Estamos iniciando a nossa cobertura na Energias do Brasil (ENBR3) com recomendação de MANTER e um preço-alvo de R$24/ação. Essencialmente, gostamos da história da empresa nos últimos anos: muito participativa em leilões de novos projetos, ativa na aquisição e venda de ativos operacionais e eficiente na gestão dos seus atuais ativos. Como podemos observar em seus últimos resultados trimestrais, os frutos de todas as medidas recentes começam a aparecer na lucratividade da empresa e na própria performance das ações nos últimos meses – o próprio grupo controlador concluiu recompras de ações ao longo do último ano na casa dos R$17-18 por ação. Dito isso, é importante mencionar que a nossa recomendação de MANTER está mais relacionada à possibilidade de entrarmos a um nível de preço mais oportuno nas ações da empresa à medida que nas últimas semanas os preços dos papéis têm apresentado uma boa performance, fazendo com que o mesmo negociasse próximo às máximas dos últimos anos, reduzindo assim a nossa margem de segurança na recomendação do papel. Além disso, observamos assimetrias mais interessantes nos cases que temos como recomendação de compra (CESP, Alupar e SABESP) do que na ENBR aos atuais níveis de preço.
Para avaliar a Energias do Brasil, fizemos a avaliação para cada um dos seus segmentos de negócio. Vale mencionar que não consideramos em nossas estimativas as linhas que foram recentemente vendidas pela empresa, mas consideramos o impacto financeiro da venda das mesmas em nosso preço-alvo.
Da água pro vinho. Depois de muito trabalho, um novo case
Energias do Brasil foi por muito tempo uma empresa que geria seus ativos de maneira pouco eficiente e cujas aquisições traziam baixa geração de valor, sendo vista como tal pelo mercado e, portanto, sub-precificada. Isso tem mudado nos últimos anos, sobretudo durante o período em que o executivo Miguel Setas esteve na presidência da empresa, entre 2014 e 2021. Entre outras mudanças podemos citar um extensivo processo de reciclagem de capital buscando investimentos que façam mais sentido para a empresa (será discutido mais a frente), o aumento na eficiência das operações, entrega de empreendimentos de transmissão e geração com prazo médio de mais de um ano abaixo do previsto pela Aneel, compromisso com o pagamento de dividendos e a manutenção da alavancagem da empresa entre 2,5x e 3,0x Dívida Líquida/Ebitda, número considerado razoável para o setor. Inclusive, vale mencionar que consideramos o guidance em termos de pagamento de dividendos razoavelmente conservador (mínimo de R$1/ação) e somos otimistas quanto a possibilidade de uma maior generosidade no que diz respeito ao pagamento de dividendos nos anos seguintes.
Podemos esperar um fechamento de capital?
Outro indicativo de que o ganho de valor da Energias do Brasil não está refletido em seu preço são as sucessivas recompras de ações realizadas pela própria empresa. Em 2019 a EDP recomprou 0,51% de seu free float a R$18,56/ação, sendo mais agressiva em 2020, reavendo 8,1% por R$18,91/ação e ainda mais em 2021, tendo em vista que um novo processo de recompra foi aberto visando 10% do free float. Entre os preços praticado em 2019 e 2020 e o preço no dia de publicação dessa análise, é possível perceber uma variação quase irrelevante, o que mostra que as recompras estão tendo pouco efeito no preço da ação e que a insistência do controlador em sua realização indica que ele considera que a empresa está, potencialmente, negociando a níveis que podem ser considerados atraentes.
Investimentos e Desinvestimentos
Como já mencionado, a empresa segue uma política de reciclagem de capital e de desinvestimentos nos últimos anos. Nós consideramos que tal regime tem sido majoritariamente positivo para a EDP, uma vez que a empresa está se desfazendo de ativos pouco sinérgicos, como as usinas de geração hídrica menores Pantanal Energética e a EDP PCH (vendidas em 2016 e 2017 respectivamente), na mesma medida em que tem aumentado seus investimentos em outras áreas do portfólio que considera mais relevantes para seus objetivos, sendo as principais distribuição, transmissão e geração solar, setores que devem concentrar 90% do Capex total para os próximos 5 anos, previsto em R$10 bilhões. Como resultado de todo esse processo, observamos a empresa não apenas demonstrando apetite por crescimento, mas também reduzindo seu perfil de risco operacional com a entrada de linhas de transmissão.
Nós consideramos que a EDP tem atuado de forma competente no setor de distribuição, uma vez que tem buscado tirar vantagem do framework regulatório brasileiro que recompensa investimentos nas distribuidoras com maiores reajustes tarifários, investindo algo em torno de 2,5x e 3,0x Capex/QRR (Quota de Reintegração Regulatória – a depreciação da base de ativos da empresa). Para o período entre 2021 e 2025, a meta de investimentos para distribuição é de R$ 6 bilhões (60% do total), dividido entre expansão (38%), melhorias (32%) e combate a perdas e outras despesas (30%).
