Nos últimos dias de dezembro organizamos uma reunião com Richard Cathcart, Diretor de Relações com Investidores do Mercado Livre, e o time de RI da Companhia, junto a clientes institucionais. Neste relatório, trazemos os principais pontos discutidos e alguns insights da reunião. Vale ressaltar que a Companhia não fornece guidance, de modo que os pontos discutidos não devem ser considerados como tal.
Destaques da reunião
Argentina
Super-desvalorização do câmbio. Seguindo a recente desvalorização de mais de 50% do câmbio oficial ARS/USD pelas autoridades argentinas, entendemos que existem preocupações dos investidores em relação ao impacto proveniente do cenário macroeconômico do país sobre o resultado consolidado do Mercado Livre. Questionado em relação a isso, Sr. Cathcart ressaltou que a mecânica de como isso impacta o P&L não muda. A Companhia converte tanto receitas quanto despesas via média de câmbio oficial mensal, porém a repatriação dos recursos é feita pela taxa “Blue Chip Swap” (câmbio de mercado, não oficial).
Desse modo, ainda havendo um gap entre o câmbio oficial e o Blue, haverá um impacto negativo em Perdas Cambiais (FX Losses) abaixo da linha de EBIT (resultado operacional) no P&L, assim como nos últimos trimestres. O que acontece é que, seguindo a aproximação entre as taxas de câmbio, o impacto das perdas seria menor, parcialmente compensando uma conversão menos benéfica dos itens nas linhas superiores do P&L.
Possíveis impactos one-off. Ainda assim, o time do Mercado Livre afirmou que, frente a essa situação, o que pode ocorrer de diferente seriam alguns impactos one-off por conta da conversão de itens de balanço. Vale ressaltar que isso já ocorreu e foi mencionado na Carta aos Acionistas do 3T23, porém, dado o tamanho da desvalorização, é provável que sejam impactos mais materiais.
E-commerce
Resultados positivos em eventos promocionais. Durante a reunião, o executivo mencionou a forte performance da vertical de e-commerce em eventos promocionais do 4T23. No México, durante os quatro dias promocionais de “El Buen Fin”, o Mercado Livre reportou um crescimento de GMV de 40% a/a (FX-Neutral). Já no Brasil, a Companhia alcançou um impressionante aumento de 80% a/a (FX-Neutral) do GMV durante o evento da Black Friday.
Quanto a Argentina, a Companhia não divulgou tais números, uma vez que a complexidade inflacionária do país não permite uma leitura assertiva da situação das operações apenas via análise do crescimento de GMV, além de que por uma estratégia de divulgação em relação à concorrência, há mais sentido em focar em países como o Brasil, considerando que na Argentina a disputa por market share é menos acirrada.
Processo de aumento da rentabilidade do 1P. Outro questionamento dos investidores durante a reunião foi em relação ao trabalho de desenvolvimento de rentabilidade que vem sendo realizado na operação de e-commerce 1P. Sobre este assunto, Sr. Cathcart ressaltou que uma melhora da rentabilidade do 1P sempre foi uma condição não negociável para a Companhia internamente começar a “colocar o pé no acelerador” nessa operação, afirmando que se sentem cada vez mais confiantes por dois motivos principais:
(i) Trabalho de melhoria de capabilities que vem sendo realizado. A Companhia implementou tecnologias para fazer uma gestão mais eficiente de pricing, promoções e inventário. Adicionalmente, durante a reunião, foi ressaltada a mudança na maneira em que são feitas as negociações com os fornecedores, passando a ser realizado um processo de negociações anuais – o que permite que o fornecedor passe a enxergar o Mercado Livre como player relevante e instigue a vontade de ambas as partes em firmarem uma parceria estratégica, estreitando o relacionamento.
(ii) Situação do mercado. Principalmente no Brasil, a Companhia foi capaz de se aproveitar do contexto do setor e do “Evento Americanas”, permitindo que acelerassem o processo de conseguir condições de compra melhores junto a fornecedores.
Dentro do plano. O executivo afirmou que melhorar a rentabilidade do 1P sempre foi o plano para 2023, e, dadas as condições do mercado e o trabalho realizado, o processo tem atingido importantes marcas, permitindo ganhos já esse ano e a visualização de um caminho para ter uma operação rentável no futuro. Vale ressaltar que o time de RI do Mercado Livre afirmou que, pelo menos com dados até o 3T23, o 1P ainda deve fechar 2023 com prejuízo similar ao ano passado (em linha com o planejamento), mas com um nível de GMV e receita muito maior do que o ano passado, culminando em uma relevante melhora de margem.
