O substitutivo da Reforma Tributária
No último dia 22, o deputado federal Aguinaldo Ribeiro apresentou o substitutivo à Reforma Tributária (PEC 45/2019). Este é um texto preliminar que visa solucionar alguns pontos de divergência entre a União e os Estados e, portanto, deve passar por alterações até o momento de sua votação na Câmara, previsto para ser votado entre os dias 3 à 7 de julho.
A reforma tem como intuito a simplificação do sistema tributário brasileiro que se mostra demasiadamente complexo, gerando por inúmeras vezes incertezas jurídicas e distorções nos preços relativos do mercado, que em última instância são responsáveis por reduzir os investimentos e promover uma alocação ineficiente de recursos na economia. Dessa forma, a aprovação da PEC se mostra de suma importância para melhorar o ambiente de negócios e aumentar a produtividade e, consequentemente, tendo impactos positivos sobre o crescimento (de 10% a 15% ao longo dos próximos anos) e a arrecadação no médio/longo prazo do Brasil.
De modo geral, o relatório propõe a implementação gradual de um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) a partir de 2026, visando acomodar os benefícios fiscais já concedidos por estados e municípios que têm vigência assegurada até 2032 pelo Congresso Nacional. O novo imposto visa substituir o IPI, PIS/Pasep, Cofins, ICMS e ISS a partir da fusão destes, dando lugar ao Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS). O sistema proposto será dual, isto é, os cinco tributos eliminados serão substituídos por uma Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), gerida pela União, e um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), gerido pelos estados e municípios.
A espinha dorsal da criação do IBS ocorre nos moldes de um modelo IVA:
- base ampla, que inclui todos os bens e serviços da economia;
- não cumulatividade plena, de modo que o imposto pago anteriormente sobre os insumos utilizados nas etapas de produção são compensados;
- incidência “por fora”, ou seja, o IBS não comporá a sua própria base de cálculo;
- princípio do destino, portanto, os tributos serão recolhidos no destino de comercialização durante à venda para o consumidor;
- desoneração de exportações e investimentos, melhorando a competitividade internacional dos produtos brasileiros.
O novo imposto também simplificará o sistema tributário através da redução do número de alíquotas e especificidades/exceções presentes nos impostos atuais. A reforma instituir três alíquotas para o IBS: a alíquota padrão, que deve incidir sobre todos bens e serviços da economia; a alíquota reduzida que será equivalente a 50% do padrão para alguns setores específicos (medicamentos; dispositivos médicos e serviços de saúde; transporte público coletivo; serviços de educação; produtos agropecuários, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura artigos da cesta básica; e atividades turísticas e culturais nacionais); e uma alíquota zero para medicamentos, Prouni e produtor rural pessoa física.
Ademais, vale destacar que o substitutivo também propõe a criação de um Imposto Seletivo, de caráter amplo, incidindo sobre a produção, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente. A ideia é que a taxa substitua o IPI e sirva como um desincentivo ao consumo desses bens e serviços.
Uma outra inovação presente no texto é a possibilidade de criação de um mecanismo para a devolução imediata do novo IBS a pessoas físicas de forma ampla, com o objetivo de combater a regressividade do sistema tributário brasileiro que penaliza a parcela da população de menor poder econômico. Os critérios utilizados para definir quais indivíduos estarão aptos a aderir ao programa de cashback devem ser definidos por meio da aprovação de uma Lei Complementar.
O substitutivo manteve os dois regimes tributários favorecidos atualmente estabelecidos em nossa Constituição: a Zona Franca de Manaus e o Simples Nacional. Dessa forma, essas duas exceções manterão suas regras atuais. Vale destacar que para o caso do Simples Nacional, a ideia é permitir que as empresas tenham maior flexibilidade para aderir ou não ao novo sistema IVA – que pode ser vantajoso para as empresas que fornecem bens/serviços para outras empresas a partir da obtenção dos créditos através do princípio da não cumulatividade do novo sistema tributário.
A transição do sistema atual para o IVA será feita de maneira gradual. O substitutivo estabelece uma transição federativa para o princípio do destino de 50 anos (entre 2029 e 2078), a fim de evitar quedas bruscas de arrecadação por parte da União e dos entes subnacionais diante da mudança da cobrança dos impostos na origem para o local de consumo final dos bens e serviços. Para tal, uma parte da arrecadação geral com o novo IBS será retida e redistribuída para evitar potenciais prejuízos nos caixas dos tesouros estaduais.
