A Vale fez o seu Investor Day 2022 ontem, dia 07/12/2022, apresentando dados que foram digeridos negativamente pelo mercado. Nossa visão sobre o guidance de produção para 2023, divulgado hoje na apresentação e que iremos detalhar ao longo do relatório, confirma os pontos que havíamos comentado a respeito da Companhia em análises anteriores: Morosidade na obtenção licenças e demanda relacionada a China ainda com dificuldades de ganhar tração, o que impacta os preços realizados.
O destaque positivo, na nossa opinião, está relacionado com mais detalhes sobre o carve-out da operação de metais básicos. Reiteramos a nossa recomendação de MANTER, a um Preço-Alvo de R$90,00, apresentando um upside ainda tímido de +6,08%.
Minérios Ferrosos: Guidance 2023 de produção não apresenta crescimento
A Companhia divulgou durante o Investor Day o guidance de produção para Minério de ferro em 2023 na marca de 310-320Mt, em linha com o guidance em 2022 (310Mt). Isso demonstra a dificuldade da minerada no ramp-up de produção em carajás, especialmente na mina Serra Norte (N5), que sofre ainda com grande morosidade para licenciamento ambiental devido a necessidade preservação do bioma apoiado por extensivos estudos. O guidance de longo prazo foi revisado para baixo, chegando a 340-360Mt em 2026 Vs. 400Mt (-10%) na projeção anterior, e ficando acima de 360Mt apenas em 2030.
Já seu maior projeto, o S11D, que deve contribuir com ~70Mt para a produção em 2022, deverá apresentar uma qualidade inferior à nossa expectativa inicial, chegando ao patamar de 63,5% – 64% apenas depois de 2026, mostrando mais desafios de processamento do que incialmente previsto.
Em nossa visão, dois pontos foram destaques: (i) O topo do guidance fica 1,2% abaixo de nossa estimativa para 2023E e reflete a dinâmica da indústria, da qual já estávamos com um tom mais pessimista, uma vez que os pares australianos também estão encontrando dificuldades de manter produção e (ii) o corte do guidance de longo prazo para 340-360Mt parece fazer mais sentido para nós, uma vez que tínhamos em nosso modelo de valuation a projeção de 352Mt, com o topo ficando 2,2% aquém da nossa expectativa, porém, ainda assim, mais próximo do que a marca de 400Mt, que nos parecia otimista em excesso.
Acreditamos que as razões que impactam o ponto (ii) se devem a fatores relacionados aos entraves para licenciamento e fatores geológicos, o que posiciona a estratégia de preço realizado sendo priorizado em detrimento de volume de produção. Porém, apesar do management ter enfatizado que essa seria uma abordagem que receberá enfoque pela Companhia, observamos um 3T22 fraco em nossa visão, justamente com o preço realizado de minério de ferro (finos) com um prêmio de US$0,6/t, bem abaixo do que esperávamos e 6x abaixo da média histórica da mineradora.
Do lado do preço, acreditamos que a Companhia ainda tem um caminho pela frente para comprovar que conseguirá negociar com um prêmio mais relevante em um cenário ainda desafiador para a commodity ferrosa, e tendo em vista as dificuldades de ramp-up do lado do volume, que não depende necessariamente dela e sim das autoridades governamentais, nossa análise é de que o tom do Investor Day não foi positivo.
Dinâmica de custos: C1 deve vir com aumentos em 2023
A expectativa no custo C1 para 2023E é de uma leve expansão, principalmente por causa do aumento no strip ratio (quantidade de resíduos a serem extraídos e excluídos para aumentar a qualidade do minério), apesar do volume, que caso venha no topo do guidance, poderá causar certa diluição de custos.
O custo all-in de minério de ferro longo prazo (2026E) da Companhia chegaria a US$42/t Vs. US$49/t 2022E, levando a um incremento de 12% em relação as nossas estimativas, o que vemos como outro ponto negativo.
Metais Básicos: Carve-out pode destravar valor
O guidance para níquel em 2023E foi de 160-175kt, em linha com as nossas estimativas de 165kt. A projeção para 2022E veio levemente acima das nossas expectativas, chegando a 180kt. Já o cobre ficou 335-370kt para 2023E, marcando um guidance 9% acima das nossas estimativas. Por outro lado, o número para 2022E ficou em linha com as nossas expectativas, com 260kt.
No Investor Day a Companhia divulgou alguns detalhes adicionais sobre a separação (Carve-out) das operações de metais básicos, o que ajudou os investidores a entenderem melhor a nova estrutura que a mineradora busca. O modelo de gestão na divisão deve ser alterado, sendo delimitado com uma governança separada. Para isso, a Vale procurará um partner com capacidade técnica e operacional para ajudar a acelerar o negócio, com a expectativa de anúncio do nome em 1S23. A proposta da Vale é que o parceiro não seja uma instituição financeira visando apenas investimento através de alavancagem e sim experiência prática no business de extração e tratamento dos metais básicos, especialmente níquel. O desenho da estrutura acionária da nova empresa deverá compor o controle ainda na mão da Vale, com ~90% do equity, restando ao parceiro uma fatia minoritária, que corresponderia ao valor de ~US$2b.
