Principais Destaques: Acidente de Mariana
(i) Deposito judicial não nos preocupa, por enquanto; (ii) Ainda assim, as premissas foram revisadas: provisão Samarco/Renova de US$2,3b em 2023 vs. US$1,9b em nosso modelo anterior. Já para 2024, nossa projeção passa a contemplar o valor de US$1,2b vs. US$1,0b na versão anterior; (iii) estamos considerando um acordo final sendo fechado por R$112b.
Principais Destaques: Prévia Operacional 1T23
(i) Esperamos produção com aumento leve a/a (+1,5%); (ii) As chuvas fortes acontecem, elas só mudam de lugar, vale deve sofrer com chuvas intensas no Pará (PA); (iii) Por que a Vale demora a conseguir licenças ambientais? Ineficiências de órgãos públicos e pressão políticas atrapalham a mineradora; (iv) Crescimento projetado do volume de embarques ainda deve ser tímido a/a (+3,6%); (v) Pelotas devem continuar entregando desempenho melhor que finos; (vi) Metais básicos ainda sofrem com manutenções em 2023.
Diante das notícias circulando sobre o aumento de provisões nos resultados da Vale em virtude do acidente de Mariana (MG), resolvemos realizar uma atualização de nossas premissas e esclarecer para os investidores o que nos preocupa e o que ainda mantemos no radar, porém, possui efeitos meramente secundários nesse momento.
Aproveitando também a oportunidade, atualizamos nossa curva de minério, e comentamos um pouco mais sobre o que estamos observando na dinâmica de oferta/demanda da commodity ferrosa.
Nossa visão é de que a consolidação de alguns fatores na China deverão frear e começar a inverter o sentido da curva de minério de ferro a partir do 2S23, reduzindo o spread da curva para patamares mais racionais: (i) Cortes de aço bruto; (ii) inspeções regulamentares, levando a liquidação parcial do posicionamento especulativo; (iii) aumento dos embarques, criando um excedente de mercado a partir do 2S23 e basicamente anulando a restrição de oferta; (iv) mercado imobiliário ainda com uma performance preocupante e (v) menos espaço fiscal para incentivos do governo na economia chinesa.
Recomendamos fortemente a leitura de nosso relatório de atualização setorial, que segue anexo (Metais & Mineração 1T23: Para onde vai o preço do minério de ferro?), no qual exploramos mais profundamente cada um dos 5 pontos elencados acima e damos a direção que acreditamos que a commodity ferrosa deve seguir daqui para frente em termos de preço.
Samarco e Renova: Aumento de provisões à frente
Desde o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), muitos processos correram contra a Samarco, a mineradora responsável pela barragem, e contra a Vale e BHP, já que ambas são as controladoras da Companhia por meio de uma JV.
Para nós, a Vale teve um plano de contingência de danos mais eficaz e imprimiu mais velocidade no tratamento com as partes legalmente envolvidas quando ocorreu o acidente de Brumadinho (MG), que foi posterior ao de Mariana. Para o acidente que ocorreu com a Samarco, como foi o primeiro de grande impacto, a falta de experiência da Vale em lidar com as múltiplas partes interessadas em reparação se tornou nítido, ao vermos que nenhum acordo final foi firmado, mesmo após quase 8 anos do evento.
Ambas as tragédias, em reflexo dos impactos materiais, ambientais e perdas de vidas, causaram também um aumento considerável de despesas da Vale, que se viu na obrigação de realizar gastos extraordinários a operação na tentativa de construir um efeito de reparação em relação a esses impactos.
Em março de 2016 a Vale, em conjunto com a BHP, criou a Fundação Renova, uma organização não governamental para intermediar a negociação de acordos e efetuar pagamentos dentro do processo de reparação pelo acidente de Mariana.
Porém, o acordo, que envolve diferentes frentes, como governo do Estado de Minas Gerais (MG), Governo Federal, Ministério Público (MP), Tribunal de Contas do Estado (TCE), escritórios de advocacia, órgãos de fiscalização ambiental, como o IBAMA, é extremamente complexo e a falta de assertividade da Vale, bem como a complexidade adicional de ter um sócio e ter que submeter decisões que agradem a ele e a todas as outras partes envolvidas, trouxe uma demora relevante no processo de construção desse aprazimento.
