Conforme antecipamos em nosso último relatório setorial, cujo o link segue anexo (Metais & Mineração: 1T23), os preços do minério de ferro entraram em trajetória descendente, o que levou a curva de referência de 62% Fe de minério exportado (seaborne) a retrair para próximo do breakeven de algumas minas de menor porte, fazendo com que algumas mineradoras reduzissem seus embarques no último mês. O mau-humor pairou sobre os papéis de mineradoras, sobretudo a Vale. A queda faz sentido? Explicamos nesse relatório como diferentes perfis de investidores estão olhando o setor e como agiram diante da queda.
Passado a temporada de resultados, decidimos também realizar uma atualização com alguns dados sobre o setor de mineração, para darmos uma sensibilidade sobre a curva de preços do minério de ferro e das Companhias que cobrimos no Brasil: Vale e CMIN.
Principais Destaques:
(i) Em uma abordagem não ortodoxa, avaliamos como os investidores estão olhando para o setor, e quais estratégias tomaram para operarem vendido, fazendo a Vale cair 24% desde o início do ano; (ii) Procuramos responder se o cenário ruim já foi todo precificado ou ainda há mais quedas por vir (seja para Vale ou para CMIN); (iii) As quedas foram irracionais ou havia motivação suficiente? Já em uma ótica fundamentalista, trouxemos dados sobre oferta e demanda de minério de ferro na China, para cravarmos uma opinião; (iv) Fizemos uma análise mais detalhada sobre a performance de subsetores que envolvem a demanda por aço downstream no PMI da China de maio; (v) Comentamos sobre os próximos passos do governo chinês e quais caminhos deverão ser explorados em prováveis estímulos; (vi) Avaliamos o setor imobiliário na China, e se os rumores sobre incentivos diretos no setor podem ou não destravar a demanda por minério de ferro; (vii) Realizamos uma retrospectiva dos resultados do 1T23 de Vale e CMIN; (viii) Olhando para frente: enumeramos quais as dinâmicas vistas no 1T23 fraco da Vale poderão ser esquecidas e quais podem continuar dificultando a vida da mineradora; (ix) Vale está barata? Acreditamos que faz sentido entrar no papel e rodamos análises de sensibilidades para mostrar o porquê; (x) Olhando para frente: demos a nossa opinião de como CMIN está reconquistando a confiança do investidor.
O cenário ruim já foi todo precificado?
Na nossa avaliação, o mercado reagiu com uma pressão vendedora acentuada no setor de mineração desde a sinalização do governo chinês sobre a meta do PIB de 5% para 2023. Como o consenso de mercado esperava um crescimento exuberante da economia chinesa (algo mais próximo de 6%), a meta de 5% anunciada em 4 de março, decepcionou uma parte relevante do mercado. A partir daí, os indicadores macro levaram a uma onda de pessimismo, que veio a afetar drasticamente os preços da curva de minério de ferro.
Por consequência, a Vale foi golpeada com uma dura queda de -19,3% e a CMIN, apesar de ter sido menos impactada pelo mau humor geral, não foi imune, acumulando uma perda de -5,9%, ambos os casos medidos entre a data de divulgação da meta do PIB até a data de divulgação de seus respectivos resultados do 1T23. Claro que há mais razões pela queda drástica da Vale do que apenas o cenário externo (chegaremos nisso mais adiante). Porém, esse cenário não foi um movimento observado apenas no Brasil, outras majors do setor, a qual gostamos de comparar com a Vale, também acumularam perdas no mesmo período. A BHP acabou retraindo -10,7% e Rio Tinto amargando uma derrocada de -10,5%.
Mercado costuma exagerar. A verdade é que se o mercado fosse lógico e o preço de negociação refletisse sempre o verdadeiro valor dos ativos, a função dos analistas de mercado não só seria desinteressante, mas também totalmente descartável. Para nós, existe uma irracionalidade do mercado em determinados movimentos, sejam eles de otimismo em excesso (visto em novembro até fevereiro), como também de pessimismo além do necessário (observado de março até hoje), em virtude de fatores como “efeito manada” ou especulações planejadas por investidores, se aproveitando da volatilidade de ações cíclicas.
Desde o início do processo de reabertura da China, no final do ano passado, mencionamos que a aceleração de preços do minério de ferro era irracional, e que não estávamos enxergando o aparecimento de um nível de demanda, vindo da economia real, que sustentasse a curva acima do patamar de US$110/t. Dessa forma, o cenário atual não nos surpreende. A referência de 62% Fe ter chegado a negociar abaixo dessa marca a partir de 25 de abril foi meramente uma confirmação de que as nossas estimativas estão assertivas, e não foi um mero presságio baseado apenas em uma opinião contrária ao consenso da época.
Aquilo que era, há 6 meses atrás, uma opinião contrária ao que a maioria pensava que iria acontecer com o setor de mineração, passou por uma brutal transformação. Como da água para o vinho, atualmente o novo consenso de mercado parece ser de que os então otimistas optam hoje por um tom de cautela.
Vimos, nos últimos três meses, outras casas mudando a recomendação de compra que tinham para a Vale, que eram baseadas no destravamento de valor após a reabertura da China, e rebaixando então o rating da Companhia para Neutro, decepcionados com as divulgações dos indicadores econômicos oficiais do governo chinês, que rapidamente se espalharam em tom mais pessimista, tomando conta dos noticiários.
E com esse movimento, o mercado mais uma vez, pesou a mão e corrigiu além do preço justo as ações do setor, sobretudo a Vale (considerando a nossa cobertura latam). De fato, enxergávamos que o setor tinha ficado caro após a rápida ascensão nos preços das ações a partir de novembro do ano passado, porém, a inversão do cenário foi igualmente rápida, de forma que as quedas vistas nos últimos 3 meses nos parecem exageradas para a Vale.
Esse tipo de ambiente volátil, abre margem para uma assimetria de informações e opiniões entre os participantes de mercado, o que dificulta o processo de precificação natural das ações do setor a valores mais próximos do justo, levando então a especulação bem como a arbitragem nos contratos futuros da commodity.
Especulação sobre o minério ainda é forte. Antes mesmo dessa virada de chave do consenso de um tom mais otimista para uma abordagem mais conservadora, alguns investidores institucionais com quem conversamos já estavam esperando uma queda no preço do minério ferro, baseados em uma opinião similar a nossa de que havia sido instaurado um rally, puxado por um otimismo em excesso sobre a reabertura chinesa. Racionalmente, nos pautamos em (i) dados sobre o mercado imobiliário (ainda em crise), (ii) inversão da pirâmide etária, (iii) menor arrecadação fiscal para custear estímulos, e (iv) consumo impulsionado pela reabertura mais atrelado a serviços do que a bens, para então diagnosticarmos que a alta na curva de preços entre novembro e março não produzia sentido lógico, conforme detalhamos mais a fundo em relatório anterior.
Quando não há racionalidade nos movimentos de preços (sejam eles altistas ou baixistas), investidores utilizam ferramentas para se posicionar de forma contrária a onda de mercado, muitas vezes porque entrar vendido em uma operação onde o consenso indica compra significa pagar barato no prêmio ou na taxa de aluguel, aumentando a rentabilidade da operação caso o investidor acerte de fato a direção dos preços e o consenso se prove errado.
Acreditamos que alguns investidores montaram operações como essas no início do ano, e mediante a dados macro mais fracos na China, estão auferindo ganhos atualmente. Segundo a nossa percepção, enquanto o pessimismo não diminuir, investidores que montaram posição vendida mais cedo permanecerão com a estrutura, enquanto novos entrantes seguiram pelo mesmo caminho, porém como chegaram mais tarde, pegaram o movimento a taxas mais altas de aluguel.
