O sentimento de aversão ao risco continua presente nos mercados globais, visto que a guerra na Ucrânia não mostra sinais de que encerrará tão cedo, além da postura mais contracionista de bancos centrais. A constante pressão inflacionária e medidas para contê-la traz cada vez mais à tona discussões referentes a uma possível recessão. Por esses motivos, o cenário macroeconômico permanece impactando negativamente o mercado de ativos de risco, que inclui os criptoativos.
O Bitcoin (BTC) encerrou o mês de junho com o segundo pior resultado trimestral desde sua criação. O BTC também registrou a pior performance mensal da história, acumulando 37.25% de queda, tendo iniciado o mês em US$ 31.7k e alcançando seu valor mínimo em US$ 17.6k. O BTC está tendo dificuldade em encontrar volume comprador para se manter acima dos US$ 20k e atualmente está sendo negociado no patamar de US$ 19k.
Além do cenário macroeconômico, a alavancagem de instituições e fundos de investimento do mercado cripto também colaborou para as quedas das últimas semanas. A sequência de liquidações em cascata do mercado parece ter encontrado uma raiz no Three Arrows Capital (3AC). O 3AC é um dos maiores fundos de investimentos voltados a criptoativos e se mostrou como peça central de grande parte da alavancagem do mercado.
Efeito dominó: 3AC pede falência e mais uma corretora congela fundos
Um dos maiores fundos de investimentos do mercado cripto abriu pedido de falência. A Three Arrows Capital (3AC), fundada em 2012 por Sun Zhu e Kyle Davis, chegou a reportar um patrimônio líquido de US$ 18 bilhões. De acordo com empresas de análises de dados de blockchain, estima-se que até Mar/22, a 3AC gerenciava cerca de US$ 10 bilhões em criptoativos. Especula-se que a maior parte desse capital foi obtida através de empréstimos provenientes de várias outras plataformas.
O histórico de sucesso de Su Zhu e Kyle Davis, derivado de um alinhamento de mercado favorável e grande agressividade e alavancagem em suas operações, permitiu que a reputação da 3AC abrisse portas para obtenção de crédito em praticamente qualquer instituição. A reputação e sucesso do 3AC era tanta que conseguiram empréstimos até mesmo de exchanges, como a Voyager. Parte dos ativos da 3AC, utilizados como garantia nos empréstimos, incluíam cerca de 38 milhões de cotas do fundo de investimentos em Bitcoin da Greyscale (GBTC), além de centenas de milhares de dólares em tokens LUNA.
Em tese, o GBTC deveria ter uma correlação 1:1 com o Bitcoin, porém chegou a acumlar um prêmio de quase 50% sobre o BTC, visto que sua demanda ficou em alta durante os anos de mercado favorável para as criptomoedas. O fundo se tornou um instrumento de exposição ao Bitcoin para investidores institucionais, que também estavam aproveitando do prêmio para realizar operações de arbitragem entre o GBTC e o BTC.
O colapso do ecossistema Terra-LUNA foi o estopim para uma série de liquidações em todo o mercado cripto, revelando o real nível de alavancagem utilizado pelos principais nomes da indústria, inclusive o 3AC, que utilizou grande dos GBTCs e dólares como colateral para se expor aos protocolos oferecidos pela blockchain Terra. O momento desfavorável de mercado também afetou a demanda de GBTC, que passou a ser negociado com desconto a partir de 2021, e atualmente é negociado com cerca de 30% de deságio.
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Esse deságio afetou a todos que eventualmente se expuseram ao fundo na expectativa de se aproveitar do, até então, prêmio sobre o BTC. Plataformas como a BlockFi detinham grandes posições de GBTC aguardando para serem realizadas com lucro, mas também sofreram com o posterior deságio das cotas para com o Bitcoin.
Com a baixa do mercado e a inesperada incapacidade de pagar seus empréstimos, o 3AC passou a sofrer pressão de seus credores, como a BlockFi, que liquidou as garantias deixadas pelo fundo para os mais de US$ 1 bilhão emprestados. A Voyager, por outro lado, concedeu um empréstimo para o 3AC de cerca de US$ 700 milhões, divididos em BTC e USDC, sem garantia. Em 22 de junho iniciaram os boatos de que o 3AC já estaria insolvente e não conseguiria reembolsar o dinheiro emprestado da corretora Voyager. Menos de uma semana depois, a Voyager emitiu um aviso de inadimplência contra o 3AC por não fazer os pagamentos necessários de seu empréstimo no valor de mais de US$ 665 milhões. No mesmo dia, um tribunal nas Ilhas Virgens Britânicas ordenou a liquidação da Three Arrows Capital. O fundo então entrou com um pedido de falência, marcando assim o fim de um dos principais fomentadores do mercado de alta das criptomoedas.
As plataformas de empréstimos de criptomoedas acabaram por compartilhar dos mesmos riscos, uma vez que tinham exposição umas às outras. Dessa forma, mesmo que sem exposição direta ao 3AC, todas sofreram com a queda do fundo. Nomes como Celsius, Babel Finance, Voyager e BlockFi concentraram mais risco do que deveriam em apenas uma instituição, mesmo que indiretamente. Como consequência, todas estão passando por condições financeiras precárias e acabaram sendo obrigadas a congelar os fundos de seus clientes. Com exceção da BlockFi, que apesar de ainda estar operando, está sendo negociada por 99% de desconto frente ao seu último valuation de cerca de US$ 5 bilhões.
