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Publicado em 02 de Dezembro às 12:56:44

Carta Macro (Novembro/22)

Cenário Doméstico

Novo governo: PEC de transição gera escalada do risco fiscal

Após a vitória do ex-presidente Lula para assumir a presidência em 2023, a expectativa acerca de seus planos para a economia vem movimentando o mercado. Enquanto não é definido o quadro de ministros, a equipe de transição já dá sinais de que o fiscal será uma variável chave para as discussões nos próximos quatro anos. Foi protocolada no Senado nessa terça (29/11) a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) originalmente concebida, ou seja, as negociações serão feitas ao longo da tramitação. Ela retira do teto de gastos o programa Auxílio Brasil por um período de quatro anos, ou seja, R$ 600,00 por pessoa mais R$ 150,00 por criança menor de seis anos, o que totaliza R$ 175 bilhões. Além disso, foi adicionado o gasto com a utilização de 6,5% das receitas não recorrentes de 2021 para aumentar investimentos, o que significaria mais R$ 23 bilhões fora do teto. Assim, a proposta sugere que, no total, o “pé direito” seja expandido em R$ 198 bilhões durante os 4 anos de mandato, 2% do PIB.

Um aumento do déficit primário desta ordem em um país emergente cuja dívida representa 75% do PIB, é extremamente arriscado. O episódio recente envolvendo a Primeira-Ministra do Reino Unido, Liz Truss, é sugestivo. Ao tomar posse, ela anunciou um programa de redução de impostos, aumento de gastos e aumento do déficit primário, que gerou violenta reação negativa dos investidores, aumento das taxas de juros dos títulos do governo e desvalorização da Libra. A Primeira-Ministra perdeu o apoio de seu partido e foi forçada a renunciar 45 dias após ter sido nomeada. Dessa forma, caso as propostas sejam aprovadas, o cenário fiscal brasileiro se tornará insustentável, com a relação dívida/PIB atingindo 98,7% em 2026, o que fatalmente levaria a um rebaixamento nas classificações de risco do Brasil pelas agências.

Por fim, uma variável que ainda pode fazer a diferença é uma possível resistência dos congressistas. Lideranças do chamado “centrão” já se mostraram insatisfeitas com o volume de gastos fora do teto, apresentando propostas alternativas. Foram sugeridas alternativas de expansão entre R$ 70 bilhões e R$ 150 bilhões, e que a retirada do programa Auxílio Brasil, que deverá voltar a se chamar Bolsa Família, do teto seja limitado a um ou dois anos, no máximo. Assim, o resultado destas negociações irá definir se a trajetória da dívida pública brasileira será sustentável nos próximos anos.

Atividade Econômica: Com avanço de 0,4% t/t, PIB atinge maior patamar da série histórica no 3T22

Na comparação ao mesmo período do ano passado, o PIB do terceiro trimestre avançou 3,6% a/a. Em números absolutos, a produção da economia brasileira nos meses de julho a setembro deste ano foi de R$ 2,544 trilhões. Com isso, o PIB está 4,5% acima do patamar pré-pandemia, registrado no 4º trimestre de 2019. Assim, o indicador alcançou o maior patamar da série histórica. Vale ressaltar que houve uma importante revisão para a alta do PIB em 2021, passando de 4,6% para 5,0%.

Pela ótica da oferta, Serviços lideraram o crescimento, com 1,1% t/t, seguido pelo avanço da Indústria de 0,8% t/t e queda de 0,9% t/t da Agricultura. Ainda que o ritmo de recuperação dos serviços tenha diminuído em relação ao trimestre anterior (em que houve avanço de 3% t/t), apenas um dos sete segmentos apresentou retração, o comércio (-0,1% t/t). Este resultado vem em linha com nosso cenário de crescente substituição do consumo de bens por serviços devido à reabertura da pandemia, bem como o efeito negativo da elevação da Selic no custo do crédito, resultando em um pior desempenho do varejo.

