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Publicado em 10 de Janeiro às 11:02:57

Economia Brasileira: O que esperar de 2023?

O ano de 2023 será desafiador não só pelo risco fiscal, mas pela expectativa de desaceleração sincronizada das principais economias globais, com Estados Unidos e Europa apresentando riscos consideráveis de entrarem em recessão já este ano. A combinação de claros sinais de desaceleração da economia brasileira com o abandono por parte da China da sua rígida política de “covid-zero” impõe um viés mais positivo para as transações correntes nos próximos meses.

A balança comercial brasileira deve sofrer um impulso positivo nas exportações em decorrência da reabertura da economia chinesa, enquanto as importações devem apresentar moderação na esteira do processo de desaceleração da economia interna. Se apresenta como um risco a esse cenário a possibilidade de o desordenado processo de reabertura da economia chinesa levar a uma disparada do número de casos de covid-19 no país asiático, o que seria um novo revés nas cadeias de suprimento globais, levando à queda na demanda por commodities exportadas pelo Brasil e ao aumento no preço de alguns bens.

No âmbito doméstico, nossa projeção para o 2023 é de baixo crescimento do PIB, refletindo a elevação da taxa de juros para combater o processo inflacionário, que deve permanecer acima do teto da meta (4,75%), e deve ser pressionada pela elevação do risco fiscal; retorno dos impostos federais sobre os combustíveis; e a aprovação de medidas de impulso para sustentar a demanda agregada em um ambiente de inflação de serviços pressionada e mercado de trabalho aquecido.

Nesse contexto, o Banco Central terá um desafio pela frente, visto que iniciaremos o ano de 2023 com uma inflação acima do teto da meta (5,0%) e sob um elevado risco de não convergência ao longo do ano. Ainda no primeiro trimestre, a atual trajetória de arrefecimento deve ser revertida com o retorno da tributação federal (PIS/Cofins) sobre os combustíveis. Além disso, a perspectiva de correção do salário-mínimo acima da inflação e da aprovação da expansão do Auxílio Brasil, que voltará a ser chamado de Bolsa Família, e as transferências de R$ 150 por criança menores que 6 anos, criarão um importante vetor de pressão altista para a dinâmica inflacionária.

Diante disso, avaliamos que a taxa de inflação só voltará para o redor da meta (3,0%) em 2025, sendo necessária uma postura mais firme (hawkish) do Banco Central para o cumprimento desta convergência. Acreditamos que a autoridade monetária deverá elevar a taxa de juros em 0,75 p.p. no próximo ano, encerrando 2023 com uma Selic em 14,5% a.a., aprofundando a política monetária em um terreno contracionista, visando a ancoragem das expectativas de inflação de 2024 em diante.

Vale destacar que a política monetária é, atualmente, mais potente do que no passado (diante das reformas promovidas no mercado de crédito). Entretanto, o crescente risco de reversão das reformas aprovadas nos últimos anos e do retorno do crédito subsidiado pelo BNDES faz com que novas altas da Selic não possam ser descartadas. O impacto da política monetária sobre a atividade econômica será relevante, esperamos que o PIB desacelere de uma expansão de 3,0% em 2022 para apenas 0,7% em 2023. Além disso, a defasagem de dois a três trimestres à frente deve impactar também o crescimento de 2024.

No nosso cenário, desde o final de 2021, tínhamos como tese que em 2022 o crescimento da economia brasileira seria beneficiado pela recuperação do setor de serviços em um contexto de fim da pandemia, o que se mostrou acertado. Entretanto, para 2023, acreditamos que este cenário não se repetirá. Até o mês de outubro de 2022, o setor se encontrava 10,5% acima do nível pré-pandemia. Portanto, é de se esperar que, diante da forte recuperação em 2022 e do impacto da política monetária sobre a economia, o segmento apresentará uma performance próxima à estabilidade, deixando de ser um driver de crescimento em 2023.

Além disso, nosso cenário também incorporava a volta dos investimentos como um importante vetor de crescimento da economia brasileira. Entretanto, já podemos observar os primeiros sinais de recuo da demanda por investimentos, refletindo o elevado grau de incerteza em torno da política econômica a ser seguida pelo governo Lula. O leilão da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) ilustra esta perda de apetite por investimento, visto que o leilão foi vencido por um lance único de ágio de apenas 1,15%. Em comparação, o leilão da Companhia Estadual de Água e Esgoto do Rio de Janeiro (Cedae) teve lances de quatro consórcios e um ágio de 114% em 2021.

Em suma, o desempenho do PIB refletirá o efeito líquido de vetores que apontam em ambas as direções. Por um lado, esperamos uma significativa expansão da Agropecuária (9,0%), devido à expectativa de uma boa safra na ausência de choques climáticos. Entretanto, os efeitos da política monetária e do elevado nível de inadimplência das famílias, que limitará o consumo mesmo com a expansão de gastos do governo, devem impactar o crescimento dos demais setores da economia (Indústria, Varejo e Serviços), podendo compensar o driver positivo advindo da agropecuária.

