Estamos mudando nossa recomendação de Cielo de Neutro para Comprar baseado em um cenário competitivo mais racional em 2023, aumento de take rate devido a mudanças regulatórias em Abril/2023 que devem ajudar a receita. Por fim, o preço da ação caiu para níveis mais interessantes e apesar de não termos mudado muito nosso preço alvo, a dinâmica para 2023 nos parece mais favorável, garantindo mais um ano de crescimento de lucro a despeito de volumes mais baixos.
Para o 4T22, esperamos uma continua evolução na rentabilidade da Cielo, com o lucro recorrente de R$ 463m avançando 9,9% t/t e 54,4% a/a. A forte expansão mesmo no comparativo a/a mostra que a decisão de venda da Merchant e-Solutions foi acertada, uma vez que era uma detratora nos ganhos da Cielo Brasil e da Cateno, com prejuízo de R$ 41m no 4T21.
Perspectiva para 2023
Para 2023, esperamos um ano com expansão dos resultados, marcados por uma carteira já reprecificada, apesar de esperarmos uma volumetria mais fraca, caindo de uns 25% em 2022 para 10-15% em 2023, por conta de um cenário macroeconômico mais desafiador somada a uma menor emissão de cartões por parte dos bancos e fintechs. Entretanto, mesmo com uma diminuição no avanço da volumetria acreditamos que a linha de receita ainda conseguirá avançar, por conta de uma boa dinâmica de preço. Além disso, a Cielo se beneficiará com a mudança da regulação do BC, assim, aumentando nossa estimativa de taxa de desconto liquida (Net MDR) de cartão de débito de 0,56% para 0,66%, que deve contribuir a partir do 2T23 e melhorar o lucro do ano de 2023 em R$ 190m.
Desse modo, chegamos em um lucro líquido recorrente em R$ 1,81b em 2023, um pouco melhor que o consenso de R$ 1,73b, sugerindo um valuation de 7,5x P/L 23E. Acreditamos que em termos de P/L a empresa se encontra em patamares atrativos, quando comparada a sua mediana histórica e também com as suas concorrentes. Desde o resultado do 3T22 a ação da empresa caiu em 16%, chegando em preços interessantes, assim, acreditamos que nosso preço-alvo (PA) de R$ 6,42, implicando um upside de 26,8% compensa os riscos da tese no longo prazo. Sendo assim, alteramos nossa recomendação de MANTER para COMPRAR. Nosso preço alvo é baseado em um modelo de dividendos descontados (DDM), payout de 50% do lucro, com um custo de capital de 14,8% e um crescimento de longo prazo (g) de 7,0% nominal. O nosso PA implica um valuation de 9,03x P/L 24E (sobre o lucro contábil).
Competição: Nebulosa no longo prazo
Acreditamos que a visão de longo prazo para a competição ainda é nebulosa. O setor continua com cada vez mais concorrentes, que como vimos no passado, podem ser mais agressivos em preço, resultando na erosão da rentabilidade do setor. Eventualmente, acreditamos que o setor possa passar com uma consolidação, mas até lá, o cenário continua pode piorar com novas empresas mais ágeis desafiando as incumbentes. Além disso, o surgimento de novas tecnologias e produtos substitutos como o Pix, ajudam a piorar a visibilidade de longo prazo. A falta de posicionamento da Cielo quanto a inovação e tecnologia o torna refém da comoditização que se tornou característica do setor.
Desde 2018, a Cielo vem perdendo market share (40,3% em 2018 para 23,1% no 3T22), principalmente pelos seus concorrentes focarem em nichos que não eram de sua especialidade, como a Pagseguro no long tail (pequeno varejo) e a Stone no rentável pequeno-médio varejista (PME).
Do lado mais positivo além dessa mudança regulatória, o setor deve melhorar sua rentabilidade assim que as taxas de juros começarem a baixar, aliviando o funding das adquirentes. A Cielo vem se beneficiando de uma melhora nos custos, satisfação do cliente e reprecificação de seu take rate. Nesses últimos trimestres, a empresa conseguiu acompanhar o mercado no aumento de preço, melhorar a eficiência de custo, desinvestir de ativos adjacentes (non-core), mais do que compensando o aumento do custo de funding pressionado pela alta da Selic.
Acreditamos que o embate para captura de market share vai continuar em 2023. Temos a expectativa que os movimentos de reprecificação não serão tão demandados como ocorreu em 2022, visto que esperamos uma Selic sem muitas flutuações até o final do ano, uma dinâmica diferente da subida rápida de juros de 2021-2022 que pressionou o custo de funding das adquirentes.