Do ponto de vista dos contratos da commodity, enxergamos ainda a possibilidade de arbitragem de preços no mercado de futuros. Alguns investidores com quem mantemos contato preferiram não realizar o play via ações das mineradoras e optaram diretamente pela negociação dos contratos futuros, arbitrando preço entre o valor spot e a curva futura, apostando na queda do minério de ferro com strike tendo vencimento em cerca de 3 a 6 meses. Um volume maior desse tipo de operação possou a ser mais evidente para nós a menos tempo atrás, o que significa que boa parte desses contratos ainda não venceram.
Então, o cenário ruim ainda não está totalmente precificado? Para tentarmos responder essa pergunta, primeiro é importante separar a tendência de baixa através de dois tipos de investidores: (i) os que entraram mais cedo em posições vendidas e (ii) os que chegaram depois. Os que formaram posição há mais tempo, por volta de dezembro a fevereiro, antes da divulgação da meta do PIB, foram os que enxergaram na frente do consenso a oportunidade por convicção. Em contraste, os que chegaram depois nos parecem possuir, como estratégia central, não necessariamente achar uma assimetria de preços em relação a expectativa na curva futura e a realidade, e sim se aproveitarem do momento para especular.
Os que entraram mais recentemente, estão (pelo menos na nossa percepção) agindo de maneira oportunística ao carregar a estrutura até mais próximo do vencimento, basicamente para especular através da arbitragem, no caso de a estrutura ter sido montada por contratos futuros, sejam do preço da commodity ou por meio de opções de mineradoras. Investidores sabem hoje que o risco de a China não crescer o que se esperava já entrou no preço dos ativos, ocasionando um mau humor geral para teses ligadas ao crescimento do país. Com o viés negativo, o preço da curva de minério desce e empurra para baixo a cotação das mineradoras. Acreditamos que enquanto o sentimento bearish não parar de ser vocalizado, os ativos continuarão em queda.
E aí está a razão pela qual, mesmo diante dos dados econômicos estarem coniventes a um PIB de aproximadamente 5%, considerando alguns prováveis ajustes que o governo deve realizar (falaremos mais adiante deles), as teses ligadas a mineração parecem ter perdido qualquer trigger de curto prazo para subirem novamente.
Do lado racional, qual a narrativa contada pelos dados de oferta e demanda?
Mostramos até aqui uma abordagem não ortodoxa para explicar a queda dos ativos ligados a China, focando na estratégia de investidores ao apostarem no recuo da curva do minério de ferro ou na derrocada dos preços das ações de mineradoras. Se ao menos a racionalidade apontasse para uma possível alta mais consistente, diríamos que os movimentos de especulação recentes não possuem algum grau de razão. Porém, não é exatamente o que apuramos ao olharmos para o equilíbrio de oferta e demanda.
Conforme comentamos no início deste relatório, o brusco recuo no preço do minério fez com que algumas minas de menor porte operassem próximo ao ponto de breakeven. Ou seja, o custo para extrair o minério se tornou apenas ligeiramente inferior ao preço de venda, o que desincentiva os embarques para a China. Historicamente, quando o minério começa a testar a barreira de ~US$80/t, algumas mudanças são feitas (estímulos do governo, na maioria), e a situação é revertida. Situações como vimos ocorrer em 2005, 2008 e 2015 são mais extremistas, e ocorreram por dinâmicas específicas, como por exemplo mineradoras inaugurando grandes projetos concomitantemente, enxarcando o mercado de oferta. Acreditamos que essa não é a realidade do setor atualmente.
Oferta: acúmulo leve, mas gradual nos estoques portuários, embarques estáveis. De acordo com o monitoramento que fazemos em 35 portos na China, a quantidade total de estoques de minério de ferro atingiu 124Mt ao final de maio, o que representa um aumento de +2,6% a/a. Acreditamos que devido à queda nos preços do minério de ferro, as siderúrgicas demonstraram (nas últimas semanas) maior disposição para comprar. Como resultado, algumas usinas retomaram a produção e observamos o volume de ferro-gusa aumentar ligeiramente, o que deve levar ao posterior recuo do nível de estocagem portuário após os dias de giro, mediante a reposição de estoques dentro das usinas.
Entretanto, conforme mencionamos na abordagem do início do relatório sobre o pensamento estratégico de investidores, o mercado segue majoritariamente desaquecido devido aos dados ligados a indicadores macros da China, o que deve continuar ferindo o volume de ferro-gusa, que ainda está limitado pelo teto de produção de aço bruto. Com algumas mineradoras sem incentivo para mandar níveis altos de carregamentos para o país, após os custos subirem (aconteceu com a Vale no 1T23) e o preço realizado das mineradoras descer recentemente, acreditamos que as chegadas de minério de ferro nos portos da China devem se manter estáveis, sem grandes aumentos sequenciais. Com embarques andando de lado nas últimas semanas do 2T23, a tendência ao longo do 3T23 é que haja, dentro de um período de latência, o acúmulo leve do minério de ferro nos portos.
Dessa forma, concluímos que o leve aumento no estoque portuário observado ao final de maio será consumido pelo apetite apenas momentâneo das siderúrgicas, que possuem hoje a oportunidade de comprar o minério de ferro a preços inferiores. Entendemos que esse movimento será breve, com os estoques rumo ao acúmulo leve e gradual. Para o 3T23, acreditamos que as mineradoras australianas e brasileiras aumentarão sua produção, acarretando uma elevação na oferta t/t. No pior dos cenários, o apetite não será retomado e o estoque de minério de ferro continuará subindo e derrubando o preço. Porém, estamos pensando no efeito que estímulos (que estão para ser anunciados) podem trazer, como cenário base a ser explorado mais adiante.
Demanda: PMI fraco continua suportando cortes no preço do aço. Em maio, o PMI da China para os setores de aço downstream, (aço que já passou pelos processos básicos de fabricação e deve ser distribuído para outros setores), sofreu uma ligeira queda de -0,18pt. em comparação com o mês anterior, atingindo 50,09 (-0,32pt. a/a). Entretanto, após o ajuste sazonal, o índice composto apresentou um ligeiro aumento de +0,71pt. em relação ao mês anterior, chegando a 48,22 (-0,26pt. a/a), ainda assim, abaixo da marca dos 50 que separa a contração de expansão. O PMI industrial foi de 48,80, abaixo do consenso (vs. 49,38), com 48% dos 21 subsetores dentro da zona de contração.
Do lado positivo, o índice de novos pedidos registrou um ligeiro aumento de +0,46pt. m/m, chegando a 50,07 (+0,30pt. a/a). Nossa análise é de que embora os setores downstream tenham recebido um aumento nos novos pedidos e mantido a produção estável, eles permaneceram cautelosos em seu comportamento de compra. Em nossa avaliação, mesmo com a queda nos preços das matérias-primas, as siderúrgicas ainda não aceleram muito o ritmo de produção.
Acreditamos ser altamente provável que os preços do coque continuem recuando. Apesar da implementação da décima rodada de cortes de preços do coque na semana passada, os estoques das empresas produtoras continuaram a diminuir. Alguns produtores em Shandong expressaram a intenção de reduzir a produção em decorrência de perdas financeiras.
Por outro lado, embora tenhamos observado certos tipos de carvão com uma leve escalada, a maioria dos preços do carvão permaneceu estável, e o metalúrgico, em queda. Com o mercado de aço apresentando um momento de fraqueza, as siderúrgicas têm se inclinado a reduzir os preços. Sem apetite de seus clientes, produtores de coque tendem a continuar cortando o valor do insumo para a siderurgia, na tentativa de salvar o volume de uma queda ainda maior.