Por fim, a expectativa de desaceleração do ritmo de atividade global (que deve sair de um crescimento de 3,2% em 2022 para 2,7% em 2023), refletindo os efeitos do ciclo de aperto monetário sincronizado entre os principais Bancos Centrais do mundo, adiciona um viés negativo para o crescimento brasileiro via redução das exportações.

A expansão fiscal em 2023 para acomodar as promessas eleitorais não virá sem custos. A PEC da transição propõe a expansão do Teto de Gastos em R$ 145 bilhões em 2023, além de permitir gastos extras que superam R$ 55 bilhões (R$ 23,9 bilhões referentes à receita extraordinária de 2022; R$ 24,6 bilhões para aumento de investimentos usando dinheiro do PIS/PASEP; despesas com programas socioambientais federais e com o combate às mudanças climáticas custeadas com doações; e despesas das instituições federais de ensino pagas com receitas próprias, de doações ou convênios estimadas em R$ 5 bilhões). A PEC da transição e seus penduricalhos apontam para uma expansão fiscal total de R$ 203,9 bilhões em 2023.

Pelo lado das receitas, esperamos que a normalização da arrecadação com Dividendos e Participações e Exploração de Recursos Naturais seja responsável pela queda do total em cerca de R$ 100 bilhões. Além disso, a Lei Complementar 194/2022, que limita a cobrança do ICMS, impactará na arrecadação dos Estados e Municípios em cerca de R$ 90 bilhões em 2023. Como medida alternativa, a elevação em 4 p.p. da alíquota média do ICMS sobre todos os outros bens não essenciais compensaria a manutenção do teto de 17-18% sobre os bens essenciais. No entanto, esta seria uma medida impopular, o que dificulta sua implementação.

De acordo com nossas estimativas, a soma destes vetores implicará em um déficit primário de 2,0% do PIB em 2023. Em nosso cenário base, isso contribuirá com a elevação da dívida brasileira (DBGG/PIB) para 79,3% do PIB, ante 73% em 2022. Ademais, sob a perspectiva que a expansão fiscal do primeiro ano de governo Lula não seja abruptamente revertida ao final do primeiro ano de mandato, acreditamos que a sustentabilidade da dívida brasileira será posta em xeque. Nesse contexto, o rebaixamento do rating soberano brasileiro pelas principais agências de crédito terá impacto negativo sobre o investimento privado e provocará desvalorização cambial. Nosso cenário incorpora a elevação da dívida brasileira para 94,5% do PIB ao final de 2026.

As primeiras consequências desta sensação de insustentabilidade da dívida já podem ser observadas. O mercado de juros já apresentou os primeiros sintomas, com a elevação das taxas longas, refletindo o significativo aumento do risco fiscal. Nossas projeções apontam para uma significativa desvalorização da taxa de câmbio e o retorno da atuação do Banco Central apertando a política monetária frente a uma política fiscal mais frouxa. Nossa projeção indica que a taxa de câmbio deve encerrar o ano de 2023 em R$ 6,0, refletindo a fuga de capitais tanto pelo lado do aumento do risco fiscal quanto do temor pela reversão das reformas econômicas aprovadas nos últimos anos, o que viria a deteriorar o crescimento de longo prazo brasileiro.

Neste cenário, as pressões inflacionárias seriam amontoadas. Em suma, a expansão fiscal em um contexto de mercado de trabalho superaquecido, a desvalorização cambial, o risco fiscal e a inflação de serviços em patamares elevados serão mais do que suficientes para fazer o Banco Central retomar o ciclo de elevação dos juros. Nossos cálculos sugerem que a taxa Selic seja elevada em 75 pontos-base ao longo de 2023, encerrando o ano em 14,5%.

O cenário, portanto, se mostra nebuloso para 2023, com muitos desafios internos e externos. As incertezas em torno do arcabouço fiscal e da sustentabilidade da dívida serão os principais drivers da economia no ano de 2023 em diante. Na nossa avaliação, a conjuntura se mostra adversa com uma assimetria no balanço de riscos inflacionários e fiscais, impondo um viés negativo para a trajetória das principais variáveis macroeconômicas. A apresentação de uma nova regra fiscal que traga credibilidade, sustentabilidade e previsibilidade para a trajetória da dívida é uma condição necessária para revertermos o quadro atual. Além disso, será necessário um ajuste tanto pelo lado das despesas quanto das receitas nos próximos anos, gerando importantes superávits primários que beneficiem a estabilização ou até mesmo a queda da relação dívida/PIB em um ambiente de juros reais elevados.

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