A virada do ano veio com novas incertezas para o segmento de saúde. Em primeiro lugar, a Ômicron está se espalhando pelo mundo e já vem aumentando a frequência de testes de covid e atendimentos em prontos socorros (P.S) no Brasil. Em segundo lugar, devemos ter um ano com taxas de juros mais elevadas e mais volatilidade nos mercados de capitais brasileiros em função da eleição. A conjuntura pode frear a consolidação observada no setor de saúde nos últimos anos, principalmente através das aquisições.
Mesmo com o cenário adverso, na nossa visão o Fleury está bem posicionado para enfrentar desafios. Dentre os fatores positivos que enxergamos para a empresa estão: (i) O aumento dos exames de COVID, que deve contribuir com a receita no 1T22; (ii) A companhia vem conseguindo crescer através de aquisições de empresas de exames diagnósticos e de novas linhas de negócio; (iii) Esperamos que o Fleury continue a sua estratégia de crescimento inorgânico, dado a baixa alavancagem (dívida líquida/EBITDA) de 1,3x no final do 3T21; (iv) Valuation atrativo de 17,3x P/L 22 (vs. 20x da média histórica).
Já com relação à Rede D’Or estamos menos otimistas. Apesar de gostarmos da tese da empresa, enxergarmos o potencial de crescimento no longo prazo e reconhecermos a qualidade de gestão, acreditamos que algumas dinâmicas podem continuar a pressionar o preço da ação, dentre elas: (i) O grau de alavancagem mais elevado de 2,4x, com 52% da dívida pós-fixada e perspectiva de juros médios mais elevados em 2022; (ii) Potencial redução do ritmo de aquisições em 2022, em função do encarecimento da dívida e menor disponibilidade de capital; (iii) Risco de paralisações de cirurgias eletivas com a nova onda de COVID; (iv) Valuation menos atrativo de 32,2x P/L 22.
Na nossa visão, a dinâmica mais positiva para Fleury do que para Rede D’Or justifica mudarmos a nossa Escolha Genial do setor de saúde para Fleury. Ajustamos o nosso preço alvo para Fleury de R$ 22,8 para R$ 23,8. Já para Rede D’Or estamos cortando o preço alvo de R$ 80 para R$ 51,3, mas mantendo a recomendação de COMPRAR.
Omicron e Influenza A:
Com a nova variante do COVID surgiu o receio de que uma nova onda da pandemia possa afetar o sistema de saúde, levando a novas restrições de locomoção. Segundo a Universidade Johns Hopkings, o número de casos de COVID semanais no mundo teve um salto na primeira semana de 2022 para 17m (vs. 5,5m na última semana de 2021).
Os casos começaram a crescer na semana de 24/out, quando atingiram 2,95m (vs. 2,83m uma semana antes). Contudo, desde a semana do dia 24 até hoje o número de mortes por COVID caiu 10,2% (vs. 475% de crescimento dos casos). No Brasil, já foram reportados aumentos no número de casos na última semana e acreditamos ser inevitável que aumentem em linha com o que observamos em outros países. O número de casos no Brasil atingiu 262k na última semana (vs. 26k na última semana de 2021).
Na primeira e segunda onda houve um aumento de casos nos EUA e Europa e posteriormente no Brasil. No entanto, a menor letalidade da nova variante deve gerar menos restrições à locomoção do que nas ondas anteriores. Por isso, acreditamos ser improvável um cancelamento em massa de procedimentos eletivos, como ocorreu na primeira onda.
Caso ocorram, acreditamos que serão cancelamentos concentrados em cirurgias eletivas, assim como realizado na segunda onda. No Ceará, os hospitais estaduais já suspenderam cirurgias eletivas. Na nossa avaliação, as medidas tomadas na segunda onda são uma projeção mais fiel ao que pode estar por vir, pois foram implementadas em um momento em que já havia mais conhecimento sobre a pandemia e seus impactos.
Uma eventual paralisação de cirurgias eletivas pode prejudicar a taxa de ocupação dos leitos de Rede D’Or. Com os cancelamentos de procedimentos eletivos na primeira onda da pandemia, a taxa de ocupação de leitos da Rede D’Or caiu para 61,2% no 2T20 (vs.76% em 2019) e a receita líquida teve queda de 16,5% t/t. O mesmo efeito só não foi observado na segunda onda em função do grande número de pacientes de COVID demandando o sistema de saúde.
