A Cielo reporta os resultados do 2T23 no dia 01/ago após o fechamento de mercado. Apesar de uma forte desaceleração de volume (TPV) nesse trimestre, bem acima do esperado, acreditamos que o resultado da Cielo venha com uma evolução sequencial de receita e lucro devido a um aumento de preço feito no final do 1T23 e mudança regulatória no intercâmbio do cartão pré-pago que beneficiou as adquirentes.
Para este trimestre, estimamos que a Cielo reporte um forte lucro reportado não-recorrente de R$ 722m (+64% t/t e +13,7% a/a), beneficiado em grande parte pela decisão recente do STF (Supremo Tribunal Federal) em relação ao Imposto Sobre Serviços (ISS) no montante de aproximadamente R$ 230m (líquido de imposto). A decisão do STF definiu que o imposto seja pago para o município sede da companhia e não do lojista. Como comentamos em nosso relatório, a sede da Cielo fica em Barueri-SP, onde a alíquota é mais baixa. Assim, para este trimestre, deve ocorrer uma reversão dos provisionamentos passados, já que a empresa provisionava os valores excedentes ainda não pagos aos municípios fora de Barueri.
Para o lucro recorrente, que não inclui o valor do ISS, estimamos um montante de R$ 492m (+12% t/t e +28,4% a/a) com uma rentabilidade (ROE) de 17,3%, beneficiado pela mudança da regra do intercâmbio do cartão pré-pago e pela reprecificação realizada no final do 1T23, além de uma melhora no resultado dos produtos de antecipação. Do lado negativo, o TPV apresentou uma contração na comparação anual devido ao cenário macroeconômico mais desafiador e perda de market share em grandes empresas.
Apesar de menos intensa que antes estimado na nossa prévia do 1T23, a Cielo passa por uma melhora de fundamentos, mas com uma mudança de história de investimento, passando de uma fase de crescimento de volume de cartões (TPV) para uma narrativa de melhora na precificação (taxa de intercâmbio liquida). No entanto, a queda de volumetria (TPV) mais forte que esperado acende um sinal amarelo com um potencial aumento concorrencial para suprimir a queda de demanda.
No entanto, acreditamos que os preços atuais das ações da Cielo já incorporam esse pessimismo e entendemos que o valuation está interessante. Por isso, no momento, reiteramos nossa recomendação de COMPRAR com preço alvo de R$ 5,65. Vemos as ações atrativas negociando apenas 5,75x P/L 23E e 5,48x P/L 24E.
Valuation: Muito barato para ignorar…
O valuation da Cielo (holding) aparenta estar bem atrativo, precificando um cenário muito pessimista para a companhia. Como exercício hipotético, realizamos o valuation da Cateno, que compõe a holding junto com a Cielo Brasil. Em nossas estimativas, considerando o modelo de Gordon de 1 estágio com um crescimento na perpetuidade de 5% aa, um custo de capital (ke) de 14,3% e um payout de 100% (montante que a Cateno distribui), chegamos a um valor justo de R$ 10,13b para a participação que a Cielo holding detém da empresa de 70%. Considerando o valor de mercado da Cielo de R$ 13,3b e o valuation da Cateno de R$ 10,13b, a Cielo Brasil (adquirência) estaria precificada em apenas R$ 3,19b.
Com base no nosso exercício de valuation, a Cateno negociaria a 11,3x lucro esperado para 2023. Portanto, usando esse parâmetro, o mercado hoje precifica a Cielo Brasil em apenas 2,2x lucro.
O nosso Preço Alvo de R$ 5,65 para as ações de CIEL3 já incorpora um forte pessimismo com um custo de capital (ke) de 17%. Usando nosso Preço Alvo e o valuation de Cateno de R$ 10,13b, a Cielo Brasil estaria negociando a atraentes 3,7x lucro, o que em nossa visão continua sendo conservador.
Olhando para dados históricos, o valor de mercado da empresa tem uma forte correlação com o lucro. O que estamos vendo no momento é um descolamento entre o lucro (que está melhorando) com seu valor de mercado, que está em queda. O valor da empresa está se distanciando de seus fundamentos, talvez por medo de uma piora no ambiente competitivo.
Continuando com a visão histórica, a empresa está negociando próximo do seu menor nível de P/L de sua história. Apesar de acreditarmos que os fundamentos da Cielo mudaram em relação ao passado e com isso a média histórica de P/L não seria uma boa referência, entendemos que o meio termo entre a média histórica e -1x desvio padrão seria um bom indicativo de valor. Assim, se considerarmos um P/L de 8,1x para 2023e, estamos dizendo que o valor da Cielo seria de R$ 18,8b ou R$ 6,9 por ação, ficando acima do nosso target mais conservador e com um upside de 41% em relação ao preço de mercado.