Seguindo a falta de apetite, o índice de produção de aço downstream marcou queda de -0,84pt. m/m, chegando a 50,7 (-0,73pt. a/a). Ainda que alguns altos-fornos em Shanxi, que estão em manutenção, retomem a produção nas próximas semanas, acreditamos que o ritmo pode ser atrasado pelo enfraquecimento da demanda final e pela queda dos preços do aço. Na penúltima semana de maio, mais duas siderúrgicas anunciaram corte nos preços do aço HRC na China (Baosteel Group e Angang, ambas reduzindo ~US$50/t).
O output de ferro-gusa provavelmente será então mantido próximo do nível atual no curto prazo. Acreditamos que o baixo estoque de minério de ferro cultivado nas usinas siderúrgicas ainda dará suporte aos preços do minério (~US$105/t). Como contraponto, o efeito negativo na demanda de aço decorrente da estação chuvosa da China pode reduzir um pouco as cotações da curva de referência 62% Fe, com os preços variando no intervalo de US$105-98/t durante o 3T23, o que manteria a nossa projeção da média ao longo do trimestre de ~US$100/t.
Mercado imobiliário melhora PMI, mas recuperação ainda parece longe. Já o setor de construção apurou um aumento de +0,12pt. m/m, com o PMI atingindo a marca de 50,36 (+0,24pt. a/a). Embora as atividades de construção tenham demonstrado uma melhora suave nesse mês, alguns canteiros de obras no sul da China sofreram atrasos devido à estação chuvosa. Os novos pedidos aumentaram em parques industriais, prédios comerciais e decoração de interiores, mas foram limitados em projetos residenciais.
Em média, as incorporadoras e empresas de construção mantiveram um estoque de matéria-prima de 10,23 dias, indicando um leve aumento de +0,02/dia em relação ao mês anterior. É importante observar que o número de dias de estoques de matéria-prima serve como um mero ponto de referência, com a amostra podendo sofrer instabilidade dependendo do período. Ainda assim, o indicador está alinhado com uma recuperação ainda lenta da construção civil.
Construtoras na China: o sentimento é de “esperar para ver”. Buscamos sintetizar alguns pontos que observamos de uma amostra de incorporadoras de médio e grande porte, suportada pela SMM (Shanghai Metals Market). Algumas empresas de construção foram acometidas por um aumento nos estoques durante maio, pois iniciaram novos projetos e se prepararam para cumpri-los, comprando os insumos a preços mais baixos. O foco na construção de interiores deve continuar provendo a alguns players uma execução relativamente inalterada pelas condições climáticas adversas. Ainda que tenhamos observado nas últimas semanas um atraso em projetos externos no sul da China (afetados pelas chuvas), prevemos um aumento de projetos internos a serem iniciados nos próximos 3 meses, mediante a conclusão de uma série de execuções concentradas em junho e outubro.
Ainda que haja uma percepção de melhora, acreditamos que uma parcela considerável das empresas na amostra que tivemos acesso ainda está travando o lançamento de novos projetos, principalmente devido as incertezas sobre as perspectivas para a segunda metade do ano. Apesar dos preços mais baixos das matérias-primas, o setor nos parece estar sendo prejudicado pelo sentimento de “esperar para ver” e pelo fluxo de caixa apertado, o que acarretou uma limitação de produção de aço nas siderurgicas.
Pelo que podemos observar, um número considerável de incorporadoras teve que adiar o lançamento de novos projetos imobiliários, originalmente programados para o final de abril, durante o pico sazonal de construção. Nesse período, as vendas decepcionaram se comparadas ao ano passado, uma base já fraca, que sofria efeitos da crise de confiança do setor. Ainda assim, prevemos uma melhora nas vendas em junho/julho para imóveis já prontos.
Vendas secundárias estão se fortalecendo aos poucos, mas construções em andamento ainda patinam. Conforme já havíamos comentado, as vendas de imóveis já concluídos vão se recuperar primeiro, e depois a recuperação deve seguir para construções iniciadas. Os dados indicam que essa trajetória está se mantendo. As vendas de imóveis no lançamento dos projetos ou em fase de construção, dependem mais da retomada de confiança dos compradores com relação as incorporadoras entregarem as unidades. E sobre essas vendas, enxergamos um processo muito mais lento pela frente.
Em abril, o número de construções em andamento voltou a desacelerar, sinalizando que a quebra de tendência em março foi mais breve do que a antecipada pelo mercado. Além disso, (i) o indicador de novos empréstimos de médio/longo prazo, que serve como proxy para a demanda por hipotecas, retornou para o território negativo pela primeira vez em 12 meses, sinalizando uma perda de apetite por novos financiamentos imobiliários. Vale destacar também a (ii) elevação dos estoques de imóveis, medidos por espaço disponível à venda, que se encontram 43% acima do nível observado em nov/21, período em que se iniciou a queda nos preços das residências devido à intensificação da crise imobiliária.
Então, conforme mencionamos acima, acreditamos que a maioria das empresas de construção estão em um momento de reabastecimento de materiais, aproveitando a queda dos insumos para aumentar o estoque, e aguardando melhores sinalizações de estímulos que venham a reacender o apetite pelo financiamento imobiliário, sobretudo para first buyers. Acreditamos que esse perfil de comprador acaba buscando uma oferta maior de imóveis ainda na planta ou em fase de construção, dado que estão (em geral) iniciando o processo de independência financeira e procuram barganhas nos preços. Observamos também que, majoritariamente, a participação de jovens na penetração de venda para first buyers costuma ser maior, o que acaba também configurando um outro empecilho para o melhor desempenho do setor.
Apesar de uma redução geral do desemprego para 5,2%, o grupo demográfico jovem chegou a registrar uma taxa recorde de 20,4% em abril. Essa tendência preocupante destaca os desafios significativos que a economia está enfrentando atualmente, que persistem mesmo diante de um aumento na demanda atrelada a reabertura econômica, sobretudo no setor de serviços. Nossa análise sugere que as empresas em geral estão hesitantes em contratar, principalmente jovens sem muita experiência, devido à incerteza predominante em relação à duração e à intensidade da recuperação econômica ao longo de 2023.
Isso nos parece preocupante, uma vez que o setor de serviços costuma fomentar mão de obra de maneira intensiva, e muitas vezes, não qualificada. Ou seja, mesmo o setor de serviços sendo impulsionado pelo que ficou conhecido como “consumo de vingança”, ainda assim o desemprego entre os jovens está em taxas recordes na China. Acreditamos que isso coloca em evidência uma distorção entre as expectativas iniciais do mercado e os indicadores atuais de confiança, que estão em níveis baixos, e continuam aquém das médias históricas, mesmo após o fim da política de Covid-zero. Sem boas perspectivas para o consumo da classe média e de jovens, as vendas no mercado imobiliário de projetos em fase de construção devem continuar patinando e freando então o lançamento de novos projetos.
Com dados mistos, o que pode acontecer para marcar uma virada de chave? Estamos cientes de que o volume de excesso na poupança dos chineses está em níveis historicamente altos, chegando a ~US$2,6 trilhões em 2022, segundo o Banco Popular da China (PBoC). Durante o primeiro trimestre, o comportamento dos chineses foi de continuar poupando recursos, atingindo aproximadamente US$3 trilhões em março, segundo nossos cálculos. Já para o 2T23, acreditamos que a tendência da trajetória de recuo no excesso da poupança observada em abril (-7,5% m/m) deve ser mantida, porém, fechando o trimestre com uma queda mais suave, mas o suficiente para fazer o excesso de poupança sair da marca de ~17% do PIB 2022 e retornar para a casa de 15%. Ainda assim, 15% é um número extremamente alto, considerando que historicamente o percentual de excesso de poupança oscila entre 5% ou até negativo (população gastando reservas acumuladas).
