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Publicado em 24 de Maio às 20:26:52

Pós-Temporada de Balanços (1T23): Setor doméstico fazendo a lição de casa.

Diante de um cenário macroeconômico desafiador, com inflação acima da meta e política monetária contracionista, empresas ligadas à economia doméstica foram capazes de desafiar as adversidades e registrar um desempenho positivo. Apesar de uma queda trimestral nas receitas, o avanço dessas empresas na comparação anual superou a inflação, destacando-se ainda mais em relação à performance das empresas exportadoras. No entanto, este panorama também mostrou um índice Ibovespa em com queda nos Lucros por Ação (LPA), puxado pelos resultados menos expressivos das empresas de commodities.

Santo de casa faz milagre!

No primeiro trimestre de 2023, as empresas listadas na B3, a bolsa de valores do Brasil, apresentaram resultados financeiros que superaram positivamente as expectativas. Este fato veio como uma surpresa, especialmente considerando as previsões da Bloomberg e as adversidades econômicas encontradas no final do ano anterior. Entre os destaques, notamos um desempenho particularmente forte por parte das empresas voltadas à economia doméstica.

Analisando detalhadamente, vemos que o número de empresas cuja receita líquida superou as estimativas caiu de 25% no quarto trimestre de 2022 para 20% no primeiro trimestre de 2023. Apesar disso, houve um aumento nos resultados em linha com as expectativas e uma estabilidade nas surpresas negativas. Isso indica que a performance geral das empresas listadas manteve-se sólida, mesmo com uma queda na porcentagem de empresas que ultrapassaram as estimativas de receita líquida.

Ao mesmo tempo, houve um aumento notável no EBITDA (Lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) e no Lucro Líquido, dois indicadores importantes de desempenho financeiro. A proporção de empresas cujo EBITDA superou as expectativas saltou de 28% no quarto trimestre de 2022 para 47% no primeiro trimestre de 2023. Similarmente, o lucro líquido que superou as expectativas também aumentou, de 35% para 49%. Isso evidencia que, apesar das dificuldades econômicas, muitas empresas conseguiram não apenas se manter, mas também expandir suas margens e aumentar a lucratividade.

Esses resultados mostraram o trabalho consistente e eficaz que as empresas, especialmente aquelas focadas na economia local, estão realizando. Apesar de um ambiente desafiador com inflação acima da meta e política monetária contracionista, com a taxa Selic em 13.75%, a maioria das empresas conseguiu superar as expectativas dos investidores.

A melhora significativa na precificação do Ibovespa nas últimas semanas, acreditamos, está intimamente ligada a esses resultados surpreendentes. O mercado parece estar otimista e espera melhores resultados à frente. Mesmo com um cenário macroeconômico desafiador, a possibilidade de uma redução na taxa Selic ainda em 2023 pode potencializar ainda mais os resultados futuros das companhias listadas na B3. Isso indica que, apesar das incertezas, os investidores têm razões sólidas para manter o otimismo em relação ao mercado financeiro brasileiro.

Como dito anteriormente, o grande destaque do primeiro trimestre de 2023 foi o desempenho das empresas ligadas à economia doméstica. Apesar de terem apresentado uma pequena queda trimestral nas receitas (-3,36%), estas empresas exibiram um crescimento acima da inflação quando comparado ao mesmo período do ano passado. O EBITDA (Lucro antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização) dessas empresas aumentou 19,17% em relação ao trimestre anterior (QoQ), e 19,80% em relação ao mesmo período do ano anterior (YoY). Estes números se destacam, especialmente se comparados aos resultados das empresas exportadoras, que apresentaram um avanço marginal de 0,02% no QoQ e uma queda de 18,03% no YoY.

É importante destacar que o Ibovespa, o principal índice da bolsa de valores brasileira, é bastante influenciado por empresas ligadas à commodities. Os resultados dessas empresas, de modo geral, puxaram para baixo os números do índice. Quando excluímos o setor bancário (resultando no índice “Ibovespa ex-Banc&Finan”), os números se tornam ainda mais desalentadores. A única nota de cautela para o setor doméstico está no nível de alavancagem, que aumentou durante o trimestre, influenciado pelo efeito da Americanas e pela sazonalidade. Em contraste, o nível de alavancagem do Ibovespa apresentou queda tanto na variação trimestral (QoQ) quanto na anual (YoY), influenciado principalmente pelas empresas exportadoras.

Por dim, o LPA (Lucro por Ação) do Ibovespa recuou 24,25% em comparação com o quarto trimestre de 2022 e 37,31% em relação ao mesmo período do ano anterior (1T22). Esta retração se deve ao cenário doméstico mais desafiador, marcado por altas taxas de juros e uma desaceleração da atividade econômica global.

