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Publicado em 29 de Junho às 14:05:00

Impacto da Reforma Tributária: Separando o joio do trigo

Finalmente! Nesta última sexta-feira, o governo federal anunciou os principais pontos para reforma tributária. Como destaques, citamos:

  1. Aumento das Faixas de Tributação para pessoa física
  2. Fim do Benefício do Juros Sob Capital Próprio (também conhecido como JCP, é uma forma de distribuição de lucro e um artifício contábil para pagar menos impostos uma vez que são considerados como despesa por serem realizados antes do lucro líquido).
  3. Tributação nos dividendos distribuídos em 20%
  4. Redução na alíquota de IR para pessoas jurídicas (IRPJ) em 2,5% em 2022 e mais 2,5% para 2023 (total 5%).

Quem Ganha e Quem Perde

Em linhas gerais, a proposta da maneira que está hoje beneficia setores que são mais voltados a consumo, crescimento ou que não precisam de capital para crescer. O maior impacto negativo ficaria em cases relacionados a setores de capital intensivo, que, por sua vez, se aproveitam do benefício do JCP com maior intensidade. Dentro do nosso universo de análise, os segmentos de energia elétrica e Fundos Imobiliários (FIIs) seriam aqueles que observamos como os mais afetados.

Fim do JCP. Do ponto de vista das ações, observamos o fim do JCP como algo negativo. Tal benefício reduzia a alíquota de impostos a serem pagos pelas empresas e remunerava os investidores de maneira similar a uma distribuição de dividendos. Em linhas gerais, considerando o método de cálculo para estimativa do JCP (patrimônio líquido x TJLP limitados a 50% do lucro antes de imposto ao ano), vemos os segmentos que são de capital intensivo mais expostos ao fim de tal benefício.

Mas Calma lá. Vale mencionar que tal reforma ainda é uma proposta. É bem possível que ela seja alterada pelo congresso e pelo senado até a sua versão final. Dito isso, vale lembrar que o objetivo desse documento é fazer uma análise estrutural de como cada setor seria afetado, tendo em vista suas características.    

Genial Analisa. Em suma, O que os analistas da Genial pensam da atual proposta, setor a setor:  

Energia Elétrica e Saneamento Básico: NEGATIVO

De uma maneira geral, a redução nas alíquotas de imposto de renda não compensa o fim do benefício fiscal do JCP e a criação dos impostos sob dividendos. Em nossa leitura, o impacto negativo vai além da menor remuneração em dividendos: o próprio modelo de negócios do setor de energia elétrica, pautado em altos investimentos com objetivo de remuneração do capital via distribuição de dividendos do projeto. Ou seja: I) a remuneração do acionista seria diretamente impactada via a criação do novo tributo, II) ruim do ponto de vista da alocação de capital. Como os projetos são adquiridos via leilões públicos realizados pela ANEEL, a ausência de leilões por longos períodos ou leilões em condições pouco atrativas (como foi no segmento de transmissão até 2016), pode deixar poucas escolhas para uma empresa além de distribuir seus recursos – e ser taxada em 20% por isso e, finalmente, III) eventual judicialização do setor. 

Acreditamos que existe um risco não desprezível em uma eventual nova onda de judicialização do setor elétrico. Pegando como exemplo os leilões públicos de transmissão de energia elétrica, a oferta dos investidores no momento do leilão é a menor possível, de tal maneira que o seu capital seja remunerado e que a tarifa ao consumidor final fique a menor possível. Novos impostos sobre os dividendos tende a afetar do fluxo de remuneração de capital da empresa – ou seja, afeta o equilíbrio econômico-financeiro do projeto por questões alheias a operação/gestão da linha pela operadora.

Estimativas: para estimar os impactos nos fluxos de dividendos futuros, simulamos em nossas estimativas como ficariam os rendimentos em dividendos considerando I) alíquota de 20% no pagamento de dividendos, II) fim do JCP, III) diminuição escalonada do IR. 

