumento da dívida como proporção do PIB. Com isto, o risco fiscal aumentará, o que deverá levar a mais desvalorização do real frente ao dólar, pressão inflacionária e aumento das taxas de juros acima do já projetado neste momento. Na verdade, pelo menos parte da desvalorização do real frente ao dólar ocorrida na semana passada decorreu dos ruídos gerados por estas propostas. Uma repetição do erro cometido com o aumento do teto do gasto, que gerou aumento do risco fiscal, desvalorização cambial, pressão inflacionária, aumento dos juros futuros e forte desaceleração da economia no segundo semestre de 2021.

Nesse contexto, mesmo diante do desempenho mais positivo das contas públicas no ano de 2021, em que observamos um superávit primário de 0,75% do PIB, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), apontou que as incertezas em torno do arcabouço fiscal se mantêm elevadas. Esse fato impõe uma elevação do risco de desancoragem das expectativas de inflação, e, portanto, provoca uma maior assimetria no balanço de riscos com viés altista.

Dessa forma, as constantes ameaças ao arcabouço fiscal que, em última instância, refletem em alterações na percepção dos agentes sobre a sustentabilidade da dívida pública, implicam na elevação dos prêmios de risco e em uma maior probabilidade de que a inflação fique acima do projetado no cenário base do comitê (5,4%). Somado a este cenário, a ausência de medidas estruturais que visam reduzir as despesas e aumentar a capacidade produtiva do Brasil impõe uma pressão altista sob a taxa de juros estrutural da economia. Dessa forma, o Comitê pondera que o ciclo de aperto monetário deverá ser mais contracionista que o cenário de referência que considera uma taxa Selic de 12% no primeiro semestre de 2022 e finaliza o ano no patamar de 11,75%. Dinâmica que implicará, necessariamente, em menos atividade.

Nossa avaliação é que as novas ameaças ao arcabouço fiscal brasileiro via PEC dos combustíveis em meio a um ano eleitoral compõem a reprise do capítulo que vivenciamos no segundo semestre de 2021 com a surpresa dos precatórios. Os mercados reagiram negativamente a esta ameaça, com uma significativa desvalorização cambial, forte queda da bolsa, aceleração do ciclo de aperto monetário e uma forte piora das expectativas de inflação nos horizontes mais longos. Surpreendentemente, a reação do mercado não parece ter sido suficiente para mudar o entendimento do congresso dos efeitos perversos que as transgressões fiscais geram na economia. Ou seja, corremos o risco de observar em 2022 esta mesma dinâmica de correção de preços, para obter um pequeno alívio inflacionário em ano eleitoral. Errar é humano, mas persistir no erro…

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