Nossa visão é de que esse recuo no excesso de poupança visto nos últimos meses se dá pelo movimento natural pós reabertura econômica de ímpeto de consumo, ligado principalmente ao setor de serviços, conforme comentamos anteriormente. Ou seja, acreditamos que por mais que a população esteja experimentando um pouco mais de propensão a consumir, esse movimento não está atrelado majoritariamente ao consumo de bens, o que justifica os dados do PMI industrial na zona de contração e ainda abaixo do consenso, em contraste com o PMI de serviços vindo em 57,1 (+0,7pt. m/m), ganhando terreno dentro da zona de expansão.
Como para o consumo de bens um dos fatores mais sensíveis é o crédito, tanto com relação a oferta quanto a taxas, nossa avaliação é de essas serão as primeiras variáveis para o governo modificar, dentro do contexto que chamamos de incentivos, o que poderia levar a economia a deixar de dar sinais mistos e aumentar a confiança de consumidores e empresários. Os indicadores de abril e maio confirmam nossa projeção, realizada no início do ano, de uma recuperação de forma apenas gradual da economia chinesa em 2023, e não voraz e intensa conforme o consenso indicava que seria. No entanto, devemos destacar que as perspectivas permanecem incertas.
Em virtude das incertezas, acreditamos que estamos próximos de observar (i) a implementação de uma redução de -25bps na taxa de depósito compulsório, a mesma redução vista ano passado, o que aumentaria a oferta de crédito e (ii) cortes da taxa de juros básica que totalizariam -25bps, em duas etapas, chegando a uma taxa terminal de 2,5% no final do ano (vs. 2,55% do consenso), baixando o custo do crédito ao longo do ano para sustentar o crescimento econômico. Vale mencionar que o consenso apontava o corte de compulsório já em maio, porém o governo não mexeu na taxa. Ainda assim, dadas as atuais circunstâncias desafiadoras, acreditamos ser imperativo que o governo tome medidas para garantir o cumprimento da meta de crescimento de 5% de PIB, o que nos leva a estimar que a alteração deva acontecer em breve.
A nossa expectativa é de que o 2S23 traga um apetite ligeiramente maior para o consumo de bens diante do efeito combinatório dessas duas medidas. Marcando uma virada de chave no humor do mercado, especialmente se confirmado via aumento dos indicadores de confiança, tanto dos consumidores quanto dos empresários, o que é aguardado por nós a partir do 3T23. Ainda assim, essas medidas ocorreriam de forma a garantir o cumprimento da meta do PIB, e não para obter um crescimento acima das expectativas já precificadas (consenso hoje coloca um crescimento de +0,6p.p. acima da meta, o que não acreditamos ser possível).
Estímulos devem ser limitados apenas ao crédito em geral ou podem abranger o setor imobiliário? Segundo nosso entendimento preliminar, a resposta para essa pergunta seria: apenas ao crédito em geral. Não acreditávamos que o governo fosse tomar medidas no que diz respeito a injeção direta e volumosa de recursos no setor imobiliário além do que já foi anunciado.
Porém, na última sexta-feira, dia 02 de junho, foi vinculando no noticiário pela Bloomberg News, que as autoridades chinesas estão contemplando a possibilidade de: (i) diminuir o pagamento inicial exigido para o financiamento de imóveis em áreas suburbanas; (ii) estipular um teto mais baixo para as comissões dos corretores e (iii) relaxar as restrições à compra (possivelmente estender condições dadas a first buyers para quaisquer compradores). Atualmente, o governo também estaria deliberando sobre (iv) o refinamento e a expansão de determinadas políticas descritas no plano de resgate abrangente, composto por 16 medidas, que foi introduzido no ano passado.
Não se sabe até esse momento se o rumor se concretizará ou não. Porém, mesmo que esses incentivos ocorram, na tentativa contínua de injetar liquidez no mercado imobiliário, acreditamos que eles não serão suficientes para incentivar as pessoas a comprar mais propriedades nessas regiões periféricas, principalmente em cidades que não fazem parte da Tier I, onde a média de imóveis por família chega à marca de 3 propriedades.
Conforme já comentamos em outros relatórios, para conseguir uma reestruturação sustentável dos gastos do consumidor na China, avaliamos ser mandatório o governo possibilitar o aumento dos orçamentos das famílias de baixa e média renda, a começar por endereçar políticas mais eficazes de diminuir o desemprego entre os jovens. Infelizmente, a classe média na China acabou se tornando a mais vulnerável à desaceleração dos investimentos imobiliários, pois as famílias não conseguem vender ou alugar suas propriedades, o que resulta em um aumento do custo de vida e em uma redução da renda disponível para a aquisição de bens, refletindo em diversos subsetores do PMI industrial ficando na zona de contração.
Apesar de os dados setoriais sugerirem uma falta de intensidade na atividade industrial e na demanda por aço, ficamos perplexos com o declínio significativo do preço das ações das mineradoras, principalmente da Vale. Nossos próximos capítulos fornecerão uma explicação deste contraste.
Retrospectiva de resultados 1T23
Após termos comentado sobre nossa visão setorial, gostaríamos de realizar uma retrospectiva das principais dinâmicas do resultado 1T23 das duas companhias sob a nossa cobertura no Brasil do setor de mineração, para então endereçarmos nossas avaliações sobre os próximos passos de ambas.
Vale: Com o EBITDA recuando -26% t/t e -43% a/a, acreditamos que foi um resultado pífio, considerando o verdadeiro potencial da Companhia. Na junção de uma produção sazonalmente fraca, ligadas a dinâmicas naturais dos 1Ts, com problemas de logística para a embarcação do minério no porto de Ponta da Madeira afetando bastante as vendas, vimos o custo de breakeven subindo +18% t/t. Nesse primeiro momento, nos parece que uma parcela significativa do aumento ocorreu pelo conjunto de itens não recorrentes, dentre eles: (i) prêmios negativos, (ii) maiores custos C1/t observados nesse trimestre pelo baixo poder de diluição em virtude da interrupção de embarques no porto de Ponta da Madeira, e (iii) maiores custos de distribuição, que já devem ser normalizados no 2T23.
Ainda que o 1T23 tenha sido fraco pelas vendas decepcionantes, reforçamos a alta capacidade de geração de caixa da Vale (3,5% do market cap em apenas 1 tri) e efeitos One-off. Negociando abaixo de R$70, passamos a enxergar uma boa oportunidade de entrada, e fizemos um upgrade de rating de Manter para Compra em nosso último relatório dedicado a Companhia. Acreditamos que passado o mau humor geral do mercado, o fluxo comprador voltará para o papel.
CMIN: (i) Na nossa visão, o resultado do 1T23 foi majoritariamente positivo, já que a companhia conseguiu crescer seu EBITDA t/t, mesmo com uma (ii) dinâmica mais fraca para a produção, que também acabou afetando suas vendas pelas (iii) barreiras logísticas que as chuvas causaram na linha férrea da MRS. Apesar disso, atrelamos que grande parte do motivo do crescimento visto se deve pela (iv) apreciação da curva de referência do minério de ferro, que chegou a ficar acima de +US$120/t. Daqui para frente, (v) vemos que o mercado perdeu o grande brilho nos olhos em relação a abertura chinesa, o que deve apresentar um encolhimento na curva média do 2T23, na qual estimamos de US$110/t, chegando até US$95/t ao final do ano.
Olhando para frente…
Conforme comentamos, nesse capítulo iremos explorar alguns pontos mais específicos de cada uma das teses, com o foco no que acreditamos que vem a seguir para Vale e CMIN.
Vale
Se os indicadores estão mornos por que a queda das ações foi irracional?