Pela ótica da demanda, houve expansão de 1,0% t/t do consumo das famílias desacelerando dos 2,1% t/t observados no trimestre imediatamente anterior. Este é mais um indicativo do efeito da política monetária contracionista para desaquecer a economia. Além disso, a taxa de investimento no terceiro trimestre de 2022 foi de 19,6%, o que representa um aumento em relação à do mesmo período do ano anterior (19,4%), e o maior nível desde o terceiro trimestre de 2014, refletindo os impactos positivos das reformas microeconômicas que impulsionam o investimento privado em diversas áreas. Já a taxa de poupança foi de 16,2% no terceiro trimestre de 2022, menor que os 17,2% obtidos no mesmo período de 2021. Por fim, houve contribuição negativa do setor externo, com elevação de apenas 3,6% t/t das exportações, impactadas pelos lockdowns na China e guerra na Ucrânia, e da expansão de 5,8% t/t das importações.

Com este resultado, mantemos, de forma preliminar, nossa projeção de crescimento do PIB em 3,0% para o ano de 2022, refletindo os efeitos positivos da significativa recuperação do mercado de trabalho sobre o consumo das famílias pela ótica da demanda. Além disso, seguimos com uma avaliação positiva para o desempenho do setor de serviços ao longo do último trimestre de 2022 pela ótica da oferta.

No que diz respeito ao mercado de trabalho, o último Caged registrou um resultado abaixo das expectativas do mercado, com 159,5 mil postos de trabalho formal. Vale destacar que o mês de outubro sofre com uma sazonalidade negativa de contratações que deve voltar a se acelerar no mês de novembro, sobretudo em serviços e no comércio. Houve admissão de 1,79 milhão e demissão de 1,63 milhão de trabalhadores no período, totalizando um saldo inferior ao do mesmo mês do ano passado quando o saldo foi positivo em 252,5 mil vagas. O resultado de outubro foi puxado novamente pelo setor de serviços, com 91,3 mil (mesmo que tenha tido resultado pior que o de out/21 em -55,9 mil) vagas líquidas geradas. Historicamente o setor de serviços representa 40% das vagas líquidas criadas na economia, entretanto, no período recente, o patamar é de cerca de 51,4% do total, mostrando o protagonismo do setor na expansão do mercado de trabalho no período pós pandemia. 

No acumulado em 12 meses, entre os maiores grupos econômicos, é possível perceber uma desaceleração disseminada no saldo acumulado de empregos formais. O setor industrial e o comércio já vêm apresentando perda de dinamismo há alguns meses, diante do contexto macroeconômico mais adverso e da normalização do perfil de consumo no pós-pandemia que beneficia o setor de serviços. Na mesma direção, o setor de serviços segue apresentando perda de dinamismo, com cinco recuos consecutivos na taxa de variação do saldo de criação de vagas no acumulado em 12 meses. Na passagem de setembro para outubro, esta queda foi de 4,1% m/m. Em nossa visão, essa desaceleração é natural haja vista que o setor já ultrapassou o nível pré pandemia e o nível mais alto da série histórica (em 0,4%).

Já com a PNAD, por mais um mês consecutivo, o mercado de trabalho mostrou sua força. A taxa de desemprego do trimestre terminado em outubro ficou em 8,3%, uma queda de 0,8 p.p. em relação ao trimestre anterior (maio a julho) e 3,8 p.p. em relação ao mesmo mês do ano passado. De modo semelhante, a população ocupada atingiu novamente o recorde da série histórica e a taxa de informalidade caiu. Além disso, a taxa de ocupação avançou por mais um mês e a taxa composta de subutilização ficou em 19,5%, o menor patamar desde o trimestre móvel encerrado em janeiro de 2016, ao passo que a população subutilizada caiu 6,7% (menos 1,6 milhão) no trimestre e 24,2% (menos 7,2 milhões) no ano. Por fim, no que se refere ao rendimento médio e à massa salarial, houve um crescimento de 2,9% e 4%, respectivamente, na comparação trimestre a trimestre. Já na comparação ano a ano, houve um crescimento de 4,7% do rendimento real habitual (o qual somou R$ 2,754 mil) e de 11,5% da massa salarial (R$ 269,5 bilhões).

