Conclusão. Essencialmente, para além do mero resultado do leilão de privatização da CORSAN, achamos que o prêmio oferecido pela concessão deve ser acompanhado de perto por investidores das empresas de saneamento com capital aberto em bolsa (Sabesp, Copasa e Sanepar). Em nossa leitura, o prêmio pago pela Corsan pode ser um indicativo sobre o quanto o mercado estaria disposto a pagar pelas empresas de saneamento com capital aberto em bolsa. Ou seja, caso o leilão venha a ser bastante disputado e o valuation implícito pago na CORSAN seja atrativo (acima de 1,5x Valor da Firma/Base de Remuneração Regulatória, por exemplo – nada impossível se considerarmos transações similares ao longo do tempo), os controladores das demais empresas podem se sentir compelidos a privatizar destas empresas de saneamento esperando capturar tais prêmios para os cofres dos seus respectivos governos estaduais – prêmio esse que também seria absorvido pelos acionistas minoritários. Aos atuais níveis de preço, Sabesp negocia a aproximadamente 1,0x VF/BRR enquanto Sanepar e Copasa negociam 0,5x-0,6x VF/BRR – valores ainda depreciados se considerarmos os níveis de prêmio oferecidos que o leilão da CORSAN pode alcançar. Em suma: ainda que esse evento, visto de maneira isolada, não deva ter força o suficiente para trazer uma reprecificação de ativos no setor de saneamento no curto prazo, achamos que o seu resultado possa ser uma alavanca interessante para o processo decisório dos governadores e merece ser acompanhada de perto tendo em vista a postura pró-privatizações dos governadores eleitos e reeleitos dos estados de São Paulo, Paraná e Minas Gerais.
O Contexto
Como amplamente divulgado e observado, a aprovação do Marco do Saneamento destravou uma série de investimentos nos segmentos de água e esgoto nos últimos anos. Como esperado, a presença do setor estatal vem sendo diminuida ao redor do país e uma série de leilões de privatizações bem sucedidos. Para além do interesse adentrar nos negócios, chama a atenção também a alta competição nos leilões de tais ativos, resultando em prêmios expressivos versus as outorgas mínimas oferecidas. Algo similar vem acontecendo com o segmento de distribuição de energia elétrica, onde os múltiplos alcançaram patamares muito interessantes versus aqueles que as empresas de saneamento negociam hoje. Vale mencionar que a comparação com o segmento de distribuição de energia elétrica não é totalmente descabida se considerarmos que o modelo de negócio é similar (distribuição de produto essencial) e com regulação também muito parecida (monopólios naturais com preços determinados pelo regulador).
O Fato
No próximo dia 20 de Dezembro ocorrerá o leilão de privatização da Corsan, a empresa de saneamento do Rio Grande do Sul. Tal privatização será de “porteira fechada”. Ou seja, será apenas um único leilão em que o vencedor levará toda a operação da empresa. O valor mínimo a ser pago pelo vencedor é de R$4,1 bilhões. A empresa fechou o último trimestre com um endividamento de R$1,6 bilhões. Sendo assim, o valor mínimo da transação (Valor da Firma = Valor de Mercado + Dívida Líquida) será de R$5,7 bilhões vs uma Base de Ativos Regulatória de R$8,2 bilhões. Ou seja, no cenário-base da privatização, o múltiplo VF/BRR seria de 0,7x.
Qual o nosso ponto?
Em nossa leitura, um case de privatização como esse deveria ser precificado, em teoria, em pelo menos 1x VF/BRR. Tal nível de avaliação representaria um patamar em que a empresa operaria com níveis mínimos de eficiência. Ou seja, custos operacionais, perdas, indicadores de qualidade em linha com aqueles pré-determinado pelo regulador em suas revisões tarifárias. Entretanto, em um processo competitivo, não é incomum o resultado em um patamar muito superior a este (1,5x – 2,5x VF/BRR) tendo em vista a possibilidade do ofertante operar com indicadores de eficiência melhores do que aqueles imbutidos em sua tarifa ou por poder alavancar a rentabilidade do negócio com serviços além daqueles inicialmente considerados no processo de licitação (coleta de lixo, co-geração de energia elétrica, reciclagem, etc).
