Organizamos o relatório na seguinte estrutura:
1. Tese de Investimentos
2. Oportunidades e Riscos
3. Valuation
4. Perfil da Companhia
5. Modelo de Negócios
6. Principais Acionistas
7. Diretoria da C&A.
Caso você, leitor, esteja começando a analisar as empresas de vestuário, recomendamos começar pelo tópico 4. Perfil da Companhia e 5. Modelo de Negócios, para então, voltar ao início do texto (você pode navegar pelos tópicos através da leitura dinâmica).
Tese de Investimentos
Com um valuation atrativo, precificada a 2,4x EV/EBITDA 2024e enquanto o setor de vestuário baixa renda negocia em 5,8x, entendemos que a C&A negocia com desconto em relação aos seus principais concorrentes (LREN3 e GUAR3). Com base em um de fluxo de caixa descontado, iniciamos nossa cobertura em C&A com recomendação de COMPRAR e preço-alvo 12M de R$8,20, que implica em um upside de 48,8% com base no fechamento de terça-feira (12/set).
Principais pontos positivos da tese: (I) retomada do plano de expansão de lojas a partir de 2024; (II) novo patamar de margem bruta indicado pelo avanço da forma de distribuição, trazendo um maior nível de produtividade e menores níveis de remarcações; (III) negociando em um valuation e múltiplos abaixo de seus pares; (IV) evolução da C&A Pay como catalisador positivo.
Principais riscos da tese: (I) empresa situada no setor de bens de consumo discricionário com produtos, majoritariamente, de ciclos curtos; (II) setor bem correlacionado a atividade econômica; (III) crescimento agressivo da financeira pode gerar maiores níveis de provisão impactando na rentabilidade do negócio; (IV) aumento da competição provocado, principalmente, por players estrangeiros; (V) riscos de execução no plano de novas aberturas.
A C&A, líder do mercado de vestuário no Brasil até 2015, está passando por um momento divisor de águas em seu operacional. O período entre 2014-2018 foi marcado por baixos investimentos e zero aberturas de lojas para a companhia, enquanto suas principais concorrentes mostravam seus planos agressivos para ganhos de penetração de mercado.
Após o IPO, a C&A ficou focada em aprimorar sua maneira de distribuir seus produtos e adotou o modelo push and pull. Nossa tese de investimentos é centrada na melhora operacional com ganhos de rentabilidade oferecidos com o novo sistema abastecimento de lojas, tecnologia RFID, precificação dinâmica e ganho de produtividade por loja favorecendo sua alavancagem operacional a ponto de estabelecer um novo padrão de margem bruta para a companhia, acrescentando +206 bps ao longo dos próximos 5 anos, segundo nossas estimativas.
Com um novo pipeline de aberturas, esperamos que a companhia possua o maior CAGR de receita líquida (2023-2028e) da nossa cobertura de vestuário, estimado em 7,7% vs. 7% para Lojas Renner e 7,4% para Guararapes.
Oportunidades e Riscos
Oportunidades e Forças
(1) Incremento de margem bruta
Um dos principais pontos da estratégia da companhia nos últimos anos, foi a adoção do modelo de distribuição Push and Pull (modelo que explicaremos ao longo do texto).
Para contextualizar, antes da implementação desse novo modelo, a C&A operava apenas com o push, no qual a mercadoria chegava dos fornecedores ao centro de distribuição e era enviado pacotes “padrões” para todas as lojas – como exemplo, uma caixa com 5 camisetas P, 5 camisetas M e 5 camisetas G.
O grande problema dessa forma padronizada de distribuição é que ela não é compatível com o Fast Fashion, dado o elevado número de coleções no ano e perfis de loja com diferentes níveis de venda. Os principais obstáculos enfrentados quando se junta o Fast Fashion com a distribuição empurrada (push) está na perda de produtividade gerada pelo (I) acúmulo excessivo de peças que não estão vendendo bem, provocando um maior nível remarcações, e (II) um aumento da ruptura de itens com forte demanda, prejudicando a evolução das vendas.
Vale dizer que antes da reforma do centro de distribuição Raposo Tavares (SP), a companhia operava de forma “manual” – também chamada “man to goods”. Esse modelo consistia na seleção à mão dos produtos, onde os funcionários do CD procuravam as peças em caixas para montagem do pedido, processo que demorava cerca de uma a duas horas. Com a implementação de 92 robôs e do software Manhattan Active Warehouse Management, o centro de distribuição passou a ser referência na America Latina para a operação em OSR Shuttle.
Os resultados dessa modernização falam por si só: (I) redução do prazo de entrega para a região metropolitana, saindo de dois dias para apenas um, também possibilitando entregas no mesmo dia; (II) redução de 80-90% nas margens de erro das encomendas; (III) a partir da seleção dos pedidos pelos robôs e da forma de operar “goods to man”, é possível um funcionário empacotar até quatro pedidos simultâneos em cinco minutos.