Efeitos na estrutura de custos em razão da dinâmica de Ponta da Madeira. Observamos no último trimestre impactos severos das chuvas intensas nos números da Vale. A Companhia não desempenhou mal na produção (levando em consideração a sazonalidade natural), chegando a 66,7Mt para finos, atingindo uma marca acima do que esperávamos (+4,2% vs. Genial Est.). Já as vendas foram muito fracas, na marca de 45,8Mt (-13,7% vs. Genial Est.), o que surpreendeu negativamente o mercado, uma vez que o mais comum, pelos dados históricos, são as chuvas dificultarem a produção e não vendas diretamente.
Sabemos que a situação ocorrida em Ponta da Madeira (porto localizado no Maranhão, que escoa o minério vindo do sistema norte), apesar de ser improvável historicamente, nunca foi impossível. Existe uma regra de bolso para não embarcar o minério que está sobrecarregado de umidade. Ou seja, por medidas de segurança, há uma política global que impõe um limite de TML (umidade por tonelada de minério de ferro), na tentativa de evitar o processo de liquefação dentro do navio, o que poderia levar a embarcação a perder nivelamento e tombar.
Além de um minério de ferro mais sobrecarregado de umidade, a propagação da precipitação ocorreu de maneira diferente, com relâmpagos mais frequentes na região portuária. Quando isso acontece, por gestão de risco a operação precisa ser interrompida, inibindo danos para equipamentos e pessoas.
Como efeitos secundários, além do volume significativamente menor de embarques, foi notório a (i) depreciação da qualidade no mix vendido, uma vez que o sistema norte possui um percentual de teor de ferro acima da curva de referência, próximo a 65% Fe, o que teria provocado um recuo no preço realizado em relação ao verdadeiro potencial da Vale. O Prêmio chegou a ficar negativo, a -US$1,4/t. Ainda, outro efeito que piorou bastante a performance dos números do trimestre foram o (ii) baixo poder diluição dos custos fixos, considerando que o monitoramento é feito a partir do volume de vendas e não da produção. Ou seja, mesma com a Vale tendo produzido um volume satisfatório para 1Ts, (iii) o C1/t ficou bastante prejudicado pelo baixo volume de embarques, chegando US$26,6/t, atingindo um valor 26% superior ao guidance, gerando uma percepção de aumento de custos e menor prêmio, com um mix de qualidade pior.
O que é temporário? Dentre a dinâmica trazida no 1T23, listamos alguns pontos que acreditamos serem passageiros e endereçamos como importantes indicadores devem se comportar nos próximos trimestres.
- Prêmio: Os valores de prêmios pelos finos devem voltar a patamares mais razoáveis já no 2T23, considerando a ressalva que independente dos efeitos atrelados as restrições de embarque em Ponta da Madeira vistas no trimestre passado, os prêmios praticados estão abaixo da média histórica desde o final de 2021. Ainda assim, acreditamos que a tendência é de que o mix de produtos melhore e o prêmio aumente t/t em cerca de +US$2,9/t nominalmente, chegando a US$1,5/t no 2T23 (vs. -US$1,4/t 1T23).
- Custo C1: A princípio, a Vale faz um número maior de manutenções concentradas nos períodos chuvosos, o que elava os custos, mas libera as minas para produzirem mais próximas a exaustão nos trimestres sazonalmente melhores (3Ts e 4Ts). Acreditamos que o 2T23 pode apresentar melhoras, porém se os investidores tinham expectativas de que sem os efeitos one off o C1/t apresentaria uma redução expressiva, informamos que isso provavelmente não acontecerá, em decorrência de vendas com lag de estoque, que carregam custos maiores do trimestre passado. Importante também dizer que historicamente os 2Ts sempre são os mais ineficientes da Vale, justamente por esse efeito. Então, mesmo acreditando que o trimestre passado foi tão ruim a ponto de que o 2T23 ainda venha com um C1/t mais arrefecido (US$24,4/t Genial Est. vs. US$26,6/t 1T23), contrariando a dinâmica histórica, ele ainda estará acima do guidance de US$20-21/t.
- Vendas: Esperamos que o gap entre a produção e a venda de finos diminua em 57% no 2T23, voltando a normalidade de ~9Mt, considerando que parte desse gap existe devido a um volume que é contabilizado na produção dos finos e vendido como pelotas, onde geralmente as vendas ultrapassam a produção, ao contrário da dinâmica de finos. Já a reversão do estoque, acumulado pelos embarques não realizados durante o 1T23, só deve acontecer ao longo do 2S23, visto que as chuvas no Sistema Norte começam geralmente em dezembro e vão até metade de maio.
- Custo All-in: Está implícito um prêmio de pelotas e finos ponderados de US$8/t parao atingimento doguidance de custo All-in de US$47/t. Porém, no 1T23 o prêmio implícito foi de US$2,1/t, quase 4x abaixo para o cumprimento da meta anual. Dessa forma, para atingir o guidance há uma dependência da performance do mercado, que na nossa visão ainda está pagando um prêmio de baixo patamar pelo minério high grade. Acreditamos que a falta de apetite deve continuar fazendo com que os prêmios de pelotas continuem em contração no 2T23, voltando a crescer ligeiramente apenas ao longo do 2S23, mediante aos estímulos que comentamos no crédito, que devem reascender um pouco a demanda por bens, e consequentemente, por aço e minério de ferro. Sobre esse aspecto, consideramos que uma importante forma de monitorar a demanda pelo minério high grade é a quantidade de lançamentos de novos projetos imobiliários, que por enquanto foram insuficientes para aquecer os prêmios mesmo diante do pico sazonal no final de abril, período em que os números de lançamentos estiveram abaixo das expectativas do consenso.
Vale figura no topo da lista das maiores renúncias fiscais. Com a reforma tributária, há riscos de ser mais taxada? Para completar o fluxo de notícias negativas, o efeito combinatório de indicadores econômicos mais fracos do que a expectativa para o crescimento da China pós-covid-zero, juntamente com os problemas enfrentados no 1T23 diante da situação no porto Ponta da Madeira, foi ainda catalisado pela divulgação, emitida pela Receita Federal na última semana de maio, de um conjunto inicial de dados sobre as empresas que obtiveram benefícios e isenções fiscais do Governo Federal. O relatório referente ao ano calendário de 2021 revelou o montante de aproximadamente R$51b deixou de ser recolhido por meio de renúncias fiscais dadas a determinadas companhias. A Vale foi a principal beneficiária da iniciativa de isenção fiscal implementada pelo governo, recebendo mais de R$20b em isenções.
Acreditamos que a circulação em alguns sites de notícias dessa lista, bem como a perspectiva de que na reforma tributária a ser apresentada pela gestão do governo Lula haja uma redução ou total inibição de incentivos dados anteriormente, contribuíram ainda mais para a criação de ambiente mais volátil para as ações da Vale. Alguns investidores com quem conversamos se demonstraram preocupados com possíveis alterações de benefícios fiscais que hoje a Companhia possui, sobretudo diante de ações como a MP.1.152, que visa aumentar a alíquota de exportadores, mostrando que o setor de commodities está potencialmente na mira da reforma tributária.
Em abril, tivemos conversas com Bernard Appy, secretário extraordinário da reforma tributária, e segundo as pautas que foram discutidas, esperávamos benefícios fiscais para a indústria automobilística (que veio a se concretizar recentemente), possíveis taxações para locadoras de automóveis, jogos de azar, e comércio crossborder, principalmente varejo. No caso da Vale, não esperamos nenhum impacto significativo, mediante a (i) baixa probabilidade de ser alterada a Lei Kandir, que trata da isenção de ICMS para exportação, considerando que para isso, o governo provavelmente teria que estender as alterações também para agronegócio, o que tornaria basicamente inviável do ponto de vista prático.
