A Vale (VALE3) divulgou ontem, dia 27 de outubro, após o fechamento do mercado, seu resultado do 3T22, que vieram abaixo das nossas expectativas, principalmente se desconsiderar efeitos não recorrentes que afetaram o lucro líquido, que mascararam o resultado no bottom line.
O destaque negativo, já previsto, foi a queda no preço realizado de minério de ferro pela Companhia. Controle de custos abaixo das nossas estimativas não auxiliaram a Vale no 3T22, que reportou um EBITDA pior do mercado esperava. Ainda assim, a resiliência na produção e diferencial competitivo fazem a mineradora parecer descontada frente aos pares. Mantemos nossa recomendação de COMPRA, com preço alvo de R$90,00, apresentando um upside de +26,92%.
Preço realizado sofre retração maior do que esperávamos para o minério de ferro
A curva do minério 62% Fe de referência da Platts retraiu -25% t/t atingindo US$103,3/t no 3T22 Vs. US$137,9/t no 2T22. Nossas estimativas apontavam para um preço realizado pela mineradora em queda. Sabemos que a Vale possui um diferencial competitivo na qualidade do minério, porém o prêmio varia para baixo quando a curva de referência também se encontra em retração.
A Vale reportou um preço realizado de US$92,6/t (-18,2% t/t; -27,2% a/a) Vs. US$106,3/t Est. Genial, ficando -12% abaixo das nossas expectativas, considerando a curva de CFR/FOB. Esperávamos que a mineradora mantivesse um desconto menor no prêmio, porém, conforme comentámos na nossa prévia de resultados, o prêmio all-in sofreu uma retração de -10% devido à queda do preço da commodity, atingindo a marca de US$6,6/t Vs. US$7,3/t no 2T22, o que trouxe um impacto maior do que esperávamos no preço realizado pela modalidade CFR/FOB.
Ainda assim, a queda no preço realizado, tanto na base t/t contra no a/a foi inferior ao desconto na curva no minério 62% Fe de referência da Platts, que retraiu 1,37x mais que o preço realizado da Vale, o que não foi o bastante para a mineradora reportar uma receita crescente nas vendas de minério de ferro. A mineradora viu retração de receita com vendas de minério de ferro tanto na base anual, já esperado, como na trimestral, auferindo US$6,0b (-14,9% t/t; -28,1% a/a) Vs.US$6,9b Est. Genial, marcando uma entrega 12% abaixo das nossas expectativas.
Já para as pelotas, a dinâmica foi reversa: receita melhor do que nossas estimativas
Observando a dinâmica de pelotas, a Companhia reportou um preço na modalidade CFR/FOB de US$194,3/t (-3,4% t/t; -22,2% a/a) acima das nossas estimativas. O efeito negativo pela retração do prêmio all-in foi parcialmente compensado por prêmios de pelotas contratuais recorde e maior qualidade do mix do portfólio de produtos com uma maior participação de blends, em linha com o que mencionamos no nosso relatório de prévias.
Apesar da retração no preço realizado, que também está ligado ao esfriamento da demanda por derivados de minério como insumos no processo siderúrgico na China, ocasionado por um setor imobiliário desaquecido e uma economia ainda com dificuldades de apresentar crescimento pela política de covid zero, acreditamos que a Vale optou por priorizar a produção de pelotas de redução direta nas plantas em Omã, no Oriente Médio, devido a condições de mercado que ainda se encontraram pressionadas no 3T22 pela guerra no leste europeu.
Na nossa análise a Companhia se beneficiou de um quadro ainda com oferta irregular de pelotas no 3T22, obtendo um prêmio recorde sobre as pelotas, apesar da priorização de Omã ter causado uma retração no volume de produção, fato mencionado também no nosso relatório de prévias. Sendo assim, a mineradora apresentou um preço realizado de pelotas +26% acima das nossas estimativas (US$194,3/t Vs. US$153,5 Est. Genial), o que ajudou a atenuar o impacto da retração no preço da commodity ferrosa.
Este fato levou a mineradora a reportar uma receita de US$1,6b (-7,0% t/t; -17,6% a/a) com as vendas das pelotas Vs. US$1,3b Est. Genial, superando nossas expectativas em +26%. Vemos a dinâmica de pelotas, mesmo tendo o trade-off entre preço/volume impactado, como um ponto positivo no resultado do top line da Companhia.