Destaques Setoriais

Frigoríficos

Minerva (BEEF3): Apesar da suspensão das restrições à carne bovina para a China, a Minerva apresentou resultados surpreendentemente positivos, com receitas razoáveis e margens acima do esperado. Isso se deve ao redirecionamento parcial das exportações para outros mercados sul-americanos e ao ciclo favorável do gado no Brasil e Paraguai. A queima de caixa aumentou devido a condições mais restritivas nas linhas de crédito bancário. Com um ciclo favorável do gado e crescente demanda chinesa, a recomendação é de COMPRA para a Minerva.

JBS (JBSS3): Apresentou resultados abaixo do esperado, com margens apertadas nos EUA, resultados fracos na Seara, alto custo de suínos na JBS USA Pork, dificuldades no mercado doméstico no Brasil e margem EBITDA negativa na Austrália. Espera-se melhores margens nos próximos trimestres, e a recomendação, mesmo após um trimestre ruim, é de COMPRA para a JBS.

Marfrig (ex-BRF) (MRFG3): Os resultados vieram em linha com o esperado, com a empresa sendo impactada pelo alto custo do gado nos EUA. A empresa se mostrou bastante alavancada. Na BRF, as margens decepcionaram e a alavancagem continua alta. Não se esperam grandes melhorias operacionais para essas empresas nos próximos trimestres. A recomendação para ambas é MANTER.

Bebidas

Ambev (ABEV3): Superou as expectativas tanto em termos de receita quanto de margem, impulsionada pelos segmentos Cerveja Brasil e NAB. O segmento LAS também apresentou melhorias. No entanto, os segmentos CAC (América Central e Caribe) e Canadá apresentaram uma contração. Mesmo com um bom trimestre, a recomendação para a Ambev é MANTER, devido ao pouco potencial de crescimento identificado.

Agronegócio

BrasilAgro (AGRO3): A empresa BrasilAgro (Agro3) apresentou um resultado trimestral fraco, embora um pouco acima das expectativas, devido à seca que afetou a produção de algodão (com um volume 40% menor do que o esperado), aos preços mais baixos das commodities e ao aumento dos custos. A BrasilAgro registrou uma receita (excluindo vendas de fazendas) de R$190,7 milhões, um aumento de 8,4% ano a ano, e acima das expectativas (+3,3% Genial Est.), consequência de um maior volume de grãos. Portanto, apesar das dificuldades, a empresa conseguiu superar as expectativas devido à sua performance na comercialização de grãos.

SLC Agrícola (SLCE3): A SLC Agrícola (SLCE3), por outro lado, apresentou resultados muito acima das expectativas do mercado. A receita líquida atingiu R$2,2 bilhões (+6,7% Genial Est.), representando uma queda de 7,9% ano a ano. A empresa registrou um EBITDA ajustado de R$934 milhões (+13,9% Genial Est.), uma queda significativa de 25,9%. Apesar da queda tanto na receita quanto no EBITDA, a performance da empresa foi acima das expectativas. Portanto, apesar de enfrentar desafios em termos de queda de receita e EBITDA, a SLC Agrícola conseguiu superar as expectativas do mercado.

Bancos

Itaú (ITUB4): Aparece como uma escolha forte entre os bancos, devido ao seu posicionamento superior em relação a seus pares privados (Bradesco e Santander) e à ausência de exposição direta a riscos políticos, ao contrário do Banco do Brasil. Esperamos um crescimento de lucro atraente de 15% ano a ano para 2023, em contraste com seus rivais privados, que provavelmente continuarão a enfrentar compressão de lucro. O Itaú deve continuar se beneficiando do hedge realizado em sua tesouraria contra a alta dos juros, mantendo a margem com o mercado positiva. Além disso, o banco possui um mix de carteira de crédito mais favorável neste momento do ciclo econômico, com uma maior participação em pessoas físicas de alta renda e grandes empresas. Projetamos um lucro líquido de R$ 35,43 bilhões para o Itaú em 2023, o que está aproximadamente no meio da faixa de guidance fornecida pela empresa.

Banrisul (BRSR6): Registrou um lucro líquido de R$ 213 milhões no primeiro trimestre de 2023, 17% abaixo das nossas estimativas de R$ 258 milhões e 13% abaixo das expectativas do mercado de R$ 245 milhões. A queda de 15% em relação ao trimestre anterior no resultado foi impactada pela redução nas receitas totais (-7% em relação ao trimestre anterior), enquanto as despesas permaneceram praticamente estáveis. No entanto, um aumento de 30% ano a ano no lucro líquido foi impulsionado por uma melhor receita líquida de juros (+11,4% ano a ano) e uma despesa administrativa total controlada (+7,0% ano a ano).