Além disso, o texto impõe uma transição dos tributos, de oito anos, com o objetivo de calibrar as alíquotas, haja vista as incertezas em torno da arrecadação do novo IVA, visando manter inalterada a carga tributária atual que se dará da seguinte forma: Em 2026 será instituída a CBS com uma alíquota de 1%, cujo valor recolhido poderá ser compensado com o PIS e a Cofins; em 2027, será instituída a CBS, extinguindo o PIS/Cofins e redução a zero da alíquota do IPI (exceto ZFM); de 2029 a 2032 haverá redução proporcional das alíquotas do ICMS e do ISS dando lugar à entrada do IBS; e em 2033 haverá vigência total do novo sistema, extinguindo o sistema atual de tributação.
O substitutivo também visa resolver um dos principais impasses em torno da aprovação da Reforma Tributária com a criação de dois fundos, com aportes da União. O primeiro é o Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR), que tem como objetivo compensar as perdas estaduais com as mudanças no sistema e reduzir as desigualdades regionais e sociais. O segundo é o Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais cujo objetivo assegurar que os benefícios já concedidos pelos estados serão garantidos até 2032. A ideia do governo é aplicar no máximo R$ 40 bilhões por ano que, inicialmente, seriam divididos entre os dois fundos até 2032 e a partir de 2032, todos os recursos iriam para o FDR. Vale destacar que o valor proposto pelo governo é inferior ao montante demandado pelos estados (R$ 75 bilhões), sendo este um dos principais pontos de divergência nas negociações.
A fusão dos impostos atuais em um IBS dual gera a necessidade da criação de uma entidade responsável pela administração e regulamentação do novo sistema tributário. Neste contexto, o substitutivo cria o Conselho Federativo do Imposto sobre Bens e Serviços com gestão compartilhada pelos entes subnacionais, com decisões tomadas a partir de votos distribuídos de forma paritária entre estados e DF, e municípios. Vale ressaltar que este é um ponto de divergência entre as regiões brasileiras, que vem sendo alvo de críticas por parte dos governadores Cláudio Castro (RJ), Ronaldo Caiado (GO) e Tarcísio de Freitas (SP). As críticas se concentram no argumento de que a criação do conselho tiraria a autonomia dos Estados, ferindo o pacto federativo.
Por fim, o substitutivo determina que a reforma da tributação da renda seja enviada ao Congresso Nacional em até 180 dias da promulgação da Emenda da PEC da reforma tributária e que o aumento da arrecadação obtida com ela seja utilizado para reduzir a tributação incidente sobre a folha de pagamentos e sobre o consumo de bens e serviços.
Desafios de aprovação
Como qualquer projeto de emenda constitucional, a aprovação da reforma tributária está sujeita à superação de alguns desafios. Na nossa avaliação, os principais obstáculos envolvem três principais pontos: i) o montante de compensação dos estados e municípios e a convalidação dos benefícios fiscais já concedidos; ii) a criação do Conselho Federativo; iii) limitar as exceções à alíquota padrão. As questões federativas devem pesar sobre o debate nas próximas semanas, sobretudo nas discussões em torno da partilha dos recursos e da administração e regulação da arrecadação do IBS que deve beneficiar a região Nordeste devido a distribuição de votos paritária do Conselho Federativo em detrimento à região Sudeste que possui uma maior concentração populacional. Já no âmbito setorial, a tendência é que haja pressões para inclusão de novos tratamentos diferenciados como, por exemplo, para os produtos que compõem a cesta básica, beneficiando a agropecuária.
Além disso, ainda há um grande mistério por trás da alíquota de referência a ser cobrada no novo sistema tributário. De acordo com o secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, a alíquota neutra (que não gera aumento de carga tributária), em um cenário que houvesse apenas uma alíquota padrão, deveria ser de 25%. Entretanto, estimativas técnicas apontam para um valor superior ao apresentado pelo secretário. Vale destacar que as exceções à alíquota de referência tendem a pressionar o valor da alíquota de referência devido ao caráter neutro que a reforma visa implementar. Na nossa avaliação, a postura atual do governo de “esconder” o valor da alíquota padrão do público corrobora com a visão de que o IBS possui uma taxa considerada elevada, o que levaria a um cenário de maiores dificuldades de aprovação devido às resistências setoriais.
