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    Publicado em 04 de Agosto às 22:32:56

    Locadoras | (RENT3) e (MOVI3): Genial Index de Depreciação de Veículos

    Nos últimos três anos, a indústria automobilística brasileira tem enfrentado períodos de alta volatilidade, seja pelos gargalos na cadeia produtiva causados pela pandemia, pela deterioração do mercado de crédito ou pela entrada de veículos chineses no mercado brasileiro. Todos esses eventos afetaram diretamente o preço dos veículos, tanto novos quanto usados. Agora, o mercado se questiona se as locadoras erraram no timing de compra de veículos, dado o novo patamar de depreciação dos ativos. Diante deste cenário, acompanhar a variação dos preços dos carros se tornou não apenas uma tarefa extremamente complexa, mas também cada vez mais importante para as locadoras e investidores.

    Recorrentemente, temos observado que o IPCA de carros usados não reflete o comportamento dos preços dos veículos das empresas listadas. Isso porque a metodologia do IPCA de usados parte das transações entre veículos, contabilizando vendas desde os mais novos aos mais antigos em sua base de dados. Com a aceleração do envelhecimento da frota brasileira de veículos, cada vez mais os dados do IBGE refletirão menos o comportamento real da depreciação do mix das locadoras.

    Para refinar nossa análise, decidimos realizar um estudo aprofundado, olhando para o comportamento de preços especificamente no mix de compra das grandes locadoras. Desenvolvemos o Índice Genial de Depreciação de Veículos, que monitora os modelos de carros mais emplacados e acompanha a desvalorização nos 12 meses seguintes. Nosso índice tem mostrado que, nos últimos 12 meses, os veículos premium se desvalorizaram quase duas vezes mais que os populares; além disso, algumas marcas específicas têm sofrido muito mais que outras.

    Observamos que a Localiza parece estar mais exposta à desvalorização de veículos premium. Por outro lado, a Movida vem adotando uma postura mais conservadora em relação ao mix da compra e ao nível de depreciação de seus carros no RAC.

    Acreditamos que em breve, haverá menos pressão no mercado de usados nos próximos meses devido à forte desvalorização cambial, à implementação de medidas protecionistas contra a entrada de veículos chineses e à recuperação gradual da demanda

    Uma breve recapitulação do que nos últimos 3 anos?

    Durante a recuperação da atividade econômica, potencializada pelos estímulos monetários e fiscais no pós-pandemia, observamos forte disrupção de cadeias produtivas. A guinada do zero para o cem em poucos meses acabou resultando em uma falta generalizada de insumos. Naturalmente, esses efeitos respingaram diretamente na indústria automobilística. Com uma produção limitada e liquidez global anabolizando a demanda, vimos os preços dos carros dispararem no mundo todo. No Brasil, especificamente, o fator câmbio também exigiu um novo patamar de preços.

    Assim, com a rápida recuperação da economia, os preços dos carros, tanto novos quanto usados, chegaram a patamares nunca antes vistos, influenciados também pela queda na taxa de juros e alta no câmbio. Além dos fatores exógenos, houve também uma mudança no mix de venda das montadoras. Mesmo após a reabertura da China, a escassez de semicondutores seguiu sendo amplamente citada como um dos fatores para a limitação da produção de veículos, que, na nossa visão, foi utilizada como justificativa para ajustar a produção e aumentar os preços. A escassez realmente existiu, mas de certa forma foi exagerada. Naquele momento, víamos as montadoras direcionarem os semicondutores disponíveis para os modelos mais caros, que oferecem maior margem de lucro, enquanto os modelos mais acessíveis foram temporariamente descontinuados.

    A estratégia de aumento de preços foi adotada para manter a rentabilidade, mesmo que isso significasse uma redução na participação de mercado. Um exemplo dessa estratégia foi o aumento de preços dos carros da PSA (Peugeot Citroen) ao longo dos últimos quatro anos, executado pela Stellantis. A empresa acabou priorizando a lucratividade sobre a participação de mercado. Essa abordagem foi seguida por outras montadoras, que viram resultados positivos em termos de lucro, apesar de venderem menos carros. Após dois anos de valorizações estratosféricas, os preços dos carros voltaram a se comportar de forma mais controlada. A recuperação das economias mundo afora também trouxe consigo um efeito inflacionário que obrigou os bancos centrais a rapidamente elevarem suas taxas básicas de juros. Esse aumento sincronizado dos juros globais tem gerado uma desaceleração nas principais economias do mundo. Naturalmente, essa desaceleração tem trazido os preços dos carros para um patamar de normalização.