Outro benefício importante para a Vale é a (ii) SUDAN, que concede isenções fiscais a empresas que atuam na região Amazônica, condicionado a investimentos na região que possui alguns dos piores indicadores sociais do Brasil. Acreditamos que, apesar de recentemente ter sido cogitado substituir a SUDAN por uma EMPRAPA focada na biodiversidade, as chances são baixas de ocorrer exclusão de incentivos na região, até mesmo para a Zona Franca de Manaus. O que acreditamos ser mais provável é a modificação de alguns planos e realocação de recursos para ajudar a fomentar a região e gerar recursos para controle de desmatamento, pauta importante para esse governo.
Sobre (iii) royalties, observamos uma discussão no passado de que houve uma inércia do governo para alterar a taxa, que passou para 3,5% em 2017 vs. 2% anteriormente. Comparativamente, para mineradoras australianas a taxa situa-se no patamar de 7,5%, o que leva a alguns investidores a pensar que haveria um espaço para o governo ainda aumentar. Porém, é importante considerar que o sistema de tributação no Brasil é mais complexo do que em outros países, e quando somam-se todas as taxas, por exemplo a TFRM, encontra-se um nível muito similar de pagamento por exploração do recurso natural feito na Austrália, principal ponto de referência do Brasil na mineração.
Além disso, o impacto é maior para outras mineradoras menores do que pra Vale, visto que elas possuem uma escala menor, e alterações tributárias poderiam impactar na quantidade de geração de empregos em lugares dependentes da mineração. Acreditamos que o setor de óleo e gás foi e continua sendo mais visado para taxação de importação ou quaisquer outras formas de políticas fiscais se comparados a mineração, em virtude de possuir um impacto mais direto no custo inflacionário do país, mediante aos incentivos concedidos entre o ano passado e o início desse ano visando baixar o IPCA, bem como redução no ICMS de óleo diesel.
Avenidas de crescimento ainda restantes. Claramente, a Vale por ser uma companhia de mais de R$300b de Market Cap (mesmo diante da queda), fundada em 1942 e privatizada em 1997, não poderia ser categorizada como tese de investimento de Growth, ao contrário da CMIN, que fez seu IPO em 2021. Dessa forma, já é esperado um crescimento menor para a Companhia. Porém, a estratégia que foi adotada pelo management nos últimos anos foi em focar no aumento gradual de produção de minério high grade, através da exploração do sistema norte, que possui um grande diferencial competitivo para outras majors do setor (pares australianos).
O planejamento estratégico da companhia está direcionado para o Sistema Norte, onde o desenho atual está chegando a 230Mtpa, com o projeto de elevar a capacidade logística até 240Mtpa, que seria o máximo que o Sistema Norte poderia produzir. A Companhia está desenvolvendo uma capacidade de reserva de mina maior, para que em caso de uma eventualidade que atinja a produção, o volume a ser transportado para o porto ainda fique próximo do potencial de extração. O grande gargalo que pode ocorrer em uma mineradora de grande porte é a logística, então elaborar um plano de investimento nesse departamento nos parece fazer bastante sentido. O Sistema Norte é composto pelas minas Serra Norte e S11D.
- Serra Norte: Existem restrições são ligadas ao licenciamento, conforme já comentamos em relatórios anteriores. A produção da Vale está sendo bastante afetada, mas ainda há alguns avanços marginais nos processos de licenciamento junto aos órgãos competentes, tanto que a produção do 1T23 foi uma surpresa positiva para nós. Ainda assim, acreditamos que há morosidade e que um ramp-up mais efetivo não deve estar no radar para o curto prazo, de forma que esperamos que a produção fique em ~100Mtpa. Acreditamos que caso o sistema de licenciamento ganhe mais celeridade, há um upside que hoje não está na conta do mercado.
- S11D: Desenhado para uma capacidade de 90Mtpa, há dois projetos de adição extra de capacidade, um de magnitude de +10Mtpa e outro de +20Mtpa, podendo então chegar a 120Mtpa no total. Porém, o corpo geológico do S11D não facilita a sua performance, uma vez que foi encontrado um volume maior de jaspilito, um minério de ferro com maior dureza, o que dificulta o processamento linear do corpo mineral considerando a operação sem uso de caminhões, uma vez que é preciso atravessar essa camada mais dura do que o convencional, perdendo assim produtividade. No curto prazo, para tentar amenizar a dificuldade, a Vale instalou recentemente novos britadores que potencializam o ativo além de levar alguns equipamentos móveis para atuar nas frentes em que encontra esse tipo de material, de forma a melhorar a produtividade. Ano passado a mina fechou com uma produção de 69Mt, em conversas recentes que tivemos com a Companhia foi comentado a possibilidade de atingir ~80Mt ainda esse ano, embora nossas projeções estejam atualmente alinhadas com um valor mais modesto de crescimento a/a (74Mt Genial Est.). Em 2025 haveria a entrada do projeto de +20Mtpa, que teria que passar ainda por um ramp-up de 1 a 2 anos, e em 2026/2027 chegaria ao desenho final. Caso a Vale consiga desempenhar esse aumento, pularia de uma produção de 69Mt para 120Mt em ~4 anos, extraindo um minério high grade (65% Fe).
Ou seja, acreditamos que o foco da Vale é de aumentar produção de minério de alta qualidade, com maior teor de ferro, o que criaria algum nível de proteção para oscilações inerentes a ciclos de baixa da commodity. O nosso ponto de vista é de que, diante de um cenário bearish, o mercado acaba pagando prêmios menores para a curva de high grade, porém, ainda assim ajudaria a adicionar um valor ao preço realizado que potencialmente os pares não possuiriam. Adicionalmente a esse ponto, parece não adiantar investir em aumento de volume de baixa qualidade para compor margens ainda mais estreitas.
Acreditamos então que o Sistema Norte possui alguns notórios desafios para a produção, até atingir a totalidade dos 240Mt, porém, considerando o ganho que o minério High grade pode trazer, sobretudo no ciclo de alta (e ele eventualmente chegará), os dois ativos (Serra Norte e S11D) nos parecem o santo gral da mineração.
Recuperação judicial da Samarco. Em recuperação judicial desde 2021, a Samarco (JV entre a Vale e a BHP), anunciou na semana passada que chegou em um acordo com seus credores para a reestruturação de suas dívidas. Nos termos, a Samarco deverá concluir a recuperação judicial com uma estrutura de capital enxuta, pagando seus credores de acordo com sua própria geração de fluxo de caixa, limitados a US$1b entre 2024 e 2030, mas com contribuições adicionais a depender do excesso de fluxo de caixa gerado. Além disso, o saldo remanescente da reparação deverá ser dividido igualmente entre a Vale e a BHP.
Em conversas recentes com a Vale, questionamos a Companhia sobre a aplicação do guiadance de provisionamento para Mariana no montante de US$1,9b para 2023, em virtude do valor quase irrisório que foi transitado pelo P&L do 1T23 em relação a essa temática. Nossa preocupação era de que o baixo volume circulado no último trimestre poderia levar a um incremento desproporcional para os trimestres seguintes, buscando atingir o que foi divulgado no guidance ainda até o final do ano. Porém, a explicação da Companhia foi de que a Samarco vinha ajudando com seu próprio caixa, fazendo com que Vale e BHP precisem desembolsar menos.
Porém, acreditamos que a Vale não escapará de ter que sequencialmente elevar sua linha de provisão relacionado a Mariana, por duas razões principais: (i) nossa visão preliminar é de que o plano aprovado de recuperação judicial deve limitar a capacidade de pagamento com o caixa da Samarco sobre as reparações de Mariana, passando a pesar mais nos balanços de Vale e BHP; e (ii) conforme já comentamos em relatórios passados, já estávamos considerando um efeito incremental de provisionamento da Vale pela situação de Mariana, em uma abordagem mais pessimistas que média de mercado sobre esse assunto, de forma que projetávamos uma provisão total de US$2,3b (+21% vs. guidance), mediante a demora para o anuncio do acordo.