Apesar disso, a Fundação Renova já desembolsou, em ações indenizatórias e doações, mais de R$20b e as provisões totais chegaram a R$60b, juntando os esforços da Vale com a BHP. Esse valor será abatido do acordo final, que o mercado esperava que fosse firmado entre as partes até o final do ano passado. Ainda assim, a Vale, por meio da Fundação Renova/ Samarco, não chegou em acordo com as partes e a negociação se estende até hoje. Considerando que a expectativa era de que o acordo saísse em dezembro, e já estamos em abril, acreditamos que essa demora traz para os investidores a incerteza sobre em quais condições esse acordo vai ser costurado, e o quanto a Vale ainda terá que provisionar para o pagamento do processo de reparação.
Notícia boa costuma sair rápido. Se o acordo ainda não foi sacramentado e anunciado publicamente, após meses terem se passado em relação a expectativa de dezembro, nossa interpretação é de que a demora é um sinal de que a Vale esteja com dificuldades de negociar um valor que seja próximo daquilo que ela inicialmente estava disposta a pagar, e isso não nos parece uma “notícia boa” para os investidores da Vale.
Deposito judicial não nos preocupa, por enquanto. Recentemente, vimos um fluxo de notícias negativo (para a Vale) em relação ao evento. Foi circulado no noticiário uma decisão que teria determinado um depósito judicial no valor de R$10,3b, dividido igualmente entre a Vale e a BHP, em 10x parcelas, referente a reparação da tragédia de Mariana. Considerando o FR que a Vale divulgou após o fechamento de mercado em 31/03, esclarecendo que a Companhia não foi notificada dessa decisão, e após conversas com a Companhia, acreditamos que mediante a uma possível notificação, a Vale iria recorrer da decisão, o que implicaria em um processo judicial que poderia se arrastar durante algum tempo. Dessa forma, não vemos razões para, nesse momento, ajustar o nosso modelo para comtemplar esse fluxo de pagamento relacionado a depósito judicial.
Ainda assim, as premissas foram revisadas. O que motivou a nossa mudança de premissas para um cenário pior para a Vale foi justamente o que comentamos anteriormente, sobre a demora para o anúncio do fechamento do acordo. Estávamos considerando o valor do Guidance, anunciado no Investor Day em dezembro (US$1,9b em 2023). Porém, ficamos mais pessimistas com relação a essa temática após o fluxo de notícias recente.
Ou seja, mesmo que ainda caiba recurso no depósito judicial, no caso em Companhia venha a ser notificada, acreditamos que a falta de articulação da Vale (Samarco/ Renova) em costurar um acordo, cria situações, como essa, possíveis de acontecer. Nossa visão é de que, caso o acordo já estivesse de pé, as incertezas com relação a esse assunto seriam consideravelmente menores. Sabemos que o mercado não gosta de incertezas, e o preço dos ativos sofrem maior volatilidade diante desse tipo de cenário onde ainda há dúvidas.
O que de fato nos preocupa não é a possibilidade do depósito judicial, e sim a falta de segurança jurídica que a Vale tem ao tentar realizar o custeio da reparação sem ainda possuir um valor final acordado perante todas as partes envolvidas. Como a articulação desse acordo está demorando muito mais do que o previsto, acreditamos que o valor que foi passado em dezembro do ano passado no Investor Day comtemplava uma estimativa de provisionamento que a Vale teria que fazer, como um percentual do valor de acordo que ela acreditava que seria fechado ainda em 2022, o que sabemos que não ocorreu.
Dessa forma, para nós, as chances de o valor final do acordo ser maior o que a Vale estava projetando em seu orçamento são grandes, e então, resolvemos criar uma sensibilidade em relação ao Guidance de provisionamento que foi passado pela Companhia, o que levou a uma detração no valuation em nosso modelo da Vale.
Além disso, a BHP responde judicialmente em nome da Samarco em um processo que pede uma indenização de US$44b para as vítimas do desastre de Mariana. O processo corre na Inglaterra, já que a BHP é listada na Bolsa de Valores de Londres (LSE). Com o processo para ser julgado apenas em 2024, a mineradora anglo-australiana entrou com uma ação de contribuição contra a Vale, para que a mineradora brasileira também respondesse ao processo na Inglaterra em nome da Samarco.