Efeitos esperados com a aprovação da reforma tributária
Vemos com bons olhos a aprovação da reforma tributária, sobretudo no que diz respeito aos potenciais ganhos de médio/longo prazo para a economia brasileira decorrentes da simplificação do sistema tributário. Na nossa avaliação, a instituição de uma alíquota dual única sobre bens e serviços será responsável por reduzir as distorções de preços relativos, haja vista a maior penalização da indústria de transformação, devido à tributação em cascata, em detrimento ao setor de serviços, que corresponde por cerca de 70% do PIB brasileiro.
Além disso, a simplificação também será responsável por criar um ambiente mais favorável para novos negócios, aumentando a taxa de investimento que deve beneficiar uma taxa de crescimento mais sustentável no médio/longo prazo. Na mesma direção, a unificação dos tributos sobre o princípio de uma alíquota única deve gerar efeitos positivos a partir da redução das distorções causadas pelos incentivos fiscais, sobretudo em relação ao ICMS, responsável pela guerra fiscal entre estados que vem acontecendo nos últimos anos. Sob esta perspectiva, o fim dos incentivos fiscais promoverá uma melhor alocação de capital na economia, permitindo que empresas mais eficientes tenham um maior acesso aos recursos disponíveis no mercado, aumentando a produtividade da economia.
Ademais, vale destacar que os gastos tributários com incentivos fiscais devem acumular R$ 486 bilhões em 2024 e, portanto, a eliminação de parte do poder de manobra dos estados deve beneficiar as contas públicas ao longo dos próximos anos. Outro ponto em que a simplificação do sistema tributário pode contribuir para aumentar a arrecadação nos próximos anos é através da redução da sonegação de impostos. Hoje em dia, devido ao alto grau de complexidade do arcabouço tributário (diversas alíquotas, exceções, isenções e subsídios) manobras fiscais se tornam mais fáceis de ser executadas vis-à-vis um modelo simplificado de alíquota única.
Por fim, podemos mencionar os efeitos positivos da reforma sobre as exportações por meio da desoneração destas, haja vista que o imposto só incidirá sobre o consumo, de modo que, as exportações internacionais brasileiras poderão ser totalmente desoneradas. A isenção tributária das exportações deve ser um vetor positivo adicional para o crescimento, fazendo com que os produtos brasileiros tenham uma maior competitividade no mercado internacional.
Acreditamos que o efeito agregado dos benefícios da reforma tributária não serão observáveis a curto prazo devido ao seu caráter neutro em relação ao aumento da carga tributária. Entretanto, enxergamos impactos positivos que serão diluídos ao longo dos próximos anos. Nossas estimativas apontam que a simplificação do arcabouço tributário brasileiro tem o impacto potencial de aumentar o crescimento do PIB em cerca de 10 pontos percentuais ao longo de 10 anos. Com um maior nível de atividade e promovendo uma base mais sustentável de crescimento, a reforma tende a beneficiar a trajetória fiscal da dívida brasileira no médio prazo, reduzindo ainda mais o risco de cauda de explosão da dívida. Neste contexto, avaliamos que a aprovação da PEC tende a contribuir para reduzir o risco soberano brasileiro, diminuindo os prêmios de risco e, consequentemente, a taxa de juros, permitindo que a economia opere em um território mais propício aos investimentos.
Em contrapartida, vemos um potencial risco inflacionário com a implementação da reforma tributária. Atualmente, o setor de serviços que corresponde a cerca de 70% da economia é comparativamente menos tributado que a indústria, que contribui com cerca de 20% da economia. Diante da implementação da alíquota única que deve desonerar a atividade industrial por meio da não cumulatividade dos tributos combinada à manutenção atual da carga tributária, enxergamos que a tributação sobre o setor de serviços deverá sofrer um aumento como forma de compensar a queda da arrecadação na indústria. A magnitude deste efeito ainda é incerta devido à não divulgação da nova alíquota padrão e a complexidade do atual sistema tributário também impõe desafios para o cálculo dos efeitos inflacionários. Além disso, a pressão dos setores da economia por maiores exceções ao IBS deve contribuir para a elevação da alíquota padrão, gerando maiores riscos altistas para a dinâmica de preços futura da economia.
O que achamos da proposta preliminar?