Nossa visão para Vale
Por que a Vale está barata? Dito tudo isso, agora chegou a hora de respondermos o porquê acreditamos que a queda acumulada de 24% nos papéis da Vale desde o início do é um movimento irracional, pautado em um pessimismo com um tom exagerado acerca da Companhia.
Rodando uma análise de sensibilidade usando como base a curva do Minério 62% Fe para o fim de 2023E, e retirando -US$5/t a cada ano, a fim de manter uma curva de preços descendente ao longo dos anos, enxergamos que o preço de tela negocia com desconto em relação ao seu valor justo, em caso de a curva futura seguir nossas estimativas já conservadoras. Com uma sensibilidade alta para o preço no final de 2023E, vemos que a curva futura inteira se desloca na mesma direção no nosso teste, perpetuando esse spread, e assim, causando uma grande variação nos preços para os diferentes cenários.
Para chegar no patamar de preço que atualmente a Vale está negociando, o dólar teria que se manter sempre abaixo de BRL/USD 5,00 e o minério chegar a US$90 ao final de 2023 (estamos no meio do ano e ele ainda está em ~US$105/t), e ir decaindo -US$5/t todo ano até atingir a curva de longo prazo em US$65/t ao final de 2028, quando basicamente todos os analistas de mercado olham para esse final de curva entre US$75-80/t.
Essa dinâmica de preço já está levando em consideração uma abordagem que está: (i) mirando a parte mais inferiordo guidance de produção, todos os anos até 2026 e ligeiramente abaixo do indicado até 2030; (ii) prêmios para finos em faixas aquém da média histórica até 2025 (max. de US$3/t); e ainda (iii) sem nenhum tipo de gatilho adicional para unidade metais básicos. Acreditamos que são três situações cujas chances de ocorrerem isoladas são muito baixas e concomitantemente, basicamente impossíveis. Importante também a ressalva que também está sendo considerado nosso cenário, que já é mais pessimista em relação a média de mercado, sobre o acordo de Mariana (MG) com provisões que chegam a ultrapassar 20% do indicado no guidance além das dificuldades para atingir a meta para custo de C1/t neste ano, ambas situações que já consideramos como cenário base em nosso modelo sem o stress test de variáveis e jogam contra o valutaion da Companhia.
Em uma conta mais simplificada, aplicamos uma curva de preços lineares até a perpetuidade, em busca de entender qual cenário estaria sendo precificado para o atual preço da ação, caso a curva de minério se mantivesse parada em apenas um valor até a perpetuidade. Nas nossas contas, mesmo com um minério estável no valor de US$75/t, que representa apenas o último ano do nosso valuation, ainda existiria um potencial upside vs. o preço de negociação atual das ações, mesmo após a queda significativa do dólar.
Mais um sinal de que ela está barata é que a Companhia está negociando abaixo do múltiplo histórico de EV/EBITDA para os próximos 12 meses, (3,81x vs. uma média de 4,84x). Nossa análise aponta para um comportamento histórico de companhias de commodities andando com os pés trocados, costumando marcar topo de ciclo com um múltiplo baixo, enquanto a pernada de alta geralmente acontece com um múltiplo mais esticado.
Nos parece ser impressionante como o mercado redirecionou tão rápido o viés para Companhia. Entendemos que o mercado está precificando na Vale um cenário catastrófico, mesmo quando comparado com as nossas projeções conservadoras para o preço de minério de ferro (US$95/t no final do ano e US$75/t no longo prazo). Logo, de maneira contracíclica, nos parece ser uma boa oportunidade a entrada no papel a um valuation barato mesmo considerando todas as dificuldades que a Companhia passa, mediante a estratégia de ganhos com a normalização de múltiplos.
Além disso, visto a penalidade forte que o mercado vem dando para alguns sinais de desaceleração já esperados por nós anteriormente, acreditamos que haverá fluxo comprador de volta para as ações da Vale em um cenário de recuperação economia chinesa, que mesmo em passos mais lentos, e crescendo daqui para frente menos do que já cresceu pré-pandemia, ainda deve ocorrer (dificilmente outra economia do G20 crescerá ~5% PIB nos próximos anos, mas a China provavelmente vai).
Levando ainda um bônus. Apenas concentrando as atenções nas dinâmicas de minério de ferro, já acreditaríamos que o mercado descontou além do ponto justo a Vale, porém, não estávamos nem colocando na mesa as discussões sobre a unidade de Metais Básicos. Acreditamos que a unidade possui um grande potencial a ser destravado mediante a venda de uma fatia de 10% para um parceiro estratégico (operação está próxima de acontecer), que deve então auxiliar a Vale no ramp-up de seus ativos ligados a transição energética. Essa unidade está saindo hoje basicamente de graça no preço da Vale. Com as negociações abaixo da linha de R$70 (>US$14 ADRs), acreditamos que o mercado não está pagando nada pelo crescimento da unidade de metais básicos e está levando de bônus um negócio que possui o potencial na direção contrária do minério de ferro. Como nós projetamos o preço do minério em queda até US$75/t, ocorre a compressão da margem EBITDA da divisão de Ferrosos para ~35% no longo prazo. Já a divisão de Metais Básicos está na direção oposta, com os preços tendendo a ascensão de longo prazo, a margem EBITDA já está na ~35% de margem atualmente, e pode ganhar uma margem bem maior no longo prazo.
Boa pagadora de dividendos. Mesmo em uma curva descendente para o minério de ferro, acreditamos que a Vale continua bem-posicionada para trazer uma geração de fluxo de caixa forte para seus acionistas (Free Cash Flow Yield de 16,4% 23E e 12,5% 24E), principalmente pela localização privilegiada nas minas do Sistema Norte, que conforme exploramos mais acima, favorece um minério de maior qualidade e com um Cash COGS em níveis mais baixo que a média dos pares australianos.
Nossa estimativa para os próximos anos é de que a Companhia mantenha um spread ainda robusto entre seu preço realizado e seu custo All-in (COGS + SG&A), mesmo com novas quedas de preços, o que deve favorecer a continuidade da geração de caixa, que juntamente com o posicionamento disciplinado na alocação de capital, propicia um nível atrativo de dividendos. Projetamos um Divided Yield de 13,1% 23E e 11,3% 24E.
Cenário de crescimento. Além disso, as novas adições de capacidade que aumentam o prêmio da mineradora em relação a curva de referência, e um guidance para uma expansão considerável na sua produção de pelotas, estimando triplicar no longo prazo (~33Mt em 2022 vs. ~100Mt em 2030E), devem refletir em um ganho de eficiência operacional e alargamento de margens. Essencialmente quando comparamos com os finos, enxergamos (i) um custo de produção levemente maior, mas (ii) prêmios derivados de curvas a patamares mais elevados no futuro, apesar de no curto prazo estarmos pessimistas com os valores (ultrapassam a média histórica apenas em 2025).
Compre na baixa, ganhe na alta. Diante de vastos argumentos acreditamos que a Vale está descontada, mas sobretudo, nos pautamos no teste de estresse de variáveis para definir que o preço em que a Vale negocia atualmente é irracional, e está enviesado por um sentimento de decepção com o crescimento da China, combinado com dinâmicas ruins trazidas por uma situação atípica do 1T23. Compreendemos que as feridas do 1T23 deixarão marcas um pouco mais graves de curto prazo, mas que devem ficar contidas em 2023.