O processo passou a ganhar maior notoriedade quando o número de assinaturas saiu de 200 mil pessoas para 700 mil em curto espaço de tempo, o que deve pressionar as autoridades, apesar do caso já estar sendo julgado na Justiça brasileira, reforçando o argumento das mineradoras sobre um julgamento duplo.
Acreditamos que, uma decisão judicial a favor da inclusão da Vale no processo, deve causar consequências financeiras certamente maiores do que as previstas pela Guidance divulgado no Investor Day. Porém, por enquanto, no que diz respeito a Vale também responder junto com a BHP a processo em Londres, a situação ainda continua em uma zona cinzenta.
O que mudou? A partir dessa atualização, estamos considerando uma despesa com provisão de US$2,3b em 2023 vs. US$1,9b em nosso modelo anterior, um aumento de +21% na despesa a ser circulada pelo P&L da Vale esse ano. Já para 2024, nossa projeção passa a contemplar o valor de US$1,2b vs. US$1,0b na versão anterior. Até o final de 2028 estiamos um valor de US$4,2b em despesas com provisões relacionadas somente a Samarco/ Renova, o que seria um incremento de ~25% em relação a conta que fazíamos antes de revisitarmos as premissas.
Para chegar a esses valores, estamos considerando um acordo final sendo fechado por R$112b, quantia pelo qual está sendo ventilada a possibilidade mais forte de que venha a ser sacramentado, o que levaria a uma diferença entre o que já foi provisionado e o montante ainda a ser pago de R$52b (a ser dividido com a BHP). Segundo nossas estimativas, a Vale levaria, pelo cronograma de desembolsos de provisões divulgados sendo ajustados para esse novo valor, algo em torno 6 a 7 anos para quitar a tramitação das despesas no resultado da Companhia.
E qual é o efeito dessas mudanças no Preço-alvo? Com a sensibilidade de premissas que fizemos em nosso modelo de valuation para a mineradora, observamos um Target Price de R$93,00 sem contar as provisões Samarco / Renova, que já reduz para R$90,00 ao contar com o valor divulgado no Guidance, e chegando a R$89,00 em nosso cenário base, onde nossas estimativas passaram a ser mais pessimistas do que o esperado pelo management no final de 2022, devido as razões que mencionamos acima. Ou seja, o fluxo de provisões e pagamentos do nosso cenário base, considerando o acordo sendo fechado por R$112b, retraem o Preço-alvo em -4,3%.
Prévia Operacional 1T23: Produção e vendas
Marcado por um trimestre sazonalmente maior em volume pluviométrico, o 1T23 deve apresentar uma queda relevante na produção de minério de ferro t/t, e assim acabar por também refletir nos embarques. Apesar de chuvoso, ainda esperamos uma evolução de produção na comparação a/a, principalmente por conta de uma menor concentração da precipitação ao longo do trimestre; ao passo que uma grande concentração, como a observada no 1T22, especialmente no quadrilátero ferrífero, provoca danos em infraestruturas importantes e pode inviabilizar tanto a extração como o transporte do minério, se tornando um grande detrator de produção do setor.
Esperamos produção com aumento leve a/a. Além disso, por serem naturalmente afetados em termos produtivos, as manutenções costumam tomar foco no primeiro semestre do ano. Dessa forma, a nossa expectativa é que a produção de finos seja de 64,0Mt Est. Genial no 1T23 (-20,7% t/t; +1,5% a/a), em um trimestre no qual a Vale deve crescer levemente a produção a/a, por conta de uma normalização da distribuição do volume de chuvas no quadrilátero ferrífero (MG), já que a Companhia segue sem grandes avanços em relação as licenças ambientais no Sistema Norte (PA), que podem destravar um volume mais significativo de produção.
As chuvas fortes acontecem, elas só mudam de lugar. Ainda que a intensidade das chuvas tenha sido menor e mais espaçada no quadrilátero ferrífero (MG) se compararmos ao igual período do ano passado, a Vale deve sofrer novamente nesse 1T23, diante de chuvas mais fortes, dessa vez no Pará (PA), onde fica Carajás, o complexo que representa ~10% do volume de produção atual da Vale e é estratégico para Companhia pela qualidade do minério, high grade (+prêmio sobre a curva de 62% Fe que o quadrilátero ferrífero).
Em relação as dificuldades de licenciamentos, justamente no Sistema Norte onde fica Carajás, nossa opinião é que a morosidade encontrada nos últimos trimestre deve continuar a se repetir, colocando grande empecilho para o ramp-up da produção da Vale.