Metais básicos: Níquel ganha destaque positivo
O preço realizado do níquel da Vale, por sua vez, contribuiu no arrefecimento de um top line fraco no a/a para a atividade de minério de ferro fino. Registrando 21,6k/t (-17,3% t/t; +19,0% a/a) de preço de venda no 3T22 Vs. 19,8k/t Est. Genial, apesar da melhora na base anual, observamos uma retração na ordem de -24% do preço médio do níquel da LME entre o 2T22 e o 3T22, o que afetou negativamente o preço realizado da mineradora na base trimestral.
Entendemos que o arrefecimento de preços na LME foi, em partes compensando, mais uma vez, pelo diferencial competitivo da mineradora em entregar qualidade superior no mix de vendas, com um prêmio aumentando 90% em relação ao agregado de níquel, o que levou a Vale a apresentar um preço realizado 9,5% maior que nossas estimativas.
Esse aumento no prêmio foi ocasionado pelo (i) efeito das refinarias voltando a operar no Atlântico Norte e (ii) maiores prêmios para produtos classe I em razão de aumento da demanda por material não originado na Rússia, de forma que observamos os embargos econômicos afetando a dinâmica de preços não só de pelotas, conforme comentamos acima.
O aumento no prêmio do níquel ajudou a Companhia a marcar uma receita líquida de metais básicos na ordem de US$2,0b (+8,9% t/t; +29, 7% a/a) Vs. US$1,4b Est. Genial, superando com uma folga nossas expetativas.
Matais básicos não salvam receita de minério de ferro: Companhia reporta top line mais fraco
A vale (VALE3) apurou US$9,9b (-11,0% t/t; -19,5% a/a) de receita líquida total Vs. 10,2 Est. Genial, marcando um top line 3% abaixo das nossas expectativas e 4% abaixo do consenso. É notório que o peso da receita vinda das vendas de minério de ferro é muito relevante, representando historicamente 63% do share de receita total da mineradora, de modo que os esforços da Companhia em entregar um avanço nas vendas de metais básicos foram apagados pela retração no preço da commodity ferrosa.
CPV veio acima do esperado
A mineradora reportou um Custo do Produto Vendido (CPV) de US$6,3b (+5,9% t/t; +15,1% a/a) Vs. US$5,5b Est. Genial, entregando uma eficiência 14,5% abaixo do que esperávamos. Entre os linhas de custo, as que mais divergiram das nossas estimativas foram a linhas de materiais e serviços (US$958m Vs. US$785 Est. Genial) e óleo combustíveis e gases (US$497m Vs. US$359m Est. Genial).
O custo com óleo combustíveis e gases reportados pela Companhia sofreu um aumento +40,8% t/t e +73,2% a/a, na direção completamente oposta do esperávamos. Acreditamos que a Vale não realizou uma boa gestão dos custos, mesmo a Companhia aplicando um processo de instalação de filtros nas embarcações contratadas com armadores para a utilização de combustível de maior teor de enxofre, sendo menos custoso que o de menor concentração de enxofre exigido pela normativa da Organização Marítima Internacional (IMO) desde 2020.
Ainda assim, a mineradora não conseguiu capturar o efeito do arrefecimento do preço do óleo diesel, puxados pela queda do preço de barril de petróleo tipo brent, que retraiu -11,5% entre o 2T22 e o 3T22. Nossas estimativas apontavam para um custo de US$3,6/t de produção Vs. US$4,2/t no 2T22, o que representaria uma redução de -14% t/t, embasada na (i) redução do preço de barril de petróleo e (ii) redução do ICMS sobre combustíveis, aprovado pela Lei Complementar nº 194/2022.
A mineradora frustrou nossas expectativas, reportando um custo com óleo combustíveis e gases na casa de US$5,0/t produzida (Vs. US$3,6/t Est. Genial), gerando uma elevação no custo total C1 acima do esperávamos.
Reflexo do CPV no C1 é parcialmente compensado por uma diluição gerada pelo aumento de produção
O custo caixa C1 da Vale, excluindo compras de terceiros, foi de US$1,1b Vs. US$985m Est. Genial, chegando a US$19,4/t (-7,2% t/t; +10,2% a/a). Acreditamos que apesar do aumento no custo caixa C1 bruto, quando fazemos a conta por produção, observamos uma diluição, marcada também por um efeito positivo do câmbio e custo de demurrage sazonalmente menores.