Potencial da vertical de Ads. Questionado sobre as perspectivas para vertical de Ads, Sr. Cathcart ressaltou que está confiante em um bom potencial de crescimento para operação, lembrando que o Mercado Livre ainda está apenas no início da oferta de certos produtos. Sem dar guidance e ressaltando que a companhia não possui uma meta interna, o time de RI considera um nível mid-single digit de penetração da receita de Ads em relação ao GMV total uma ambição razoável (hoje essa relação gira em torno de 1,6% – 1,7%).
Ainda assim, a Companhia ressaltou sobre a otimização na relação entre conversão e GMV, trabalhando para evitar que a operação de Advertising dificulte a experiencia dos usuários no marketplace – de tal modo que isso eventualmente poderá ser um limitador ao nível da operação.
Adquirência
Move up-market deve continuar como driver de crescimento. Durante a reunião, alguns investidores levantaram questionamentos sobre as perspectivas para o negócio de adquirência em 2024, considerando o cenário setorial desafiador, principalmente no Brasil. Sr. Cathcart reforçou então a estratégia de move up-market em relação aos merchants que a Companhia tem realizado ao longo dos últimos trimestres – buscando focar no atendimento a lojistas com um faturamento superior aos micro-merchants, que até pouco tempo atrás eram o foco do Mercado Pago. Segundo ele, a Companhia acredita que está apenas no início desse processo, então essa tendência continuará como uma alavanca de crescimento em 2024.
Ajuste na estratégia de MPoS ainda deve impactar negativamente o número de máquinas vendidas. Apesar do movimento up-market potencialmente trazer um TPV maior, Sr. Cathcart reforçou que o Mercado Pago realizou alguns ajustes em relação aos MPoS (máquina de cartão). Entre eles, apesar do corte no MDR (falaremos mais adiante) houve também uma mudança do foco na precificação e de seleção de merchants, justamente para poder viabilizar a maior penetração na categoria de SMB.
Por conta disso, a venda de máquinas de cartão tem desacelerado nos últimos trimestres, e isso deve continuar sendo um vento contrário à operação de adquirência ao longo do 1S24.
Nossa análise sugere que o TPV adicional trazido por clientes de maior recorrência deve mais do que compensar a queda no MDR, fazendo com que a operação do Mercado Pago continue crescendo receita em 2024.
Na busca por ganhos de share, não veremos taxas subindo. Conforme comentamos acima, a taxa MDR sofreu uma redução e não deve subir aos patamares anteriores no curto prazo. Sr. Cathcart afirmou que essa dinâmica está relacionada com uma tentativa de ganho de market share, de modo que não pensam em aumentar o Take-rate dos serviços, nem mesmo no processamento online.
Já no lado de MPoS, a Companhia promoveu um corte nos MDRs por volta do meio de 2023, para alinhar com os outros players, seguindo o movimento up-market que vem sendo realizado. O time de RI ressaltou durante a reunião que não são first movers em pricing do MPoS, de modo que as taxas cobradas pelo Mercado Pago sempre vão ser uma consequência da situação dos concorrentes e o nível de agressividade deles.
Perspectivas positivas sobre Online Payments. Sobre a adquirência online, o time de RI ressaltou que a operação continua com um bom fôlego para continuar o crescimento. A Companhia se mantém otimista com o potencial desse segmento para o Mercado Pago, dada a combinação entre (i) a transição das compras em lojas físicas para e-commerce e (ii) o fato de já possuírem um produto robusto e muita experiência no negócio.
México
Oportunidade de evolução da Fintech. Sobre a evolução da Fintech no México e perspectivas para acelerar a operação, Sr. Cathcart afirmou que existe uma grande oportunidade, tanto para a adquirência, quanto para banking (crédito). Dado isso, o Mercado Pago deve continuar focando e investindo no país, buscando manter o alto nível de crescimento de TPV, crédito e usuários pelos próximos anos.
Apesar dessa perspectiva, o time de RI ressaltou que existe uma limitação estrutural que seria a concorrência com o dinheiro físico, que deve continuar se posicionando como um desafio para a operação da Fintech no México. Por outro lado, o mercado no país é menos competitivo, o que pode ser positivo para a evolução do negócio.