Por fim, destacamos que o desempenho mais recente da economia brasileira está em linha com nossas expectativas para o crescimento do PIB em 2022. Acreditamos no protagonismo do setor de serviços, em meio à dinâmica de mudança do padrão de consumo de bens para serviços. Além disso, a melhora do mercado de trabalho e as medidas aprovadas de impulso à demanda deverão contribuir positivamente para a expansão do setor nos próximos meses. Em contrapartida, para os setores Varejista e Industrial, o nosso viés segue pessimista diante da política monetária contracionista e do significativo encarecimento do custo do crédito.

Fiscal: Resultado primário do Governo Central amplia superávit acumulado em 12 meses

Com superávit do Governo Central (R$ 30,2 bilhões) e das empresas estatais (R$ 711 milhões), e a despeito do déficit dos governos regionais (-R$3,9 bilhões), o setor público consolidado apresentou superávit de R$ 27,1 bilhões em outubro. Com o oitavo superávit do ano, o superávit primário do setor público consolidado nos últimos doze meses atingiu R$ 173,1 bilhões, equivalente a 1,82% do PIB.

Vale ressaltar que os números apresentados apontam para a piora do resultado primário dos Entes Subnacionais, diante das reduções das alíquotas de ICMS resultante da aprovação da LC 194/2022 que estabeleceu o limite de 18% para alíquotas de ICMS. Nos últimos 12 meses, o superávit do Governo Consolidado de R$ 173,1 bilhões se deve a combinação do resultado dos Entes Subnacionais, que acumulam resultado positivo de R$86,2 bilhões; do Governo Central, que acumula superávit de R$82,8 bilhões; e das empresas estatais que apresentaram superávit de R$ 4,1 bilhões no período.

Além disso, o resultado do governo central ficou positivo em R$30,8 bilhões, ante superávit de R$ 30,0 bilhões no mesmo mês do ano passado, segundo os dados do Tesouro Nacional. Houve déficit de R$ 15,9 bilhões no INSS e de R$ 31 milhões no banco central. Em contrapartida, o governo federal apresentou superávit de R$ 46,8 bilhões. Vale destacar que, no período entre jan/22-out/22 a combinação do resultado do Tesouro Nacional e o Banco Central foi de superávit de R$ 316,9 bilhões, o melhor resultado da série histórica. Isto é reflexo da melhora da arrecadação do governo central que atingiu a máxima histórica no acumulado em 12 meses de R$ 2,32 trilhões, sendo o bom desempenho disseminado nos três grupos de receita.

A dívida bruta recuou em outubro para 76,8% do PIB, reduzindo 0,3 p.p. no mês. Essa redução decorre do efeito da variação do PIB nominal (impacto de -0,7 p.p.), dos resgates líquidos da dívida (impacto de -0,1 p.p.) e do efeito da valorização cambial (impacto de -0,1 p.p.). Por outro lado, os juros nominais aumentaram o endividamento em 0,6 p.p. Como é possível perceber, a redução do endividamento bruto do governo decorre, principalmente, pela elevação do PIB nominal, que vem sendo influenciado por um nível de atividade mais robusto e pela inflação que segue elevada no acumulado em 12 meses.

Inflação: Combustíveis passam a fazer pressão altista

Os indicadores para a inflação de novembro já divulgados apontam resultados opostos, por mais um mês. Enquanto o IGP-M (-0,56% m/m) registrou a quarta contração seguida, o IPCA-15 (0,53% m/m) tem segunda variação positiva, mas quarto mês de aumento da taxa.

No indicador da FGV, o IPA-M (Preço ao Produtor Amplo) foi o principal vetor de baixa. Foi a combinação da deflação agrícola (-1,45%) e industrial (-0,74%) que fez com que a abertura acumule três meses seguidos de recuo. Após encerrar a sequência de três meses seguidos de taxas negativas, avançando 0,50% em outubro, a inflação ao consumidor (IPC) avançou ainda mais em novembro, registrando 0,64%. Sete das oito categorias apresentaram acréscimo em suas taxas. Mais uma vez, a principal contribuição para esse movimento adveio do grupo Transportes, que deixou de registrar deflação (-0,96%) e passou a registrar inflação (0,79%). Com o aumento do preço do barril do petróleo no mercado internacional, a gasolina deixou de registrar deflação (-3,74%) e passou a registrar inflação (1,58%). Já para a prévia do IBGE, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 acumula no ano alta de 5,35% e, em 12 meses, de 6,17%. Todos os grupos de produtos e serviços pesquisados tiveram variação positiva em novembro, com exceção de Comunicação, que apresentou estabilidade. Os maiores impactos vieram de Alimentação e bebidas e Saúde e cuidados pessoais, seguidos por Transportes. Assim, como no IGP-M, a gasolina foi um importante vetor altista. Em Transportes, os combustíveis voltaram a ter variação positiva (2,04%) após cinco meses consecutivos de quedas. Enquanto em outubro os preços da gasolina recuaram 5,92%, neste mês eles subiram 1,67%, contribuindo com o maior impacto individual no índice do mês (0,08 p.p.).