Qual impacto para as empresas? Por enquanto, existe uma longa apresentação sobre como a reforma deve se estruturar em relação ao modelo atual – que como sabemos, é bem confuso e ineficiente do ponto de vista da eficiência econômica e justiça tributária. Entretanto, faltou algo essencial para estimarmos questões relevantes como impacto na arrecadação, lucros, dividendos e, evidentemente, nas avaliações/preço-alvo das empresas sob nossa cobertura: as alíquotas, que ainda não foram divulgadas.
Para fins de comparação, em 2021 o Governo Federal divulgou algumas propostas relacionadas a alíquotas de novas faixas de imposto de renda de pessoas físicas e jurídicas, assim como o fim de benefícios fiscais interessantes para empresas com capital aberto em bolsa (como os juros sob capital próprio).
Como referência, sugerimos darem uma lida na primeira versão publicada (“Impacto da Reforma Tributária: Separando o Joio do Trigo”) e na segunda versão (“Nova Proposta da Reforma Tributária: Tirando o bode da sala”). Em ambos os documentos fazemos um exercício sobre o impacto das alíquotas propostas à época nas diversas empresas sob nossa cobertura.
Concluímos que setores capital intensivo e razoavelmente maduros (energia elétrica, bancos, etc) tenderiam a ser prejudicados devido o impacto do fim do Juros Sob Capital Próprio (que é calculado em relação ao patrimônio da empresa e TJLP) e taxação de dividendos versus cases de crescimento (varejo e tecnologia, por exemplo) devido a redução nas faixas de imposto de renda, aumentando os recursos disponíveis para investimentos.
Imaginamos que em algum momento o tema de alterações nas alíquotas de impostos vá ser colocado em questão. Como ainda não temos nada nesse sentido, sugerimos uma leitura nos links acima à medida que imaginamos que uma proposta mais estruturada no que diz respeito às alíquotas ainda vá ser discutida em um futuro breve.
Qual o impacto preliminar da proposta nos setores da bolsa?
Petróleo & Gás
Em nossa análise preliminar, constatamos que a indústria de Petróleo & Gás pode sofrer impactos negativos.
Com relação à forma como a proposta é estruturada em relação à cobrança de impostos (substituição de IPI, PIS, Cofins e ISS) pelo IVA, percebemos que isso pode ser neutro (dependendo da alíquota, é claro), uma vez que a indústria de petróleo não possui isenções específicas desses tributos. Portanto, é necessário compreender se a nova alíquota do IVA acabará sendo maior do que a carga tributária total atualmente aplicada pelos impostos regulares, conforme conhecemos hoje.
Do lado negativo, identificamos a possibilidade de as empresas petrolíferas serem alvo de um eventual “imposto do pecado”, pois estamos lidando com a comercialização de uma fonte não-renovável e poluente. Embora o documento deixe claro que as exportações não serão tributadas, é importante mencionar que a maior parte do petróleo extraído no Brasil destina-se ao mercado interno.
No caso dos combustíveis, deverá existir uma proposta tributária específica, com a aplicação de uma única alíquota uniforme ao longo de todo o Brasil e com possibilidade de crédito para os contribuintes do imposto.
Caso essa interpretação esteja correta, Petrobrás (PETR4) passaria a ser a grande empresa negativamente afetada vs empresas privadas (PRIO3/RECV3/RRRP3). Tal afirmação é derivada do fato das empresas privadas terem como objetivo exportar a sua produção à medida que obtenham escala para isso. Uma vez mais, citamos que essa é uma interpretação particular e preliminar em relação aos documentos divulgados.
Energia Elétrica & Saneamento Básico
Em linhas gerais, temos um viés neutro/positivo para os setores de Energia/Saneamento Básico. Antes de mais nada, é importante mencionar que historicamente os setores de energia e saneamento são fontes de receita para os estados em seus diversos níveis e, devido à natureza essencial dos seus serviços, os impostos e taxas que incidem sobre os mesmos são muito difíceis de serem sonegados. Sendo assim, o eventual ganho para o setor viria muito mais de um método de cobrança simples e eficiente do que necessariamente da carga tributária de todo o setor.
Saneamento/Distribuição de Energia Elétrica: a atual regulação dos negócios de distribuição de energia elétrica e saneamento tratam impostos como “Custos Não-Gerenciáveis” e trata de assegurar o repasse integral para as tarifas aos consumidores a cada reajuste e/ou revisão tarifária. Sendo assim, se por um lado esse mecanismo protege o acionista do aumento de impostos, uma eventual redução na carga tributária também seria repassada ao consumidor.