Varejo: POSITIVO

Ao contrário de muitos setores da economia que foram impactados negativamente pela impossibilidade de isenção de tributos sobre dividendos e JCP, acreditamos que o setor de varejo foi beneficiado. Isso porque a tese das companhias de varejo não está baseada na distribuição dos dividendos e pagam pouco JCP. Dificilmente um investidor decide investir numa empresa de varejo com base nos dividendos distribuídos, até porque elas não são boas fontes de renda passiva comparadas com outros setores, como os de capital intensivo (energia, saneamento e telecom). Na verdade, a tomada de decisão final acontece mais por conta da expectativa futura de crescimento. Quanto maior é essa expectativa, maior é o interesse do investidor em adquirir aquela ação. E a proposta da nova reforma tributária beneficia o crescimento do setor em 2 pontos:

  1. Mais recursos para famílias: com menor incidência tributária, os contribuintes terão mais renda disponível para alocar para o consumo, aumentando sua propensão marginal a consumir e beneficiando o setor de varejo. Cerca de 5,6 milhões de brasileiros passarão a ser considerados isentos, o que representa um aumento de 31% na faixa de isenção. Isso ocorre porque, com a proposta, o teto de contribuição passará de R$ 1.903,98 para R$ 2.500,00. Aqueles que possuem renda superior a esse teto também serão beneficiados, conforme consta na tabela abaixo.
  2. Redução de 5 p.p. do IRPJ, diminuindo o imposto pago e possibilitando que as empresas reinvistam o montante do seu recurso no próprio negócio e fomentando o crescimento interno.

Bancos: NEGATIVO

A proposta de reforma tributária deverá impactar negativamente os 4 maiores bancos do país. A redução da alíquota de IR em 5% não compensará o término do JCP, que gera benefícios fiscais de menos 10% na média. Assim, em um cenário hipotético no qual a reforma fosse adotada ainda em 2021, a queda nos lucros dos bancos deveria ser na faixa dos 5%. Dentre os 4 maiores bancos, o Bradesco deve ser o menos impactado com queda de 3,6%, seguido pelo Itaú (-4,2%) e Santander (-5,9%). A distinção entre os impactos está na alíquota nominal das companhias, que estimamos ser 42%, 43% e 44%, respectivamente.

Nota-se que a menor alíquota do Bradesco é influenciada pelo ágio da compra do HSBC e maior diversificação de suas receitas em setores menos tributados, como de seguros. Caso a proposta seja aprovada, o ganho marginal da diversificação das receitas deverá aumentar. Assim, os bancos devem passar a investir na melhor utilização de seu canal bancário e clientes para a venda de produtos acessórios. Muitos dos novos entrantes, como bancos digitais, estariam bem-posicionados, pois já utilizam seus canais digitais para vender produtos financeiros e não-financeiros com uma tributação inferior.

No caso específico do Banco do Brasil, estimamos um impacto bem mais severo. O patrimônio líquido elevado e baixa rentabilidade possibilita que pague muito JCP em relação ao lucro, possuindo um benefício tributário na faixa dos 15%. Desta forma, estimamos um impacto no lucro líquido de 14,5%, bem mais acentuado que concorrentes.

Seguros: POSITIVO

O impacto em seguradoras deve ser marginalmente positivo, uma vez que algumas empresas fazem pouco pagamento de JCP, sobrando apenas o efeito positivo da diminuição de IRPJ em 5 p.p. Hoje, a alíquota corporativa cheia das seguradoras gira em torno de 40%, maior que o restante das outras indústrias (34%), mas menor que os bancos (45%). No entanto, o setor é de menos capital intensivo que do que os bancos e, portanto, usam menos o JCP como benefício fiscal.

A BB Seguridade deve ser a maior beneficiada, pois mal paga JCP e deve se aproveitar da diminuição do imposto de renda e contribuição social de 40% para 35%. Estimamos um impacto positivo no lucro da empresa em cerca de 8% sobre o lucro de 2021. Já na Porto Seguro, estimamos um impacto positivo de 3% no lucro da seguradora.

Saúde: POSITIVO

No caso das empresas do setor saúde, vemos uma melhora com o fim do benefício fiscal trazido pelo fim do JCP e com a redução da alíquota de IRPJ, que deve alcançar seu mínimo em 2023. Além disso, a priorização da distribuição de dividendos, programas de recompra de ações e a procura por investimentos, devem virar opções mais corriqueiras para as empresas de saúde, como alternativa para uma melhor alocação de capital.