Mercado de Crédito: Primeiros sinais de desaceleração são sentidos

Diante do forte ciclo de aperto monetário desempenhado ao longo dos últimos meses, a expectativa de que haja consequências para o mercado de crédito começou a se concretizar. Por mais um mês, o saldo das concessões de crédito acelerou em outubro, em 1,0% m/m. A última taxa negativa foi em janeiro de 2021, mas esta foi a menor taxa de expansão dos últimos quatro meses. No diz respeito ao número de concessões do mês o cenário muda, este já é o segundo recuo consecutivo, com -5,9%, a menor taxa em seis meses. Além disso, outro sinal contrário veio das concessões livres, que registraram -4,3% depois de forte alta em agosto (7,9%) e estabilidade (0,0%) em setembro. Vale ressaltar que o saldo de concessões direcionadas também vem apresentando desaceleração, visto que este é a menor taxa dos últimos quatro meses, bem como as concessões no mês apresentaram a segunda taxa negativa consecutiva (-15,7%), a menor desde janeiro.

O efeito mais direto que pode ser extraído do alto patamar que a Selic atingiu se vê no aumento das taxas de juros. A taxa total de outubro ficou em 29,9% a.a., apenas 3 p.p. abaixo do máximo da série histórica (33,0% em out/16). Vale lembrar que naquele contexto de recorde dos juros do mercado de crédito, a taxa básica estava em 14% a.a. que, com o IPCA em 7,87% a/a, tinha juros real de 6,13% a.a. Já atualmente, a Selic foi mantida em 13,75% a.a. e a taxa real está em 7,28% a.a., ainda mais elevada que o visto em 2016.

No que diz respeito aos juros ex-ante, ou seja, calculado com base nas projeções para os próximos doze meses (taxa de swap pré-DI 360 dias menos a expectativa Focus para a inflação nos próximos doze meses), é possível ver na série histórica que a tendência é de que seu aumento iniba as concessões de crédito. No entanto, a partir do final de 2019, o que vemos é uma tendência de aumento de ambos. Acreditamos que isso seja reflexo de um movimento de ampliação da massa de rendimentos real que, associado aos programas de estímulo à demanda a partir de 2020, tem limitado os impactos da política monetária restritiva sobre o mercado de crédito. Assim, o aumento da inadimplência se coloca como um desafio para os próximos meses, especialmente para as pessoas de classes sociais menos abastadas. A elevação das chances de retomada do aperto monetário, decorrente do ao aumento do risco fiscal, se coloca como mais uma problemática para o ano de 2023, que já sofrerá com os efeitos defasados do atual ciclo de política monetária.

