Após o encerramento do pregão dessa quinta-feira (10), a Americanas, Magazine Luiza e Via (ex Via Varejo) reportaram os seus números do 3º trimestre. A dinâmica não veio muito diferente do que já havíamos comentado em nossa prévia de resultados. Confira a análise detalhada para cada uma dessas empresas.
A Americanas (ticker AMER3) tem recomendação de COMPRA, com preço-alvo YE23 de R$ 28,40. O Magazine Luiza (ticker MGLU3) tem recomendação de MANTER, com preço-alvo YE23 de R$ 5,20. A Via (ticker VIIA3) tem recomendação de MANTER, com preço-alvo YE23 de R$ 4,80.
Americanas (AMER3): Capital de Giro assusta
Existe um famoso adágio que podemos aplicar em absolutamente todas as situações: “Espere o melhor, se prepare para o pior”. Foi com essa cabeça que mergulhamos ao analisarmos a prévia de Americanas para este 3º trimestre (caso você ainda tenha interesse, escrevemos esse relatório a respeito).
Em termos operacionais, sabíamos que este seria um trimestre desafiador, com uma performance fortemente impactada por uma desalavancagem de vendas, principalmente olhando para o GMV 1P.
Colocamos as “cartas na mesa” em nossa prévia de resultados, comentamos e embasamos a dinâmica esperada para cada canal, físico e digital. A Americanas registrou um GMV Total Líquido de R$ 11,79b (-8,3% a/a; +0,1% Est. Genial) nesse 3T22. Sem surpresas, o número veio exatamente conforme esperado em nosso último relatório.
A queda de 8,3% no Volume Bruto de Mercadoria foi reflexo de uma desaceleração das categorias de alto ticket. Quando falamos de Americanas, devemos lembrar que a varejista é bastante sensível à categoria de eletrônicos leves, que são compostos por itens como smartphones (30%~40% do GMV 1P), telas e notebooks. Falamos sobre isso em nosso relatório de atualização de top pick publicado em setembro.
Por ser uma categoria que gira a um ticket médio mais alto e que é muito atrelada ao fornecimento de crédito, a venda de eletrônicos sofreu o impacto de um cenário macroeconômico mais desafiador para o varejo – de um lado, a indústria reajustou o preço de seus produtos, de modo a preservar a sua margem operacional; do outro, as famílias brasileiras, que endividadas e com poder de compra deteriorado, deixaram de consumir esses produtos; o resultado foi um estrangulamento nos dois lados da cadeia.
Segundo a Neotrust, a categoria de eletrônicos caiu 19,6% nesse terceiro trimestre, em comparação com o mesmo período de 2021. A Americanas sentiu essa desaceleração mais do que qualquer outro player do mercado. A companhia reportou um GMV 1P de R$ 3,1b (-32% a/a; +3% Est. Genial).
Apesar da queda de eletrônicos afetar bastante a performance do Digital, a companhia mostrou um crescimento de duplo dígito no número de transações (+22,3%). Ou seja, o consumidor deixou comprar eletrônicos na plataforma, no entanto, continuou adquirindo itens de outras categorias, que giram a um ticket menor. O aumento desse número de transações, no entanto, não foi suficiente para segurar o ticket médio do trimestre, que recuou 22% a/a.
As lojas físicas também não conseguiram fugir do impacto dessa desaceleração de categorias de alto ticket. Quando falamos dos modelos Tradicional e Express, os produtos de eletrônicos leves acabam tendo grande participação nas vendas.
A Americanas reportou um faturamento bruto de lojas físicas de R$ 3,28b (+12,4% a/a; +2,7% Est. Genial). Em nossa análise, o efeito de novas lojas nos últimos 12 meses (232 unidades) foi o principal propulsor de crescimento. A companhia reportou um SSS de -2,7% a/a.
Consolidando os números de lojas físicas e digital, a Americanas registrou uma Receita Líquida de R$ 6,38b (-14,5% a/a; +4,8% Est. Genial). Antes de seguir adiante, separamos os números consolidados e nossa expectativa para o trimestre, confira logo abaixo.
A Americanas encabeçou a estratégia de não crescer a qualquer custo. Mesmo diante de um fraco apetite a compra de produtos de ticket médio mais alto por parte do consumidor, a varejista manteve uma postura comercialmente cautelosa, preservando margem bruta ao crescimento de faturamento neste trimestre.