    Além desse cenário global mais desafiador, no Brasil, vários eventos e ruídos culminaram numa demanda mais fraca para compra de carros. Por exemplo, tivemos uma piora substancial no mercado de crédito, principalmente por conta do caso Americanas, que fez com que os bancos aumentassem a cautela em relação à concessão de crédito. Potencializando esse evento de crédito, a manutenção dos juros em patamares mais elevados contribuiu com o aumento na inadimplência e consequente redução da concessão de crédito. De maneira mais secundária, as eleições presidenciais de 2022 aumentaram ainda mais as incertezas e, consequentemente, levaram a uma certa redução na atividade econômica.

    Visando reduzir o preço dos veículos populares, salvar a atividade no setor automotivo e renovar a frota circulante, o governo aprovou, em junho de 2023, a MP dos carros populares. Essa medida resultou em descontos de R$ 2 mil a R$ 8 mil no valor de aquisição de veículos populares. Assim como no passado, houve um reajuste para baixo dos preços dos carros usados.

    Para se ter uma dimensão do impacto da MP dos populares em um passado recente, o impacto de medidas semelhantes nas operações da Localiza. Em 2009, durante o governo Lula II, houve uma isenção de IPI que resultou em um impairment de cerca de 46% do valor total da frota da companhia. Em 2012, uma medida semelhante de redução de IPI acarretou um reconhecimento de perdas de cerca de 71% do valor da frota da empresa. Após a MP dos populares em 2023, a Localiza teve de realizar um impairment com impacto negativo entre R$ 575 milhões e R$ 650 milhões (cerca de 13% do valor da frota).

    O aumento da competição entre as montadoras

    Com o colapso do setor imobiliário chinês, um forte componente do crescimento recente do país, é iminente que essa queda no setor traga uma mudança de rotas por parte do governo chinês. Dada a flexibilidade das usinas chinesas, grande parte da produção de aço chinês tem sido direcionada a bens duráveis, como automóveis, maquinários e equipamentos eletrônicos.

    Apesar da China já ser a maior fabricante de veículos do mundo, o governo ainda tem ambiciosos projetos de crescimento no setor. O governo tem incentivado o setor tanto no mercado interno, por meio da concessão de descontos, quanto no mercado externo, pela liberação de subsídios às fábricas exportadoras. Em 2023, as vendas internas cresceram 12%, enquanto as exportações avançaram 58% quando comparadas ao ano anterior.

    Como grande parte dos veículos chineses são híbridos ou elétricos, grande parte da frota de chineses se enquadrava na MP 1.205, que liberava R$ 19 bilhões em incentivos fiscais para o setor automotivo. Com a apropriação dos benefícios, houve uma forte entrada de veículos chineses no mercado de automóveis brasileiro, de tal maneira que a China aumentou de 7% para 26% sua participação de mercado no Brasil.

    O crescimento das exportações chinesas para o Brasil está fortemente ligado ao aumento da demanda por veículos elétricos e híbridos. A China tem se destacado globalmente como um dos maiores produtores e exportadores de veículos elétricos, potencializada pelos subsídios do governo chinês.

    O lado negativo desse movimento é a queda gerada na exportação de veículos, ou seja, o Brasil aumentou o número de importações de veículos e diminuiu as exportações, também demonstrando um certo enfraquecimento da indústria local. Essa conjuntura exigiu que o governo introduzisse medidas protecionistas, não apenas reduzindo os incentivos nas fábricas instaladas no Brasil, mas também aumentando os impostos sobre carros importados.

    Mudança no mix: um efeito de oferta ou de demanda?

    Além da forte inserção de veículos chineses no mercado brasileiro, também observamos um aumento no percentual das vendas de SUVs. Nos anos 90, houve um fenômeno de crescimento de SUVs nos EUA, principalmente pelo crescimento das famílias que precisavam de carros maiores para atender às suas necessidades. No Brasil, essa tendência tem se consolidado, porém não pelo aumento da demanda por SUVs, mas sim pelo fato de que esses modelos oferecem maior margem para as montadoras.

    Esse novo patamar de preços dos carros de entrada zero km têm gerado uma busca cada vez maior do consumidor por carros usados e mais velhos. Com o mercado de usados se consolidando no Brasil, temos um efeito colateral que preocupa: o envelhecimento rápido da frota. De acordo com a Fenauto, desde o início do ano houve um aumento de 72% nas unidades vendidas de usados e a expectativa segue sendo de um mercado aquecido.

    Com o consumidor cada vez mais optando por modelos mais baratos, o novo patamar de preços dos veículos tem tornado o seminovo das locadoras uma opção cara. Dado o poder de compra do brasileiro médio, entendemos que, embora o mercado de usados cresça no longo prazo, as transações ficarão concentradas nas maiores idades.