Seguradoras

Porto Seguro (PSSA3): A Porto Seguro reportou um lucro líquido recorde para um primeiro trimestre, de R$ 333 milhões, crescimento de 90% em relação ao ano anterior. Esse resultado foi alinhado com nossas estimativas de R$ 330 milhões, mas 5% abaixo das expectativas do mercado de R$ 349 milhões. Com isso, a Porto atingiu um retorno sobre o patrimônio (ROE) de 12,3% no trimestre (+4,9 pontos percentuais em relação ao ano anterior), ainda abaixo do seu potencial, mas, na nossa visão, com perspectivas de melhora nos próximos trimestres.

IRB Brasil (IRBR3): Por outro lado, o IRB Brasil (#IRBR3) registrou um lucro líquido de R$ 8,6 milhões, abaixo das estimativas e do consenso do mercado. A empresa consumiu R$ 411 milhões de caixa no trimestre devido ao alto volume de pagamentos de sinistros e retrocessão, demonstrando um desempenho aquém do esperado. A situação financeira do IRB permanece desafiadora e a empresa ainda enfrenta um cenário complexo para a recuperação de sua rentabilidade e a reversão da queima de caixa.

Siderurgia

Gerdau (GGBR4): A Gerdau foi o maior ganhador no setor de siderurgia. Destaques positivos incluíram um aumento no volume da Obra Nova (ON) na América do Norte e uma recuperação do market share na ON Brasil, o que resultou em um aumento trimestre a trimestre. No entanto, os preços da ON Brasil decepcionaram, embora a resiliência da ON América do Norte tenha compensado isso. Isso levou a um trimestre sólido, com um EBITDA consolidado 7% acima das estimativas e um lucro líquido crescente trimestre a trimestre, mesmo excluindo os efeitos não recorrentes. A Gerdau é reforçada como o top pick no setor de Metais & Mineração.

CSN Holding (CSNA3): A CSN Holding foi a maior perdedora no setor de siderurgia. A empresa enfrentou problemas em apenas um de seus cinco negócios, a Mineração (CMIN), registrando um aumento na receita. A empresa enfrentou problemas de produção em sua unidade de siderurgia, que foram compensados por uma queima de estoque. Isso levou a uma boa diluição nos Custos dos Produtos Vendidos por tonelada (COGS/t), mas os preços de mercado foram significativamente menores do que o estimado. Embora a queima de estoque tenha causado um maior efeito de diluição no COGS/t, ela não favoreceu a dinâmica total do resultado, com o efeito no custo sendo neutralizado pela mineração, que apresentou uma eficiência pior devido à interrupção da linha férrea da MRS, atrasando os embarques.

Mineração

CSN Mineração (CMIN3): O maior ganhador no setor de mineração foi a CMIN. Apesar de problemas na produção e barreiras logísticas causadas pelas chuvas, a companhia conseguiu aumentar seu EBITDA trimestre a trimestre, principalmente devido ao aumento no preço de referência do minério de ferro, que chegou a ultrapassar +US$120/t. No entanto, a perspectiva para o próximo trimestre não é tão positiva devido à diminuição da demanda da China. A curva média para o 2T23 é estimada em US$115/t, podendo cair para US$95/t até o final do ano.

Vale (VALE3): A maior perdedora no setor de mineração foi a Vale. A companhia apresentou um EBITDA significativamente menor, tanto trimestre a trimestre (-26%) quanto ano a ano (-43%), devido a uma produção sazonalmente baixa e problemas de logística. O custo de breakeven subiu +18% trimestre a trimestre devido a itens não recorrentes, como prêmios negativos, custos mais elevados e problemas com a distribuição. Apesar de um 1T23 fraco, a Vale ainda demonstra uma alta capacidade de geração de caixa. Considerando que a Vale está negociando abaixo de R$70, a empresa apresenta uma boa oportunidade de entrada, levando à mudança do rating de Manter para Compra. A expectativa é que, após o humor geral se dissipar, o fluxo de compra voltará para as ações da empresa.

Telecom

Vivo (VIVT3): O maior ganhador no setor de telecomunicações foi a Vivo. Apesar de uma ligeira queda trimestral no EBITDA devido a custos totais acima do esperado, a Vivo apresentou sólidos resultados no 1T23. A empresa viu um aumento na receita tanto na parte móvel, graças ao contínuo upsell de sua base e fortes vendas de aparelhos, quanto na parte fixa, graças à aceleração da conexão FTTH. A empresa também reduziu significativamente seu CAPEX, o que sugere um potencial de geração de caixa operacional acima do esperado. A Vivo é vista como líder tanto no mercado de conexão de fibra quanto na operação móvel, mantendo sua posição de Top Pick para o setor de telecomunicações.