Transmissão/Geração: tais segmentos não possuem mecanismo de repasse de preços automáticos para além daqueles contidos na inflação. Sendo assim, por terem seus negócios operados dentro de um regime de concessão com requisitos relacionados ao equilíbrio econômico-financeiro de tais operações, uma reforma que acabaria por retirar esse equilíbrio geraria uma grande judicialização no setor, em nossa leitura.
Se por um lado o “imposto sob o pecado” pode ter um impacto negativo nas petroleiras, cases expostos a uma agenda ambiental positiva podem ficar no lado positivo da reforma. Em nossa interpretação, empresas do segmento de saneamento básico e geração de energia limpa (hidroelétrica, solar ou eólicas) podem ser encaixadas em regimes tributários especiais devido à natureza “limpa” do seu negócio.
Mineração e Siderurgia
Em uma análise preliminar da reforma tributária, enxergamos um impacto possivelmente NEGATIVO no setor de Mineração & Siderurgia.
Atualmente, o setor de Mineração & Siderurgia está sujeito ao pagamento de IRPJ, CSLL, ICMS, PIS, COFINS, com a siderurgia submetida ao IPI, e a mineração a CFEM (“Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais”, representando royalties pagas pela permissão da atividade de extração mineral, com taxas de 3,5% sobre a receita de minério de ferro, e a TFRM (“Taxa de Fiscalização de Recursos Minerais”) com o pagamento de R$4,37 a R$5,03 por tonelada métrica produzida nos estados de Minas Gerais e Pará.
A alteração do regime tributário unificando para o pagamento do IVA, não deve mexer diretamente nas taxas de CFEM e TFRM, mas podem adicionar impostos seletivos na mineração, em caso do enquadramento da atividade como prejudicial ao meio ambiente, principalmente se relacionada com os acidentes já causados pelas barragens a montante, e a contaminação do solo e dos rios locais.
Transporte
No geral, acreditamos que o setor de transportes será negativamente afetado pela reforma.
Dentro do setor de transportes temos figuras mistas para os diferentes segmentos. Se por um lado o setor aéreo já foi definido como estratégico em termos de redução de tributos, por outro o setor de locação pode acabar sendo penalizado. Na cadeia de geração de valor, o governo já definiu uma sinalização positiva para a indústria. Assim, o setor de locação pode ser utilizado como forma de compensação na arrecadação de tributos.
Aéreas: Para as empresas do setor, a incidência do imposto conjunto faria com que sua carga tributária possivelmente se elevasse, dado que as receitas de transporte de passageiros são isentas de ICMS, PIS e COFINS (os dois últimos sendo inicialmente até 2026). Outro ponto que cabe ressaltar é a possível criação de um imposto sobre aeronaves e embarcações. Segundo o parecer preliminar da reforma, empresas que utilizam aeronaves para prestar serviços a terceiros seriam isentas, com isso, empresas como Azul e Gol não seriam afetadas.
Locadoras: Já no que diz respeito às empresas do setor de locação, julgamos que essas seriam umas das mais afetadas pela reforma de maneira negativa. A unificação de impostos por si só não nos preocupa tanto, visto que as companhias do setor geram fortes quantidades de créditos tributários em seu processo de compra de veículos. No entanto, a maior preocupação das empresas de locação de veículos está relacionada à introdução de uma tributação na venda de ativos imobilizados, independentemente da obtenção de ganho de capital.
Essa medida teria um impacto significativo na divisão de seminovos, reduzindo substancialmente os níveis de rentabilidade dessas empresas. Como consequência, o setor de locação no Brasil poderia enfrentar dificuldades de crescimento, já que o aumento dos custos seria repassado aos consumidores através de tarifas mais altas de locação. Isso, por sua vez, poderia diminuir a atratividade da locação em comparação à compra ou financiamento de veículos.
É importante ressaltar que o ponto de equilíbrio só poderá ser avaliado quando as alíquotas forem definidas, especialmente levando em consideração a expectativa de queda no preço dos carros. O texto anterior mencionava uma redução de até 35% com a adoção do IVA. Atualmente, a carga tributária média sobre os veículos automotores é de 49,6%. Essa redução de preço poderia resultar em uma diminuição nas necessidades de investimento em frota e ajudar a mitigar parte do aumento dos impostos.
