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Publicado em 12 de Agosto às 15:19:51

O fim da inflação de veículos

Um fenômeno emblemático dos últimos dois anos foi o aumento do preço dos automóveis, quando vimos veículos com valores impensáveis há poucos anos. Nesse sentido, o que fez com que a inflação de veículos alcançasse quase 20% a.a. nos últimos meses? E por que, em nossa visão, o cenário atual se tornou mais favorável com tendência de acomodação desses preços?

A pandemia de Covid-19 foi responsável por uma grande ruptura logística global, criando gargalos severos no sistema produtivo. O cenário macroeconômico ficou marcado pela falta de insumos, atrasos nos fretes, escassez de contêineres, lockdowns e voos cancelados. Ou seja, um contexto extremamente adverso para o crescimento do setor industrial, que se deterioraria ainda mais com o início da guerra na Ucrânia, pressionando os preços de diversas commodities importantes para produção. Combinado a isso, a prolongada política de Covid zero na China, colaborou negativamente para agravar o cenário logístico global, com os engarrafamentos de embarcações nos portos chineses.

Essa combinação de eventos forçou montadoras de veículos a dar férias coletivas aos seus funcionários e até parar plantas de produção por conta da escassez de componentes, como chips. Com os lockdowns no início de 2020, a demanda por bens eletrônicos (celulares, computadores) disparou, concentrando a oferta desses insumos. Entretanto, com o arrefecimento da pandemia e a volta da demanda por veículos, não havia oferta nem logística suficientes para suprir o retorno e a recomposição dos seus estoques.

Nesse contexto, os gargalos no sistema produtivo acarretaram uma pressão de custos muito significativa que, inevitavelmente, teve que ser repassada aos consumidores: houve forte desvalorização cambial, os preços de commodities importantes para produção de veículos (aço e alumínio) dispararam, além de outros custos altos como frete (aéreo e marítimo), pneus e contêineres. Mais essa combinação de fatores fez com que a inflação de automóveis novos e usados, que rodavam ao redor de zero nos últimos anos, disparassem, chegando a quase 20% a.a. e contribuindo com aproximadamente 0,9 p.p. no índice cheio do IPCA.

Entretanto, em nossa avaliação, o cenário para indústria automobilística está melhorando progressivamente com a evolução de diversos indicadores, apesar de ainda vermos gargalos a serem solucionados. Em primeiro lugar, a desaceleração econômica no mundo tem freado a demanda global e, com isso, reduzido preços de importantes insumos e ampliando a capacidade de navios e contêineres na costa brasileira. O preço do aço já caiu cerca de -19% e do alumínio -11%, em dólares, desde o início do ano, assim como de resinas e elastômeros (-5.8%). A oferta de semicondutores vem apresentando uma melhora substancial, com o represamento de volumes parados na China retornando mais rápido que as expectativas. Dessa forma, a produção de veículos vem apresentando recuperação, com julho/22 registrando o maior volume desde janeiro/2021.

A recomposição dos estoques da indústria vem ocorrendo não só pelo cenário mais favorável do lado da produção, com o aumento da oferta de matérias primas, mas também pelo arrefecimento das vendas, tanto internas (-13% no ano), como também das exportações, que vêm sendo impactadas pela crise na Argentina (50% as exportações de veículos vão para o país vizinho). Ademais, a política monetária contracionista já parece estar afetando as concessões de crédito para aquisição de veículos, que estão em trajetória de arrefecimento, com cada vez menos compras sendo efetuadas a prazo, auxiliando a frear a demanda doméstica. Portanto, as perspectivas para o mercado de veículos são positivas, com a redução de custos de produção, maior oferta de matéria prima e desaceleração, doméstica e internacional, da demanda por bens, permitindo a recomposição dos estoques da indústria. Assim, alguns fatores de alerta se mantêm no radar: (1) a imprevisível política de covid zero chinesa pode reverter a qualquer momento uma melhora da logística de transportes; (2) os custos dos fretes permanecem em patamar elevado e não devem arrefecer tão cedo.

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