Cielo seja talvez um dos casos mais interessantes de se analisar em retrospectiva. Por muitos anos, a empresa dominou o cenário de adquirência (maquininhas) mesmo depois da quebra do duopólio em 2010 com o fim da exclusividade de bandeiras por credenciadoras. Entregando aumento consistente de volume de cartões e expansão de margens, a Cielo conseguiu surfar por muitos anos crescimentos substanciais de lucros. Mas, como quase tudo que está indo bem, não se mexe, a empresa ignorou as novas entrantes que em primeiro momento atacaram de frente a Redecard ou fomentaram novos mercados.
A primeira grande nova entrante foi a Pagseguro, que por capturar clientes na base da pirâmide (microempresários) que nunca antes haviam usado maquininhas de cartão, fomentaram um novo mercado e portanto não incomodaram as incumbentes por muito tempo. Depois veio a Stone que, com seus hubs (polos) de vendas, se espalhou pelo Brasil com cultura forte, tecnologia ágil e melhor qualidade percebida pelo cliente, possibilitando que a nova entrante dominasse o lucrativo meio da pirâmide. Por fim, o Santander arrematou com a criação da Getnet quase que do zero para se tornar um competidor respeitável, com 16% de market share. Por conta da competição, nos últimos anos, a Cielo sofreu sucessivas perdas de participação de mercado, culminando em uma forte desvalorização de quase 90% do seu valor de mercado desde seu pico, há 5 anos atrás.
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Para piorar, no 2T20, a Cielo registrou seu primeiro prejuízo em decorrência da pandemia, competição acirrada, commoditização de serviços, guerra de preços, baixa penetração de produtos de crédito, menor eficiência de custos, e pior qualidade percebida pelos clientes. Desde então, a companhia vem se recuperando, cancelando contas com prejuízo, cortando custo, melhorando o NPS, e aumentando a presença no lucrativo meio da pirâmide de lojistas. No curto prazo, a dinâmica é mais positiva, tendo em vista a retomada dos volumes financeiros com a reabertura econômica, aumento de produtos com antecipação embutidos (d+2), crédito e os potenciais desinvestimentos em subsidiárias, como a Merchant-e. Mas, como tudo tem seu preço, achamos que eventualmente o valuation atrativo de 4,72x P/L 22 venha chamar a atenção dos investidores e, possivelmente, dos controladores, que poderia culminar com o fechamento de capital da Cielo. Por esses potenciais catalisadores, juntamente com uma precificação excessivamente descontada e uma conjuntura operacional mais favorável, é que estamos com a recomendação de COMPRAR para CIEL3.
A Cielo não é a nossa preferida no setor e também não estamos advocando colocar todas as fichas em uma aposta só. A empresa já perdeu a ambição de ser uma companhia de tecnologia de ponta em meios de pagamentos, mas ela está bem barata, os fundamentos estão melhorando e do ponto de vista dos controladores, achamos que algo poderia ser feito para destravar valor. Por fim, ainda tem o imbróglio da Cateno a ser resolvido (empresa de processamento de cartões do BB que foi comprada pela Cielo, mas que ainda roda nos sistemas do BB) e a própria vontade do Banco do Brasil (BB) de recomprar a Cielo no momento em que o banco está se desfazendo de ativos.
Dinâmica das Linhas de Negócio
A taxa de administração é a principal receita da Cielo correspondendo a 32,1% do total em 2019 (valor estimado). Ela advém do processamento de pagamentos de cartões de débito, crédito e receba rápido. Este último se refere ao pagamento da venda do cartão de crédito em D+2, ao invés dos D+30 praticados tradicionalmente no mercado, adicionando um percentual à taxa de administração.
Com o aumento da competição no segmento de pagamentos, as taxas de administração cobradas no setor vêm caindo gradativamente. Ademais, em função da perda de market share, a redução dos preços não é compensada pelo aumento dos volumes transacionados pela Cielo, gerando decrescimento da receita de processamento de pagamentos.