Com a atualização do CD Raposo Tavares, veio a implementação do modelo push and pull por SKU. Agora, invés da C&A mandar caixas padronizadas para as lojas, a reposição é feita de forma ágil e sob demanda através da inteligência de dados.
O modelo push and pull é capaz de repor peças de maneira individualizada para cada loja por tamanho, modelo e cor através do uso de dados e tecnologia. Uma das tecnologias que possibilitam isso é o RFID (Radio-Frequency Identification), que assegura a identificação de cada SKU, seja dentro do CD ou da loja, trazendo uma visão mais ágil de todo estoque da companhia e assim, possibilitando a identificação de quais peças estão sendo mais requisitadas em cada unidade, proporcionando uma maior eficiência do inventário.
O notável benefício dessa implementação é justamente a eficiência e ganho de produtividade. Com o produto certo na loja certa, a C&A consegue aumentar suas vendas pelo menor índice de rupturas em produtos altamente demandados além de contar com um estoque otimizado, para que sua tecnologia de precificação dinâmica possibilite menores níveis de remarcações.
Figura 1: Entendendo o Push and Pull
Como fruto disso, é possível observar um aumento próximo de +25% de venda nas peças da categoria de dobrados, principal grupo a desfrutar do sistema para a C&A. Em 2017, quando a Lojas Renner estava no processo de implementação do modelo Push and Pull, foi realizado um estudo que mostra a queda de aproximadamente 50% da ruptura (falta de produtos) com a integração e um aumento na taxa de crescimento de vendas na casa de 7 pontos percentuais, como se pode observar na figura 2 abaixo.
Figura 2: Benefícios do Push and Pull
Atualmente, a companhia já possui cerca de 35% dos seus produtos (SKUs) viáveis para operar no push and pull. A meta da diretoria é passar para 40% até final de 2023, número que corresponde por 100% das peças categoria “A” (dobrados). Para ir além dos 40%, a C&A teria que dispor um sistema push and pull para a categoria “B” de cabides e mais uma rodada de fortes investimentos em CapEx.
Partindo dessa melhora, observamos que a C&A estará apta para alcançar novos patamares de margem bruta, como é possível ver no Gráfico 1 abaixo.
Gráfico 1: Evolução de Margem Bruta
Para fins de comparação, trouxemos as margens bruta de varejo e consolidada da Lojas Renner no Gráfico 2, quando ela passou pelo período de adoção do push and pull para dobrados. O ganho proveniente da operação vem desde melhoras na produtividade de ter um CD automatizado para comportar a estrutura, até menores níveis de remarcações dos produtos.
Gráfico 2: Evolução de Margem Bruta Lojas Renner
Até os dias de hoje, a Lojas Renner é a única empresa aberta na bolsa brasileira com estrutura para implementação do push and pull para cabides. O capital empregado para viabilizar o modelo para produtos de cabides foi de R$ 750m e ainda não está operando com toda sua capacidade. Devemos observar a C&A e a Riachuelo ainda em uma posição mais cautelosa quanto a esse investimento dado o relevante desembolso necessário.
(2) C&A Pay, uma faca de dois gumes!
Como pudemos observar no Gráfico 2, a margem bruta consolidada da Renner é mais alta do que a apresentada pela C&A também por conta de uma financeira mais desenvolvida. Com baixos custos, a operação de crédito tende a girar a uma margem bruta significativamente superior à de varejo. Na Renner, o efeito tende a ser de uma margem consolidada em média +5p.p. maior em comparação com a margem da operação exclusiva de varejo, dado o tamanho da sua vertical financeira. Para a C&A, com uma financeira ainda em fase de maturação, o impacto sobre a margem consolidada é menor.
No final de 2021, com o contrato assinado com o Bradesco para a recompra dos direitos de oferecer serviços financeiros a seus clientes, a C&A Pay foi formada.
Enxergamos a oferta de crédito como uma faca de dois gumes. Se por um lado, (I) você concede crédito para impulsionar as vendas, no outro, (II) uma gestão equivocada do score de crédito pode fazer a companhia aumentar sua provisão.
Explorando o tópico (I), a parte boa da financeira própria:
O fato de os serviços financeiros estarem desde 2009 nas mãos do Bradescard somado com a política de concessão de crédito mais conservadora, levou a C&A perder poder de venda contra suas principais concorrentes. Como podemos observar no Gráfico 3 abaixo, a penetração da oferta própria de crédito dentro das vendas no varejo é significantemente abaixo da Renner, Riachuelo e Marisa.