Mas e se o leilão decepcionar?
Caso o valor da privatização se estabeleça em valores pouco empolgantes (muito próximo ao valor mínimo da outorga, no caso), tal evento não deve eliminar por completo a possibilidade de privatização dos ativos listados. Uma outra possibilidade de privatização é aquela utilizada pela Eletrobrás e a Copel (caso tudo der certo para Copel, óbvio): transformar a empresa em uma corporation. Ou seja: uma empresa sem controle definido via venda de uma pequena quantidade de ações até o ponto de ter menos de 50% do bloco de controle. A vantagem desse formato é que as ações remanescentes poderiam ser vendidas em um segundo momento a preços mais atrativos, de preferência com a cotação das ações já refletindo as medidas realizadas pelo controle privado – algo parecido com o que foi feito com a BR Distribuidora (atual Vibra), onde o Governo Federal vendeu sua participação na BR em momentos distintos.
Apetite dos Investidores
A grande questão aqui vai além da mera extrapolação dos níveis que a Corsan pode alcançar – vale lembrar que os últimos anos foram marcado por juros muito baixos ao redor de todo o mundo e que juros baixos são uma proxy para a avaliação de ativos de infraestrutura. Ou seja, à medida que a renda fixa passa a ter uma remuneração muito baixa, ativos de intraestrutura (energia elétrica, saneamento, rodovias, etc…) ganham um protagonismo por terem uma natureza mais estável em seus fluxos de caixa e serem uma alternativa natural à renda fixa em momentos como estes. Entretanto, houve um aumento expressivo nas taxas de juros tanto no Brasil quanto no mundo. Sendo assim, esse seria o primeiro leilão de um ativo relevante e de “porteira fechada” em um momento de juros mais altos ao redor do mundo. Ou seja, não seria necessariamente uma surpresa um processo competitivo morno por parte dos players.
Qual o risco de investir nesses cases?
É importante mencionar que à despeito dos comentários e declarações de intenções dos respectivos governadores dos estados controladores de tais empresas, os projetos de lei com as propostas oficiais de privatização de cada um desses ativos ainda estão dentro da gaveta dos governadores. Ou seja: todo esse exercício em relação aos preços potenciais de cada um desses ativos ainda é um exercício meramente especulativo. Nesse caso, ao observar os níveis de preços da Sabesp (que negocia praticamente em linha com sua base regulatória), existe o risco de realização expressiva nas ações da empresa caso o atual governador eleito simplesmente mude de opinião em relação à privatização da empresa ou resolva priorizar outras pautas nos seus primeiros anos de governo – aqueles anos que são famosos por ter uma pauta mais dura. Ainda em relação à Sabesp, citamos o exemplo da gestão do ex-governador João Dória (PSDB-SP) que depois de um primeiro ano sendo muito enfático na defesa da privatização da empresa, acabou por desistir do processo e derrubando o preço do ativo aos seus níveis históricos. Nossa recomendação aos investidores é não escolherem meramente os ativos pela possibilidade de privatização da empresa e sim em um contexto de preço em que você compraria o ativo independentemente do cenário de privatização – decisão esta que nos levou a alterar a nossa recomendação da Copasa (CMSG3) na casa dos R$12/ação, momento esse que a empresa estava negociando a apenas 3x EV/EBITDA 23E e EV/BRR de apenas 0,45x e simplesmente não carregava o cenário de privatização nos seu preços – para maiores informações, clique aqui.
Qual potencial de destravamento de valor em caso de privatizaçãono caso da Sanepar?
No caso da SANEPAR, o potencial de valorização seria de 95%-350% em relação as cotações atuais se considerarmos a base de ativos a ser submetida na sua próxima revisão tarifária (R$15,1 bilhões em Março/23).