O preço da ação de Valid disparou 16,8% nos últimos dias e acreditamos que existam dois principais gatilhos para isso:
- Do lado mais fundamentalista (financeiro), o presidente Jair Bolsonaro assinou no dia 23/fev um decreto válido a partir de 1/mar que muda a regra de emissão de documentos de identidade (ID) no Brasil com a criação de um documento de RG único nacional. Os documentos passarão a ser de policarbonato e pessoas terão prazo de até 10 anos para substituir seu documento. Por passarem a ser feitas de um material mais caro do que o antigo papel utilizado nas identidades, o novo documento poderá ser cobrado, ao contrário do RG atual que é gratuito. Com preço quase que 3x maior e margens melhores, acreditamos que as receitas unitárias da Valid por RG emitido poderão ser incrementadas, potencialmente melhorando também as margens da empresa. Além disso, por estipular um prazo para a troca de documentos de identidade, poderão haver volumes adicionais de emissões que não estariam ocorrendo se não fosse a mudança da regra. Por fim, com a interoperabilidade entres os órgãos emissores, abre-se a chance de aumento de negócios para Valid com produtos de maior valor agregado, como biometria, e ganho de market share.
- O segundo fator positivo é que, com a alta da ação, o exercício dos bônus de subscrição ao preço de R$ 10,67 se tornou atrativa. O exercício tinha que ocorrer até ontem 3/mar, a VLID3 fechou em R$11,87, alta de 11,3% no dia. Caso a totalidade dos bônus fosse exercida, a companhia poderia captar R$ 115,2m. A entrada de recursos em caixa seria favorável aos planos de diversificação da Valid e melhora da estrutura de capital, ambos positivos para a tese da empresa na nossa avaliação.
Dada mudança regulatória e potencial sucesso do segundo aumento de capital, reforçamos a recomendação de COMPRAR para Valid. A companhia possui dinâmicas positivas que nos atraem, tais como: (i) a volta de volumes represados; (ii) estratégia mais contundente de diversificação das receitas sem perder o foco nos principais negócios que geram caixa para financiar de forma rentável as promissoras novas avenidas de crescimento; (iii) processo de restruturação e corte de custos adicionais; e (iv) valuation atraente de 5x EV/EBITDA 22.
Novo RG único: mais receitas e margens
O presidente Jair Bolsonaro assinou no dia 23/fev um decreto que criará um número único de RG para todo o país. Os institutos de validação têm até mar/23 para se adequarem. O número do RG atual será substituído pelo CPF. A nova carteira de identidade será de policarbonato, mas poderá ser acessada também pelo aplicativo do GOV.BR.
A emissão das carteiras de identidade permanecerá sob responsabilidade das Secretarias de Segurança Pública de cada Unidade Federativa. O decreto entrará em vigor em 1/mar e a carteira atual seguirá válida por até 10 anos para a população de até 60 anos e por prazo indeterminado para cidadãos com mais de 60 anos.
A Valid é responsável pela emissão de carteiras de identidade em múltiplos estados do Brasil, como São Paulo. Com a mudança para um material mais caro esperamos um incremento nas receitas da Valid. Os documentos de identidade têm uma margem inferior do que as carteiras de motorista (CNH), também emitidas pela companhia. Acreditamos que a mudança poderá contribuir para a margem da emissão de documentos.
As receitas unitárias de cada emissão de documento de identidade pela Valid devem ser superiores aos antigos documentos de papel dado material mais caro – estimamos cerca de 3x maior. As margens também podem ser impactadas positivamente.
A mudança nas regras para emissão do RG deve contribuir para o aumento dos volumes da Valid. O Brasil possui hoje 213m de pessoas segundo o IBGE. Como cerca de 3m não tem documentos de identidade, aproximadamente 210m de pessoas possuem RG. Excluídos os 30,3m de idosos do país, que não terão prazo limite para emitir um novo documento de identidade, 180m de documentos precisarão ser emitidos nos próximos 10 anos. O número de idosos foi obtido através da PNAD contínua.