Outra receita que vem sendo impactada é a de aluguel de maquininhas, que estimamos ter representado 8,4% da receita total da Cielo em 2019. Os terminais que capturam os pagamentos com cartões podem ser próprios do lojista ou da adquirente que o aluga. Em 2015, as receitas de aluguel eram superiores a 20% da receita total da Cielo, mas, com a popularização das maquininhas próprias, difundida principalmente pela PagSeguro, essa receita vem caindo desde então. Hoje, a Cielo conta com terminais para a venda, mas que ainda são pouco representativos no resultado que, por muitas vezes, precisam de subsídios para expandir a base de clientes.
Na sequência, o pré-pagamento também é relevante nas receitas da Cielo, representando 5,1% do total em 2020. Ele consiste em uma antecipação dos recebíveis de cartão do lojista, gerando uma taxa pelo serviço. Por ser colateralizado nos recebíveis de cartão, este produto infere muito pouco risco de crédito, pois os bancos emissores dos cartões (geralmente os grandes bancos) que efetuaram as compras, obrigatoriamente terão que pagar o valor das transações a adquirente. Ou seja, as contra-partes de risco tipicamente são os bancos.
Destaca-se que, com o advento das centrais de recebíveis, que permite que as adquirentes antecipem os recebíveis dos clientes uma das outras, a Cielo passou a praticar o “receba rápido” mesmo para volumes passíveis de antecipação, a fim de que o recebível do seu cliente não caísse na central e fosse capturado por outra empresa. Por isso, as receitas do pré-pagamento vem diminuindo, tendo saído de 17,4% de participação da receita total em 2015.
Além das receitas do core bussiness, a Cielo tem duas subsidiárias relevantes em termos de receita. A Cateno, que é importante no lucro da Cielo, é uma joint-venture com o Banco do Brasil, cujo objetivo é dar suporte a operação de cartões do banco. A Cielo tem 70% do capital social da empresa. Entretanto, com toda a estrutura física dentro do Banco do Brasil, a Cielo não tem controle sobre a distribuição e estratégia da Cateno, o que pode gerar dissinergias.
Por fim, a Merchant-e (MeS) é uma subsidiária americana adquirida em 2012 por US$ 670 milhões, cujo objetivo principal era tropicalizar e trazer o sistema tecnologicamente mais avançado da MeS para o Brasil. Entretanto, a demora na integração de sistemas resultou em duas plataformas segmentadas, certamente gerando menos flexibilidade e agilidade no desenvolvimento de novos produtos. Além disso, a MeS roda com prejuízo, sendo deficitária por muitos anos. A intenção da Cielo é vender a MeS esse ano, destravando algum valor de curto prazo.
Luz no Fim do Túnel
Os controladores de Cielo, BB e Bradesco, eventualmente possuem interesses distintos, a começar por um ser um banco privado e o outro estatal, além da Cielo possuir alguns produtos que podem se sobrepor ao dos bancos, como o crédito garantido com recebíveis. Acreditamos que isso possa ter também influenciado na lentidão de uma definição mais contundente acerca da estratégia a ser adotada, diminuindo a velocidade de reinvenção da Cielo, enquanto o mercado estava se tornando mais competitivo e tecnológico. Além disso, ter um controlador estatal gera especulações que, apesar de nem sempre serem verídicas, podem aumentar a percepção de risco do investidor. Um exemplo recente foi a saída do CEO Caffareli, que gerou o boato de que ele teria sido pressionado politicamente.
Ainda que a maior competição em adquirência e a demora para a Cielo se reinventar tenham reduzido o market share, prejudicado margens e consequentemente o preço da ação, estamos mais otimistas com alguns gatilhos que, na nossa visão, podem destravar valor. Dentre eles, como já comentamos, está a venda da Merchant-e, eventual fechamento de capital, aumento de clientes no meio da pirâmide e sucesso em produtos de crédito (D+2 e “fumaça”).
O crédito fumaça consiste na cessão de crédito com garantia de recebíveis, viabilizado para as adquirentes principalmente pelo advento das centrais de recebíveis. No 2T21, a Cielo efetuou uma captação para o FIDC Receba Mais, cujos recursos serão utilizados para a concessão. Com o produto, a Cielo poderá aumentar suas receitas e seu take rate. Do lado negativo, novas entrantes como caso da Stone se aventuraram antes no produto e, mediante falhas nos sistemas das centrais, a companhia chegou a fazer provisões que corresponderam a 40% da carteira de crédito.
