O que aconteceu?
A Vale oficializou ontem a noite, dia 26 de agosto, o nome de Gustavo Pimenta como seu novo CEO (diretor presidente), eleito de forma unânime pelo Conselho de Administração, após um longo imbróglio para processo de seleção, envolvendo a recomendação de uma lista tríplice da consultoria Russell Reynolds, que foi contratada em maio para auxiliar nessa tomada de decisão. O Sr. Pimenta, que atualmente é CFO (diretor financeiro) da companhia, traz mais de 20 anos de experiência executiva. Nossa leitura para o anúncio é positiva, e deve impulsionar as ações no pregão de hoje. Damos mais detalhes ao longo do relatório.
Quem é Gustavo Pimenta?
Formado em economia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e com Mestrado em Finanças pela Fundação Getulio Vargas (FGV), em sua bagagem encontramos 12 anos de atuação em cargos de alto escalão na AES (companhia norte americana de energia), onde chegou a posição de CFO global, exercida de 2019 a 2021. Antes disso, foi Vice-presidente de Estratégia e M&A no banco Citi em Nova York, onde permaneceu no cargo por quase 6 anos, tendo também uma passagem pela KPMG no início da carreira.
Chegou a Vale ao final de 2021, ocupando a posição de CFO, cargo o qual permanecerá até dezembro, quando o atual CEO, Eduardo Bartomeo, passará o bastão para o início do processo de sucessão. Sr. Bartolomeo exercerá a função de consultor durante 2025, garantido uma transição segura, que é reforçada pela própria experiência executiva do Sr. Pimenta e do conhecimento que adquiriu sobre os ativos da Vale em seus quase 3 anos de atuação na companhia.
Nossa visão e recomendação
Entendendo a cronologia dos fatos…
Como é de conhecimento geral, um dos overhangs (ruídos) que circundava sobre a Vale era a troca de CEO, que estava determinada a acontecer até dezembro deste ano, após ter sido adiada com a extensão do contrato de Eduardo Bartolomeo por mais alguns meses, fato ocorrido em março. Na época, como a troca de CEO deveria acontecer ainda em maio, vimos a decisão de extensão do contrato por um período tão curto (maio a dezembro) como parcialmente negativa, uma vez que não colocava um ponto final sobre quem seria o nome por trás das decisões estratégicas da companhia de 2025 em diante, dando margem para o governo continuar a pressionar na indicação, que por ventura, fosse alinhada aos interesses da gestão Lula.
Governo vs. Vale
Cabe dizer que os embates frequentes e declarações calorosas proferidos pela gestão Lula sobre a Vale foram constantemente repercutidas pela mídia na atividade jornalística. A gestão Lula acabou usando, em nossa interpretação, a repactuação do acordo sobre o acidente de Mariana (MG), que ainda transita no TRF-6, bem como situações como reorganização da estrutura de outorgas das ferrovias EFVM e EFC, como moedas de troca para pressionar politicamente a Vale, em meio ao processo de sucessão, tentando articular viabilidade inclusive para o ex ministro Guido Mantega ocupar o cargo.
A percepção era de que o atual presidente Lula tinha um sentimento de retribuição a Mantega por sua gestão passada, e portanto, estava determinando a encontrar um cargo que estivesse a altura deste sentimento para Mantega ocupar, mas que fosse fora do espectro político de maneira direta. A sondagem vinha como rumor desde 2023 e ganhou muita repercussão durante janeiro deste ano. Entretanto, a priori, os bastidores seriam de que Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia, teria conversado com a composição do conselho de adm. e reportado a Lula que a viabilidade de Mantega era muito baixa para aprovação de maneira ampla. O nome certamente desagradava aos investidores.
Conflitos como um dos motivos para o fraco desempenho das ações
As ações da Vale regridem ~25% YTD, compondo uma forte queda ao longo deste ano. Conforme já defendemos em relatórios passados, atribuímos grande parte dessa queda as incertezas sobre a economia da China. Entretanto, os overhangs também desempenharam papel fundamental para justificar essa volatilidade negativa de forma expressiva. Entre eles, enumeramos (i) sucessão de CEO e interferências políticas, (ii) cenário de indefinição para o acordo de Mariana (MG) e (iii) reajuste no valor de outorgas a pagar pela concessão das ferrovias EFVM e EFC.