No exercício que fizemos, comparamos as projeções de lucro das empresas que cobrimos com e sem a alteração de tributação. Nesse caso, Hapvida e GNDI teriam um leve prejuízo com o fim do JCP. Já Quali e Fleury se beneficiariam com um lucro 25% maior.

Mas nem tudo são flores. Apresar da redução gradual de IRPJ, que pode diminuir a alíquota em até 10%, é bom ficar de olho nas PECs 45/2019 e 110/2019, que prevem a substituição do PIS/COFINS por um tributo de valor imposto sobre valor agregado (IVA), chamado CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). Veja como fica a mudança na tributação para os diferentes grupos de empresas do setor de saúde:

  • Hospitais e laboratórios: PIS/COFINS de 3,65% é transformado em um CBS de alíquota de 12%. Aumento de 3,3x.
  • Seguradoras e planos de saúde/odontológicos: PIS/COFINS de 4,65% é transformado em CBS de alíquota de 5,9%. Aumento de 1,3x.

Telecomunicações: NEGATIVO

Temos duas empresas no setor de telecomunicações que são visadas pelos investidores para recebimento de renda passiva (dividendos e JCP): Vivo e Tim.

Conforme mostramos em nosso início de cobertura, nossa tese para TIM e Vivo vai além do pagamento de dividendos. Enxergamos pontos positivos e negativos com essa mudança: é negativo para o acionista que tem como estratégia principal o recebimento de proventos e é negativo para a empresa que perde o benefício do JCP. Em contrapartida, a alíquota cai em 5 p.p. e muito provavelmente também veremos recompras de ações com maior frequência.

O setor de Telecom ainda possui espaço para crescer e as novas iniciativas são bastante animadoras, nosso preço-alvo considera essa perspectiva e continuamos confiantes com a oportunidade apresentada em Vivo e Tim. Nossa leitura preliminar, no entanto, é que a reforma tributária será negativa para o setor.

Educação: NEUTRO

Não impacta diretamente. De todos os setores de nossa cobertura, o educacional é o que sentirá os menores impactos da nova reforma tributária, sejam eles positivos ou negativos. Isso se deve pelo modo de atuação do setor. Por possuírem uma parte de sua base de alunos (aprox. 10%) advinda do Programa Universidade para Todos (PROUNI), as Universidades contam com um benefício fiscal, chegando a pagar efetivamente perto de zero.

E os Dividendos? Também não enxergamos impactos significativos nessa vertente. As empresas de educação historicamente nunca foram as maiores pagadoras de proventos. Os investidores que optam por investir no setor costumam buscar empresas com uma sólida tese de crescimento, bem como planos de investimentos futuros já bem estruturados.

Onde pode impactar? Enxergamos também um possível upside. Com o aumento das faixas de tributação para pessoa física, famílias de menores renda irão usufruir de uma isenção que não possuíam anteriormente. Mesmo com uma demanda já grande pelo ensino superior, acreditamos que essa renda extra possa servir como um gatilho na hora de se matricular nas instituições.

Tecnologia: POSITIVO

Do ponto de vista das empresas de tecnologia, o impacto é mais positivo que negativo. São empresas de alto crescimento, empresas asset light e que estão ainda em um estágio inicial de maturidade. Essas empresas já não pagam dividendos, pois reinvestem todo seu lucro em suas próprias operações. O acionista dessas empresas espera uma valorização de capital em decorrência da valorização de suas ações e, somente no futuro, o recebimento de dividendos.

Para essas empresas, a diminuição da alíquota do IR é muito bem-vinda! Além disso, com a diminuição do IR para pessoa física, os clientes dessas empresas também passam a poder consumir mais, beneficiando o setor (as empresas de tech, cobertas pela casa, possuem bastante relação com empresas de Varejo).

Fundos imobiliários: NEGATIVO

A proposta impacta diretamente o mercado de fundos imobiliários. Atualmente, os fundos contam com isenção nos dividendos e tributação de 20% sobre o ganho de capital. A proposta é de tributação em 15% dos dividendos e redução da alíquota em 5 p.p. para 15% no ganho de capital. Com a aprovação do texto, acreditamos que a cotação dos ativos deva sofrer ajuste do preço na mesma proporção da alteração da alíquota no curto prazo.

