Nós participamos da reunião com o CFO, Sr. Marcelo Bacci, realizada ontem (17 de set.), ocasião em que a companhia promoveu uma atualização abrangente a analistas (apenas sell side) sobre aspectos da (i) estratégia comercial de mudança de portifólio, (ii) dívida líquida expandida, (iii) dividendos vs. recompras de ações e (iv) condições de mercado (minério de ferro e metais básicos).
Em nossa leitura, a mensagem central transmitida pelo Sr. Bacci foi inequívoca: a companhia posiciona-se menos como uma produtora orientada a volumes e mais como uma maximizadora de margens e disciplinada alocadora de capital. A previsibilidade no cronograma de reparações (Mariana + Brumadinho) atrelada à objetividade no framework de retornos e a agenda consistente de expansão orgânica em cobre reafirmam que a companhia consolida uma trajetória de criação de valor no médio prazo, ao mesmo tempo em que resguarda opcionalidades estratégicas capazes de catalisar rerating vs. outras majors. O resultado é um ativo que gera um FCF yield ~2x superior ao dos seus pares (BHP e Rio Tinto), mantendo um Dividend Yield de ~9% (mesmo com uma preferência por recompras) e sendo negociado a 4,0x EV/EBITDA 25E e 3,8x 26E, que que está bem abaixo da média histórica de 5x.
Reunião com CFO: No detalhe!
Flexibilidade de portfólio está gerando reprecificação.
Na primeira metade da reunião, o Sr. Bacci salientou que a companhia vem trabalhando forte na flexibilidade de portfólio. Ao adequar as especificações de seus produtos às necessidades da demanda, a companhia conseguiu capturar ganhos marginais relevantes em suas realizações de preço, não apenas por meio da blendagem estratégica, mas também pela capacidade de moldar prêmios e descontos a seu favor. Embora o IOCJ (Carajás 65% Fe) possua um prêmio por ser high grade, as usinas hoje não incrementam uma demanda tão forte pelo produto devido a: (i) pressões adicionaisno nível de lucratividade da indústria do aço chinesa, que segue vetor contracionista, embora a suavização no preço do carvão metalúrgico (-4,8% YTD) tenha contribuído para um certo alívio; e o fato de que (ii) teores de sílica abaixo de 4,5% comprometem a resistência do sínter nos Altos-fornos. Importante mencionar que o IOCJ está marcado entre 2-2,5% (ou seja, abaixo de 4,5% SiO2). Acreditamos que injetar volumes excessivos desse tipo de qualidade no mercado comprometeria a própria precificação diferenciada que a companhia tenta sustentar.
Por isso, o BRBF — blend de ~63%, vindo da combinação de Carajás de alto Fe com baixo Fe do sistema Sudeste — está ganhando cada vez mais tração frente as usinas, uma vez que ele está no considerado “Sweet spot” (4,5% de SiO2 e baixo em alumina). A reprecificaçãodo BRBF, isoladamente, resulta em um acréscimo estimado de +US$400m/ano (+US$4/t sobre ~100Mt de vendas), ao passo que a redução das penalidades de sílica também gera efeitos positivos. Ademais, a introdução consistente do produto Carajás de qualidade intermediária (~63% Fe) agrega opcionalidade de volume a um custo competitivo, consolidando a posição da companhia como formadora de preços em segmentos específicos.
360Mt no longo prazo; perda mássica em concentração e pelotização.
Do lado da demanda, o management destacou que a China tem surpreendido positivamente — na visão da companhia, o cenário está menos bearish do que o mercado antecipou—, o que sustenta a decisão de ancorar seu guidance de produção em 360Mt em 2030+, considerado o ponto ótimo para equilibrar diluição de custos fixos e capacidade de absorção de mercado no longo prazo. Esse guidance foi detalhado com a explicitação do hiato estrutural entre produção e vendas, derivado de (i) ~10% de perda em pelotização; (ii) 20–30% em concentração na China; e (iii) ~1–1,5% de umidade no portfólio, além de variações de estoques.
Segundo o management, esse gap entre produção vs. vendas não deve ser interpretado como fragilidade, mas como reflexo da estratégia de blendagem e concentração, que assegura maior capacidade de calibrar qualidade e oferta em linha com as condições de mercado. Além disso, a diversificação geográfica foi enfatizada: a participação da China no mix de vendas recuou para 64% (vs. 67% anterior), refletindo redirecionamento de volumes para Brasil, Índia (hoje ~10Mt), Oriente Médio e Sudeste Asiático. A Índia, em particular, desponta como vetor de crescimento pela capacidade de blendagem com a produção doméstica, enquanto a Europa deve se manter estável a decrescente, atuando mais como base de sustentação do que como alavanca de expansão. No campo da alocação de capital para minério de ferro, a companhia mantém-se com visão oportunista, aberta a fazer M&As seletivos — como ativos da Anglo American ou a fatia da BHP na Samarco —, mas sem perseguir movimentos transformacionais. Ainda assim, Sr. Bacci argumentou que não há nada sendo negociado no momento.
Preços em ~US$90/t nos próximos 5 anos.