Além disso, na nossa visão, a retomada econômica decorrente da maior vacinação deve auxiliar na recuperação dos volumes transacionados e consequentemente receitas e margens. Por isso, estimamos receitas crescendo 2,8% em 2021 e 4% em 2022, com avanço do lucro de 95% e 9,75% nos respectivos anos.
Valuation
O nosso preço-alvo para Cielo é de R$ 3,5, inferindo em um upside de 48% em relação ao preço atual de R$ 2,4. Na nossa visão, o múltiplo descontado de 4,74x P/L 22, junto aos gatilhos que observamos para a companhia, justificam a compra da ação. O método que utilizamos para o valuation foi o dos dividendos descontados (DDM) considerando um payout médio de 60%. Na perpetuidade, assumimos um g (taxa de crescimento perpétuo) de 6% e um Ke (custo de capital próprio) de 14%.
Pontos positivos
- Retomada de volumes. Com a abertura econômica e maior número de vacinados, esperamos uma gradativa normalização dos volumes financeiros processados, tendência que deve melhorar os resultados em 2021 e 2022.
- Potenciais desinvestimentos. A Cielo vem demonstrando interesse em vender ativos periféricos como a M4U. Mas ainda falta a maior, a americana Merchant-eSolutions. Inicialmente comprada para aproveitar seus sistemas, a venda pode destravar valor dado que por muitos anos a operação só deu prejuízo.
- Novas linhas de negócio. A Cielo está buscando ampliar a sua oferta de produtos, a exemplo do lançamento do “crédito fumaça” (crédito ao lojista garantido pelo fluxo de recebíveis de cartão). A iniciativa pode ampliar seu take rate e o valor agregado de seus serviços.
- Liderança de mercado. Com 27% de market share, a Cielo se mantém como empresa líder de adquirência no Brasil.
- Valuation. Ao valuation atrativo de 4,72x P/L 22, acreditamos que a ação esteja barata, dado o cenário favorável no curto prazo.
- WhatsApp Pay. A Cielo fechou uma parceria com o Facebook Pay para processar transações realizadas via WhatsApp. Caso aprovada pelo BACEN, as transações para fins de pagamento podem aumentar os volumes e receitas da Cielo.
- Fechamento de capital. Em função do valuation atrativo e desafios da companhia, surgiram rumores de que a Cielo pudesse fechar seu capital, o que inferiria no pagamento de um prêmio aos acionistas. Mesmo não sendo o ponto central de nossa tese, acreditamos que o fechamento de capital seja uma opção viável – vide Itaú e Redecard.
- Vencimento de contratos. Ao longo dos últimos anos, em razão do aumento da competição, a Cielo manteve contratos, principalmente em grandes contas, com margens negativas a fim de tentar mitigar a perda de market share. Alguns desse contratos devem vencer em 2021, o que apesar de reduzir o volume transacionado, aumentará a margem.
- Meio da pirâmide. A Cielo tem uma atuação mais concentrada em grandes contas, segmento que possui uma margem inferior. A companhia vem tentando fazer o downsell, buscando clientes cujo take rate é superior.
Pontos negativos
- Eficiência. A Stone entregou em 2020 um lucro 2x maior do que a Cielo com 1/3 da receita, mostrando a maior eficiência das competidoras.
- Competição. Com a desregulamentação, as barrerias de entrada caíram substancialmente e a competição ficou muito acirrada. O aumento da competição no mercado de adquirência, com a entrada de companhias como a Getnet, PagSeguro e Stone podem continuar a pressionar as taxas de administração.
- Comoditização. A Cielo não ambiciona ser uma empresa de tecnologia no segmento de pagamentos. Sem muita diferenciação, os serviços de adquirência tendem a se comoditizar, gerando mais competição e pressão em preços.
- Conflito de interesses. Em função de ter 2 controladores (Bradesco e o Banco do Brasil), acreditamos que a Cielo tenha mais restrições de fazer vendas cruzadas com produtos bancários, tendo menor habilidade de adaptação e inovação que as novas entrantes e, eventualmente, tendo conflito de interesses em certos produtos com seus controladores como na área de crédito e antecipação de recebíveis. A Cielo paga comissões de distribuição para os bancos controladores, reduzidas há alguns trimestres conforme a rentabilidade de cada cliente.