Em nossa visão, essa foi uma decisão acertada do management, afinal não haveria sentido em ver a Americanas “gastando” sua munição em um período ‘pouco elástico’ considerando que o 4º trimestre pode demandar uma maior demanda por parte do consumidor – Black Friday, Copa do Mundo e Natal.
Mantendo uma postura menos agressiva, a varejista reportou um lucro bruto acima de nossa expectativa, a R$ 1,73b (-12% a/a; +6% Est. Genial), com uma margem bruta de 31,9% (+50 bps a/a; +40 bps Est. Genial).
Frente a uma desalavancagem operacional, a Americanas viu o seu EBITDA retrair fortemente a/a. A companhia reportou um lucro operacional ajustado de R$ 582m (-22% a/a; +5,5% Est. Genial).
Ciente do cenário, a companhia precisou reprogramar a sua estrutura de despesas, de modo a realizar ajustes nos gastos com pessoal, lojas e em marketing no período. Contudo, existe um descasamento entre o “enxugamento” e o report desse 3T22, esperamos ver um impacto positivo dessa otimização a partir desse próximo trimestre.
Diferente do Magalu e Via, como veremos adiante, a Americanas não carrega o risco de crédito em seu resultado e, portanto, não sofre com o PDD em suas despesas operacionais.
Mas, não tem como fugir do peso de despesas financeiras. Com um endividamento bruto de R$ 19,3b e um custo médio de dívida de CDI+2,9% a/a, inevitavelmente, o lucro líquida (ou melhor, prejuízo) da Americanas sofreria forte pressão de sua alavancagem financeira.
Já comentamos a respeito, mas é sempre bom relembrar: com um alto montante de dívida, a Americanas é a varejista que mais se beneficia da queda da taxa Selic, que pode acontecer ao longo do 2º semestre do próximo ano.
A chave para que a companhia entregue valor ao mercado depende de uma ‘realavancagem’ operacional, ou seja, vender mais para diluir despesas e conseguir offsetar sua alta despesa com dívidas. A nossa expectativa é que isso aconteça em 2024. Portanto, a escolha de Americanas para a posição de top pick do varejo e-commerce se baseia em um horizonte de MÉDIO prazo. Mantenha isso em mente!
Voltando à questão de lucro, a Americanas reportou um prejuízo líquido de R$ 212m e uma margem líquida de -3,9% (-380 bps a/a; +178 bps Est. Genial). O número ficou acima de nossa expectativa, devido à incorporação do efeito positivo de R$ 140m no Imposto de Renda vindo do Hortifruti Natural da Terra. Com a incorporação dos CNPJs nesse trimestre, a cifra foi gerada a partir de uma reversão do IR diferido sobre a mais valia dos ativos identificados e, também, da provisão do IR diferido sobre o prejuízo fiscal.
Um ponto sensível
Operacionalmente, o resultado de Americanas não veio fora, em linhas gerais, do que imaginávamos para a companhia. Nossa expectativa era de uma desaceleração de receita e margem. Dito isso, para nós, a dinâmica de consumo de caixa operacional não seria um fator surpresa no curto prazo. No entanto, a intensidade que observamos nesse 3T22 foi desproporcional ao que esperávamos. Enxergamos a linha de Capital de Giro como um ponto sensível nesse trimestre da Americanas.
A companhia viu o seu estoque atingir 107 dias no 3T22, um aumento de 11 dias em comparação ao mesmo período de 2021. Essa dinâmica já era esperada, uma vez que o trimestre apresentou vendas fracas e a companhia precisou reforçar seus estoques para o 4T22, que abrangerá eventos como Black Friday, Copa do Mundo e Natal.
Porém, observamos duas outras dinâmicas nas linhas de capital de giro da varejista: (i) o prazo de pagamento a fornecedores contraiu 7 dias a/a, de forma que a Americanas encerrou o trimestre com 93 dias na linha de giro e (ii) o Contas a Receber da varejista arrefeceu em 29 dias a/a, fruto de uma adoção mais cautelosa na oferta de crédito ao consumo.
Em nossa análise, a redução no prazo de pagamento a fornecedores leva um impacto maior no Capital de Giro da companhia, que não foi compensado pela otimização do contas a receber, de forma a pressionar a necessidade de giro acima do que projetávamos para o 3T22.
Tendo um capital de giro mais pressionado, a companhia efetuou pagamentos aos fornecedores antes mesmo de vender o seu produto. O resultado desse descasamento gerou um consumo de R$ 991m de caixa operacional da varejista no período – respondendo por 46% da queima de caixa no período. No total, o consumo de caixa operacional do período foi de R$ 2,1b.