Oi (OIBR3): A maior perdedora no setor de telecomunicações foi a Oi. A empresa apresentou um resultado decepcionante, com um EBITDA fraco e custos acima do esperado. A situação da empresa é considerada precária, com baixa geração de caixa e perspectivas incertas para o futuro. Além disso, a empresa está avaliando a venda de sua fatia na V.tal por um valor que se acredita estar superestimado. Mesmo que a venda ocorra, é provável que o valor real seja muito inferior, resultando em pouca perspectiva de redução significativa na relação dívida líquida/EBITDA. Isso levou à rebaixamento da recomendação de manter para vender.

Tecnologia

Mercado Livre (MELI34): O maior ganhador no setor de tecnologia foi o Mercado Livre. A empresa superou as expectativas já otimistas, demonstrando grande capacidade de execução e superando seus concorrentes na vertical de e-commerce, bem como apresentando sinais positivos de controle de inadimplência na vertical de Fintech. O Mercado Livre viu um crescimento maior que o esperado no volume bruto de mercadorias (GMV), impulsionado principalmente pelo Brasil. A empresa também expandiu o volume total de pagamentos (TPV), com uma grande contribuição do TPV fora da plataforma no negócio de aquisição. Além disso, a carteira de crédito da empresa cresceu acima das projeções, consolidando um resultado excelente. O Mercado Livre é considerado a principal escolha (Top Pick) no setor de tecnologia.

Méliuz (CASH3): O maior perdedor no setor de tecnologia foi o Méliuz. A empresa continua com uma estrutura de custos alta, que não é compensada pelo crescimento da receita. Houve uma forte desaceleração no Bankly e uma retração ano a ano na vertical de shopping. No lado positivo, as despesas totais foram mais baixas do que as estimativas devido ao custo de rescisão ter sido menor do que o esperado. No entanto, a dinâmica operacional da empresa entre preço (Take-rate) e volume (GMV) sugere que a empresa verá uma desaceleração maior nos próximos trimestres e que o Bankly continuará a pressionar os custos no próximo ano. Há uma observação cautelosa sobre o fluxo de ações da empresa, já que não se acredita que as ações sustentem altas de forma resiliente.

Transportes

Dentre as locadoras, a Localiza (RENT3) foi o destaque positivo, apresentando margens muito fortes graças à sua maior escala e captura de sinergias após a fusão com a Unidas. A empresa reagiu menos ao movimento de fechamento de curva, dado ser um papel mais bem precificado. Já no setor aéreo, destaque positivo foi a Gol (GOLL4), com excelentes níveis de ocupação e tarifa. No entanto, a Azul (AZUL4) se saiu ainda melhor no período, devido ao excelente acordo de renegociação de dívidas que a companhia conseguiu negociar.

Industrial

Dentro do setor industrial, tivemos surpresas positivas em relação WEG (WEGE3) que reportou um nível excelente de rentabilidade, mesmo com a desaceleração que já esperávamos. Para o setor de autopeças, o mercado esperava um cenário bastante desafiador, devido aos dados de produção de veículos pesados no Brasil. No entanto, Randon (RAPT4) e Tupy (TUPY3) conseguiram neutralizar bem essa pressão negativa do mercado local, graças à sua diversificação. Mesmo com volumes mais fracos nas divisões que abastecem as montadoras, ambas as empresas apresentaram margens acima das estimativas e reagiram bem à divulgação dos resultados.

Varejo

Os últimos meses têm se mostrado desafiador para as operações de varejo. Frente a um núcleo de inflação persistentemente alta e uma taxa Selic em 13,75% a.a., e sazonalmente afetada, sentimos que este foi um trimestre de desaceleração de demanda. As varejistas precisaram equilibrar o seu fraco crescimento de receitas, sem deixar a margem operacional escorrega

Não é uma tarefa fácil, requer ajustes de investimentos e enxugamento de despesas a todo momento. Mas esse é o tom que enxergamos para o ano. Ao longo das teleconferências de resultados do 1T23, várias companhias mostraram a menor perspectiva de Capex para 2023, além de buscar otimizar o seu ciclo operacional.

Das 11 empresas de varejo sobre a nossa cobertura, 55% apresentaram um resultado em linha ao esperado e 27% abaixo de nossa estimativa. Confira a análise de cada setor!

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