- Market share. A Cielo vem perdendo market share, tendo saído de 41,2% de participação de mercado em 2018 para somente 33,6% em 2020 e 27% no 1S21.
- Risco de execução. Dados os desafios da empresa, como a resolução dos conflitos entre controladores, venda de subsidiárias, lançamento de novos produtos e perda de market share, consideramos haver um alto risco de execução da estratégia da companhia.
- Centrais de recebíveis. O crédito com garantia de recebíveis precisa estar registrados em centrais de recebíveis. A Stone enfrentou diversos problemas com a centrais, gerando uma grande perda no “crédito fumaça”. Caso se mantenham, dificuldades operacionais com centrais de recebíveis podem frear o crescimento do novo produto de crédito da Cielo.
Um pouco mais sobre o setor:
O mercado de adquirentes nem sempre foi competitivo no Brasil como é hoje em dia. Até 2009, as maiores bandeiras, Mastercard e Visa, detinham contratos de exclusividade com duas empresas: a Visanet (Cielo) e a Redecard (Rede). Em 2010, após estudo sobre a relação da Visa com a Visanet, o conselho administrativo de defesa econômica (Cade) julgou que a exclusividade contratual usufruída pela adquirente no país infringia a ordem econômica, o que levou a quebra da exclusividade no mercado de adquirência nacional, abrindo as portas para a competição. Atualmente, mais de 12 empresas brigam por espaço no mercado brasileiro, fazendo com que as líderes de mercado perdessem market share.
Para entender melhor como essas mudanças aconteceram, cabe entrarmos mais a fundo na dinâmica da adquirência. No que se refere aos atores envolvidos em uma transação, eles se resumem a adquirente, bandeira do cartão e emissor. A adquirente é aquela que presta serviços para varejistas e empresas que necessitam de soluções para pagamentos com cartões bancários, realizando a captura da transação com suas maquininhas e terminais. O emissor é geralmente um banco ou instituição financeira que emite o cartão para o consumidor final, como por exemplo o Banco do Brasil, Inter, Nubank, Bradesco, Itaú, Santander, dentre outros. Ele é responsável por verificar se o saldo ou limite do cliente permite o pagamento, efetuando a liquidação da conta ou fatura. Por fim, o último agente é a bandeira (exemplo, Visa e Mastercard) dos cartões, que estabelecem as regras, promovem e administram o todo o esquema de pagamento.
Na prática, quando o consumidor usa seu cartão em um equipamento de captura (exemplo, uma maquininha da Cielo), o terminal registra os dados referentes ao pagamento no sistema da adquirente. Na sequência, as informações são transmitidas para a bandeira que irá identificar a instituição emissora do cartão e notificá-la da intenção de compra. Esta, por sua vez, conferirá se o consumidor possui saldo ou limite. Caso aprovando, a transação é liberada pelo intermédio da aquirente.
Cada um dos agentes envolvidos monetiza a sua participação no ciclo da transação. O emissor cobra uma taxa que chamamos de intermediação, deduzida na hora do repasse para a adquirente. Esta, cobra a taxa de administração, que também é retirada na hora do pagamento ao lojista. Já a bandeira recebe de ambos agentes apartadamente.
A modalidade da transação é outra variável muito importante no processo de pagamento, podendo ser de débito e crédito. Caso seja de débito, o cartão está diretamente ligado a uma conta-corrente ou poupança, que verifica a existência de saldo ou limite na conta do cliente, debitando-o quando a compra é aprovada. O montante, no entanto, só será recebido em D+1 pelo lojista, deduzidas as taxas dos respectivos agentes envolvidos.
Na modalidade de crédito à vista, o lojista recebe em D+30 e o que é conferido na hora da compra é o limite de crédito. Diferentemente em outros países, o pagamento é feito em D+2. Note que o banco emissor assume o risco do cliente não pagar a sua fatura pois, independentemente disso, deverá fazer o repasse à adquirente, encarecendo as taxas de intercambio cobradas no pagamento no crédito, independentemente de ser uma compra parcelada ou à vista, mas recebendo juros no crédito rotativo do cartão.
