Na segunda-feira, 14 de agosto de 2024, as ações da Azul (AZUL4) sofreram uma queda abrupta de 24,14% após a divulgação de uma notícia pela Bloomberg. A reportagem sugeriu que a companhia aérea estaria considerando diversas opções para lidar com sua dívida, incluindo uma oferta de ações e a solicitação de proteção contra credores nos EUA, conhecida como Chapter 11. Durante o call de resultados do 2T24, a gestão da Azul já havia comentado sobre as preocupações com os passivos diferidos do período da pandemia e as renegociações necessárias com os credores, dado que o preço das ações da Azul estava significativamente abaixo do valor de R$ 36 acordado para a conversão da dívida em equity. Com um balanço mais fragilizado pela desvalorização do real, a notícia gerou uma forte reação imediata e negativa no mercado.
Algumas horas após o fato, a Azul realizou uma reunião com analistas e investidores para esclarecer os recentes eventos que levaram a uma queda acentuada das ações da companhia. A reunião foi conduzida pelo CEO e CFO da Azul, que trouxeram mais detalhes importantes sobre as estratégias da empresa e a resposta à notícia divulgada pela Bloomberg. Durante a reunião, os executivos da Azul esclareceram que a empresa não tem planos de solicitar proteção contra credores sob o Chapter 11 nos EUA. A notícia publicada pela Bloomberg, que sugeriu o contrário, foi considerada uma “representação errônea” da situação. Os executivos enfatizaram que a Azul está focada em fortalecer seu balanço e buscar soluções comerciais que evitem qualquer necessidade de reestruturação judicial. Entendemos a queda, mas esclarecemos que não achamos justificada.
Com um balanço mais fragilizado pela desvalorização do real, a notícia acabou gerando uma forte reação imediata e negativa no mercado, que deve ser revertida na sequência. Porém, os executivos destacaram que os lessores, como Avalon e Air Cap, que continuam a fornecer aeronaves para a Azul, têm interesse em ver a companhia financeiramente forte a longo prazo. A renegociação está focada em ajustar a estrutura de capital de maneira que permita à Azul continuar operando de forma robusta, evitando a necessidade de medidas extremas como o Chapter 11.
Renegociação com Lessores
O passivo total relacionado à dívida da Azul, incluindo aqueles deferidos e atrelados à conversão em equity, estava vinculado a aproximadamente US$ 600 milhões. Esses passivos foram inicialmente acordados durante o período da pandemia e posteriormente renegociados em 2023 com a expectativa de conversão em ações, caso o preço das ações atingisse o patamar de R$ 36,00. Com a desvalorização das ações e a depreciação do real frente ao dólar, esses passivos precisam ser renegociados. Nessa condição, a diluição esperada para os acionistas seria ~18% do capital social da companhia.
Contudo, devido à significativa queda no preço das ações da Azul, que recentemente estavam sendo negociadas perto de R$ 6,00 por ação, a diluição resultante da conversão se tornou um ponto crítico de discussão. Durante o call, foi mencionado que a Azul está em negociações com os lessores para limitar esse efeito, buscando um acordo para fixar a quantidade de ações a serem emitidas, o que evitaria uma diluição ainda maior e forneceria mais clareza e previsibilidade ao mercado. A nova diluição esperada estaria em torno de 20-30%, ou seja, ligeiramente maior que os 18% originalmente projetados, mas muito abaixo do que seria necessário se a conversão fosse realizada ao preço de mercado atual sem um acordo de limitação.
A Azul informou que está em negociações ativas com seus principais lessores, que representam 98% da estrutura de dívida conversível em equity da companhia. O CEO mencionou que, ao contrário do que a Bloomberg sugeriu, a Azul está propondo um acordo comercial para encerrar a dívida em um montante fixo de ações. Os executivos da Azul abordaram a importância da conclusão do pagamento dos diferimentos e como isso pode impactar a percepção do mercado em relação ao balanço da companhia. Eles destacaram que a estrutura de dívida vinculada a esses diferimentos, especialmente aqueles relacionados à conversão em equity, criou uma complexidade adicional no entendimento do balanço da Azul.