Quanto ao mercado de minério de ferro, a companhia reiterou que sua expectativa para os próximos 5A: de equilíbrio estrutural entre oferta e demanda, sustentando preços >US$90/t. O avanço de Simandou deverá ser neutralizado pelo esgotamento acelerado de minas de alto custo na China e pela degradação estrutural da produção australiana, projetada em queda nos próximos 5–7 anos. Nesse contexto, o Brasil deverá contribuir com crescimento líquido sem desestabilizar o mercado, o que deve sustentar a avaliação da companhia de que o impacto deste projeto está superestimado nas curvas de preços futuros.
VBM: Possível IPO fica em segunda plano; Cobre é destaque.
Já em cobre, o Sr. Bacci delineou a ambição de alcançar produção de 700Ktpa até 2035E, com meta final de 1Mtpa, patamar considerado divisor de águas para relevância global. Os próximos +350Ktpa, destravados pela licença de Bacaba (PA), foram classificados como altamente atrativos em termos de risco-retorno, enquanto expansões além desse patamar dependerão de maior detalhamento técnico e mitigação de riscos. O management reconheceu que acredita que esse crescimento ainda não está refletido nos valuations, mas reforçou que a execução consistente deve construir credibilidade e catalisar rerating estrutural.
Já no segmento de níquel, o portfólio atual permanece deficitário em geração de FCF quando considerado o CAPEX, ainda que a diluição de custos fixos tenha melhorado com a estabilização de volumes. Ressaltamos que ativos como Thompson (MB) estão sob revisão, sujeitos a desinvestimento ou redução drástica de CAPEX, mas a companhia reforçou que não pretende alienar ativos em momento de preços deprimidos, preferindo preservar a opcionalidade até a retomada do ciclo, o que n[os concordamos ser uma boa abordagem. No Canadá, ativos puramente de níquel não terão expansão orgânica, ao passo que ativos polimetálicos – como ouro e cobre como subprodutos – apresentam maior atratividade. Ainda assim, ressaltamos que os projetos em Carajás (PA) seguem oferecendo retornos superiores, mantendo o Canadá em posição secundária na agenda de crescimento. Em relação às especulações sobre um possível IPO da VBM, o managment minimizou o tema, esclarecendo que não se trata de prioridade estratégica, embora possa ser considerado taticamente em operações visando M&As no futuro (troca de ações, com venda de participação). Mesmo em tal cenário, a companhia manteria posição majoritária, reiterando que o cobre é a peça-chave do portfólio atualmente.
Nossa visão e recomendação
Renovação das conceções ferroviárias pode ser judicializada.
O debate contemplou ainda as concessões das ferrovias EFVM e EFC. Renovadas em 2020 mediante pagamento antecipado durante vigência do governo Bolsonaro, com validade até 2057, as concessões tornaram-se alvo de questionamentos pela atual administração Lula. Em Dez do ano passado, a companhia firmou uma carta de intenções para pagar montante adicional em troca de maior clareza contratual sobre obrigações e base de ativos. A divergência está na avaliação do quanto equivaleria os bens não amortizados (espécie de VNR) vs. o valor da outorga. Pela proposta discutida e aprovada ano passado pelo órgão regulador de transportes (ANTT), a companhia faria um aporte adicional de R$11b (~US$2b), com (i) R$4b pagos de imediato e (ii) R$7b condicionados à mediaçãopeloTribunal de Contas da União (TCU) nas etapas finais do acordo.
Contudo, o TCU bloqueou o acordo, exigindo novas contrapartidas. Como o prazo para efetivar a validação se encerrou, a companhia teve que anunciar ao final de Ago que não chegou a consenso com as autoridades. Enquanto a EFC entrou no radar de relicitação, nos parece que não há — até este momento—, questionamento relevante sobre a manutenção da EFVM sob gestão da Vale. Por isso, a companhia segue operando sob o contrato antigo, ligeiramente mais favorável em termos financeiros, mas sujeito a pressões políticas. O Sr. Bacci reforçou durante a reunião que a companhia busca uma solução negociada, embora esteja preparada para defender sua posição na esfera judicial, se necessário, ressaltando que um eventual processo de revogação poderia se arrastar por décadas.
Em nossa leitura, o tema se configura mais como ruído político do que como risco substancial ao balanço. Por outro lado, investidores com quem temos contatos temem que possa haver uma ligação entre a falta de consenso do TCU com o desejo da atual administração do governo de induzir a Vale a realizar uma oferta no pacote de ativos da Bamin (BA), que incluiria um CAPEX alto para construção de trechos da FIOL (Ferrovia de Integração Oeste-Leste). Valores de ~R$30b seriam cogitados para o bid (fontes não oficiais). Segundo a visão partilhada pelo management, adisponibilidade de minério de ferro não seria suficiente para justificar colocar a infraestrutura de pé.
Não vemos chances materiais de pagamento de dividendos extraordinários.