No crédito parcelado, a compra pode ser com ou sem juros. Caso tenha juros, ele é cobrado da fatura do dono do cartão e a adquirente recebe o valor da compra total da compra, deduzida a taxa de intercâmbio, em D+28. Os juros neste caso, se referem justamente ao serviço de antecipar o recebimento do valor total da compra ao lojista, o que possui um custo para o banco dado que só receberá de seu cliente ao decorrer do pagamento de suas faturas. Assim, o lojista recebe o montante da venda líquido das taxa em até D+30. Caso a compra seja sem juros, tanto a adquirente quanto o lojista recebem em intervalos de D+30, cujo período é definido pelo número de parcelas. O parcelado sem juros também é um produto inventado pela indústria brasileira e gera oportunidade de ganhos na antecipação desses recebíveis.
Nota-se que o pagamento sem juros é inconveniente para o lojista, pois ele consome capital de giro para o seu negócio por não receber o valor total da venda por vários meses. Por isso, algumas instituições financeiras passaram a antecipar o pagamento (pre-payment), utilizando como garantia justamente o valor que o lojista tem a receber, conhecido também como recebível. Desta forma, a adquirente/banco pode antecipar o valor da compra ao lojista com um desconto (juros) que, em troca, receberá o valor cheio das parcelas.
Além da dificuldade com o parcelado sem juros, os lojistas sofrem com qualquer modalidade de crédito, pois em todas recebem somente em D+30, também prejudicando seu capital de giro. Para sanar esses problemas e com aumento de pressões regulatórias e competição, as adquirentes começaram a fazer os repasses em D+2, aumentando sua taxa de administração em contrapartida.
Além das formas que já comentamos de como as adquirente monetizam, dentre elas a taxa de administração, a antecipação de recebíveis e o crédito para capital de giro, ainda há o aluguel de maquininhas. Ele se refere a cobrança mensal para que o lojista possa utilizar a máquina da adquirente, e já foi muito representativo nas receitas dessas companhias.
Conforme comentamos, a maior competição vem mudando o setor de pagamentos acentuadamente no que se refere a market share e margem, que naturalmente passa a ser menor pela queda na taxa de administração. Entretanto, a competição também vem mudando o modelo de negócio das adquirentes, com descontos maciços no preço do aluguel, migração de maquininhas alugadas para maquininhas próprias, maior popularização do produto de antecipação e maior qualidade oferecida ao cliente através de softwares e plataformas cada vez mais completas.
Parte dessa mudança no mercado advém, não somente da herança da quebra do duopólio, mas da nova agenda do banco central, pautada essencialmente em aumentar a competição no setor financeiro. Uma das mudanças implementadas foi a central de recebíveis como meio para substituir a trava bancária, ou seja, a regulação que impedia tomar créditos com garantia de recebíveis em mais de uma instituição financeira até que a totalidade do saldo da dívida estivesse quitado.
Outro produto é o crédito fumaça. Em síntese, os lojistas que tem fluxos de caixa a receber, advindos da diferença entre o faturamento da venda e o recebimento em D+30 ou parcelas mensais, podem dar esse direito como garantia a um banco para contrair um empréstimo. Diferentemente do pre-payment, esse produto possui inadimplência, pois o crédito contraído é superior às garantias. Assim, caso lojistas não paguem, o banco passa a ser o credor dos recebíveis, mitigando suas perdas. A trava bancária era um instrumento que assegurava que os lojistas não iriam à vários bancos dando a mesma garantia para pegar crédito, mas acabava travando todo o fluxo de recebíveis do lojista. A nova regra do BC trava apenas o fluxo proporcional à dívida restante do estabelecimento.
Logo, as centrais de recebíveis foram implementadas para conciliar tais garantias e abrir a possibilidade de um lojista pegar crédito em múltiplas instituições sem extrapolar o limite de recebíveis que possui. Apesar da mudança possibilitar que empresas como a Cielo, Stone e Getnet deem crédito colateralizado para clientes antes presos em bancões, por estar muito incipiente, tem gerado problemas à empresas como a Stone, que teve dificuldade de executar as garantias amargando um bom prejuízo no 2T21.