Mesmo que a proposta não impacte os impostos sobre os CRIs, acreditamos que estes ativos devam ser afetados indiretamente. Os fundos imobiliários de papel são os maiores investidores desses ativos, e os gestores exigirão um yield maior para justificar o investimento nesse tipo de ativo. A mesma lógica se aplica para a compra de um imóvel, que deve ter seu preço reduzido para que o cap rate (aluguel recebido dividido pelo valor pago pelo imóvel) fique mais atrativo.

Bens Industriais: NEUTRO

No caso da WEG teríamos uma redução pequena na alíquota efetiva, saindo de 10,5% (média de nos últimos 5 anos), para 9,5% de 2023 em diante. A Tupy, seria impactada positivamente à medida que sua alíquota efetiva seria reduzida de 23,7% (média dos últimos 7 anos) para 21,8% de 2023 em diante. Já a Randon é um caso mais complexo, o impacto em relação à perda do benefício fiscal é pequeno, já que a frequência com que a empresa remunera seus acionistas por JCP é baixa. Quando somamos o efeito da redução da alíquota nominal, o saldo é positivo, uma queda na alíquota efetiva de 30% (média dos últimos 4 anos) para 25,5%. O impacto sobre os dividendos é o ponto mais sensível, tanto entre empresas quanto para os acionistas, uma queda de 6,7% no DY projetado para 5,3% em 2022. A seguir apresentamos nossas estimativas para 2022, num cenário sem a reforma (Pré) e num cenário com a reforma (Pós):

As mudanças mais significativas ocorrerão a partir da simplificação do sistema tributário. No cenário perfeito, os impostos IPI, PIS/Cofins, ICMS, ISS e IOF se transformariam em um único imposto e o Brasil se tornaria mais competitivo e estaria alinhado às práticas internacionais. A reforma completa é fundamental para reduzir o elevado custo Brasil, um dos principais entraves para a indústria nacional.

Portanto, nesse primeiro movimento, entendemos que os impactos serão levemente positivos, porém pequenos em comparação a reforma tributária que desonera a cadeia produtiva. No momento existem algumas propostas em trânsito no congresso e a principal diferença entre elas está no número de tributos que serão substituídos pelo novo IVA. 

PEC 45: Unificação do ICMS, PIS, Cofins, IPI, ISS, criando o IBS;

PEC 110: Unificação do ICMS, PIS, Cofins, IPI, ISS, IOF, Pasep, CIDE-Combustíveis, Salário-Educação em um único, criando IBS;

Projeto de Lei: Unificação do PIS r Cofins em um único, o CBS.

Alimentos – Frigoríficos: POSITIVO

Os impactos da reforma para as empresas do setor de alimentos são semelhantes aos impactos descritos no setor de varejo e de tecnologia: com mais renda disponível para as famílias, maior a propensão para consumir alimentos mais nobres, como, por exemplo, a própria carne bovina. O setor é caracterizado por ser cíclico, então apesar de a distribuição de dividendos acontecer (especialmente quando se passa por um momento do ciclo mais favorável), normalmente não é a principal razão pela qual o investidor procura alocar seu capital em frigoríficos. Além disso, o pagamento de JCP nunca foi algo muito relevante para o setor. A redução do IRPJ aumentará os lucros, e com a taxação em dividendos, as companhias devem dar maior foco em reinvestir seus lucros em suas operações e procurar mais oportunidades de aquisições – uma das principais e mais importantes avenidas de crescimento para o setor.

Transportes: POSITIVO

O setor de transporte se caracteriza por ser intensivo em capital, onde as empresas preferem alocar o capital no seu próprio crescimento ao invés de pagar acionistas. Por conta dessas características, o setor deve ser pouco impactado com a reforma tributária. Com o efeito da redução do imposto de renda, as empresas podem se alavancar mais em busca de pagar menos imposto e aumentar o apetite para fusões e aquisições para consolidar o setor.  

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