A Tenda reportou um resultado fraco neste primeiro trimestre, como já era esperado após a notícia de revisão orçamentária no 4T21, que revelou margens muito mais pressionadas do que vinham sendo reportadas e levou a um prejuízo de R$ 191m em 2021. O principal motivo para um quarto trimestre que assustou o mercado e levou as ações da Tenda a caírem mais de 60% desde então foi a revelação e revisão de uma política orçamentária que não considerava adequadamente os efeitos da inflação nos custos de obra, uma vez que não se fazia necessário considerar tais efeitos em períodos de inflação “normal”.
Por entre grupos de investidores pessoa-física, temos visto frequentemente a ideia de que as ações de Tenda estão excessivamente descontadas e espera-se um ganho fácil com a mentalidade de “caiu, comprou”. Na nossa visão, não vemos esta queda como uma oportunidade e entendemos a situação atual da Tenda como delicada e sem triggers este ano que possam favorecer os papéis de Tenda de forma significativa, ou seja, não vemos motivo para fechamento do desconto ainda. Aproveitamos para reiterar nossa recomendação de Manter e atualização do preço alvo de TEND3 para R$ 6,00. Abaixo destacamos alguns pontos principais que baseiam nossa opinião:
- Repasse de preços: por focar no grupo 2 do Programa Casa Verde e Amarela (PCVA), a Tenda tem uma maior dificuldade de repassar preços para recuperar rentabilidade, uma vez que há um limite máximo de preço em cada empreendimento para que este se enquadre dentro do grupo (calculado a partir do comprometimento máximo de 30% da renda familiar). Além disso, seu público alvo é mais sensível ao aumento de preços, nos levando ao próximo ponto
- Dependência de reajustes do PCVA: os subsídios oferecidos pelo PCVA diminuem o valor a ser financiado pelo comprador do imóvel e portanto a sua parcela mensal (<30% da sua renda), possibilitando que a Tenda aumente os preços dos imóveis. No nível atual, mesmo após 2 revisões este ano, a Tenda ainda deve continuar com margens relativamente baixas, e depende de novas e constantes revisões das curvas de subsídio enquanto perdurar a alta da inflação
- Inflação segue muito elevada: a expectativa de arrefecimento da inflação no início deste ano não tem se concretizado. O INCC voltou a subir em abril, saindo de 11,47% em março para 11,52% (acumulado 12 meses). O preço de materiais (e.g. aço e cimento) tiveram aumento significativo em abril e alguns ainda estão abaixo dos preços internacionais, podendo provocar novos aumentos e pressionando ainda mais os custos da Tenda.
- Momento de cautela: em razão do resultado de 2021, a companhia agora deve agir com cuidado, focando em recuperação da rentabilidade em detrimento ao volume. Ou seja, mesmo que a rentabilidade volte a subir este ano e milagrosamente atinja margens iguais às de 2019, ainda deve levar vários trimestres para que os lançamentos retomem a um patamar mais elevado
- O desconto não é tão grande assim… A Tenda negocia a 0,43x P/BV e vem apresentando prejuízos que devem aumentar este número. Dentro do próprio setor de construção civil encontramos outras empresas também muito descontadas e que não estão passando por dificuldades, por exemplo, a Mitre (MTRE3: 0,54x P/BV) e Moura Dubeux (MDNE3: 0,48x P/BV)¹.
¹ Apesar de atuarem em segmentos e modalidades de financiamento diferentes, utilizamos ambas as empresas apenas como exemplo de desconto elevado no setor. Por completude, ressaltamos que em momentos típicos, a Tenda tende a negociar a múltiplo P/BV mais elevado que empresas do segmento da Mitre e Moura Dubeux, em virtude de um modelo de negócios mais asset light.
É claro, existem fatores que podem jogar contra a nossa recomendação, mas acreditamos que a chance de ocorrerem é baixa. Destes, destacamos dois: arrefecimento acelerado da inflação ainda em 2022 e ajustes agressivos no PCVA.
E como foi o trimestre?
Dito tudo isso, mesmo com um trimestre fraco, já tivemos uma reação muito negativa do mercado na última semana na expectativa dos resultados, o que pode levar a uma reação branda na abertura amanhã. As prévias operacionais já indicavam um nível de lançamentos mais baixos, que ficou em R$ 467m (-44% t/t e -23,5% a/a), levando a um resultado de vendas também mais baixo de R$ 579m (-26% t/t e -17,8% a/a) e a uma receita de R$ 581m.
Neste trimestre, ainda vemos pressão dos custos que levou a uma margem bruta ajustada baixa de 20,6%, mesmo após uma revisão da curva de subsídios do PCVA. Para o segundo trimestre, podemos ver uma melhoria em função de uma nova revisão dos subsídios aprovada no final do trimestre, além da expectativa de novas revisões ainda em 2022. Mesmo assim, não esperamos que estas mudanças provoquem um aumento significativo de margem sem perda de VSO. Nossa visão se corrobora com a queda da VSO neste primeiro trimestre, que caiu para 26,5% (-5,4p.p. t/t e -5,0p.p. a/a) em função do aumento dos preços das unidades vendidas. Outro ponto que merece atenção é o fato de que apenas 5,8% (-9,8p.p. a/a) das vendas no trimestre foram lançadas neste trimestre. Isso significa que apenas 7% (R$ 34m) do que foi lançado no 1T21 foi vendido, representando uma VSO de lançamentos muito fraca.
A queima de caixa veio como uma surpresa muito negativa, provocando um aumento de R$ 265m na dívida líquida da Tenda, que chegou a um nível de endividamento de 52% do PL – muito acima do target de -10% a 10%. O aumento do endividamento líquido impactou e continuará impactando o resultado financeiro, que veio em -R$37,5m. Assim, a Tenda fechou o trimestre com prejuízo de R$ 67m e segue pressionada. As margens baixa e prejuízo levam a companhia a focar em melhorar a rentabilidade dos seus produtos em detrimento ao volume, assim, devemos ver lançamentos mais fracos e números minguantes no top line.