Operação de Crédito. Sobre a operação de crédito no México, o executivo comentou sobre a menor correlação entre as originações de crédito e a taxa de juros do país, em comparação com o Brasil. Em um mercado que a bancarização é muito subpenetrada, e, portanto, menor endividamento da população, a taxa de juros do país quase não tem impacto no perfil que buscam para integrar a carteira de crédito.
Segundo Sr. Cathcart, existe um bom apetite para crédito no México, de modo que o ritmo de originações na carteira de consumo (Consumer Book) vem sendo relativamente alto, recentemente ultrapassando a carteira no Brasil (em dólares), mesmo com um PIB nacional menor. Além da carteira de consumo, o cartão de crédito do Mercado Pago foi lançado no país no início de 2023, então existem produtos adicionais que também estão em fase de desenvolvimento nesse mercado.
Disponibilidade de dados como vantagem competitiva. Outro ponto importante ressaltado foi em relação a uma vantagem competitiva da Companhia na sua operação de crédito mexicana. Sendo um mercado muito pouco bancarizado, uma parcela significativa da população é quase invisível do ponto de vista de dados e do comportamento de consumo, não existindo informação nenhuma do sistema financeiro para fazer score de crédito.
Desse modo, o Mercado Pago consegue se diferenciar de outros players puros de crédito/fintech por ter os dados do marketplace do Mercado Livre para usar no scoring de crédito, criando um diferencial para a empresa.
E-commerce e cross-borders. Finalmente, sobre a vertical de e-commerce no México, alguns investidores levantaram questionamentos sobre a recente entrada de um grande player cross-border no país e como isso estaria afetando a evolução da operação do Mercado Livre. O executivo afirmou que esse contexto não implicou em uma mudança de estratégia e que seguem analisando de perto a situação. Segundo ele, a tese da Companhia é de que a venda deste novo player está (i) trazendo uma venda do offline para o online, ou (ii) muito focada em itens de ticket muito baixos – o que vai sempre atrapalhar o tempo para chegar no average order value que vai fazer os economics do negócio serem sustentáveis no longo prazo. Desse modo, a Companhia não está sentindo, nesse momento, um impacto negativo deste novo contexto.
Outro ponto destacado pelo Sr. Cathcart é sobre o overlap, queatualmente parece ser maior entre os próprios players cross-border do que com o Mercado Livre, de modo que as plataformas estrangeiras que já estavam no país provavelmente continuarão sentido mais impacto no curto prazo.
Novos produtos de crédito
O time de RI esclareceu dúvidas sobre os novos produtos de crédito lançados ao longo do 3T23, sendo eles:
(i) Montante por prazo. Por meio deste produto, a Companhia passou a oferecer empréstimos mais altos com durations mais longas, além de menores taxas anuais. Esse é um produto especificamente preparado para desenvolver ainda mais o relacionamento com os usuários de baixo risco. Segundo a equipe de RI esse produto deve impulsionar tudo o que tem a ver, por exemplo, com Consumer Electronics, categoria preferencial dos consumidores no 1P.
Sr. Cathcart comentou que o produto de crédito em questão foi pensado para isso, mas não dependente exclusivamente desse impulso no 1P. É importante frisar que o Mercado Livre não enxerga, nesse momento, a inserção de crédito como uma forma suplementar necessária para fazer as operações 1P crescerem. Além disso, em termos de volume, ainda não devemos observar um grande impacto na operação.
(ii) Crédito para merchants. Com o Open finance, a Companhia acelerou o processo de decisão do empréstimo de capital de giro para os merchants, sendo feito em poucos dias – algo que antes poderia chegar a seis meses. Essa iniciativa anda em linha com o movimento em direção a merchants maiores, que necessitam de mais acesso a crédito. O time de RI afirmou que essa iniciativa está entregando resultados satisfatórios e que seguem focados nos métodos de menor risco. Em termos de volume, também permanece imaterial por enquanto, mas auxilia na diferenciação dos concorrentes.
(iii) Cartão de crédito corporativo. Além disso, o Mercado Pago lançou um cartão de crédito para os pequenos empreendimentos (Merchants) que utilizam tanto o marketplace, quanto os serviços de processamento de pagamentos. Ainda assim, foi reforçado que com os estágios iniciais do movimento up-market em relação aos merchants, o cartão de crédito corporativo não está ganhando tração por preferência estratégica de focar primeiro em trazer TPV com recorrência dentro do low tier da categoria SMB, mas que segue sendo uma opcionalidade interessante para gerar valor em breve.