Os impactos do cancelamento de cirurgias eletivas tendem a ser pequenos para Fleury. No 2T21, o número de procedimentos realizados pelo Fleury seguiu crescendo 1,73% t/t no 2T21, mesmo com uma redução da participação de testes de covid para 8,3% da receita (vs. 9,7% no 1T21).
Em um cenário de menores internações, mas maior transmissibilidade da COVID, acreditamos que o Fleury deva se beneficiar com o aumento da participação dos testes de COVID na receita bruta. A manutenção das margens elevadas mesmo quando valores relevantes da receita advinham de testes de COVID sugere que não devemos ter impactos negativos nas margens com aumento dos exames. No 4T20 e 1T21 os testes de COVID correspondiam a 11,1% e 9,7% da receita bruta e as margens EBITDA foram de 32,1% e 31,9%, respectivamente.
Pela nova variante do COVID não gerar um número elevado de internações, dada menor gravidade, a Rede D’Or não deve ter incrementos de receitas. Mesmo com o maior número de atendimentos em P.S por problemas respiratórios, acreditamos que tenham um baixo impacto no resultado do 1T22. Os atendimentos em P.S tem pouca contribuição nos resultados, representando serviços complementares a procedimentos de maior complexidade.

Consolidação no setor
As teses de Fleury e Rede D’Or estão muito atreladas a consolidação no setor de saúde. O setor é muito fragmentado e companhias vem crescendo principalmente inorganicamente (com fusões e aquisições). Em 2020, a Rede D’Or realizou 10 aquisições, totalizando R$ 3,5b. O Fleury fez 4, totalizando R$ 836,4m.
O Fleury aposta na ampliação de praças, adquirindo laboratórios em outras localidades, e na diversificação de receitas. As receitas de novos negócios cresceram 542% a/a no 3T21 e já atingem uma penetração de 7,9% da receita bruta (vs. 1,4% no 3T20). Com o endividamento em 1,3x dívida líquida/EBITDA no final do 3T21, acreditamos haver espaço para o Fleury continuar sua estratégia de crescimento inorgânico.
A Rede D’Or tem como objetivos ampliar as praças onde atua e rapidamente melhorar as margens das adquiridas, compensando o investimento. Ela consegue fazer isso pelo ganho de escala e eficiência operacional.
Ao fazer o IPO em dez/20, a Rede D’Or sinalizou a intenção de expandir 5.2k leitos até 2025. Somente em 2021, a empresa teve um crescimento de 2.2k. Dado o ritmo mais acerelado de crescimento em 2021 e maior endividamento, esperamos que a companhia diminua o ritmo das compras. A Rede D’Or atingiu uma alavancagem (dívida líquida/EBITDA) de 2,4x no 3T21 que deve sentir uma pressão nas despesas financeiras com a Selic média subindo substancialmente de 4.38% em 2021 para algo em torno de 11.2% em 2022.
Além de frear a agenda de M&A, o maior endividamento da Rede D’Or pode manter o resultado financeiro pressionado ao longo de 2022. No 3T21, já houve uma queda de 77,2% a/a e 38,3% t/t do resultado financeiro. Uma parte do resultado está atrelado a antecipação do pagamento de um título, que gerou uma despesa de R$ 74m. No entanto, com 52% de suas dívidas pós-fixadas, esperamos um encarecimento da dívida neste ano.
Sazonalidade jogando contra:
O resultado do 4T de empresas prestadoras de serviços de saúde geralmente é mais fraco, apresentando queda t/t. Por ser um período de férias as pessoas costumam realizar menos procedimentos eletivos no período. No entanto, o volume adicional das cirurgias eletivas que estavam represadas pode contribuir para um crescimento t/t da receita da Rede D’Or t/t no 4T21.
Por acreditarmos estar com o volume praticamente normalizado, o Fleury deve manter a queda t/t de receitas. Além disso, em função da forte base da comparação do 4T20, acreditamos que possa haver uma queda da receita a/a de Fleury. A participação de exames de covid na receita do 4T20 era de 11,1% (vs. 6% no 3T21), contribuindo para a forte base de comparação.
Portanto, esperamos um resultado mais fraco de Fleury no 4T21, o que pode prolongar o tempo para destravar o valor da ação. No entanto, acreditamos que o resultado positivo do 1T22 com o maior volume de testes de COVID, continuidade da agenda de crescimento inorgânico e valuation atrativo, devem contribuir com a performance da ação da Fleury ao longo de 2022.