A conclusão desses pagamentos, por meio de um acordo comercial com os lessores, onde a dívida seria liquidada em um montante fixo de ações, ajudaria a simplificar a estrutura de capital da Azul. Isso, por sua vez, permitiria ao mercado ter uma visão mais clara e direta da saúde financeira da empresa. Além disso, a conclusão desse processo reduziria a preocupação com a diluição contínua, tornando mais fácil a compreensão da verdadeira alavancagem e a capacidade de geração de caixa da companhia. Essa clareza é crucial para estabilizar as ações da Azul e recuperar a confiança do mercado..
Assim como afirmamos em 2023, esse acordo é benéfico para a Azul, pois permite que a empresa elimina o “overhang” das incertezas do tamanho da diluição e evitam a necessidade de liquidar essas obrigações em dinheiro. Esperamos que o mercado reavalie a situação de maneira mais favorável.
Novas estratégias de captação de recursos
Outro ponto abordado foi o impacto da depreciação do real em relação ao dólar, que afetou significativamente a dívida da companhia. Com o real desvalorizado, a dívida denominada em dólar aumentou, pressionando ainda mais o balanço da Azul. A empresa já havia anunciado uma capacidade adicional de captação de recursos utilizando Azul Cargo como garantia primária no montante de até US$ 800 milhões, para mitigar a necessidade de caixa. Esses recursos são fundamentais para fortalecer o balanço da companhia sem a necessidade de recorrer ao mercado de ações em níveis de preços desfavoráveis.
Outras fontes de liquidez também estão disponíveis. Ontem, o Congresso brasileiro aprovou o projeto de lei que permite que as companhias aéreas tenham acesso a linhas de crédito recorrentes apoiadas pelo Fundo Nacional de Aviação Civil (FNAC). Os executivos mencionaram um pacote financeiro aprovado pelo governo brasileiro, que oferece R$ 5 bilhões anuais em crédito para o setor aéreo. Esse pacote foi aprovado na noite passada e a Azul pretende utilizar essa linha de crédito para sustentar suas operações e reforçar sua posição de caixa.
Cenário revirado de cabeça para baixo
É importante ressaltar que a Azul enfrentou uma sequência de eventos não recorrentes que contribuíram significativamente para que a companhia errasse suas projeções para 2024. Esses eventos inesperados tiveram impactos substanciais tanto nas operações quanto nas finanças da empresa, levando a uma revisão das expectativas ao longo do ano:
Desvalorização do Real: A forte desvalorização do real frente ao dólar foi um dos principais eventos que impactou negativamente a Azul. A companhia possui uma grande parte de sua dívida denominada em dólar, o que aumentou significativamente o montante da dívida em reais. Essa desvalorização pressionou as finanças da empresa, aumentando os custos financeiros e contribuindo para uma maior alavancagem.
Enchentes no Rio Grande do Sul: as enchentes no Rio Grande do Sul resultaram na interrupção das operações da Azul em uma parte significativa de sua malha, causando uma redução de cerca de 10% dos volumes de voos e, consequentemente, nas receitas. Esse evento climático inesperado afetou diretamente a capacidade da empresa de manter sua oferta de assentos e pressionou os yields.
Atrasos na Entrega de Aeronaves: comprometeu sua capacidade operacional, especialmente no segmento internacional. Esses atrasos impediram a empresa de expandir sua oferta conforme planejado, impactando negativamente o crescimento esperado de ASK em 2024.
Estratégia de Consolidação
A Azul já havia explorado anteriormente a possibilidade de fusão com outras companhias aéreas, como a Gol, e essas conversas têm ganhado força, especialmente considerando o contexto em que a Gol tenta se recuperar. Essas conversas ganharam destaque durante o call e são vistas pela Azul como parte de uma estratégia mais ampla de sobrevivência e fortalecimento das companhias envolvidas, especialmente em um ambiente desafiador marcado por alta dívida e condições macroeconômicas adversas.
As negociações mencionadas entre a Azul e o Grupo Abra, que atualmente é o maior acionista da Gol, trazem à tona a possibilidade de uma consolidação significativa no setor aéreo brasileiro. Durante o call, os executivos da Azul confirmaram que estão mantendo discussões com a Abra para explorar possíveis parcerias ou combinações de negócios em um possível movimento de consolidação, mas destacaram que essas negociações estão em estágios iniciais e que a Azul continua comprometida em operar como uma empresa independente.
Vemos uma possível fusão com a Gol como uma oportunidade para criar uma empresa mais robusta, com mais pricing power e melhorar a geração de caixa.