Gráfico 3: Penetração do Cartão de Crédito C&A vs. Concorrentes
Com a celebração do novo contrato, a C&A Pay voltou on track para preencher essa lacuna contra a concorrência e aumentar a penetração do crédito nas vendas. O número saiu de 14-16% em 2020/2021 para um patamar de 22-25% em 2023. Olhando para os outros players ainda vemos o número como baixo e devemos observar ele se aproximando dos 35-40% nos próximos anos.
Com a carteira de crédito com um pouco mais de um ano, ainda devemos observar números mais agressivos de crescimento até 2025, ano que normalizamos o crescimento do portfólio com o crescimento de receita do varejo, como pode-se observar no Gráfico 4 abaixo.
Gráfico 4: Evolução do Portfólio de Crédito
Ainda temos um gatilho que não incorporamos em nosso modelo de valuation que é o início do cartão co-branded da C&A Pay. Acreditamos que com o ingresso nessa modalidade de cartões, a companhia consiga crescer sua carteira de forma mais acelerada antecipando o breakeven da operação de serviços financeiros.
No tópico (II), a parte complicada da financeira própria:
Com o controle de crédito sendo realizado internamente, é preciso de um mapeamento de dados robusto e uma política de concessão com pilares bem embasados para não correr riscos maiores com inadimplência.
Dito isso, como o portfólio de crédito da C&A Pay é novo, é normal esperarmos um aumento da provisão mediante a evolução das safras, contudo, é preciso estar atento com as novas concessões para não incorrer um maior nível de PDD. Atualmente, a C&A está com uma média de Non Performing Loans (NPL) sobre a carteira de 20%, abaixo da Realize, Midway e MBank com 21%, 23% e 39%, respectivamente.
Gráfico 5: Vencidos acima de 90 dias (% da carteira)
(3) Compra da Carteira da JV pelo Bradesco
Como explicamos no tópico “Perfil da Empresa”, a C&A readquiriu seu direito de oferecer crédito no final de 2021 com o contrato de recompra assinado com o Bradesco. Com a piora no cenário de inadimplência à vista, a companhia prorrogou a sociedade pelo período de 2,5 anos com manutenção das contas ativas atuais e um novo modelo de remuneração pela prestação de serviços de abertura de novas contas.
A partir do término dessa postergação, caso o Bradesco queira ficar com a carteira de recebíveis, ele precisará desembolsar uma quantia para aquisição desse volume. Construímos uma tabela de sensibilidade para tentar precificar a carteira da Joint Venture, no contexto em que haja interesse pelo Banco em adquirir o portfólio.
Tabela 1: Em uma possível oferta, qual seria o valor justo da Carteira de Recebíveis?
Vale lembrar que ao término da prorrogação, a C&A precisa desembolsar o valor de R$ 415m, corrigidos a 112,5% do CDI. Então, caso haja interesse pelo Bradesco em comprar a carteira da Joint Venture e consideremos um volume da carteira de recebíveis em um patamar próximo à R$1,6b e essa oferta venha com um deságio de 75%, o Bradesco precisaria desembolar cerca de R$ 400m, amortizando quase a totalidade da obrigação da C&A.
Ressaltamos que esse gatilho serve apenas como uma opcionalidade positiva para a tese da C&A, dado que não consideramos o interesse da aquisição em nosso cenário base.
Riscos e Fraquezas
(1) Ameaça Cross-Borders
O segmento de “Vestuário e Calçados” está em um momento altamente disruptivo. Os cross-borders asiáticos estão ocupando o mercado nacional, conquistando a demanda de consumidores locais com sua precificação agressiva – possibilitada por um custo de produção significativamente menor do que o incorrido por players locais. Acreditamos que o mercado de vestuário passa pela maior disrupção entre todas as categorias do varejo nacional, e as companhias nacionais precisarão se adaptar ao novo jogo dentro do setor.
Gráfico 6: Importações de pequeno valor via encomendas internacionais
Cross-borders ganhando espaço no mercado local. Com consumidores extremamente sensíveis a preço, varejistas brasileiras de vestuário vêm perdendo parte de sua demanda para as grandes plataformas cross-borders, que atuam com preços mais agressivos do que players como a C&A e os players nacionais conseguem praticar. Em nossa estimativa, a Shein já se apossou de 4,7% do mercado nacional. Com um faturamento no Brasil de cerca de R$ 7,0b em 2022, a companhia chinesa se posiciona como a 2ª maior varejista do setor – atrás apenas da Renner, que faturou R$ 11,0b no mesmo ano.
Gráfico 7: Market Share Vestuário & Calçados no Brasil
Esse movimento, que traz nomes de peso como a Shein, deve continuar a apertar a concorrência no setor de vestuário de baixa renda ao longo dos próximos trimestres.
