- Mantemos nossa perspectiva de que o pacote de medidas será positivo para os consumidores, para a indústria de autopeças e siderúrgica. A medida pode beneficiar o setor produtivo pelo leve aumento da demanda por veículos e, por consequência, dos níveis de produção.
- Porém, apresenta um cenário misto para o setor de locação de veículos. Mesmo com a compra de carros mais baratos e redução do Capex nos próximos 12 meses, podemos esperar uma maior pressão nas margens dos seminovos das locadoras devido ao aumento na oferta de veículos 0 km a preços relativamente mais baixos.
- Um ponto de atenção: os efeitos da isenção na cadeia produtiva não serão imediatos e ainda dependem de uma validação por parte das montadoras em relação ao apetite do consumidor.
Carro Popular no Brasil: De volta para o passado…
Governo federal e indústria selaram acordo com a pretensão de viabilizar o carro popular no Brasil. Além da carga tributária, a reunião também abordou a recuperação da capacidade ociosa das montadoras e a criação de linhas de crédito. De acordo com Alckmin, a redução dos tributos será escalonada, podendo resultar em cortes no preço final dos veículos entre 1,5% e 10,79%. O vice-presidente anunciou que o pacote fiscal em estudo envolve a redução de 3 impostos federais, o IPI, PIS e COFINS, para empresas que atenderem a 3 requisitos:
- Preço: Quanto menor o preço, maior será a redução de impostos;
- Poluição: Quanto menor o nível de emissões de CO₂, maior será a redução de impostos;
- Nacionalização: Mais de 50% das peças fabricadas no Brasil.
A redução dos impostos será aplicada apenas a modelos com preço até R$ 120 mil. O ministro também mencionou que o BNDES disponibilizará financiamento em dólar no valor de R$ 4 bilhões para a indústria, com destinação de R$ 2 bilhões para exportação e R$ 2 bilhões para investimentos dos exportadores.
As negociações entre o governo e as montadoras em relação ao retorno do carro popular continuarão pelos próximos dias. O Ministério da Fazenda solicitou um prazo adicional de 15 dias para estudar possíveis reduções na carga tributária e outras medidas que incluem a utilização do FGTS para a compra de veículos, algo que até o momento só existe no âmbito habitacional.
Taxa de juros continua sendo gatilho
Acreditamos que, pelo que se sabe até a data de hoje, apenas os incentivos de desconto (máximo 10,8% a depender do veículo) não mexeriam tanto nos ponteiros a ponto de criarem um aquecimento de demanda. Ou seja, haverá um leve aumento de demanda em relação ao que projetávamos, mas o cenário, segundo nossa visão, já era era muito pessimista para esse segmento. Portanto, se a política de desconto não vier combinada de incentivos na taxa de juros para o consumidor, não reverterá completamente o cenário depressivo.
Concluímos então que a medida apenas será eficiente caso a política de utilização do saldo do FGTS para aquisição de automóveis seja levada adiante. Adicionalmente, ressaltamos que a medida não afeta o segmento de pesados, cuja taxa de juro para financiamento também impacta bastante a demanda. Por enquanto, as taxas devem se manter em patamares altos, o que na nossa visão minimiza os efeitos positivos para as siderúrgicas e para o segmento de autopeças.
Tupy e Randon | Qual impacto no setor Industrial?
Avaliamos positivamente as medidas propostas pelo governo para a indústria automotiva. A inclusão de isenções fiscais para toda a cadeia produtiva pode impactar positivamente as empresas do setor industrial. Dado que os benefícios serão aplicados apenas nos modelos com preço até R$ 120 mil, vemos impactos menos expressivos no segmento de autopeças, que majoritariamente atende o segmento de pesados.
Por outro lado, o apoio do BNDES por meio de financiamento em dólar para a indústria e os critérios de avaliação relacionados às emissões de CO₂ e conteúdo nacional podem favorer as vendas das divisões de autopeças como freios, blocos e cabeçotes direcionadas às OEM’s.
Dentre as empresas que cobrimos, destacamos que a Tupy e a divisão de autopeças (freios) da Fras-le (indiretamente Randon) serão impactadas positivamente no curto prazo com essas medidas.
Movida e Localiza | Qual o impacto no setor de Locação?
O setor de locação de veículos poderá se beneficiar com a redução do Capex dos próximos 12 meses. Nesse sentido, a Localiza tem uma vantagem em relação à Movida, uma vez que continua a adquirir mais carros e segue trabalhando no giro da frota. No 1T23, a Localiza comprou 48 mil enquanto a Movida comprou 8,9 mil.
Mesmo com a compra de carros mais baratos, podemos esperar uma maior pressão nas margens dos seminovos devido ao aumento na oferta de veículos a preços relativamente mais baixos. Uma vez que os carros 0 km subsidiados entram no mercado, o apetite do consumidor pelos seminovos da mesma faixa de preço muda. No fim do dia, isso resultaria em novas quedas nas FIPEs dos veículos impactando ainda mais as últimas linhas dos resultados das locadoras de veículos.
Um risco que na nossa visão está fora do radar diz respeito à quais setores serão prejudicados no futuro como forma de compensação à redução de arrecadação prevista. Avaliamos que o setor de locação é um dos possíveis alvos na ótica do governo para aumento de impostos. Portanto, a sinalização positiva para indústria pode ser um prelúdio do que vem a seguir. Segundo informações, o governo já estuda taxar a venda de imobilizado e aumentar as alíquotas de PIS/Confins para o setor de locação, o que na nossa seria extremamente negativo para o setor.
Usiminas | Qual impacto no setor de Siderurgia?
Com uma exposição de 34,5% das vendas totais no setor automotivo, a Usiminas é a Companhia sobre nossa cobertura com maior nível de vendas para segmento. Sendo assim, deve se beneficiar pelo leve aumento da demanda que a redução de impostos trará para o mercado automobilístico.
No último trimestre, a companhia anunciou um desconto nos preços do aço para o segmento automotivo em cerca de -10% a partir de janeiro para ~20% dos seus contratos e mais -12% em abril. Em um cenário macro desfavorável, com (i) uma taxa de juros de mais de dois dígitos, (ii) preços dos carros novos em patamares muito elevados e (iii) pouca disponibilidade de semicondutores, o fraco apetite do mercado por veículos atinge a produção das montadoras, que acaba refletindo diretamente o consumo de aço, e assim as vendas da Usiminas.
Nossa visão é de que, apesar de ser uma notícia positiva, a Usiminas provavelmente sofrerá impactos no volume, principalmente por conta de contratos reajustáveis de maneira mais ampla apenas no 1S24. Além disso, o benefício fiscal possui uma latência de alguns meses para ter um efeito significativo na companhia, acontecendo essencialmente após uma recuperação de confiança no mercado automotivo por parte das montadoras ao sentirem mais apetite dos consumidores.
Enxergamos agora um cenário menos pessimista, ou seja, a notícia é positiva, ainda que o efeito seja pequeno frente a outros desafios que a Usiminas tem pela frente, como reforma no Alto-forno 3. Acreditamos que as vendas devam subir, porém de maneira lenta, e a política de preços para 2023 pode ser menos agressiva do que estávamos cogitando após o resultado do 1T23. Esperamos uma recomposição dos estoques de aço, que seguem em níveis baixos por conta de uma visão conservadora para a demanda do setor durante o ano antes do anúncio.