Já na transmissão de energia a empresa investiu, a partir de sua entrada no setor em 2016, R$4,1 bilhões. Recentemente, a empresa realizou duas de suas maiores transações nesse setor, comprando o segmento de transmissão da estatal goiana CELG, CELG-T, por R$ 2 bilhões e se desfazendo de outras 3 linhas, com Rap de R$131 milhões e recém-construídas, por R$ 1,3 bilhão, quando considerados o equity e a dívida das linhas.
Outro setor de entrada da EDP foi a geração solar, com aquisições recentes da Blue Sol, empresa focada no B2C e da AES Inova, braço de geração solar da AES Brasil, que somam R$ 200 milhões e reúnem uma capacidade de geração 7,8 GW. A empresa pretende investir R$ 3 bilhões nos próximas 5 anos (30% do total) e tem como meta atingir 38 GW de capacidade de geração para 2030.
Política de dividendos generosa!
Outro ponto positivo da Energias do Brasil, principalmente para investidores que buscam uma renda extra, está em sua nova política de dividendos. Aprovada a partir de 2020, a empresa se compromete a pagar pelo menos R$ 1/ação, podendo pagar também 25% de seu lucro líquido ou 50% de seu lucro líquido ajustado com base em realizações em caixa de longo prazo, se comprometendo a usar o maior valor dentre os citados. É importante apontar que esses níveis de dividendos são altos em relação ao histórico da EDP, que pagou em média R$0,6/ação nos últimos 4 anos. Como já mencionado anteriormente, temos números mais agressivos quanto a distribuição de proventos em nossas estimativas.
CELESC: Risco ou Oportunidade?
No ano de 2019, a empresa fez um aquisição que consideramos pouco ortodoxa: comprou o equivalente a 11,5 milhões de ações da CELESC, entre ações ordinárias e preferenciais, em um investimento total de um pouco mais de R$400 milhões (valuation implícito de c. 0,7x EV/Base de Remuneração Regulatória à época). Atualmente, a empresa detém uma fatia de 29,9% na empresa. O racional não deixa de ser interessante: apenas três distribuidoras de energia elétrica seguem sendo estatais em todo o Brasil (Cemig-D, Copel-D e Celesc). Em nossa leitura, a grande onda de privatizações de distribuidoras de energia elétrica ao longo das décadas aconteceu devido a forte necessidade de investimentos na expansão e qualidade da rede, aliado ao aumento na necessidade de eficiência em termos de custos operacionais por parte da ANEEL a cada revisão tarifária.
Por se tratar de um setor intensivo em mão-de-obra, tal questão tende a não se conciliar muito bem com a gestão pública, que tem um regime mais restrito para contratação/demissão de funcionários, além de questões referentes a salários do corpo de funcionários e benefícios previdenciários. Entretanto, apesar dos pesares, a CELESC é uma empresa de distribuição que, apesar de ser estatal e operar abaixo das métricas regulatórias em termos de eficiência de custos, consegue seguir adiante com a sua operação sem grandes sobressaltos. Além disso, não observamos qualquer indício de desejo do controlador (Governo do Estado de Santa Catarina) e querer privatizar a sua empresa de distribuição de energia.
Quanto valeria a CELESC? Sendo a ENBR um comprador natural da CELESC, é importante avaliar o quanto de valor a empresa eventualmente destravaria caso o governo do estado resolva pelo seu desinvestimento. Fizemos uma atualização da Base de Remuneração Regulatória da Celesc e da sua dívida. Utilizando múltiplos alvo de 1x-2,0x EV/BRR, alcançamos um impacto positivo de até quase +R$4,8/ação no caso de a distribuidora ser adquirida pela EDP ou por outro player privado (ajustamos o impacto desse evento pela fatia que a ENBR tem na CELESC).
Maiores riscos para Energias do Brasil:
I) Cenário Macro desafiador. Apesar da resiliência do setor elétrico, o segmento de distribuição tem variáveis que acabam sendo influenciadas pelo cenário macro. Como principais variáveis a serem afetadas citamos o próprio consumo de energia elétrica, que tende a se desacelerar. Além disso, variáveis relacionadas à perdas de energias e inadimplência também tendem a ser afetadas por cenário macro anêmico.
II) Hidrologia ruim. Como amplamente abordado ao longo dos nossos documentos anteriores, a hidrologia ruim tende a afetar os negócios expostos à geração hidroelétrica via o GSF (para mais informações, clique aqui). Não bastando afetar os negócios de geração, os custos relacionados ao despacho nas termoelétricas tendem a impactar as tarifas de energia ao consumidor final, atrapalhando a evolução do consumo e o combate as perdas e furtos de energia.
III) Alocação de Capital. Apesar do bom trabalho feito pela empresa nos últimos anos, sempre surgirão questionamentos relacionados aos novos projetos, aquisições ou venda de ativos ou participações feitas pela empresa. Citamos como exemplo a aquisição das ações da CELESC e a compra e venda recente de projetos de transmissão.