Indústria
Já quando olhamos para o setor industrial, acreditamos que a reforma tributária será positiva.
A indústria brasileira é notoriamente conhecida por sua alta incidência tributária, principalmente devido à incidência cumulativa de alguns impostos devido às elevadas quantidades de insumos e matéria-prima utilizados pelas empresas do setor. Hoje, cerca de 46% do valor total da produção industrial do Brasil é destinada para o pagamento de tributos. A reforma promete reduzir o peso dos impostos que incidem sobre a cadeia industrial brasileira, algo que aumentaria sua competitividade e, em tese, geraria um efeito cascata em outros setores.
Máquinas e equipamentos: Dentre as empresas sob nossa cobertura, destacamos que Aeris e Weg podem obter algum ganho adicional devido às linhas de negócio voltadas para energias renováveis. No entanto, ressaltamos que existe a possibilidade da extinção dos incentivos fiscais da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) à Aeris, que consistem em uma redução de 75% do imposto de renda sobre o lucro líquido da companhia.
Bebidas
Em nossa visão, o setor de Bebidas deve sofrer impacto NEGATIVO.
Atualmente, a única companhia de capital aberto listada na B3 deste setor é a Ambev (ABEV3). Embora ela produza bebidas não alcoólicas, como refrigerantes, seu foco é na produção, distribuição e comercialização de bebidas alcoólicas, majoritariamente cervejas. O segmento de não alcoólicas representa menos de 10% do faturamento da companhia.
A reforma propõe a criação de um Imposto Seletivo, que deve incidir sobre a produção e comercialização de bens prejudiciais à saúde, como bebidas alcoólicas, justamente o maior foco da Ambev (ABEV3). Ainda que a companhia tenha também atuação fora do Brasil, o segmento Cerveja Brasil representa quase metade de seu faturamento. Dessa forma, nossa avaliação preliminar é de que Ambev (ABEV3) deve ser impactada negativamente de modo relevante.
Frigoríficos
Em nossa visão, neste setor, os frigoríficos podem sofrer impacto NEGATIVO.
Atualmente, o setor se beneficia da isenção de tributos federais em produtos da cesta básica, que é bastante extensa e envolve até mesmo, filé mignon. No entanto, a reforma propõe que, sobre os itens da cesta básica, incida uma alíquota reduzida (50% da alíquota geral aplicada a bens e serviços).
Ou seja, não haverá isenção de tributos, o que pode levar a um encarecimento dos produtos e consequente redução do consumo, prejudicial aos frigoríficos com maior exposição ao mercado doméstico, como BRF (BRFS3). Porém, vale notar que demais frigoríficos negociados em bolsa apresentam características que devem mitigar os impactos negativos, como maior foco em exportações, no caso de Minerva (BEEF3), ou menor dependência do Brasil, como Marfrig (MRFG3), que possui foco na América do Norte, e JBS (JBSS3), que possui boa diversificação geográfica.
Agrícolas
Atualmente, o sistema tributário do agronegócio apresenta muita complexidade, com uma alíquota estimada em torno de 5%. O setor agrícola recebe um tratamento diferenciado, com alíquotas reduzidas devido ao seu caráter social e estratégico. No entanto, com a extinção dos antigos tributos para a criação de uma alíquota unificada do IVA Dual, espera-se que a alíquota aumente significativamente, podendo chegar a 25%. Essa mudança tende a ter um impacto negativo no setor como um todo, especialmente na Boa Safra (SOJA3), que está na base da cadeia produtiva e possivelmente será uma das mais oneradas.
Contudo, a proposta de desoneração das exportações, que se mostra essencial para manter a competitividade do agronegócio brasileiro nos mercados globais, é motivo de um otimismo moderado. Dentro da nossa cobertura, a SLC Agrícola (SLCE3) será provavelmente a mais beneficiada, uma vez que ocupa uma posição de destaque como uma das maiores exportadoras de grãos.
Telecomunicações
Atualmente, o setor de telecomunicações enfrenta inúmeras questões judiciais relacionadas ao ICMS. A proposta de uma alíquota única, com a extinção do ICMS, é negativa para o setor pois pode aumentar a carga tributária de 11% para 25%. Por causa da unificação dos impostos cobrados sobre call center e manutenção de redes, Vivo (VIVT3) e Tim (TIMS3), grandes players do segmento, devem ser prejudicados. No entanto, há uma possibilidade remota do setor receber uma carga tributária diferenciada e ser desonerado de acordo com o deputado federal Reginaldo Lopes, coordenador do grupo de trabalho da Reforma Tributária.