Isenção de taxas de importação. As novas regras tributárias publicadas sobre a taxação de cross-borders trazem a isenção de impostos sobre todos os valores abaixo de US$ 50 para as companhias que adotarem o programa “Remessa Conforme”. Anteriormente, teoricamente todas as compras importadas estavam sujeitas a um imposto de 60%, apenas remessas (de até US$ 50) entre pessoas físicas estavam isentas. Como contrapartida à isenção, a portaria publicada pelo governo impõe o pagamento de um ICMS de 17% sobre as vendas. Vale lembrar que a Shein já aderiu ao programa Remessa Conforme, e a AliExpress já entrou com um pedido de adesão também.
Em nossa visão, as novas regras devem oficializar o cenário atual. Acreditamos que a nova regulamentação fiscal de cross-borders não deve evitar um ambiente tributário assimétrico, podendo colocar os itens da C&A em desvantagem em relação à precificação agressiva das plataformas estrangeiras. Ainda, a ausência de um imposto de importação pode atrair ainda mais interesse de empresas estrangeiras pelo mercado brasileiro.
Shein: um case de sucesso internacional
Muito além de um player de arbitragem tributária. Reduzir o sucesso da Shein no Brasil à uma consequência de condições fiscais assimétricas pode custar caro para o varejo nacional. A companhia chinesa se posiciona como símbolo do real-time fashion, necessitando de apenas ~20 dias entre a concepção final do design e a fabricação do produto ao consumidor – 6,0x mais rápido do que a média da indústria. A Shein possuí mais de 1 milhão de SKUs em sua plataforma e adiciona cerca de 5 mil novos produtos por dia em sua plataforma.
O diferencial da Shein é o modelo de negócio. A gestão de supply chain da companhia destoa do padrão do varejo de vestuário, além de contar com o uso de tecnologia (IA e Big Data) na produção das peças. Outro importante diferencial da Shein é a utilização de SEO no marketing digital e o engajamento dos usuários da plataforma, impulsionando a conversão de vendas por anúncios direcionados.
Nacionalização da produção e vendas locais. Com o objetivo de nacionalizar 85% das vendas locais até 2026, em abr/23, a Shein assinou um memorando de entendimento com a Companhia de Tecidos Norte de Minas (Coteminas). O acordo prevê que 2 mil clientes confeccionistas da Coteminas passem a ser fornecedores locais da empresa asiática, visando atender os mercados doméstico e da América Latina.
A entrada e ascensão dos cross-borders asiáticos, com destaque para a Shein, representam um risco para a as varejistas de vestuário de baixa renda no Brasil, incluindo a C&A. Além da concorrência acirrada devido à precificação agressiva dessas plataformas estrangeiras, a recente isenção de taxas de importação para compras abaixo de US$ 50, aliada à agilidade e eficiência na cadeia de suprimentos da Shein, tornam a competição ainda mais desafiadora.
A busca pela nacionalização da produção e parcerias locais pela Shein também indica uma estratégia de longo prazo para consolidar sua presença no mercado brasileiro, o que pode representar um desafio adicional para as empresas nacionais do setor de vestuário. Portanto, a C&A e outras empresas do setor devem estar preparadas para enfrentar uma concorrência feroz e buscar estratégias de diferenciação para se manterem competitivas, buscando se adaptar ao novo jogo dentro do varejo.
(2) Overhang do Controlador
Quando falamos de uma empresa com controlador, sempre há o risco de uma venda massiva pressionar a performance de curto prazo de um ativo. Dado o momento macroeconômico e a boa estabilidade financeira da Cofra e da família Brenninkmeijer, consideramos essa possibilidade como baixa e acreditamos que os controladores não devem realizar um movimento de venda no curto e médio prazo.
Valuation
Negociando a um EV/EBITDA 24e de 2,4x vs. sua média histórica de 6x e uma média do setor de vestuário de 5,8x 2024e, observamos que o cenário macroeconômico com altas taxas de juros e maiores níveis de inadimplência afetaram o valor de mercado do varejo como um todo, e consequentemente a C&A. Entretanto, entendemos que o contexto em que a companhia passe a desfrutar dos benefícios do push and pull com a melhora de produtividade não esteja refletido nos preços atuais. Dessa forma, iniciamos nossa cobertura com recomendação de COMPRAR para CEAB3, com um preço-alvo de R$ 8,00, implicando em um upside de 48,8%.
Chegamos em nosso preço-alvo a partir da metodologia de fluxo de caixa descontado (DCF), utilizando como Ke de 16,9% e um crescimento na perpetuidade “g” de 4%.
Principais premissas:
- Abertura líquida média de 8 lojas/ano C&A, com 1.850 m² para cada unidade;
- Taxa de Crescimento Anual Composta (CAGR) de Receita Líquida de 7,7% ao longo dos próximos 5 anos;
- Recomposição da margem bruta consolidada para 52,3% ao longo dos próximos anos;
- Margem EBITDA ajustada alcançando 13,2% até 2028 – sendo o maior patamar já alcançado pela companhia;
- Capex médio anual de R$ 360 milhões.