Observamos um descasamento similar com o Magazine Luiza no 1T22. Esperamos que a Americanas reajuste a sua estrutura de capital de giro ao longo dos próximos trimestres. A constante necessidade de capital de giro pode levar a companhia a precisar de mais financiamento no médio prazo, o que comprometeria em partes a nossa tese de virada para 2024.
Magazine Luiza (MGLU3): o melhor resultado do trimestre
O Magalu reportou um resultado bem alinhado às nossas expectativas para o trimestre. Em nossa visão, considerando os números reportados pela Americanas e pela Via, o Magazine Luiza teve o resultado mais consistente do período, apresentando uma importante recomposição de margens devido ao ganho de escala do digital e melhor performance de lojas físicas.
Como já esperado, o Magalu foi a única varejista a registrar crescimento no GMV Líquido Total, apresentando um Volume Bruto de Mercadorias de R$ 14,15b (+2,2% a/a; -0,4% Est. Genial). Mas não vamos com sede ao pote, esse resultado positivo tem um dedo importante de vias inorgânicas: KaBuM!
Com as vendas da KaBuM! sendo incorporadas ao GMV 1P neste ano, a companhia adiciona um forte volume que não está incorporado nos números do ano passado, dessa forma, a base acaba ficando maior. O Magalu reportou um GMV 1P de R$ 6,73b (+3,5% a/a; +1,5% Est. Genial).
O GMV 3P da varejista segue entregando bons resultados. Com mais de 236 mil sellers (+18% t/t), o Magalu mostra que está pronta para crescer ainda mais o seu digital, criando um ecossistema que se retroalimenta: mais sellers traz mais produtos, que por sua vez traz mais consumidores e, que por fim, atrai o fluxo de mais vendedores para a plataforma.
Com uma maior maturidade do digital, Magalu tem avançado na oferta de novos serviços ao canal. A oferta de serviços agregados como Magalu Ads, Magalu Entregas e Fintech Magalu é uma verdadeira injeção de rentabilidade bruta para a companhia. Impulsionado principalmente pela categoria de moda, o GMV 3P cresceu 0,9% a/a, a R$ 3,53b (-2,9% Est. Genial).
Com uma base comparativa fraca, as lojas físicas mostram leve recuperação nesse trimestre, atingindo R$ 3,88b (+1,4% a/a; -1,3% Est. Genial). O SSS ainda é negativo, a -3,6% a/a.
Juntando as peças, Magalu reportou uma Receita Líquida de R$ 8,81b (+2,4% a/a; +1,5% Est. Genial). Confira a tabela de expectativas vs. consolidado abaixo.
Importante destaque para a recomposição de margem bruta da companhia. Com o repasse gradual da inflação de custos para o preço final dos produtos somado ao crescimento da receita de serviços – reflexo de uma maior rentabilidade do marketplace –, o Magalu registrou um lucro bruto de R$ 2,45b (+15,3% a/a; +13,7% Est. Genial) e uma margem bruta de 27,9% (+774 bps a/a; +273 bps Est. Genial).
Os efeitos positivos do enxugamento de despesas (marketing e logística) começam a aparecer nesse trimestre. As despesas com vendas mostra uma redução de 0,8 p.p. comparada ao mesmo período de 2021.
Por outro lado, com o investimento no digital e frente a consolidação das empresas adquiridas nos últimos 12 meses, as despesas gerais e administrativas ainda trazem impacto de 1,2 p.p. para a margem EBITDA a/a. Esse efeito negativo se soma ao aumento de 85% a/a nas provisões para Perdas em Créditos de Liquidação Duvidosa, reportado em R$ 58,8m nesse 3T22.
No frigir dos ovos, a forte recomposição de margem bruta mais do que compensa a pressão das despesas para o lucro operacional. O Magalu reportou um EBITDA aj. de R$ 528m (+294% a/a; +10,6% Est. Genial), com uma margem operacional de 6% (+443 bps a/a; +43 bps Est. Genial).
Apesar da melhora operacional, o alto patamar de juros fez com que as despesas financeiras crescessem mais do que três vezes, em comparação anual. Com isso, a companhia não conseguiu fugir do vermelho no trimestre, apresentando um lucro líquido contábil de R$ 167m (+17,6% Est. Genial) e uma margem líquida de -1,9% (-24 bps Est. Genial).
Em visão ajustada (desconsiderando os efeitos não recorrentes), o resultado líquido foi negativo em R$ 146m, bem próximo à nossa estimativa.