Cenário Externo

Estados Unidos

CPI desacelera em outubro para 7,7% na comparação ano a ano

Durante o mês de outubro, o CPI (Consumer Price Index) avançou 0,4% na comparação mês a mês, abaixo da expectativa de 0,6% do mercado. Desse modo, a inflação em 12 meses alcançou 7,7%, configurando um recuo frente aos 8,2% de setembro. Por um lado, o avanço de 4% nos preços da gasolina (embora previsto, a julgar pelo movimento de alta do Brent no mês em função do corte de produção feito pela Opep+) contribuíram para a deterioração do poder de compra das famílias norte-americanas. Por outro, os preços dos alimentos cederam pelo segundo mês consecutivo, ao registrar avanço de 0,6% na comparação mês a mês e 10,9% no acumulado em 12 meses. Todavia, tal desaceleração se deve exclusivamente aos preços da alimentação no domicílio, pois alimentação em bares, restaurantes e similares avançou 10 bps em outubro, indo a 8,6%. Além disso, os preços de habitação (shelter), que correspondem a aproximadamente 30% do CPI, avançaram 0,8% no mês e contribuíram com 0,25 p.p. para o headline, haja vista o avanço de 0,7% dos aluguéis e 0,8% do OER (aluguel equivalente dos proprietários). Já o núcleo, que exclui alimentos e energia, avançou 0,3% na comparação mês a mês, igualmente abaixo das expectativas, indo a 6,3% no acumulado em 12 meses. Além disso, deve-se pontuar que o CPI já se encontra próximo ao PPI (Producer Price Index) e, portanto, os repasses de preço ao consumidor estão limitados, o que mostra uma boa trajetória para o CPI. Para nós, a leitura do CPI ancora o tom dovish adotado pelo Federal Reserve desde o último Fomc, e será fundamental – em conjunto com o relatório do payroll de novembro – para a decisão da autoridade monetária em dezembro.

Mercado de trabalho se mantém em desequilíbrio, mas apresenta sinais de melhora

Por mais um mês consecutivo, o mercado de trabalho norte-americano surpreendeu. De acordo com o relatório do payroll, 263 mil postos de trabalho foram criados em novembro, superando as expectativas do mercado de 200 mil. Além disso, deve-se destacar que a criação de postos de trabalho em outubro foi revisada para cima em  23 mil, de 261 mil para 284 mil, compensada, todavia, pela revisão para baixo em 46 mil do resultado de setembro, de 315 mil para 269 mil. Em relação à taxa de desemprego, esta se manteve estável em relação aos 3,7% do relatório de outubro, ainda abaixo da NAIRU (taxa de desemprego que não acelera a inflação) estimada pelo Federal Reserve, em 4%. Portanto, ainda se observa um descasamento entre oferta e demanda por mão-de-obra, nitidamente perceptível pela diferença entre os empregos disponíveis (compreendidos como as vagas abertas + a população ocupada) e a força de trabalho, o que justifica a dinâmica de elevação dos salários. Em novembro, o salário médio por hora avançou 0,6% na comparação mês a mês, ao passo que no acumulado em 12 meses mostrou uma considerável aceleração, de 4,7% em outubro para os atuais 5,1%, o que impõe um viés altista sobre a inflação e dificulta a tarefa do Federal Reserve de convergir a inflação à meta de 2% ao ano. Todavia, há alguns indicadores que mostram um arrefecimento no mercado de trabalho. De acordo com o JOLTS, as vagas de emprego caíram 353 mil em outubro, para 10,33 milhões, 6,8% abaixo do mesmo período de 2021, evidenciando, portanto, a menor oferta de empregos. De modo semelhante, as contratações caíram 6,9% em relação a outubro do ano anterior. Além disso, o ADP, que mostra a criação de emprego no setor privado e antecede o payroll, mostrou a criação de 127 mil postos de trabalho, ao passo que as expectativas apontavam para 190 mil. O emprego no setor de serviços está contraindo segundo o PMI/ISM, haja vista que se encontra em 49 pontos (abaixo dos 53 de setembro).

Federal Reserve adota tom dovish, e deve elevar a taxa de juros em 50 bps

Diante das persistências inflacionárias e dos desequilíbrios no mercado de trabalho, acreditamos que o Federal Reserve se manterá firme em elevar a fed funds rate. Durante o Fomc de novembro, a autoridade monetária elevou a taxa básica de juros norte-americana em 75 bps, a 4%, já acumulando uma alta de 375 bps. Contudo, o Fomc afirmou que, em suas próximas reuniões, irá considerar os efeitos defasados da taxa de juros sobre a inflação e a economia, uma sinalização crucial para a formulação das expectativas. Para nós, o comunicado foi dovish, e o mercado parece ter entendido da mesma forma, afinal, o S&P 500 recuperou parcialmente as perdas acumuladas em 2022 e as treasuries recuaram. Além disso, Jerome Powell afirmou em evento da Brookings Institution, ao final de novembro, que “o momento de moderar o ritmo de aumento das taxas pode chegar logo na reunião de dezembro”, reforçando ainda mais as expectativas do mercado de aumento de “apenas” 50 bps. Se por um lado a sinalização do Federal Reserve e o CPI apontam, de fato, para uma desaceleração no ritmo de alta dos juros, o mercado de trabalho, por outro lado, reforça a elevação em 75 bps. Diante disso, alteramos nossa call para o Fomc de dezembro, ao passo que acreditamos, agora, que o Federal Reserve elevará a taxa de juros em 50 bps em sua reunião de dezembro, e não em 75 bps como antes, fazendo com que a mesma chegue a 4,50% (limite superior).