Por que a Vale demora a conseguir licenças ambientais? Segundo a nossa visão, após termos conversado com especialistas em direito ambiental e os agentes públicos, as dificuldades que geram a morosidade não estão necessariamente ligadas a Vale, e sim, aos órgãos emissores das licenças, como o IBAMA, e ao Instituto Chico Mendes, que exercem um grande poder nas áreas de preservação ambiental situadas na floresta amazônica.
Acreditamos que esses órgãos não possuem a infraestrutura necessária para dar celeridade nos processos, e também, julgamos que, por mais que a Vale faça a parte que cabe a Companhia, com o custeio e a emissão dos estudos de impactos ambientais dentro dos prazos corretos, o viés político na concessão de permissão a uma atividade extrativista no entrono de áreas de preservação é sempre um peso grande que joga contra a mineradora. Com a pauta pró-meio ambiente do novo governo, esse viés tende a ser ainda mais forte.
Apesar de não nos parecer provável, a dificuldade acaba colocando um upside no caso de as licenças serem obtidas de maneira mais rápida que a esperada, de forma a aumentar sua produção e vendas de minério high grade.
Crescimento projetado do volume de embarques ainda deve ser tímido a/a. Mantendo a tendência, a nossa projeção para os embarques de minério de ferro finos é de 53,1Mt Est. Genial (-34,5% t/t; +3,6% a/a), o que eventualmente atrapalharia a formação de top line com um crescimento mais robusto para a Vale, caso o preço do minério durante o trimestre não tivesse compensado na outra ponta. Vimos a média de preço da curva de referência ficar em US$125/t no 1T23, muito acima do que consideramos racional, conforme explicamos com mais detalhes em nosso relatório setorial (link no início).
Pelotas devem continuar entregando desempenho melhor que finos. Ainda dentro de minério, mas para Pellet feed, esperamos que a produção atinja 8,0Mt Est. Genial no 1T23 (-2,8% t/t; +16,0% a/a), e acompanhados pelas vendas, em 8,2Mt Est. Genial no 1T23 (-6,6% t/t; +17,1% a/a), mais um trimestre na qual as vendas superam a produção, por conta do processo de transformação. Os números representam uma grande alta na comparação a/a, principalmente por conta da melhora no processamento das plantas de sintetização, provocando um aumento relevante no guidance de 2022A para 2023E, saindo de 33Mt para 36-40Mt.
Metais básicos ainda sofrem com manutenções em 2023. A restrição que a pandemia trouxe acabou por atrasar várias manutenções na unidade de metais básicos, que ainda devem atrapalhar o ano de 2023 da unidade. O guidance divulgado para o Níquel, apresenta uma queda de produção em torno de até ~10% a/a, principalmente por conta de uma manutenção programada em Onça Puma, mas que não deve atrapalhar tanto a produção do 1T23, visto que deve ocorrer ao longo do ano. Sendo assim, a nossa expectativa é que a produção de Níquel venha em 46Kt Est. Genial (-3,4% t/t; +0,2% a/a), enquanto as vendas atinjam 44Kt Est. Genial (-24,2% t/t; +12,7% a/a).
Na dinâmica oposta, o Cobre, que apresenta um Guidance de produção em 335-370Kt para 2023E vs. 253Kt em 2022, implica uma alta de até ~45% a/a. Dessa forma, para o 1T23 esperamos que a produção de Cobre chegue a 68Kt Est. Genial (+2,2% t/t; +19,7% a/a), enquanto as vendas sigam a mesma alta para bater 63Kt no 1T23 (-12,7% t/t; +25,7% a/a).
Nossa visão e recomendação
Com a nossa curva de minério revisada, um custo de capital maior, uma sensibilidade nas provisões para o acidente de Mariana (MG), uma visão menos construtiva que o consenso para a demanda na China, realizamos um corte em nosso Target price para R$89,00 FY23E, o que leva o papel a um upside de +15,96%, reiterando a visão neutra para as ações da mineradora, com a recomendação de MANTER.
Encorajamos a leitura de nosso relatório sobre a nossa expectativa para os preços da curva do minério de ferro daqui em diante, com uma visão ampla e detalhada do setor de mineração para o 1T23, que segue em anexo (Metais & Mineração 1T23: Para onde vai o preço do minério de ferro?)