    A Localiza, que é a maior do mercado, enfrenta um dilema após a fusão com a Unidas: seguir crescendo a frota e possivelmente encarar maiores descontos estruturais ou seguir com o tamanho atual e evitar rentabilidades ainda mais baixas na divisão de seminovos no futuro. Esse risco surge porque a empresa se tornou grande demais em um mercado que ela mesma ajudou a construir anos atrás.

    Genial Index de Depreciação de Veículos

    Recorrentemente, temos observado que o IPCA de carros usados não reflete a magnitude da depreciação das locadoras listadas. A metodologia do IPCA de usados, que parte das transações entre veículos e contabiliza vendas desde os mais novos aos mais antigos, está cada vez mais desalinhada com a realidade do mercado.

    Após um longo período de aumento nos preços dos veículos, os automóveis com menor valor agregado passaram a dominar as transações de usados, indicando uma mudança nas preferências dos consumidores em relação às faixas de idade dos veículos. Esse comportamento se deve à alta nos preços, que fez com que os consumidores se voltassem para opções mais econômicas, preferindo carros mais antigos e acessíveis. Essa tendência acentua a discrepância entre os dados do IPCA. Com a aceleração do envelhecimento da frota brasileira, os dados do IBGE tendem a refletir menos a depreciação do mix de veículos das locadoras.

    Pensando na dificuldade em mensurar a real depreciação de seminovos, desenvolvemos o Genial Index de Depreciação de Veículos, que tem como objetivo mensurar essa desvalorização de maneira rápida e eficaz.

    Em nossa metodologia, buscamos nos dados mensais da Fenabrave de emplacamentos os top 20 carros mais vendidos do mês. Com esses modelos em nossa base de dados, extraímos da Fipe todas as versões disponíveis. Durante os 12 meses seguintes, acompanhamos a evolução do preço de cada uma das versões para calcular a média de depreciação de cada modelo. Assim, conseguimos ter uma boa noção da depreciação corrente das locadoras, que representam boa parte das compras dos mais emplacados de cada mês.

    Acreditamos que nossa metodologia traz uma proxy melhor que o IPCA de usados, pois conforme a frota de usados envelhece, esses veículos mais velhos continuam tendo um certo peso no cálculo do IPCA. Como nossa base de dados muda a cada mês, conseguimos mensurar a depreciação de seminovos de forma mais dinâmica e eficaz.

    Fizemos dois tipos de análise: na simples, calculamos a média da depreciação com pesos iguais para os modelos mais vendidos; no ponderado, utilizamos os volumes de emplacamentos de carros de cada mês para calcular a contribuição na depreciação total 12 meses à frente. Computamos os dados desde janeiro de 2019.

    Entendemos que há uma certa normalização de preços, onde os níveis de depreciação ainda seguem elevados e acima do que o IPCA tem apontado. Nosso índice sugere que o mês de maio foi extremamente negativo para o mercado de seminovos, com a depreciação anualizada crescendo 140 bps em comparação ao mês anterior.

    Como o cálculo ponderado acaba sendo composto por mais veículos populares, observamos que, quando a média ponderada é menor que a média simples, os veículos populares desvalorizam menos que veículos intermediários e premium. Nossos dados vêm indicando uma tendência de queda maior em veículos mais premium, principalmente com a entrada de veículos chineses no mercado doméstico, enquanto os populares têm segurado mais seus preços ao longo do tempo.

    Quando comparamos nosso índice com a evolução da margem bruta de seminovos de Localiza e Movida, principais empresas do segmento no país, encontramos fortes correlações de 0,82 e 0,88, respectivamente. Embora tenhamos apenas os dados trimestrais de Movida e Localiza, conseguimos perceber a alta aderência do modelo com os dados mensais do nosso índice. No caso de Movida, a menor correlação pode estar associada à melhora do próprio negócio de seminovos da companhia.

    Estudo da FIPE & Composição de Veículos

    Em busca de uma análise mais aprofundada, escolhemos os 10 carros mais vendidos de acordo com a Fenabrave no mês de junho de 2023 e fizemos um acompanhamento mensal da variação desses preços—com base na FIPE. É importante frisar que nesse estudo consultamos tanto modelos de 2023 quanto modelos mais antigos até 2019.

    Dividimos e agrupamos esses carros por percentis com base nos preços, segmentando em três classes:

    • Popular: até R$78.000
    • Intermediário: entre R$78.000 e R$92.000,
    • Premium: acima de R$92.000.

    Nossa amostragem sugeriu que, no acumulado anual, os veículos premium chegaram a desvalorizar quase duas vezes mais que os populares, reforçando o impacto dos veículos chineses no mercado de automóveis brasileiro. Na variação m/m, também é possível visualizar uma desvalorização consistente no mercado de veículos premium.

