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Publicado em 24 de Abril às 11:55:24

Economia internacional continua a exibir sinais mistos

No período que ficou conhecido como a “Grande Moderação”, os ciclos econômicos foram suavizados e a inflação permaneceu baixa e estável, mas não foi acompanhado por estabilidade financeira na mesma medida. As taxas de juros ultrabaixas que se seguiram à crise financeira global de 2008 provocaram desequilíbrios no mercado de capitais e estimularam a formação de bolhas de ativos. Por outro lado, em economias emergentes como o Brasil, principalmente no período pós-pandemia de Covid-19, os juros altos para combater a inflação contribuíram para aumentar o custo das dívidas (pública e privada), resultando em empresas superendividadas, com dificuldade de rolar as suas dívidas, aumentando os níveis de estresse financeiro.

Os problemas bancários recentes ocorridos nos EUA e na Europa se deram muito mais por questões de má gestão e má regulação do que pelo processo de alta de juros do período pós-pandemia, tendo-se em vista os casos de escândalo envolvendo o Credit Suisse e a flexibilização da regulação bancária por lobby dos bancos regionais norte-americanos. Antes desses problemas bancários virem à tona, era esperado um bom ano para os bancos europeus na esteira do processo de alta de juros empreendido pelo BCE. Apesar da crise bancária aparentemente ter sido contida, só começamos a ter conhecimento dos seus impactos sobre a concessão de crédito e sobre a atividade nas divulgações dos dados mais recentes.

Na última publicação do Livro Bege (relatório sobre a situação econômica dos Estados Unidos, que considera informações recolhidas junto de economistas, analistas financeiros, acadêmicos e homens de negócios) os sinais foram de que a eclosão da crise bancária parece não ter pesado muito nem sobre a atividade econômica corrente, nem sobre o futuro, dado que as expectativas futuras quase não sofreram alterações, embora os volumes e a demanda por empréstimos para pessoas físicas e jurídicas diminuíram de maneira geral, enquanto que demanda e vendas permaneceram mais ou menos estáveis para serviços não financeiros. Várias regiões do país notaram que os bancos apertaram os padrões de empréstimos em meio à incerteza aumentada e às preocupações com liquidez. Os preços apresentaram crescimento modesto em vista do arrefecimento tanto da demanda como da melhora das cadeias de oferta. O mercado de trabalho registrou alguma desaceleração no crescimento do emprego, algo que não se via há algum tempo. A oferta de trabalhadores aumentou com as pessoas voltando para a força de trabalho e a retenção cresceu sem que as firmas precisassem promover altas de salários, o que ajudou a conter o crescimento dos mesmos, embora esses ainda se encontram em patamares elevados.

A divulgação do índice de preços ao produtor (PPI) de março nos Estados Unidos se assemelhou bastante com índice de preços ao consumidor (CPI), no qual o índice cheio surpreendeu significativamente para baixo, mas o núcleo de preços veio mais ou menos em linha com o esperado. Um PPI mais fraco significa menos espaço para repasses da inflação ao nível do produtor para o consumidor e, portanto, menos pressões de custos. Por outro lado, os núcleos dessas duas métricas de inflação têm mostrado maior inércia e de difícil desinflação, o que ainda força o banco central norte-americano (Fed) a seguir com o aperto monetário. A eclosão da crise bancária no mês de março impôs pressões baixistas sobre o CPI cheio, vindo expressas nos itens voláteis (energia e alimentos) e nos temores de uma maior desaceleração da atividade. Tal ocorrido não vai se repetir em abril devido ao corte surpresa na produção de petróleo empreendido pela OPEP+, motivo pelo qual o resultado de março não deve ser encarado como um sinal de arrefecimento mais generalizado dos preços. Nesse sentido, o Fed deve dar mais peso para o núcleo de inflação ao decidir sobre a política monetária.

A conjuntura do início do ano, no qual os dados relativos à atividade, emprego e a inflação vinham, todos, extremamente fortes deve dar lugar a um cenário de atividade mais fraca e um mercado de trabalho ainda apertado e inflação mais persistente. A alta recente das expectativas de inflação para diversos prazos incorpora esse fato. Num ponto que também foi compartilhado pela Zona do Euro, as vendas no varejo surpreenderam para baixo, enquanto a produção industrial surpreendeu para cima, revelando sinais mistos nos dados de atividade dessas economias.

Com os bancos centrais norte-americano (Fed) e europeu (BCE) entrando numa fase mais discricionária da política monetária, na qual as decisões a partir de agora seriam tomadas reunião a reunião levando em consideração a situação de momento e as perspectivas futuras de uma série de dados econômicos, as divulgações mais recentes reforçam o cenário de mais um aumento de juros de 25 pontos-base nos EUA e aumentam as apostas num aumento de apenas 25 ao invés de 50 pontos-base por parte do BCE na reunião de maio.

Por fim, na seara doméstica, o Brasil também não escapou desse padrão e exibiu sinais mistos na atividade econômica. Antes o grande responsável pelo processo de recuperação da economia no pós-pandemia, o setor de serviços perdeu folego devido ao esgotamento natural do processo de reabertura. Mais recentemente o setor varejista passou a demonstrar um fôlego maior, algo que não foi visto ano passado, no qual as vendas decepcionaram justamente na alta temporada do varejo (BlackFriday e Natal), com as empresas querendo recuperar o terreno perdido nesse início de ano.

Com o aumento das incertezas a nível global por conta tanto dos eventos econômicos como geopolíticos recentes, a trajetória futura de diversas variáveis ficou ainda mais duvidosa. Apesar da crise bancária ter sido controlada e os bancos centrais poderem voltar a se concentrarem no combate à inflação, o processo desinflacionário ainda está suscetível a percalços, interrupções e até a possíveis reversões.

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