Setor Financeiro
Atualmente o setor financeiro está sujeito ao imposto cumulativo para as contribuições de PIS, COFINS, ISS, IRPJ e CSLL, podendo ter algumas exclusões para as instituições financeiras. A proposta do IVA Dual não inclui o setor financeiro devido a sua complexidade, assim terá um regime tributário específico. Acreditamos que o impacto no segmento é NEUTRO, já que os documentos preliminares apresentados excluem o setor da aplicação não cumulativa.
Por outro lado, os documentos abordam possíveis alterações nas alíquotas, regras de creditamento e na base de cálculo, sendo que a tributação deve ser com base na receita ou no faturamento. Atualmente, a alíquota cheia de IRPJ e CSLL para bancos é de 45%(vs 34% de outros setores), assim, caso ocorra uma revisão para baixo, o impacto seria positivo para as instituições financeiras, mas acreditamos que seja pouco provável ter uma melhora muito significativa. Dessa forma, entendemos que o maior julgamento para o setor financeiro virá da decisão referente a possível extinção do pagamento de Juros sobre Capital Próprio (JCP).
Saúde
Vamos separar as companhias do setor de saúde em duas vertentes que estão sob nossa cobertura: (i) hospitais (prestadores de serviços hospitalares) e (ii) operadoras de planos de saúde. Os efeitos da reforma tributária podem ser diferentes para as duas vertentes, primeiro vamos explicar como é atualmente a tributação para ambas.
Hospitais são geralmente sujeitos ao pagamento de IRPJ, CSLL, PIS, COFINS, ISS e a contribuições previdenciárias. No entanto, uma importante vantagem tributária para hospitais é a isenção do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre a prestação de serviços de assistência à saúde. Essa isenção do ICMS é um benefício fiscal que contribui para reduzir a carga tributária para hospitais, aliviando os custos relacionados à prestação de serviços médicos e hospitalares.
Assim como os hospitais, as operadoras estão sujeitas ao IRPJ, à CSLL, ao PIS, à COFINS, ao ISS e a contribuições previdenciárias. Além disso, algumas operadoras podem se beneficiar de incentivos fiscais, como a exclusão do ICMS sobre as mensalidades dos planos de saúde.
Olhando primeiro para os hospitais, esperamos que os serviços de saúde recebam alíquota reduzida de 50% do IVA. Como ainda não sabemos quanto será a alíquota, é difícil afirmar com certeza qual será o efeito. Isso pois, atualmente, os hospitais têm isenção sobre o ICMS, o que reduz a carga tributária dessa classe. Ainda assim, acreditamos que a reforma não terá resultados extremamente negativos para as companhias do setor.
Já em relação às operadoras de planos de saúde, o substitutivo da PEC 45 dita que planos de assistência à saúde terão regime tributário específico. Como ainda não há mais informações nesse sentido, acreditamos que seja melhor entender um pouco mais a tributação específica, antes de investigar os possíveis impactos da reforma tributária.
Imobiliário
Separamos o setor imobiliário em duas partes: incorporação e properties. Na atual proposta da reforma tributária, ambos serão categorizados como regimes específicos de tributação, com poucos detalhes de como deve ser seu funcionamento.
Incorporação
Hoje, o regime de tributação de incorporadoras já é diferenciado, com alíquotas mais baixas que a média dos outros setores. Considerando apenas os impostos indiretos, as incorporadoras estão sujeitas a pagar Cofins, com uma alíquota de 1,71% e PIS/Pasep, com uma alíquota de 0,37%. No total, os impostos indiretos representam 2,08%.
Em uma avaliação preliminar, acreditamos que a atual tributação deve continuar mesmo após a reforma tributária. A lei que define o regime de tributação das incorporadoras (RET) não inclui apenas definições dos impostos indiretos, mas também IRPJ e CSLL, de forma que a alíquota total de impostos do setor soma 4,0%. Na nossa visão, as alíquotas no RET são complementares e a mudança de uma delas exige compensação nas outras, o que só ocorreria após esta primeira reforma.