Entendendo as premissas:
- Com o mapeamento realizado para mais de 150 localidades atrativas para se ter uma C&A, estamos adotando uma abertura líquida média do parque de lojas de 8 unidades/ano. Para nós, essa recomposição será de forma gradual com a retomada de 8 aberturas líquidas para 2024e, seguida de 14/ano inaugurações em 2025e-2026e e finalizando com 16 lojas/ano em 2027e-2028e;
- Esperamos um CAGR de 3,6% vindo do aumento da área total de vendas enquanto estimamos um crescimento anual composto de 4,2% relacionado ao ganho de produtividade na venda média mensal por loja;
- O ganho de margem bruta virá da automação do CD da Raposo Tavares e da implementação do push and pull. Com a adoção do modelo junto com as tecnologias de RFID e precificação dinâmicas, entendemos que a C&A será capaz de reduzir tanto seu nível de rupturas como de remarcações. Estimamos um ganho de margem bruta de +206 bps para os próximos 5 anos, mostrando que a melhora na alavancagem operacional na unidade de varejo deixe a companhia com um novo padrão de margem bruta;
- Considerando o carrego positivo de margem bruta, os esforços da C&A em otimizar sua estrutura de despesas e maior nível de diluições vindo da melhora do top line, entendemos que a companhia também terá um novo patamar de margem EBITDA Ajustada, alcançando os 13,2% – seu maior nível histórico.
Tabela 2: Múltiplos de Empresas Comparáveis
Tabela 3: Matrizes de Sensibilidade (Preço-alvo; Upside e EV/EBITDA 2024e)
Tabela 4: Projeções DRE, BP e Fluxo de Caixa
Perfil da Companhia
História
Fundada pelos irmãos holandeses em 1841, a C&A – que leva as iniciais de seus fundadores, Clemens e August -, revolucionou o mercado de tecidos dando início ao modelo de confecção de “roupas prontas para usar”.
Como curiosidade, no início do século XIX, o comum era você ir em uma loja de tecidos, comprar o material e fazer suas próprias roupas de forma artesanal em seu domicílio. Após a primeira revolução industrial, em meados século XX, pudemos observar o arranque da indústria do vestuário, com os modelos de confecção cada vez mais presentes – ainda que disputassem espaço com as alfaiatarias.
Atualmente, a marca holandesa expandiu sua presença global, operando em mais de 18 países com um total de mais de 1.700 lojas. No entanto, ao mencionar CEAB3, estamos direcionando nossa atenção exclusivamente para a operação que abrange o portfólio de lojas da C&A no Brasil.
A C&A Brasil deu seu pontapé inicial no país em 1976, com sua primeira loja inaugurada no Shopping Ibirapuera – um dos shoppings mais antigos do Brasil, sendo o segundo inaugurado em São Paulo. No entanto, as primeiras lojas da marca ocorriam por meio de outras sociedades, passando a ser uma companhia, apenas 5 anos depois, em 1981.
Sendo uma das precursoras do conceito “Fast Fashion” – modelo que realiza diversas coleções, além das tradicionais coleções por estações -, a C&A conquistou seu reconhecimento em nível nacional, especialmente com seu icônico slogan “Abuse e Use”, que contou com a participação de Sebastian Soul, uma figura de destaque da televisão brasileira.
Com o IPO que movimentou R$ 1,8b, realizado em outubro de 2019, a operação da C&A Brasil começou a ser negociada na B3 sob o ticker CEAB3. O objetivo da oferta pública foi de alavancar seus investimentos em reforma e aberturas de lojas, logística e tecnologia.
A estratégia da empresa consiste em oferecer produtos de vestuário a preços competitivos, principalmente para mulheres entre 25 e 44 anos que buscam um estilo casual e contemporâneo. Vale ressaltar que, embora o público-alvo seja predominantemente feminino, devido à sua representatividade nas vendas, a C&A também reserva parte de suas lojas para o público masculino e infantil.
Para cumprir com sua proposta, a C&A conta ao final de 2022 com 333 lojas físicas, quatro centros de distribuição, que juntos somam uma área total de 120 mil m², localizados em São Paulo (Raposo Tavares e Tamboré), Rio de Janeiro (Pavuna) e Santa Catarina (Navegantes), além da sua financeira C&A Pay e a parceria, com prazo até jul/2025, com o Banco Bradescard.
Figura 3: Cronologia C&A
Crescimento do Mercado e de Lojas
O mercado de Vestuário e Calçados no Brasil atingiu R$ 148 bilhões (evolução no Gráfico 1) em vendas no ano de 2022, crescendo 8,5% na comparação anual, de acordo com a Euromonitor. Como sabemos, a baixa barreira de entrada faz com que essa indústria seja altamente fragmentada, abrindo espaço para consolidação de players que possuem escala.
