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Publicado em 25 de Outubro às 12:30:33

Opinião: Um barco à deriva

O anúncio do governo de que pretende pagar parte do novo programa de transferência de renda fora do teto do gasto, gerou forte reação negativa dos investidores. Esta reação já era esperada. O teto do gasto é a âncora fiscal do país. Quando a economia cresce e as receitas tributárias aumentam, o teto restringe o aumento das despesas e o crescimento da receita é utilizado para reduzir a dívida pública. Este mecanismo torna a dívida sustentável ao longo do tempo. Se o comandante levanta a âncora no meio da tempestade, o barco fica à deriva, pode ir de encontro a um rochedo e afundar. É o que está acontecendo.

A proposta anunciada nesta semana é manter o valor do programa assistencial em torno de R$ 200,00 por mês, acrescido de duas parcelas adicionais e temporárias, no valor de R$ 100,00 cada, com duração até o final de 2022. Com isto, as transferências atingiriam R$ 400,00 por mês para cada família. O programa atenderia a 17 milhões de famílias. Uma das parcelas de R$ 100,00 seria paga dentro do teto dos gastos.

Já a parcela adicional de R$ 100,00 seria paga fora do teto, com a previsão de pagamento incluída na PEC dos precatórios. A reação dos investidores foi imediata e muito negativa. A possibilidade de mudar o teto para financiar o programa social torna o teto uma ficção. Afinal, se o governo está disposto a aprovar uma PEC para deslocar o teto para cima e aumentar os gastos, para que serve o teto? No final, a PEC dos Precatórios incluiu não apenas o financiamento do programa social, mas também uma mudança no indexador do teto para criar um espaço para gastos em 2022 de R$ 85 bilhões.

O principal pilar de nosso cenário era a obediência ao teto. Com o fim de fato do teto, aumenta o risco fiscal e o prêmio de risco do país, o que pressiona a taxa de câmbio e a taxa de inflação. O resultado é um aumento da taxa de juros necessária para controlar a inflação, queda do investimento privado e menos crescimento. Um rebaixamento da classificação de risco do país não está fora do horizonte. Mais inflação e mais desemprego. A força da retomada vai depender exclusivamente da melhora de bem estar gerada pelo fim da pandemia. Será o fator positivo no cenário e insuficiente para compensar os efeitos negativos do fim do teto. A dúvida é se o governo vai conseguir retomar o controle ou o barco vai afundar, como em 2014/2015?

Texto publicado no Estadão em 23 de outubro de 2021.

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