    No quesito de modelos de veículo, essa tendência também é clara, dado que carros como Jeep Renegade e Compass apresentaram uma desvalorização de, respectivamente, -9,9% e -14,2%. É importante ressaltar que, em 2023, vários proprietários de veículos Jeep, especialmente os modelos Renegade, Compass e Commander, relataram problemas significativos com o trocador de calor do câmbio automático Aisin TF72-SC.

    Além disso, acreditamos que esse movimento foi agravado pela entrada massiva de concorrentes chineses no mercado. Os veículos chineses híbridos ou elétricos estão na mesma faixa de preços dos seminovos Jeep, o que gera uma pressão adicional. Os veículos chineses ainda estão em fase de entrada e ganhando mercado de forma agressiva, mas isso não será constante. Outra hipótese que explica a desvalorização desses veículos é a troca do ano modelo, que introduz novas tecnologias ao novo modelo e, por consequência, torna o modelo antigo mais obsoleto e depreciado.

    Perspectiva da depreciação: o pior já passou

    Os níveis de depreciação ainda seguem relativamente elevados, porém acreditamos que o pior pode ter passado devido à implementação de medidas protecionistas, melhora na concessão de crédito/demanda local e estabilização no preço dos insumos.

    Acompanhando a tendência global de tributação de veículos elétricos chineses, o Brasil, após uma enorme pressão das montadoras, subiu as tarifas de importados. A Anfavea ainda clama por um novo aumento das alíquotas. Esse movimento pode aliviar as pressões baixistas de preço no mercado. Reduzindo a briga por market-share, as montadoras têm menor propensão à redução de preço. Com menor expectativa de queda no mercado de zero km, o mercado de seminovos deve ficar mais comportado. A recente melhora na concessão de crédito doméstica é positiva para o panorama de preços. Esperamos que isso aqueça a demanda no varejo, que já vem mostrando uma melhoria em 2024. Caso as locadoras reduzam sua participação nas compras totais no mercado local, poderemos observar pressões ainda menores no mercado de seminovos.

    Por fim, os preços de insumos como o aço têm se mantido relativamente estáveis e, junto a isso, houve a implementação de quotas para a importação de aço, o que, de modo geral, deve encarecer o preço dos carros zero km, reduzindo a pressão de preços sobre veículos usados e consequentemente ajudando na estabilização da depreciação.

    Uma análise do mix de frotas de cada companhia

    Passaremos a realizar um monitoramento dos anúncios de carros à venda nos sites de seminovos da Localiza e da Movida para tentar estimar o mix de cada locadora. Com esse mix, será possível acompanhar a depreciação mensal de cada locadora. Atualmente, observamos que a Movida tem uma frota mais exposta a carros populares, enquanto a Localiza detém uma participação maior no segmento premium.

    Aproveitando esses dados, implementamos uma categorização dos veículos anunciados com base nas categorias Hatch, SUVs, Sedan, Pick-up e Vans, e Elétricos. Confrontamos esses dados e com o mix divulgado na apresentação de resultados da Movida do 1T24. É possível notar a aderência dos dados obtidos aos dados reportados.

    Localiza (RENT3)

    Acreditamos que a companhia pode sofrer mais com a recente escalada de depreciação devido à sua maior exposição aos veículos premium. No 2T23, a empresa havia reconhecido, após a MP dos populares, um impairment de R$ 575 milhões (cerca de 1,3% do valor da frota). Entendemos que existe o risco de a Localiza aproveitar o reconhecimento das perdas dos desastres do Rio Grande do Sul para realizar um ajuste na depreciação da sua frota no RAC. Nas nossas contas, esse ajuste deveria ser de pelo menos 1%, que é a diferença entre a depreciação média por carro anualizado reportada no 1T24 e a depreciação média anualizada encontrada por nosso modelo, segundo o mix de seminovos. Somando os dois impactos, Rio Grande do Sul (R$ 300 milhões) e ajuste do valor da frota (R$ 500 milhões), poderíamos observar um evento não recorrente suficientemente grande para gerar um prejuízo no 2T24.

    Movida (MOVI3)

    Assim como a Localiza, a Movida sofreu, e de maneira mais significativa, com a alta depreciação de veículos no pós-pandemia. Mesmo com a alta significativa dos preços de carros durante a pandemia, a Movida continuou comprando veículos, o que resultou em grandes perdas para a companhia. A estratégia de crescer a qualquer custo elevou os níveis de alavancagem para um patamar relativamente alto.

    No entanto, acreditamos que, diferentemente da Localiza, hoje a Movida tem uma maior exposição aos carros de entrada em sua frota, que têm sofrido muito menos no quesito de depreciação. Além disso, após o reajuste do valor recuperável da frota RAC de R$ 391 milhões, reportado do 4T23, vemos os níveis de depreciação da Movida mais aderentes aos encontrados pelo nosso índice.

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