Greyscale processa a SEC
A Greyscale conseguiu visibilidade por ter sido uma das primeiras empresas a criar um instrumento de exposição ao Bitcoin para o investidor institucional. O GBTC, seu fundo de Bitcoin, foi negociado com um prêmio durante a maior parte de sua vida, com seu preço nos mercados secundários subindo até 132,5% acima de seu valor patrimonial líquido. Isso se deu pelo fato de, até então, existirem opções limitadas para que instituições conseguissem investir em Bitcoin. Isso mudou e agora há mais maneiras de se expor ao Bitcoin, dados os vários ETFs que surgiram nos últimos anos.
O GBTC, que tem US$ 12 bilhões sob gestão, caiu 47% nos últimos 12 meses. O desconto aumenta enquanto a Greyscale está engatando em uma luta legal contra a Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC) por negar sua tentativa de converter o fundo em um ETF. Ao transformar o GBTC em um ETF à vista para negociação de BTC, o desconto essencialmente desapareceria e ajudaria a estancar parte do sangramento de mercado causado por cotas do fundo usadas como garantia de outros empréstimos. Antes da decisão da SEC, os volumes de GBTC negociados atingiram seus segundos níveis mais altos do ano, já que os investidores procuraram novamente o GBTC para uma possível negociação de arbitragem. Se o GBTC fosse convertido em um ETF à vista e começasse a ser negociado pelo valor nominal, o desconto atual de cerca de 30% poderia ser capturado como lucro assim que o fundo transitasse para um ETF e, como resultado, vimos os volumes de GTBC aumentarem significativamente na última semana de junho.
Análise de dados
A tendência de acumulação de Bitcoin retornou para próximo das máximas. Os principais fatores para esse aumento foram as carteiras com mais de 10k BTC sob custódia e as carteiras com menos de 1 BTC, aumentando significativamente sua exposição à criptomoeda. As últimas vezes em que a tendência de acumulação atingiu valores tão altos foram em momentos de (i) euforias de mercados de alta; (ii) após topos de mercado e (iii) durante fundos de ciclos de mercado em baixa.
A métrica de Reserva de Risco atingiu o valor histórico mais baixo. Essa métrica tende a reduzir quando há um aumento de pessoas segurando suas posições em Bitcoin. Isso indica que apesar da drástica queda de 2022, os detentores de Bitcoin, em geral, estão mantendo segurando seus BTCs. Os últimos fundos da Reserva de Risco foram durante o mercado de baixa de 2015 e durante o crash de mercado provocado pelo Covid.
Outras métricas também sinalizam que o mercado pode estar próximo de encontrar o fundo do atual ciclo de baixa. O número de endereços ativos na rede do Bitcoin costuma ser uma delas. Durante mercados de baixa, o número de endereços ativos na rede tende a lateralizar acima dos níveis do último ciclo e, gradativamente, voltar a subir à medida que o mercado se recupera. Atualmente estamos no meio do canal de atividade dos últimos ciclos de baixa.
O percentual de Bitcoin em lucro atingiu cerca de 40% nos últimos ciclos de mercado em baixa, ou seja, mais da metade de todas as moedas em circulação haviam sido obtidas por valores superiores aos de negociação durante as piores fases do mercado. Durante a queda para US$ 17,6k, a oferta de BTC em lucro atingiu cerca de 50%. Esse foi o menor valor de negociação do BTC nos últimos 2 anos e desencadeou um grande volume de negociações no patamar de preço abaixo de US$ 20k.
De acordo com o gráfico de Preço de Distribuição Realizado, podemos confirmar que cerca de 1,43 milhões de BTC foram negociados entre US$ 17,6k e US$ 21,6k. Essa quantidade representa mais de 7% de todo a oferta de BTC e, no caso de um reteste desses valores, colocaria toda essa oferta também abaixo do preço de aquisição. Fazendo com que o percentual de Bitcoin em lucro atingisse a faixa dos últimos ciclos de baixa, alcançadas em 2015 e 2019.
Web3: Arbitrum pausa evento promocional: Sucesso ou fracasso?
A blockchain Arbitrum, juntamente com a Optimism, é uma das mais conhecidas redes de escalabilidade da Ethereum. Ambas atuam a partir do sistema de rollups otimistas, uma das alternativas de solução de escalabilidade da Ethereum.
Em teoria, as redes de escalabilidade existem para que seja possível se aproveitar da segurança e robustez da rede principal, ao mesmo tempo em que seja possível realizar transações com menores custos e mais agilidade.
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A Arbitrum precisou interromper temporariamente o evento “Arbitrum Odyssey” por não ter suportado a grande demanda de novos usuários na rede. O custo para realizar uma transação na Arbitrum chegou a superar os custos da própria rede Ethereum, o que para uma solução de segunda camada, representa um problema sério.
A “Arbitrum Odyssey” é uma iniciativa de 8 semanas que recompensa os exploradores do ecossistema com NFTs exclusivos. A grande atração de usuários também pode ser explicada pelo rumor de que os NFTs entregues semanalmente como recompensa, de alguma forma serviriam como um “vale-airdrop” quando anunciassem a distribuição pública de seu token de governança. Essa especulação veio à tona pois a Optimism realizou o airdrop de seus tokens recentemente. Um airdrop é uma distribuição não solicitada de um token, geralmente de graça, para vários endereços de carteira. Dependendo da popularidade da rede que realizou a distribuição, os valores distribuídos podem chegar a centenas de dólares.
Os responsáveis pela Arbitrum informaram que o evento será retomado após a implementação da atualização “Nitro”. Apesar de não haver cronograma certo, espera-se que após essa atualização a rede tenha capacidade significativamente maior, além de reduzir as taxas de transação.
O que realmente chamou a atenção nessa situação foi a incapacidade de uma rede que, supostamente, deveria funcionar como uma forma de reduzir o congestionamento da Ethereum, ter sofrido justamente com os mesmos problemas. Questionamentos sobre a capacidade das redes de segunda camada conseguirem cumprir seu propósito começaram a surgir.