A Valid tem 76% de participação de mercado de emissão de carteiras de identidade. Logo, a empresa deverá emitir, no mínimo, 136,8m de documentos nos próximos 10 anos em função da nova regra. O volume corresponde a 5,25x o total de documentos emitidos pela Valid em um só ano. Em 2019 a companhia emitiu cerca de 26m de documentos, entre CNH e documentos de identidade. O ano de 2019 é uma aproximação mais exata ao volume de emissões de um ano normalizado, dadas paralisações de emissões em 2020 e 2021 em função da pandemia.
Por não sabermos a proporção de documentos de identidade emitidos pela Valid frente ao total de documentos emitidos (RG e CNH) e qual a frequência com que uma pessoa costuma trocar de carteira de identidade não conseguimos calcular com exatidão o volume que será incrementado nos próximos 10 anos. Entretanto acreditamos ser relevante. Se considerarmos que 10% das pessoas passam mais de 10 anos sem trocar a carteira de identidade, teríamos um volume incremental mínimo de documentos emitidos pela Valid de 13,7m nos próximos 10 anos (1,37m ao ano). O volume incremental ao ano corresponderia a 5,25% do total de documentos emitidos pela Valid em um ano, com uma receita e margem potencialmente maiores que as de costume.
Mudança no prazo da CNH: um grande desafio
Um grande desafio nos próximos anos vai ser a mudança de prazo do CNH, seu principal produto. Com a validade da CNH tendo passado de 5 para 10 anos, o que se tornou vigente em abr/21, a Valid corre para suprir a perda de receita e margem com outras linhas de negócio. A mudança impactará a empresa a partir de 2026, quando todas as carteiras de habilitação com o novo prazo de validade já tiverem sido emitidas, com perdas de receita estimadas em até R$ 50 milhões por ano. Esperamos então a recuperação do nível normal de emissões a partir de 2031.
Para entender melhor a gravidade do desafio, a unidade de identidade (VGS) corresponde a 60% de todo o EBITDA da Valid em anos normalizados. Sendo o principal produto do VGS, estimamos que o CNH corresponde a mais de 40% de todo o EBITDA da empresa. Os outros 20% seriam basicamente o RG, que com essa nova mudança de identificação pode vir a ser de grande valia.
Em paralelo, o novo managment reperfilou a dívida e fechou uma unidade fabril que a empresa possuía em São Bernardo. Em fevereiro de 2021, a Valid fez um aumento de capital em uma operação envolvendo somente a própria base acionária, captando R$ 100 milhões para financiar a virada de chave da companhia. A operação foi suportada pelo seu maior acionista, a asset Alaska, que detém diretamente ~28% da empresa. O investimento e estrutura acionária devem auxiliar com o funding necessário para a reinvenção da Valid.
Bônus de subscrição: salvo pelo gongo!
A operação de aumento de capital de R$ 100m de Valid deu aos acionistas um bônus de subscrição por cada ação adquirida na operação. O bônus dava o direito de participar de um novo aumento de capital, podendo exercê-lo até ontem (3/mar) ou até 5/set. O preço de exercício do bônus é de R$ 10,67.
Caso a ação estivesse cotada abaixo de R$ 10,67 no dia do primeiro exercício (3/mar) faria pouco sentido aos acionistas subscreverem, pois estariam pagando mais caro por uma ação que está mais barata no mercado. Como a ação até o dia 2/mar estava cotada abaixo do preço de exercício era pouco provável que o aumento de capital fosse sair. No entanto, no fechamento do dia 2 a ação atingiu exatamente o preço de exercício, justificando que os detentores dos bônus passassem a subscrever novas ações.
Como foram emitidos 10,8m de bônus de subscrição, a Valid poderia levantar até R$ 115,2m. Apesar de provavelmente a totalidade dos bônus não ter sido exercida, acreditamos que a subscrição tenha sido relevante. Os recursos captados contribuirão para o crescimento das novas verticais de negócio da Valid e continuidade da melhora da estrutura de capital.