Gastos com consumo se mantêm robustos, porém, não são sustentáveis

Por fim, o PCE referente ao mês de outubro mostrou como os gastos com consumo permanecem resilientes, porém, que não são sustentáveis. De acordo com o relatório, os gastos com consumo cresceram 0,8% em relação a setembro e 7,9% no acumulado em 12 meses. Contudo, embora o consumidor norte-americano continue a consumir, a inflação tem corroído consideravelmente sua renda. Desse modo, o crescimento dos gastos com consumo tem se mostrado mais voraz que o da disposable income (ambos em termos reais), isto é, a renda disponível, que, na verdade, tem caído nos últimos 12 meses. Em outras palavras, os gastos com consumo têm crescido a uma taxa mais alta do que a renda, o que, no longo prazo, torna-se insustentável. Então, de onde vem a força motriz do consumo? Para nós, do chamado “excesso de poupança”, que segundo nossas estimativas caiu 25% entre o 3Q22 e o início do 4Q22, para algo em torno de US$ 1 trilhão. Isto é, as famílias, para manterem o consumo razoavelmente estável, estão consumindo seu estoque de riqueza, o que se traduziu em mais uma queda na taxa de poupança, dessa vez de 2,4% em setembro para os atuais 2,3% – próximo da mínima histórica de 2,1%, em 2015. Portanto, o principal driver do consumo nos Estados Unidos está caminhando para seu esgotamento, e caso se mantenha no ritmo atual, se esgotará no 3Q23. Em relação à inflação do PCE, a preferida do Federal Reserve, a mesma avançou 0,3% em relação a setembro. Todavia, devido ao efeito base, no acumulado em 12 meses a inflação caiu de 6,3% em setembro para os atuais 6%. Já o núcleo acelerou 0,3% na margem, frente as expectativas de 0,2%. Em 12 meses, o núcleo do PCE avançou 5%, recuando 0,2 p.p. em relação ao resultado de setembro, um reflexo da desaceleração dos preços de alimentação (11,6% em outubro frente 11,9% em setembro) e dos preços de bens e serviços de energia (18,4% em outubro ante 20,1% em setembro).

Europa

Inflação reverte tendência de crescimento

Já na Europa, após 22 meses em alta, o CPI da Zona do Euro desacelerou. De acordo com dados do Eurostat, a inflação na região recuou 0,1% mês a mês na estimativa preliminar de novembro, levando a inflação em 12 meses a 10% – abaixo dos 10,6% de outubro. Dessa vez, os preços de energia, que até então vinham sendo o principal driver para a aceleração da inflação (contribuindo, em média, com 50% para o headline), contribuíram para sua queda ao recuarem 1,9% na comparação mês a mês e desacelerarem de uma alta de 41,5% em 12 meses para 34,9%, especialmente por conta da queda nos preços do gás natural. Além disso, os preços de serviços recuaram 0,3% mês a mês, recuando de uma alta acumulada de 4,3% para 4,2%. Ao excluirmos os preços de energia do headline, observamos uma alta de 0,2%, fazendo com o que a inflação avançasse para 7% frente aos 6,9% de outubro. Em relação ao PPI (Producer Price Index), o mesmo desacelerou consideravelmente na comparação mês a mês, ao recuar 2,9%, especialmente por conta dos preços de energia, que caíram 6,9%. Desse modo, a inflação ao produtor na Zona do Euro desacelerou frente aos 41,9% de setembro para os atuais 30,8% na comparação ano a ano. Para nós, embora ainda alta, a inflação ao produtor menor pode significar menores repasses ao consumidor.