Muitos investidores se questionavam sobre qual seria a decisão do conselho na escolha da sucessão de Bartolomeo, e se a companhia iria ceder às pressões políticas. Há de se colocar em perspetiva que, embora a Vale seja uma corporation (companhia sem controlador), a composição do conselho de Adm. favorecia o lado do governo, com o Sr. Daniel Stieler ocupando a presidência do conselho e tendo sido indicado ao cargo pela Previ (Fundo de previdência do Banco do Brasil, uma estatal). Julgamos que os embates entre o Sr. Stieler e alguns conselheiros dentro do âmbito da sucessão do Sr. Bartolomeo criaram um clima pouco sustentável, culminando na renuncia de José Penido (ex presidente do conselho e estava na Vale desde 2019) em março, além de Vera Marie Inkster (atuante desde 2023 e uma das poucas vozes estrangeiras dentro do board) em julho. Destacamos inclusive que ambos eram conselheiros independentes. Com a saída dos dois, a Vale passou a estar em desacordo com o estatuto social sobre a quantidade de conselheiros independentes em seu board.
Como era de se esperar, o mercado estava reagindo de maneira negativa desde o final do ano passado/ início deste ano, diante da possibilidade da Vale ter um nome chancelado pelo governo ocupando o cargo de CEO, ainda mais considerando que a companhia havia sido privatizada desde 1997. A administração Lula é vocal em dizer que é contra os fortes dividendos que a Vale pagou a seus acionistas nos últimos anos e também sobre os Investimentos fora do Brasil, como as minas da VBM no Canadá e indonésia, ativos que consideramos estratégicos para posicionar a companhia para a transição energética. Portanto, os maiores receios dos investidores eram de que, caso o governo conseguisse emplacar um nome de sua escolha, (i) os dividendos da Vale poderiam ser reduzidos, bem como a (ii) alocação de capital em investimentos estratégicos passaria a ser errática, além de (iii) gerar uma grande insegurança jurídica, inclusive aumentando a percepção do Risco Brasil para investidores estrangeiros.
Esperamos reação positiva com o anúncio
Entendemos que o nome de Gustavo Pimenta deve refletir ventos favoráveis para as ações da Vale, afastando de vez a perspectiva de conectar o governo ao cargo de CEO. Além disso, trata-se de um nome já conhecido dentro da companhia e no setor, não só percebido com (i) uma blindagem a pressões externas do ponto de vista político, como também (ii) não será um outsider para as tomadas de decisões da Vale, uma vez que ele próprio era o responsável pela alocação de capital da companhia, funções atribuídas ao cargo de CFO.
Segundo o nosso entendimento, o Sr. Pimenta já conhece os ativos da Vale e os projetos de expansão em curso (Capanema, MegaHubs e Vargem Grande) e sabe do papel da companhia na transição enérgica, com a VBM (níquel e cobre) e os briquetes verdes tendo função fundamental nos próximos anos dentro da descarbonização da indústria siderúrgica. Pimenta entrega a Vale em uma nível de alavancagem responsável, com decisões consideradas assertivas para o CAPEX da companhia durante seus quase 3 anos de gestão como CFO.
Um pouco mais de Pimenta não faz mal…
Depois de uma grande novela, concluímos que a decisão nos parece assertiva e que o mercado deve reagir de maneira positiva, retirando um dos overhangs (faltam os empasses envolvendo Mariana e as ferrovias ainda). Por outro lado, também cria uma dúvida de quem será o CFO que substituirá o Sr. Pimenta em suas funções. Isso não ficou claro no comunicado oficial. Ainda assim, preferimos não só que Sr. Gustavo Pimenta continue sua trajetória na Vale, com também seja elevado ao cargo de CEO, ficando ainda mais a frente do rumo estratégico da companhia. Um pouco mais de Pimenta não faz mal…
Principalmente por estar sendo excessivamente penalizada pelo mercado, negociando um EV/EBITDA 25E de 3,3x (vs. 5,0x na média histórica) e por ser uma companhia com geração sólida de fluxo de caixa nesse nível de preço descontado (+) programa de recompras de ações, reiteramos nossa recomendação de COMPRA, com um Target-Price 12M de VALE3–B3 em R$78,50 e Target-Price 12M das ADRs-NYSE em US$14,50, compondo um upside de +35,23%.