Acreditamos que o Carve-out deve destravar valor, com a nova empresa podendo negociar a um múltiplo maior do que o que a Vale está negociando atualmente, e uma política de alocação de capital diferente, utilizando os recursos do caixa para reinvestir na própria empresa ao invés de distribuir dividendos, prática comum vista hoje na Vale.
A proposta deverá incluir um quadro do conselho de administração próprio para a nova empresa, juntamente com um balanço separado, não comprometendo a estrutura da Vale, de forma que a responsabilidade de captação de recursos ficará a cargo da empresa de metais básicos e não da Vale.
Alerta ESG: Eventos em Brumadinho e Mariana foram subestimados pela mineradora
Após a primeira tragédia em 2015, a Companhia em busca de redenção social, desembolsou uma quantidade representativa do seu caixa com acordos e indenizações, o que não foi suficiente para evitar novas e mais fortes regulações em cima do setor de mineração e para a própria Vale. Como reflexo de regulações ambientais mais apertadas, desde o acontecimento em Mariana a mineradora retraiu em -25% sua produção total, contando com várias estruturas sobre revisão, em processo de adequação a novas normas relacionadas à segurança.
Para que o ramp-up da produção seja efetivo, a Companhia vai precisar manter uma relação mais estreita com autoridades ambientais e responder melhor aos seus pedidos. Seu histórico deve continuar a atrapalhar sua produção, principalmente visto que o guidance de longo prazo é de ~360Mt, enquanto sua produção no ano de 2018, anterior a tragédia de Brumadinho, foi de 385Mt; representando uma queda de -5,3%, mesmo após vários anos.
Nossa visão e recomendação
Acreditamos que o tom do Investor Day foi levemente negativo, colaborando para um cenário em linha com as nossas expectativas mais neutras a cerca da Vale e do setor de mineração. Vemos dois entraves principais como desafios para a Companhia: (i) licenciamento ambiental para ramp-up de produção, com divulgações de guidances sendo rebaixados, porém, em linha com nossas projeções, que estavam conservadoras devido a nossa visão mais neutra; (ii) discurso enfático do management durante a apresentação sobre dinâmica de preço realizado sendo priorizada em detrimento de volume, apesar de um 3T22 fraco em nossa opinião com relação aos prêmios de minérios ferrosos (finos).
Do lado positivo, vemos a possibilidade de destravar valor pela separação das operações de ferrosos de metais básicos, com o carve-out sendo viabilizado juntamente de um investidor parceiro, que deverá entrar com 10% do negócio, avaliado de maneira preliminar em ~US$20b. Acreditamos que o um investidor com perfil técnico e com experiência prática na extração e tratamento de metais básicos deve acelerar o processo de crescimento da nova empresa, que terá um balanço e conselho de administração separado da Vale.
Com uma política dividendos e de alocação de capital distinta da Companhia atualmente, nossa análise é de que a nova empresa deverá destravar mais valor para os acionistas em comparação ao business sendo gerido dentro da própria Vale, rodando a múltiplos mais esticados ao consolidar uma tese de investimento de growth.
Surpresa negativa para o mercado, não para nós. Enquanto o novo guidance foi digerido de maneira negativa pelo mercado logo após o anúncio, com o papel acelerando uma queda ainda durante a apresentação do Investor Day, o número não causa surpresa a nós. Conforme comentamos nos relatórios anteriores, nossa visão segue neutra para a Vale. Estamos trabalhando com premissas de preço de minério de ferro a longo prazo de ~US$70/t, enquanto o management acredita ter suportes para uma curva de US$90-100/t, o que nos parece carregar um tom otimista demais.
A apresentação não nos convenceu que o desempenho operacional da Vale está incompatível com a sua precificação de mercado. Ainda reforçamos a nossa visão de que o contexto macroeconômico na China é desfavorável, com o minério de ferro devendo sofrer repiques no preço em 2023, alimentado por algum nível de demanda reprimida na reabertura da China devido a flexibilização da política de Covid Zero (podendo chegar a ~US$100/t no 1S23), porém com um dinâmica de médio prazo ainda em baixa por um mercado imobiliário dando sinais de desaceleração, com nossas estimativas apontando que o setor imobiliário precisaria contrair ~25% para equilibrar a oferta e a demanda de imóveis nos próximos 10 anos, eventualmente a curva seria puxada de volta para patamares mais baixos, após os meses de demanda reprimida do 1S23. Dessa forma, reiteramos a nossa recomendação de MANTER, a um Preço-Alvo de R$90,00, o que faria com que o papel apresente um upside ainda estreito de +6,08%.