Gráfico 8: Tamanho do Mercado de Vestuário & Calçados no Brasil
Atualmente, como podemos observar no Gráfico 9, os cinco maiores players de Vestuário e Calçados possuem juntos cerca de 24% de penetração no mercado. Se realizarmos um corte para apenas as varejistas de vestuário média/baixa renda, a C&A está em quarto lugar com 3,4% de market share, atrás da Renner, Shein e Riachuelo (7,4%, 4,7% e 4,2%, respectivamente).
Gráfico 9: Market Share Vestuário & Calçados no Brasil
Para saber os próximos passos da companhia, devemos olhar para trás e analisar o contexto que ela se inseriu. Vamos separar essa história em cinco pequenos blocos, sendo: (I) Liderança e reconhecimento nacional; (II) Crise macroeconômica e baixo grau de investimentos; (III) Reestruturação; (IV) IPO e o plano de crescimento; por fim, (V) Pandemia e evolução do digital.
(I) Liderança e reconhecimento nacional (2009-2014). Com um forte plano de expansão de novas lojas, abrindo +100 lojas no período, a C&A se posicionou como líder do setor de vestuário com 4,3% de market share, na frente de Renner e Riachuelo (4% e 3,9%, respectivamente).
(II) Crise macroeconômica e baixo grau de investimentos (2014-2016). Com a recessão de 2015 e a queda do produto interno bruto de -3,8%, os mais diversos setores foram afetados. O setor de Vestuário e Calçados, inserido dentro da cesta de consumo discricionário com produtos de ciclo curtíssimo, viu suas vendas caírem aproximadamente -5%, saindo de R$131 bilhões em vendas em 2014 para R$125 bilhões. Como resultado disso, o controlador holandês reduziu os investimentos diminuindo sua exposição ao Brasil.
(III) Reestruturação (2016-2018). Após a crise, a companhia iniciou uma frase de reestruturação do seu portfólio, reduzindo o número de novas aberturas além de um maior nível de fechamentos. Esse foi um período em que a C&A buscou uma maior otimização do parque de lojas, buscando focar na rentabilidade das unidades e racionar custos.
(IV) IPO e o plano de crescimento (2019). Com a empresa preparada para retomar seu grau de investimento, após ter mapeado mais de 150 novas localidades para abertura de lojas, a companhia realizou seu IPO em out/2019 movimentado R$ 1,9 bilhões.
(V) Pandemia e a evolução do digital (2020-2021). Com o advento da pandemia e a restrição de mobilidade global, as companhias precisaram se reinventar e aumentar seus investimentos direcionados ao mundo digital. Foi inaugurado nesse período as vendas por Whatsapp – que hoje representam +50% das vendas do canal online. Além disso, o ano de 2021 foi marcado pela finalização da automação do CD da Raposo Tavares (SP), tornando-se referência na América Latina.
Vale frisar, como relatado no tópico (II) e (III) acima, no momento que a C&A deixou de realizar novas aberturas e estagnou seu patamar de investimentos visando a otimização do seu portfólio e rentabilidade, suas concorrentes seguiram crescendo os respectivos parques de loja de maneira agressiva. Como podemos ver no Gráfico 10, a C&A era a líder até 2015 para então, perder a liderança para a Lojas Renner.
Gráfico 10: Evolução do número de lojas
(Comparação acima considera apenas a marca Renner e a marca Riachuelo – com exclusão de outros segmentos, como casa & decoração)
Buscando preencher esse gap imposto pelas principais concorrentes, a companhia em seu IPO sinalizou ao mercado um mapeamento de 159 localidades em shopping centers que ainda não tinham uma C&A, como oportunidade de expansão.
Mesmo com a companhia capitalizada para seguir seu plano adiante, o ano de 2020 acabou sendo marcado por uma pandemia. O cenário mudou com a restrição de mobilidade global mediante aos lockdowns instaurados nas cidades e pelo medo da população de sair às ruas e contrair o vírus. Nesse sentido, a C&A (assim como todas as outras varejistas) mudou seu foco para o ambiente digital, com impulsionamento das vendas omnichannel além foco na gestão do caixa e despesas mediante a queda no faturamento.
Passada a pandemia, a soma da desregularização da oferta com aumento abrupto de demanda, trouxe um choque nas principais cadeias de suprimentos, gerando inflação. Para conter o aumento generalizado de preços, o Banco Central do Brasil começou a elevar sua taxa de juros a partir do 1T21, de 2% para fechar 4T22 com 13,75%.
Gráfico 11: Histórico da Taxa Selic Média
Dentro desses dois contextos, desde a oferta pública de ações, a C&A abriu 59 lojas – equivalente a 37% do seu mapeamento. Nossa expectativa de inaugurações para os próximos anos busca atingir uma parcela dessas localidades, em virtude do aumento do custo de capital, algumas regiões deixaram de ser atrativas para a companhia.