Observamos o CPV (+) Despesas chegando à marca de US$7,0b (+4,2% t/t; +16,3% a/a) Vs. US$6,4b Est. Genial. A diluição dos custos fixos (Caixa C1) não compensou inteiramente o efeito que observamos no aumento do CPV, de forma que a ineficiência foi superior em +9,8% as nossas estimativas.
Com top line morno e CPV acima do esperado, EBITDA retrai
A mineradora reportou um EBITDA de US$3,6b (-30,2% t/t; -46,9% a/a) Vs. US$4,9b Est. Genial Vs. US$4,6b consenso. Através de um top line afetado por um desaquecimento da demanda por minério de ferro e uma ineficiência maior do que o esperado no CPV, a mineradora marcou uma margem EBITDA de 36,9% (-10,71p.p t/t; -19,09p.p a/a). A margem veio -11,19p.p abaixo das nossas estimativas.
Lucro líquido sobe, mas efeito é não recorrente
Com um resultado operacional abaixo das nossas estimativas e do consenso, apesar da divulgação de resultados pré-operacionais de produção e vendas ter demonstrado resiliência da Companhia em relação a dinâmica de volume, acreditamos que a Companhia não apresentou números compatíveis na variável de preço.
Com um preço realizado abaixo do que esperávamos, o lucro líquido da Companhia teria sido impactado com mais intensidade pelo operacional morno. A surpresa positiva do lucro líquido chegando a US$4,4b (+8,8% t/t; -18,7%) Vs. 2,5b Est. Genial foi gerada por um efeito não recorrente na linha de resultado financeiro, oriundo de uma redução de capital de subsidiária no exterior, ocorrido em agosto de 2022. Essa redução de capital gerou um ganho em função da reclassificação da variação cambial acumulada no patrimônio líquido para o resultado do período na ordem de US$1,5b.
Desconsiderando o efeito não recorrente do ganho com a variação cambial, o lucro líquido teria sido de US$2,9b. A mineradora reduziu seu endividamento bruto em 3,3%, saindo do patamar de US$11,0b no 2T22 para US$10,6 no 3T22, o que teria ajudado a arrefecer a despesa financeira em -40,6% (US$221 Vs. US$372 no 2T22). Ainda assim, a alavancagem subiu, de 0,2x Dívida Liq. /EBITDA LTM para 0,3X, devido a uma diminuição no caixa de US$1,7b, gerado principalmente pelo programa de recompra de ações, US$3,1b de pagamento de dividendos e amortização da dívida.
Nossa visão e recomendação para VALE3
Com um cenário adverso em relação a demanda pelo minério de ferro na china, devido ao setor imobiliário no país asiático menos aquecido, vemos o resultado da Vale como um ponto de alerta. A mineradora entregou um lucro líquido com uma expansão de +8,8% t/t, apurando uma margem líquida de 44,9% (+8,18p.p t/t; +0,45p.p a/a), crescendo inclusive na base anual apesar da curva do minério 62% Fe de referência da Platts desvalorizando 25% Vs. 2T22.
Todo esse crescimento de margem líquida, originado por um efeito não recorrente, nos parece mais um baile de máscaras que arrefeceu o impacto de um resultado operacional morno. Se por um lado acreditamos que Companhia demonstrou resiliência na produção e não deve apresentar dificuldades para atingir a banda inferior do guidance no 4T22, por outro, o cenário menos aquecido na China exige cautela do investidor, principalmente no curto prazo. É inegável também que a Vale possui uma qualidade superior em relação na curva de 62% Fe para e o prêmio de níquel foi um destaque positivo do top line, de forma que ainda acreditamos que a Companhia negocia com um desconto frente a seus pares australianos.
Nossa análise é de que o governo chinês deve continuar estimulando a economia com os pacotes de intervenção, porém, conforme comentamos no relatório da prévia do 3T22, há um tempo de delay até essas medidas fazerem efeito, o que pode dificultar a mineradora a continuar crescendo o lucro líquido sem o auxílio de valores não recorrentes no bottom line. Por ora, mantemos nossa recomendação de COMPRA, com preço alvo de R$90,00, apresentando um upside de +26,92%.