Por fim, vemos a Cielo negociando apenas 5,8x P/L 2023 com base em nossas estimativas, enquanto Stone e Pag Seguro negociam bem acima com base nas projeções do mercado. Em nossa visão, o desconto excessivo da Cielo para os múltiplos de Stone e Pags não é justificado.
Competição: Continua acirrada
A competição do segmento de adquirência continua acirrada, mas já há algum tempo a Cielo decidiu abrir mão de share subsidiado para focar em rentabilidade. Assim, a empresa tem perdido participação de mercado no segmento de grandes empresas e longtail (microempreendedores) para focar em Pequenas e Médias Empresas (PMEs), já que esse segmento possui melhor rentabilidade.
Essa estratégia é interessante para os investidores, já que uma rentabilidade acima do custo de capital gera maior valor para os acionistas. Porém, esperamos que a Cielo deva perder um pouco de share em PMEs no 2T23, devido a maior força comercial dos concorrentes no período.
Acreditamos que a competição no segmento poderá se acirrar nos próximos trimestres, principalmente com Rede adentrando o segmento PME e o Mercado Pago dando sinais de entrada, mas ainda no fundo da pirâmide. Por outro lado, a Cielo tem começado a reagir, dando início a contratação de mais 400 a 1000 pessoas para a área comercial além dos 400 hunters recém contratados no 4T22/1T23, que acreditamos que será essencial para a empresa conseguir dar um ponto final na perda de share e talvez voltar a conquistar mercado no segmento foco no curto/médio prazo.
Volume: Pressionado pela perda de share
Esperamos que o volume transacionado (TPV) apresente uma queda de 6% a/a no 2T23, com pressões do cenário macroeconômico desafiador e perda de market share, principalmente em grandes contas. Por outro lado, projetamos que o TPV tenha um leve aumento de 3% t/t, beneficiado pela sazonalidade e baixo crescimento anual do trimestre passado.
Receita: Auxiliada pelo intercâmbio e reprecificação
Apesar de um volume mais fraco, esperamos que a receita líquida pós pré-pagamento apresente um crescimento de 18,6% t/t e 26,1% a/a, impulsionado pelo efeito da regulação do intercâmbio que deve aumentar o yield em 4-5 bps e pela reprecificação realizada ao final de mar/23 que deve aumentar em mais 1 bp, assim esperamos um yield de 0,83%. Além disso, a receita gerada pelo ARV (antecipação de recebíveis) deve apresentar melhora devido ao maior volume e um spread ligeiramente maior.
Despesas: Maior, mas por um bom motivo
Acreditamos que o 2T23 deve apresentar um forte crescimento de despesa em relação ao primeiro trimestre do ano devido à alguns fatores:
- No 1T23 teve uma movimentação de provisão que reduziu a linha, logo o 2T23 não deve ter esse impacto, o que irá aumentar naturalmente o valor reportado das despesas;
- As 400 pessoas contratadas para a área comercial têm impacto cheio no segundo trimestre do ano;
- As despesas de marketing devem voltar a patamares mais normais, já que no trimestre passado houve uma redução por conta de um concorrente ter feito uma forte campanha no Big Brother Brasil.
Nossas projeções incorporam um aumento de 10,4% t/t e 25,2% a/a nas despesas totais, atingindo um total de R$ 2b. Apesar do aumento, acreditamos que os gastos com equipe comercial e marketing devem auxiliar a Cielo no curto/médio prazo a estancar e voltar a conquistar market share.
Lucro: ISS deve ajudar o trimestre
Apesar de acreditarmos que o 2T23 tenha um volume financeiro mais fraco e um crescimento significativo nas despesas, o lucro reportado deve apresentar um forte crescimento de 64% t/t e 13,7% a/a, atingindo o total de R$ 722m, puxado pela melhora no yield/take rate beneficiando a geração de receita, além do impacto do ISS que deve beneficiar o lucro do trimestre em aproximadamente R$ 230m. Já o lucro recorrente deve apresentar uma boa expansão de 11,7% t/t e 28,4% a/a, ficando em R$ 492m.
Importante destacar que o ISS deve beneficiar a empresa no longo prazo, já que não terá que realizar mais provisões em relação a este tema.