Gráfico 12: Evolução do número de lojas C&A e Número de aberturas líquidas
Modelo de Negócios
A C&A Brasil é um player de varejo de vestuário Fast Fashion. Sua abordagem segue a linha de concepção de coleções proprietárias pelo time de estilistas da companhia, contudo, sem fabricação própria. A partir do momento que a coleção é criada, a C&A contata seus fornecedores para produção e, assim, comercialização de seus produtos.
Vale dizer que a C&A foi uma das pioneiras no modelo de loja self-service, quando o cliente entra na loja e pode transitar por ela, sem necessariamente ser abordada por um vendedor comissionado.
Varejo
(1) Fast Fashion
Com os modelos de confecção ganhando tração, o comércio de roupas “prontas para usar” foi se tornando cada vez mais atual dentro da realidade das pessoas e, por consequência, das varejistas.
O conceito de Fast Fashion pode ser traduzido para renovação constante de peças vendidas com o foco pensado em obter coleções que reflitam a real necessidade da cliente considerando as últimas tendências da moda, preço competitivo e uma produção rápida.
E de modo a suprir essa demanda por novas coleções, a C&A revitalizou todo seu cronograma semestral (vide Imagem 3) para estar sempre com novidades em sua loja, aproveitando os espaços de transição, virada e estação do ano.
Figura 4: Nova construção de coleção C&A
Pensando nisso, a C&A criou em novembro de 2018 a Mindse7, um projeto da transformação digital e de mapeamento de dados da companhia. A proposta consiste em apresentar coleções semanais inspiradas nas principais tendências das redes sociais junto de um modelo de co-criação entre a C&A e seus fornecedores. Desde seu lançamento já foram realizadas mais de 200 coleções.
Atualmente, a C&A conta com um time de estilistas e mais de 794 unidades de produção (221 fornecedores diretos e 573 subcontratados), sendo ~84% deles locais e 13% responsáveis por mais de 70% dos pedidos solicitados pela companhia.
(2) C&A
A C&A possui um conjunto de mais de 20 marcas proprietárias dentro da loja para adoção e familiaridade de cada gosto de seus respectivos consumidores.
Com 333 lojas, a companhia concentra cerca de 52% de seu portfólio da região Sudeste, seguida pelas regiões Nordeste e Sul, com 23% e 10%, respectivamente. O modelo ideal de uma unidade dispõe de aproximadamente 1.850 m² com um investimento de R$ 8 milhões por loja.
Figura 5: Mapeamento de Lojas Físicas
As mais de 250 lojas modernizadas – que englobam o conjunto das mais relevantes – já trabalham com o conceito de CVP (Customer Value Proposition), no qual a C&A arquiteta sua loja com base na localização dos produtos e seu perfil de venda – quanto mais reconhecido, mais perto ele estará do consumidor.
Figura 6: Conceito CVP e distribuição de Loja C&A
Nossa projeção de abertura de novas lojas se inicia com 5 inaugurações para 2023, 12 para 2024, 16 /ano no período de 2025-2026 e 18/ano entre 2027-2028. Como as demais varejistas de vestuário, a maturação de uma loja gira na casa dos 4 anos.
(3) Double Door Ace
Com um maior nível de buscar por artigos e peças de caráter esportivo, a companhia visou uma nova estratégia, a loja double door Ace. A marca é uma das que compõem o portfólio da C&A, dentre as 20 existentes.
A ideia de usar esse conceito é para proporcionar uma experiência de compra personalizada, com espaços divididos por modalidades esportivas, para atrair esse perfil de público.
Operando como uma store-in-store, a double door Ace está dentro da metragem quadrada da loja “mãe” C&A. Ou seja, se considerarmos uma loja C&A de 1.850 m², dentro dessa metragem terá um espaço destinado para esse novo modelo.
Até então, todas as 13 double doors foram abertas em lojas já existentes que passaram por uma readequação para comportar o formato. O projeto ainda está em fase de testes para sentir a receptividade e engajamento da marca esportiva.
(4) Fashiontronics e Beauty
O negócio de vendas de eletrônicos e beleza entra nessa categoria denominada de Fashiontronics. O modelo de negócios funciona em um pequeno espaço da loja – cerca de 5% do tamanho da loja -, com o intuito de impulsionar a venda por m², dado o ticket mais elevado dos produtos vendidos.
Atualmente, o cenário para Fashiontronics não é dos melhores. A restrição de renda das famílias, altas taxas de juros e o cenário mais apertado de crédito, tem feito com que a oferta por esse tipo de produto diminua. A níveis de comparação, esse segmento já foi responsável por cerca de 20% das vendas da C&A como um todo, e hoje está em um patamar na casa dos 13%, vide gráfico abaixo.