Entre elas, nosso cenário base para 2023 é o (i) não cumprimento do guidance de C1/t, com US$22,3/t Genial Est. vs. US$21/t (já na banda superior), bem como (ii) aumento acima de +20% do mecanismo de provisionamento para as despesas de reparação do acidente de Mariana, além de (iii) uma curva de minério caindo do patamar atual de ~US$105/t para US$95/t no final do ano. Nenhum desses três pontos favorecem a Vale, pelo contrário, só fazem o valuation de fato cair, porém, ainda ficando com um preço justo bem maior do que o mercado está precificando nos papéis atualmente (queda de 24% em 6 meses).
Porém, é importante destacar que após as conversas recentes que tivemos com a Companhia, realizamos alguns ajustes de premissas em nosso modelo. Principalmente motivados por uma falta de visibilidade sobre o cumprimento do guidance de C1, conforme destacamos no parágrafo acima, chagamos a um corte de Target Pricepara US$16,75 nas ADRs NYSE (vs. US$17,30 na recomendação anterior), o que levaria a um Target Price de R$83,00 para VALE3-B3 (vs. R$87,50 na recomendação anterior). Mesmo com o corte, ainda há um upside atrativo +23,18%.
Negociando a múltiplo EV/EBITDA 3,6x 23E (abaixo do histórico), nos parece uma boa oportunidade de entrada em um ativo de qualidade na geração de caixa, pagador de dividendos, e que deverá sofrer reprecificação de múltiplos para cima, apesar de que sabemos que os investidores talvez tenham que ser pacientes no curtíssimo prazo até o jogo virar. Reiteramos o nosso rating de COMPRA.
CMIN
Maior confiabilidade no aumento de produção
O cenário de queda de preços das ações de CMIN é melhor que o da Vale, tanto que mesmo considerando o mau humor que atacou todas as mineradoras mundo a fora entre março e a temporada de resultados do 1T23, a CMIN conseguiu se reerguer nos dias que sucederam o seu release. Se a Vale caiu 24% desde o início do ano, a CMIN acumula uma alta de +17% no mesmo período.
Nosso ponto de vista é que a CMIN foi afetada quase que exclusivamente pelos indicadores macro da China, sem nenhum tipo de combinação de fatores que tivesse trazido um fluxo vendedor ainda maior para o papel. Diante de um resultado do 1T23 majoritariamente positivo, indicando boas perspectivas para a produção esse ano, ao contrário das revisões de guidances observadas em um passado recente, a CMIN busca ganhar terreno e retomar a confiança do investidor institucional.
Problemas logísticos do 1T23. Apesar de entregar uma produção + compra de terceiros forte de 8,94Mt no 1T23 (-4,3% t/t e +38,2% a/a), a CMIN sofreu impactos do grande volume pluviométrico característico do início do ano. Devido a deslizamentos de terra nas linhas da MRS, a Companhia teve que optar por outra rota férrea, que além de dificultar e trazer ineficiências para sua logística, trouxe maiores custos. Com destaque negativo para o COGS/t que atingiu R$229/t, em uma alta de +39,7% t/t e +23,1% vs. Genial Est.
Dificuldades na MRS totalmente resolvidas. Com o bloqueio da linha férrea, a CMIN não conseguiu embarcar todo seu minério produzido durante o trimestre, abrindo um gap de cerca de 1Mt entre a produção e vendas no 1T23. Conversamos recentemente com a Companhia, e a mesma nos garantiu que o problema já foi totalmente solucionado e não impactará os números do 2T23. Acreditamos que a CMIN está buscando deixar para trás a visão de “promete, mas não cumpre”, visto que no mês de maio a mineradora bateu recordes ao realizar o maior volume mensal observado em toda sua história, demonstrando e refletindo em números a confirmação do fim dos empecilhos logísticos que as chuvas causaram bem como o ganho de confiança para atingir (ou até superar o guidance).
Guidance de produção pode ser superado. Dessa forma, enxergamos que o guidance de 39-41Mt para o ano de 2023 deve ser atingido com tranquilidade. Apesar de ainda ser um pouco prematura para cravar uma opinião mais convicta, acreditamos que a CMIN está aprumada e terá plena capacidade de entregar um número superior conforme o contínuo ramp-up, podendo então superar a barreira dos 41Mt da meta para o ano de 2023.
Hedge ajudou no controle de preços. Além disso, após montar uma posição de hedge no minério de ferro ao observar uma oportunidade pelos preços praticados pelo mercado durante o 1T23, já enxergando (assim como nós) que a curva não teria sustentabilidade acima de +110/t, a CMIN montou uma operação sadia para se proteger da queda. Nossas conversas com a Companhia indicam que a não há a pretensão de realizar novos hedges nos níveis atuais de preço, com uma curva futura que talvez teste o patamar de US$90/t, visto que caso o cenário pessimista se confirme, algumas mineradoras com menores vantagens competitivas e maiores custos deve começar a reduzir produção, retirando oferta do mercado. Conforme comentamos no início do relatório, já estamos observando falta de incentivos de mineradoras de menor porte em mandar carregamentos para China uma vez que os preços começam a se aproximar da barreira de breakeven.
A vida não é um mar de rosas. Ainda assim, nossa expectativa é de que alguns custos que não foram reconhecidos no 1T23, acabem permeando o resultado do 2T23, mediante a realização dos estoques com a estrutura do trimestre passado, dinâmica próxima do que ocorreu com a Vale, porém de menor intensidade, mas mantendo uma certa pressão no COGS. Apesar disso, o COGS deve ainda sofrer uma redução sequencial, uma vez que atingiu a marca de R$229/t no 1T23. Esperamos uma redução na casa de -5% t/t, nesse momento.
Nossa visão para CMIN
Reforçando a sua pegada de um case de growth, a CMIN vem conseguindo crescer produção com o ramp-up de alguns projetos como a Planta Central, que foi por sinal a grande responsável por uma produção inferior ao seu guidance em 2022, na qual a sazonalidade de início do ano causou impactos fortes em seu projeto, principalmente pela concentração de uma grande quantidade de volume pluviométrico em poucos dias.
Ainda assim, seus projetos que realmente criam valor e trazem retornos aos seus acionistas estão apenas em fase preliminar, com o ramp-up do P15 Itabirito previsto para o 4T25, em caso de manutenção do atual cronograma. O cenário turbulento para a commodity ferrosa e para a economia brasileira acaba atrapalhando ainda mais a viabilidade econômica dos seus projetos, que já foram adiados duas vezes desde seu IPO em 2021. É justamente sobre essas revisões que batemos na tecla sobre a postura de Companhia de ter que correr atrás do tempo perdido e recuperar a confiança de investidores.
Apesar das dificuldades logísticas com a MRS, gostamos dos resultados reportados pela CMIN no último trimestre, na qual mantemos uma boa expectativa para o 2T23, mesmo com a queda observada para a referência do minério 62% Fe desde então, acreditamos que a produção virá fortificada e a Companhia deverá compensar a potencial queda no preço realizado pela entrega de aumento de volume, na saído do período sazonal de chuvas para o quadrilátero ferrífero em Minas Gerais (MG).
Negociando a um EV/EBITDA 23E de 4,76x (acima do histórico), preferimos (por ora) a cautela em relação a CMIN, mesmo enxergando um bom momentum para os seus números. Acreditamos que um re-rating para cima pode estar próximo, mas precisamos observar a consolidação do terreno fértil que enxergamos para realizamos alguns ajustes de premissas que envolvam níveis de risco de execução ainda mais baixos nos projetos de ramp-up. Dessa forma, reiteramos nossa recomendação de MANTER, com um Target Price 23E de R$5,50, o que implica em um upside de +16,27% em relação ao fechamento de ontem.