Mudança regulatória: Ajuda o resultado em 2023
Em set/22 o Banco Central do Brasil (BCB) disponibilizou a resolução n° 246, a qual trará uma limitação na taxa de intercâmbio cobrada pelos bancos nas transações. A resolução estabelece que o limite de intercâmbio será de 0,5% em transações de débito e 0,7% nas de pré-pagamento, nas transações de crédito não há nenhum limite, as alterações devem acontecer a partir de 01/abr. No débito, apesar dessa regra ser mais antiga, alguns arranjos ficavam fora dessa limite, puxando a taxa média de intercambio para cima de 0,5%. Uma taxa de intercambio menor para as emissoras, leva um maior espaço para um aumento da taxa de desconto liquida (net MDR) das adquirentes, se essas conseguirem manter a taxa de desconto bruta (gross MDR) constante frente aos lojistas.
Desta forma, vemos que as limitações das tarifas de intercâmbio serão benéficas para a Cielo aumentar o seu Net MDR (taxa de desconto líquida). Isso deve ocorrer de forma mais transitória nas transações em débito, dado que a concorrência deva absorver parte disso e os grandes varejistas devam exercer seu poder de barganha. Mas de forma mais permanente, vemos que o limite de intercambio de 0,7% nas operações de pré-pagamento pode ser bem benéfico para a indústria e para Cielo, já que a taxa média de intercambio é muito alta, em torno de 1,25%, que em muitos casos pressiona o Net MDR das adquirentes. Isso deve acontecer pois as taxas cobradas nas transações (Intercâmbio + Net MDR) são previamente combinadas com os lojistas, assim, o “espaço” que sobrará com a redução do intercâmbio complementara a taxa cobrada pelas adquirentes.
Estimamos que o volume de pré-pagamento da Cielo seja próximo ao da indústria em 7% do volume total (TPV). Desse modo, esperamos que a Cielo conseguirá aumentar seu Net MDR em 0,1pp, de 0,56% para 0,66%. Estimamos que em 12M a partir de abr/23 a contribuição adicional no lucro pode chegar a R$ 250m. Já no ano de 2023, o benefício estimado é de R$ 190m.
Volumes: Sazonalidade ajudando no 4T e normalizando em 2023
Acreditamos que o 4T22 continuará com uma forte volumetria mas desacelerando por conta da Copa do Mundo, apesar da maior sazonalidade de eventos de final de ano, como a Black Friday e Natal. Estimamos os volumes (TPV) desacelerando para um crescimento de apenas 17% a/a no 4T22 de 23% no 3T22 e 34% no 2T22. Acreditamos que em 2023 o volume transacionado começará a ter um menor crescimento relativo. O ano de 2022 foi marcado por uma forte expansão da volumetria para Cielo. Estimamos que a empresa deva finalizar com uma expansão de 24% a/a (considerando crédito + débito). Para 2023, esperamos uma evolução de 15%, desacelerando em relação a 2022.
Em 2022, tivemos alguns drivers (motivos) para um forte avanço no volume transacionado, sendo:
- inflação alta no ano: possuindo uma forte correlação com a volumetria, visto que é um indicador referente ao consumo
- desemprego controlado: acreditamos que o patamar de desemprego propiciou um avanço no consumo das famílias, o que beneficiou a volumetria.
- guerra dos bancos e fintechs: nos últimos anos presenciamos uma forte distribuição de cartões por parte das instituições financeiras, o que beneficiaram à maior volumetria e número de transações.
Em 2023, acreditamos que não teremos um cenário tão favorável para o crescimento de volumetria. Apesar de estimarmos uma inflação mais alta (7% 2023 vs. 5,8% 2022), também esperamos um maior desemprego (8,8% 2023 vs. 7,8% 2022) e desaceleração econômica. Por isso, acreditamos que esse mix de uma inflação mais alta acompanhada de aumento de desemprego e arrefecimento econômico não devam ajudar a emissão de cartões e também a expansão de volumes da indústria e da Cielo.
Receita: volume crescente beneficiando
Esperamos que a receita da Cielo cresça 9,9% t/t no 4T22, por conta da sazonalidade, dos eventos de final de ano e da reprecificação feita ao longo do ano. Vale destacar que quando visto pela ótica a/a, há uma queda de 8,5% na receita, motivada pela presença da Merchant e-Solutions (M-eS) no resultado do 4T21, que apesar de ter um volume de receita relevante, não dava lucro.
Em 2023, acreditamos que a dinâmica continuará positiva, isso pois esperamos um volume ainda crescente, mas de maneira mais controlada. Além de uma melhor dinâmica de preço, com uma carteira já reprecificada com a concorrência mais racional, além de um benefício de mudança regulatória, elevando o Net MDR da faixa de débito.
Despesas: em linha com a inflação
No 4T22, esperamos as despesas crescendo 6,9% t/t e caindo 24,5% a/a (por conta da saída da M-eS), puxadas pelas despesas de pessoal, com crescimento de 2,7% t/t e 6,8% a/a. Vemos a despesa de pessoal impactada pelo aumento de força de vendas e pelo dissídio, que agora ocorrerão no trimestre inteiro.
Em 2023, apesar do aumento nas despesas com tecnologia e time de vendas, estimamos um nível de despesas crescendo em linha com a inflação, por conta de melhorias na eficiência.