A dívida líquida expandida está em ~US$17b, dos quais ~USS$5b (~30%) vinculam-se a obrigações de reparação (Mariana e Brumadinho). Avaliamos que o intervalo de US$10–20b deve seguir como norteador, equilibrando a capacidade de remunerar acionistas vs. compromissos de pagamento agendados , contribuindo para nossa projeção de Dividend Yield de ~9% 25E e ~10% 26E. O cronograma de reparações foi detalhado: >US$3b em 25E, ~$2b em 26E, convergindo a valores residuais a partir de 2027E–2029E, o que deve aproximar a dívida líquida expandida da dívida líquida financeira.
Por isso, como há um dispêndio maior para pagamento de acordos nos próximos 2 anos, principalmente o relacionado ao acidente de Mariana (MG), não vemos a redução de CAPEX recentemente anunciada para novo intervalo de US$5,4–5,7b em 25E (-5,9% vs. ponto médio anterior) como catalizador para pagamento de dividendos extraordinários. Até é possível que aconteça, mas não consideramos como nosso cenário base, uma vez que identificamos como baixa probabilidade material nesse atual estágio. Entretanto, caso ocorram, serão incorporados ao pagamento de Mar/26, fazendo um gross-up ao que já seria normalmente pago, não havendo uma data exclusiva.
Já para a recompra de ações, a companhia atualmente reduziu o ritmo, para ter mais clareza sobre a geração de FCF, com um possível retorno após a divulgação do 3T25. Adicionalmente, Sr. Bacci comentou que foi estabelecido o patamar de US$15b em dívida líquida expandida como gatilho para intensificação da remuneração ao acionista (seja por meio de recompras, seja dividendos). Segundos nossos cálculos, a companhia só chegaria a esse patamar no 2S26. A gestão de passivos também foi abordada, em especial as debêntures participativas (CVRDA6), com yield de ~12% a.a. Ressaltamos que, embora onerem o FCF, não são contabilizadas como dívida e, portanto, não impactam diretamente indicadores de alavancagem.
Na direção certa no Micro, ainda dependente do Macro.
A reunião com o Sr. Bacci reforçou o caráter diferenciador da estratégia comercial da companhia e preferências na alocação de capial. O cronograma de reparações —>US$3b em 25E e ~US$2b em 26E, convergindo para patamares residuais a partir de 2027E — assegura que a dívida líquida expandida de ~US$17b (~US$5b associados a reparações-Mariana + Brumadinho) deverá se alinhar progressivamente à dívida líquida financeira, mitigando riscos de ampliando a margem de manobra para retornos. Entretanto, segundo o nosso modelo proprietário, apenas no 2S26 a dividia líquida expandida abaixaria para ~US$15b, definidos pela companhia como o patamar ideal para intensificar o pagamento de dividendos.
Por isso, em conversas recentes que tivemos com investidores, observamos temores relacionados ao timing. Se por um lado (i) o preço da referência 62% Fe está mais resiliente do que muitos imaginavam a essa altura (ao redor de US$100-105/t), por outro (ii) no momento atual, a companhia possui fortes compromissos de dispêndio de FCF com os acordos, principalmente o de Mariana (MG). Dessa forma, a dívida líquida expandida só iria ficar abaixo do patamar para aumentar a remuneração do acionista em 2027. Até lá, o grande receio do mercado está na alteração das condições macro, com um volume mais forte de Simandou e de outras capacidades entrando em Pilbara (Austrália).
A companhia procurou minimizar o efeito líquido de adição de capacidade, uma vez que defende que uma parte relevante será para cobrir a saída de oferta via deplation, além da queda gradual de teor de Fe nas minas que estão entrando em exaustão. Dessa forma, mais massa terá que ser usada na tendência de blendagem para se chegar ao medium grade (62% Fe) vs. o que é aplicável na realidade de hoje, o que iria acomodar melhor o volume entrante das novas capacidades (Simandou + Pilbara). Por isso, Sr. Bacci reforçou a manutenção do guidance de produção de 360Mt em 2030+, sinalizando um equilíbrio entre diluição de custos e absorção de mercado, enquanto há explicitação das perdas estruturais (de ~10% em pelotização, 20–30% em concentração na China e ~1–1,5% em umidade).
Importante notar que, assim como o management, reconhecemos que esse crescimento ainda não se encontra refletido no valuation, sugerindo que a execução pode se tornar catalisador de rerating. Fazendo tudo o que está em alcance do lado micro, como (i) corte de CAPEX (sem postergar projetos importantes), (ii) redução de C1/t para US$20,5–22/t em 25E (-2,5% a/a), além da (iii) repaginação no portfólio de produtos, com reprecificaçãodo BRBF gerando +US$400m/ano (+US$4/t sobre ~100Mt de vendas), a companhia ainda enfrenta as dificuldades do cenário macroeconômico, com os dados da China piorando no curto prazo, gerando incerteza se realmente os novos volumes serão tão bem acomodados como a companhia acredita. Ainda assim, muitos projetavam que o cenário já seria bearish esse ano, mas o minério de ferro continua surpreendo para cima. Reiteramos a nossa recomendação de COMPRA com Target Price 12M de US$12,20 ADRs – NYSE e R$66,00 VALE3–B3, o que implica em um upside de +14,2%.