Diferente da Americanas, o Magalu mostra um maior controle sobre o Capital de Giro neste trimestre, com um delta entre a linha de estoques e fornecedores em 2 dias. Essa melhor otimização de estrutura somado a recomposição de margens operacionais traz uma evolução no caixa operacional do Magalu, ficando positivo em R$ 324m nesse 3T22.
Via (VIIA3): Resultado é neutro, mas a direção é positiva
Faz exatos 12 meses em que a Via assustou o mercado com o reconhecimento de uma despesa trabalhista de mais de R$ 2b. Desde então, a companhia embarcou em uma verdadeira jornada de enxugar custos, despesas e reconhecer seus devidos créditos tributários – +R$ 401m monetizados nesse 3º trimestre .
Enxergamos que, dentro de suas limitações, a Via tem caminhado para uma rentabilização de suas operações. Com uma estrutura de custos e despesas mais enxutas, a varejista mostrou mais um trimestre de forte recomposição operacional.
O top line da Via não teve surpresas. Sequencialmente, as lojas físicas da varejista continuam a apresentar a melhor produtividade líquida do setor de varejo e-commerce. Com um faturamento bruto de R$ 5,12b (+3,7% a/a; -1,7% Est. Genial), este canal avançou 8 p.p. a/a em participação no GMV Líquido Total da companhia.
A fraca performance do digital é resultado de uma transição do marketplace da Via. A medida que a Via avança na comercialização de produtos de “cauda longa”, e estes giram a um ticket muito menor do que os produtos “core”, não esperamos ver um aumento significativo de volume de vendas de modo a compensar esse menor ticket.
Apesar do GMV 3P recuar 42% a/a, a companhia mostra um crescimento de 6,5% na receita deste canal, reflexo de um maior nível de take-rate médio, que saiu de 6,2% para 11,5% em um ano. O canal segue em break-even. Em um momento de fragilidade macroeconômica, tenha em mente que ser rentável é mais importante do que crescer a qualquer custo.
Na soma das partes, a Via apresentou uma Receita Líquida de R$ 8,29b (-4,4% a/a; +0,5% Est. Genial). Confira a tabela entre os números consolidados e esperados para a varejista.
Em relação ao lucro bruto, existem três fatores que precisam ser destacados: (I) a maior penetração de lojas físicas, naturalmente, traz uma margem bruta maior; (II) a melhor monetização do marketplace também é positivo para margem; (III) a desalavancagem operacional joga contra o crescimento do lucro bruto. A Via reportou um lucro bruto em linha com as expectativas, a R$ 2,15b (+0,6 a/a; -0,7% Est. Genial).
Vamos precisar citar o termo desalavancagem operacional duas vezes. Frente a retração de vendas no período, a companhia não conseguiu manter aquele efeito de diluição de despesas com vendas que apresentou no 1º e 2º trimestre deste ano, onde as despesas com vendas representaram 18,8% e 19,8% da receita líquida, respectivamente.
Neste trimestre, as despesas com vendas atingiram 22,5% da receita líquida do período, o que ainda assim mostra uma evolução de +7,6 p.p. na comparação anual. As despesas gerais e administrativas saíram de 4,6% em 3T21 para 3,6% nesse trimestre.
Assim como o Magalu, o aumento do PDD (R$ 658m) também impactou a margem operacional da Via. Esse aumento de provisionamento é explicado em (I) função do aumento da carteira em R$ 800m vs. 3T21 e (II) piora da inadimplência do mercado como um todo.
Em linhas contábeis, a Via reportou um EBITDA aj. de R$ 390m, com uma margem EBITDA de 5,6%. Se adicionarmos os ajustes não recorrentes (atualização de processos trabalhistas), o lucro operacional da companhia seria de R$ 475m e uma margem de 6,8% no trimestre.
Diante de uma taxa Selic estruturalmente maior, as despesas financeiras da Via mais do que dobraram, ano contra ano. Com isso, a varejista também não conseguiu fugir do prejuízo nesse trimestre. A companhia apresentou um prejuízo líquido de R$ 203m (-68% a/a; -8,5% Est. Genial) e uma margem líquida de -2,9% (+580 bps a/a; +30 bps Est. Genial).
Com a linha de Capital de Giro mais equilibrada, a companhia encerrou o trimestre com uma geração de R$ 2,3b de caixa operacional. Destaque para a redução da posição de estoques frente ao 2T22.
No entanto, ao olharmos para a geração de caixa livre vemos uma queima de R$ 549m de caixa, reflexo de um forte consumo de caixa nas atividades de financiamento.