O atual ciclo de mercado dos criptoativos possui muitas particularidades. A grande influência do cenário macroeconômico sobre a precificação do Bitcoin, assim como a grande correlação da criptomoeda com os ativos de risco são novos importantes fatores a serem monitorados, e podem ser os motivos principais que levaram a desvalorização observada essa semana.
A estrutura de mercado atual possui semelhanças ao final do último ciclo de baixa, no entanto, as métricas e dados de rede indicam que não há demanda suficiente para sustentar uma nova tendência de alta. Esse fato nos leva a crer que, nos próximos meses, deveremos passar por uma fase de consolidação do fundo do ciclo, podendo atingir novas mínimas.
O mercado cripto encerrou a semana com uma liquidação relevante, fazendo com que os principais criptoativos acumulassem grande desvalorização. A capitalização total dos criptoativos saiu de US$ 1.16t na quarta-feira, para cerca de US$ 1t durante o final de semana, no qual tanto o Bitcoin quanto o Ethereum perderam mais de 13% em valor de mercado.
Os motivos para essa queda mais acentuada podem estar relacionados novamente com o cenário macroeconômico. As recentes declarações do FED foram duras e reforçaram o compromisso com a necessidade de reduzir a taxa de inflação norte americana, trazendo a expectativa de que novos aumentos na taxa de juros não estão descartados. O índice de força do dólar (DXY) atingiu o maior valor do ano, registrando também o maior nível dos últimos 20 anos.
O dólar fortalecido gerou um ambiente instável para ativos de risco. Desde o início do período de análise desse relatório, o S&P500 desvalorizou cerca de 4% enquanto a Nasdaq caiu mais de 6%. As expectativas estão em cima do Simpósio de Jackson Hole, que acontecerá nesta sexta-feira e pode dar ao mercado uma orientação sobre a política que o FED adotará daqui em diante.
No início do mês, o índice de medo e ganância atingiu um pico de 47, se mantendo apenas a 3 pontos de atingir o nível de ganância. Entretanto, dado o novo cenário e incerteza macroeconômica, o índice rapidamente caiu para os atuais 25, retornando ao nível de medo extremo
A volatilidade do Bitcoin passou as últimas semanas entre os níveis mais baixos do ano. Dados históricos mostram que o BTC não sustenta baixos níveis de volatilidade por muito tempo, tornando essa uma métrica indicativa para movimentos intensos de preço, como o dessa semana.
A atual queda do BTC desde as máximas está em 69% e iniciou há 287 dias. O valor mais baixo atingido pelo Bitcoin ocorreu 222 dias após o topo, e representou um rebaixamento de 74%. Apesar disso, durante os ciclos de 2014 e 2018, os fundos foram atingidos entre 12 e 13 meses após o topo, atingindo um rebaixamento máximo superior a 80%. O ciclo atual possui muitas particularidades, como por exemplo o topo duplo atingido em novembro e abril, assim como a queda inferior ao topo do ciclo anterior, nunca antes presenciada no BTC. Porém, caso a história venha a se repetir, pode-se esperar que o valor mais baixo do BTC seja atingido no final desse ano.
A grande desalavancagem sofrida pelo mercado cripto, com início no episódio de Terra-Luna, trouxe à tona a grande alavancagem à qual instituições centralizadas estavam expostas, o que resultou em inúmeros casos de congelamento de fundos de usuários.
As grandes saídas de Bitcoin de instituições centralizadas indicam que os investidores estão confiando cada vez menos em exchanges e plataformas de empréstimos. As crescentes vendas de hardwallets também indicam que o Bitcoin está cada vez mais sendo movido para métodos de armazenamento mais seguros.
O mercado em baixa tem se refletido também na baixa utilização da rede. As taxas de transações diárias do BTC caíram 30% ao longo da semana, chegando a somar apenas US$ 224k na cotação atual. Esse é o menor valor em dólar desde Abr/2020.
Atualmente, as taxas de transação correspondem a somente 1.15% da receita total dos mineradores. O restante é representado pelos Bitcoins minerados em cada bloco. Essa proporção da receita gera questionamentos quanto à sustentabilidade da atividade de mineração, uma vez que, por conta do halving (evento que acontece a cada 4 anos e reduz a emissão de novos BTCs em 50%), a emissão de novos BTCs tende a caminhar para zero.
Existem duas formas de manter a segurança da blockchain do Bitcoin no longo prazo (i.e. alto hash rate, devido alta atividade de mineração). A primeira forma é a partir da valorização exponencial do preço do BTC, fazendo com que os satoshis pagos como taxa sejam suficientes para cobrir os custos de mineração.
A segunda forma seria através da redução dos custos de energia elétrica, utilizada para manter as máquinas de mineração em funcionamento. A redução também pode ser através de maquinário energeticamente mais eficiente, entretanto essa forma possui uma barreira de velocidade de desenvolvimento tecnológico, além do alto custo para a troca dos equipamentos.
A mineração de Bitcoin é uma indústria extremamente competitiva, e as mineradoras que pagam mais caro pela eletricidade serão gradualmente expulsas da indústria. Isso significa que, à medida que o setor amadurece, o preço médio da eletricidade no setor tende a diminuir. No longo prazo, os únicos mineradores que sobreviverão serão aqueles que usam energia ociosa e subvalorizada. Além disso, a dinâmica ultracompetitiva da indústria de mineração forçará os mineradores a ajudar a resolver esses problemas de energia para otimização dos seus custos de operação.