Todavia, ainda é cedo para falar sobre uma reversão de tendência (como a que vimos nos Estados Unidos) e, portanto, acreditamos que o Banco Central Europeu continuará elevando a taxa de juros da Zona do Euro, hoje em 1,50%. Contudo, ainda há muita incerteza se a contração monetária se dará por mais um aumento de 75 bps ou se haverá uma desaceleração no ritmo de alta, assim como se desenha o cenário para os Estados Unidos. Desse modo, as condições financeiras começam a se deteriorar na Europa e, para nós, a desaceleração econômica já está em curso. Tanto o PMI de serviços como o do setor industrial se encontram abaixo dos 50 pontos, mostrando a tendência de contração da atividade. Além disso, disso, observamos que o agregado monetário M1 (papel moeda em poder do público + depósitos à vista) é um bom indicador antecedente de uma recessão (quando adiantado 6 meses à frente), bem como a desaceleração do setor industrial.

China

Covid amplia protagonismo na pauta econômica

No último mês, a China viveu uma nova onda de contágio de Covid-19, fazendo com que recordes fossem quebrados quase que diariamente. No último sábado de novembro, o país registrou 39.7914 novas infecções, segundo órgãos oficiais, uma semana depois do registro da primeira morte pela doença em quase um ano e meio. A capital e as megacidades da China continuam lutando para conter os surtos, com Chongqing e Guangzhou relatando a maior parte das novas infecções. Os casos locais em Pequim continuaram aumentando, disparando 66% na última semana. As autoridades da capital chinesa bloquearam bairros e fecharam temporariamente lojas e outros negócios para reduzir o risco de infecções, somado à retomada de testagens em massa. No entanto, a insatisfação da população começou a gerar protestos cada vez maiores, pedindo pelo fim da política de “covid-zero” e uma abordagem menos agressiva dos órgãos de controle. Embora a China tenha uma taxa geral de vacinação de mais de 92% tendo recebido pelo menos uma dose, o número é consideravelmente menor entre os idosos – principalmente aqueles com mais de 80 anos – onde o índice cai para apenas 65%.

A economia chinesa apresentou sinais mistos de recuperação no terceiro trimestre de 2022. A desaceleração das importações e das exportações mostram enfraquecimento tanto a demanda interna quanto externa. Nesse sentido, a evolução dos setores vem sendo desigual, com a indústria apresentando forte recuperação em linha com a expansão das exportações dos produtos. Por outro lado, o varejo ainda não conseguiu retornar para a tendência de crescimento, refletindo que a economia chinesa fica mais vulnerável à crise imobiliária e à política de zero-Covid, sem perspectivas de melhora no curto prazo.

O setor imobiliário vem sofrendo nos últimos meses com a crise de insolvência das principais incorporadoras chinesas. O setor contribui com cerca de 25% do PIB, o que demonstra a gravidade da situação e a dificuldade de resolução. Estimativas apontam que o setor precisa se contrair cerca de 25% para equilibrar a oferta e a demanda de imóveis nos próximos 10 anos. Diante disso, o governo chinês anunciou um plano com 16 pontos para resgatar o setor imobiliário, no qual bancos distribuirão US$ 140 bilhões em financiamentos. Além disso, haverá redução de exigências de pagamento de entrada e piso para a taxa de hipoteca para first buyers. Ademais, bancos como o China Development Bank e o National Bank for Agriculture and Rural Development oferecerão empréstimos especiais para garantir que projetos imobiliários sejam entregues. Por fim, um desafio de longo prazo que se coloca para a China é o envelhecimento de sua população. A economia chinesa enfrentará nos próximos anos o fim do seu bônus demográfico. A PIA deve encolher cerca de 22% até 2050 e 65% até 2100, como consequência das políticas de filho único. Com isso, haverá uma forte pressão por gastos com serviços públicos, sobretudo de saúde e cuidados aos mais idosos. Assim, será necessário expandir os investimentos em capital em substituição do uso de mão de obra. Por fim, a necessidade de estimular a demanda interna e conquistar uma maior independência externa se impõem. É preciso que um novo motor de crescimento se apresente em substituição ao setor imobiliário, no entanto, o momento atual apresenta uma queda na propensão a consumir que será dificilmente superada no curto prazo.

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