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Publicado em 24 de Janeiro às 12:25:41

Luz no fim do túnel? Desafios do crescimento chinês

A repentina suspensão das restrições impostas pela política de “covid-zero” na China foi o primeiro passo para a retomada do crescimento econômico após três anos de rígido controle. Com grande atraso, governantes da segunda maior economia do mundo decidiram seguir o exemplo do resto do mundo e passar a “conviver com o vírus”. Como consequência, ao menos no curto prazo, os indicadores de infecções e óbitos dispararam, a mobilidade urbana diminuiu e o autoisolamento segue prejudicando o funcionamento de serviços e áreas produtivas. No entanto, espera-se que, assim como em outros países, o arrefecimento gradual da pandemia possibilite a retomada do crescimento no curto prazo.

Em linha com a nossa projeção, o Produto Interno Bruto (PIB) da China cresceu 3,0% a/a em 2022, segundo pior resultado desde 1976. A taxa ficou bem abaixo da meta estipulada pelo governo de 5,5% a/a, consequência clara da manutenção da política de tolerância zero Covid e da crise imobiliária que afetaram significativamente a confiança das famílias e dos empresários. Ademais, o cenário externo se mostra desafiador. O desaquecimento das principais economias globais, refletindo o ciclo de aperto monetário sincronizado entre os Bancos Centrais, e a guerra na Ucrânia tendem a agravar a atual conjuntura que se mostra adversa.

Outro fator de preocupação se apresenta nos dados demográficos que mostram uma China mais velha e com uma população menor. Foi a primeira vez que a população encolheu desde 1961. Além do envelhecimento, a desaceleração do crescimento da produtividade, o alto nível de endividamento e o aumento da desigualdade social são desafios para a retomada do crescimento vigoroso. Os dados apontam que o encarecimento do custo de vida, sobretudo nos crescentes custos com educação e moradia, têm impactado substancialmente o índice de natalidade, que se encontra nos níveis mais baixos das últimas décadas. Em suma, com uma população que está envelhecendo e cada vez menor, as perspectivas de longo prazo são menos favoráveis, haja vista o impacto do fim do bônus demográfico em um país altamente industrial e de renda média baixa.

Para evitar um colapso da economia no curto prazo, nos últimos meses, o governo chinês tem flexibilizado uma série de medidas regulatórias. Um dos principais braços da recuperação chinesa será o mercado imobiliário, que representa cerca de 25% do PIB além de que 70% da poupança das famílias chinesas está atrelada ao setor. A crise de liquidez se estende desde o final de 2021, quando várias incorporadoras de alto nível deixaram de pagar suas dívidas, resultando no atraso ou interrupção da construção imobiliária. Dessa forma, o prolongamento deste cenário tem o potencial de gerar consequências catastróficas, o que levou o governo a tomar medidas de recuperação. O BC chinês divulgou um plano de 16 pontos que facilitou os prazos para vencimento da dívida bancária das empresas e trouxe apoio à emissão de títulos, além de tornar permanente a permissão de cortar pisos de taxas de hipoteca além do mínimo geral em diversas cidades. Logo em seguida, bancos estatais concordaram em lançar linhas de crédito para combater o alto nível de dívidas e aumentar a credibilidade. Com a reeleição de Xi Jinping e uma equipe mais homogênea ideologicamente, é esperado que esses impulsos continuem ao longo de 2023, com novas medidas para melhorar as condições financeiras.

Com a reabertura dos últimos meses, os preços ao consumidor sofreram uma pressão altista. A taxa anual de inflação ao consumidor chinês acelerou em dezembro (1,8% a/a ante 1,6% a/a em novembro), impulsionada pelo aumento dos preços dos alimentos (4,8% a/a ante 3,7% a/a em novembro). À medida que a reabertura avançar, esperamos que haja uma continuação dessa tendência, ao contrário do que é observado para os produtores, que registraram nova queda em seu nível de preços (-0,7% a/a ante -1,3% a/a em novembro), apesar das interrupções devido ao alto número de casos de covid-19.

Pequim agora aposta em uma forte recuperação da atividade econômica com especialistas esperando que o processo vá elevar a demanda global de petróleo para um novo recorde este ano. Além disso, outras commodities já estão se beneficiando com o fim da “covid-zero”, como o minério de ferro que engatou um rali de quase 50% em novembro. Vale ressaltar, no entanto, que a reabertura só tomará força quando o pico das infecções for superado e a população começar a, de fato, “conviver” com o vírus. Para as exportações brasileiras esse processo de reabertura, ainda que lento, é fundamental, uma vez que o comércio sino-brasileiro representa fatia de 26,8% em 2022 (ante mais de 30% em 2020 e 2021), além de que a China é um player determinante para os preços das commodities produzidas pelo Brasil.

Portanto, a repentina retomada econômica da China deverá dar um impulso em uma economia mundial enfraquecida. Essa dinâmica será sentida no retorno integral dos setores de serviços, como aviação, turismo e educação, a exemplo do que ocorreu no Brasil. Nesse sentido, a continuação e intensificação de políticas públicas de apoio ao mercado imobiliário são fundamentais para a gradativa recuperação, aliando uma política fiscal proativa com uma política monetária prudente, tendo no radar o aumento da dívida e inadimplência. Assim, diante do risco de um cenário recessivo em parcela importante dos países desenvolvidos, a reabertura chinesa se apresenta como uma possível luz no fim do túnel.

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