Gráfico 13: Penetração de Fashiontronics e Beauty na Receita
Contudo, a baixa do segmento não tem sido de todo mal, dado que os produtos eletrônicos possuem margem bruta inferior às praticadas no varejo (aprox. 25% vs. 50%, respectivamente), como podemos observar abaixo.
Já o segmento de Beleza (Beauty) na C&A é relativamente novo, lançado no 4º trimestre de 2019. Com o advento da pandemia, eles seguraram a evolução da implementação da categoria, com a retomada acontecendo apenas em 2022. Nos dias de hoje, a categoria de Beleza vem crescendo dentro da C&A e hoje já é responsável por 18% das vendas de Fashiontronics e Beauty. A maior penetração de Beleza dentro do mix é favorável para a margem de Fashiontronics, dado que a categoria também roda acima de eletrônicos, na casa dos 30%.
(5) Centros de Distribuição
A companhia possui quatro Centros de Distribuição, que juntos somam 120 mil m², localizados em: (I) Raposo Tavares, São Paulo (65 mil m² – o maior da companhia); (II) Tamboré, São Paulo; (III) Pavuna, Rio de Janeiro; e, por fim, (IV) Navegantes, Santa Catarina.
Acreditamos que com a modernização do CD Raposo Tavares, a companhia deva descontinuar a operação do centro de distribuição Tamboré.
Financeira
Em 1984, a C&A foi a primeira rede a oferecer crédito aos seus clientes. Seu primeiro produto consistia no cartão private label, que concede um limite para compras apenas dentro das lojas da companhia. Posteriormente, a C&A também adotou o modelo co-branded que permitiria seus clientes utilizarem seu limite para compras tanto nas lojas como em lugares terceiros.
Em 2001, a C&A, que já passava a oferecer crédito aos seus clientes há mais de 17 anos, criou seu próprio banco, o Banco Ibi. O foco aqui era oferecer limite para seu público-alvo de modo a que eles gastassem mais em suas lojas e remunerasse com o pagamento de juros – dado que esse tipo de perfil de cliente, provavelmente tinha seu crédito negado em uma grande instituição financeira.
Em 2009, após a crise financeira, o controlador queria diminuir sua exposição ao ato de conceder crédito e decidiu fazer uma parceria com o Banco Bradescard (Bradesco). O acordo que envolveu uma cifra de R$ 1,4 bilhões fornecia a exclusividade até 2029 ao Bradescard na venda de produtos financeiros aos consumidores da C&A.
No entanto, com o Bradesco registrando a provisão e a carteira de crédito em seu balanço, ele adotava sua metodologia de score de crédito que acabava negando diversos clientes C&A e assim diminuindo sua força como impulsionador de vendas – algo que a Renner e a Riachuelo estavam trabalhando bastante. Isso mudou em 2021, com a C&A celebrando um contrato com o Bradesco para a recompra dos seus direitos de oferecer serviços financeiros por um valor de R$ 415 milhões a serem pagos no início de 2023.
No início do ano, com um cenário de inadimplência alto e políticas mais restritivas de crédito, a C&A decidiu prorrogar sua parceria com o Bradescard até jul/2025 – e, com isso, prorrogando o pagamento da parcela acrescida de 112,5% do CDI.
Com os dados fechados do 2T23, a C&A Pay possui uma carteira de crédito de R$ 702 milhões e mais de 3,6 milhões de cartões private label emitidos. Já em sua Joint Venture com o Bradescard, a companhia possui 1,9 milhões de cartões co-branded ativos.
Principais Acionistas e Free Float
A C&A é controlada pela Cofra, veículo da família holandesa Brenninkmeijer, que fundou a companhia em 1941. A família detém 65% do total das ações da companhia, controlando a operação. Do restante, apenas 1,2% das ações estão em tesouraria ou na administração – consolidando um free-float de 33,5%.
Figura 7: Estrutura Societária C&A
Estrutura da Diretoria da C&A
Paulo Correa é o CEO da C&A Brasil a mais de 8 anos, sendo uma figura de destaque no mundo da moda e varejo pela sua visão estratégica e de liderança. Como diretor executivo, Paulo tem se empenhado em inovar e adaptar a empresa às mudanças do mercado de varejo, especialmente no contexto digital. Compreendendo a importância de uma presença online forte e de oferecer uma experiência de compra omnicanal aos clientes, Correa tem liderado a transformação digital da companhia nos últimos anos.
Este ano, Laurence Beltrão Gomes assumiu como CFO e DRI da C&A. Laurence tem uma vasta experiencia no varejo de vestuário, atuando como CFO da Lojas Renner de 2013 a 2020 – onde assumiu também a posição de Diretor Presidente da Realize CFI, braço financeiro da Renner. Laurence deve contribuir positivamente para o desenvolvimento da operação C&A Pay, trazendo conhecimentos de seu período na Realize.
Figura 8: Diretoria Executiva C&A