Properties
Neste segmento, olhamos especificamente para empresas cuja atividade é relacionada à locação de imóveis, como shoppings. Hoje, os principais impostos indiretos que impactam o setor são: PIS, Cofins e ISS.
Em relação ao ISS, sua participação é muito baixa no segmento, uma vez que um percentual pequeno da receita das empresas se enquadra como “serviços”. A maior parte do ISS pago é referente à administração de imóveis de terceiros. A companhia listada com maior exposição ao fim do ISS é a Aliansce Sonae, cuja receita de serviços representa ~10% da receita total. Neste caso, a reforma terá um impacto negativo, visto que a alíquota do ISS tende a ser mais baixa do que as expectativas das alíquotas para o CBS e IBS.
No caso do PIS/Cofins, as empresas de properties adotam dois possíveis regimes de tributação: lucro real e presumido. No lucro presumido, o PIS e Cofins somam alíquota de 3,65%. No lucro real, o PIS e Cofins somam alíquota de 9,25%, mas contam com alguns abatimentos. Na prática isso significa que a alíquota efetiva fica neste intervalo entre 3,65 e 9,25%, a depender do tamanho das propriedades da empresa (se a maior parte da receita se concentra em propriedades grandes, a alíquota é mais alta). Como o segmento se enquadra em regime especial, o impacto é totalmente dependente da força do lobby do segmento, que deve tentar buscar alíquota efetiva menor que 7%. Ou seja, sem conhecermos o número final, não temos como prever a direção do impacto.
Educação
Nossa análise sobre o impacto da reforma tributária no setor educacional possui um viés neutro. Reconhecemos que o setor de educação é um dos principais pilares do desenvolvimento socioeconômico de um país, sendo essencial para o aumento da produtividade. Portanto, é válido assegurar que as mesmas têm aproveitado de benefícios fiscais.
As empresas do setor e sob nossa cobertura, se beneficiam do incentivo fiscal do Programa Universidade para Todos (ProUni), regulamentado pela Lei n° 11.096/2005. Suas alíquotas efetivas são calculadas com base na alíquota padrão de 34% (composta por 25% do Imposto de Renda Pessoa Jurídica – IRPJ e 9% da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL), subtraindo-se os incentivos fiscais do ProUni. Esse programa isenta as receitas da modalidade de graduação do pagamento de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS. Vale mencionar que as companhias não são pagantes do ICMS nem do IPI.
De acordo com o substitutivo preliminar, a postura favorável ao benefício do ProUni foi mantida, assim como a redução de 50% da nova alíquota do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), cujo valor exato ainda não é conhecido.
No geral, as empresas do setor possuem uma alíquota efetiva de aproximadamente 5%, considerando que a maior parte de suas receitas está vinculada à modalidade de graduação (mais de 80%). Dessa forma, elas são amparadas pela redução da alíquota efetiva devido ao atual benefício do ProUni. Logo, até o momento, esperamos que as companhias não sejam afetadas pela reforma tributária, portanto, mantemos nosso viés neutro.
Varejo
Em visão geral, o varejo é um dos grandes impactados com a aprovação da reforma tributária, visto que o setor é bastante exposto a benefícios fiscais, principalmente atrelado ao ICMS, como também Lei do Bem, Lei da Moda e SUDENE. Tanto o varejo discricionário, quanto o não discricionário deve sofrer um aumento de carga tributária.
Como o texto da reforma ainda está no campo de discussões, é cedo demais para avaliar potenciais impactos. Vale lembrar que esses efeitos só deverão ser plenamente percebidos em cerca de 10 anos, após o período de transição, e até lá a estratégia tributária das companhias serão ajustadas à nova legislação, o que deve ajudar a mitigar os efeitos nos resultados.
Nas atuais condições do texto, as empresas que comercializam bens essenciais, como alimentos e medicamentos, sofreriam um aumento de carga tributária – considerando a redução de 50% da alíquota para os setores. Atualmente, cerca de 70% dos medicamentos vendidos no Brasil são isentos do pagamento do PIS/Cofins (lista positiva), assim como itens da cesta básica de alimentos. Usando como exemplo uma alíquota de 25% (valor hipotético, ainda não definido), mesmo uma redução ao patamar de 12,5% sobretaxaria esses itens. Para compensar esse efeito, as empresas precisariam repassar parte dos custos através de uma elevação do preço de produtos.
Papel & Celulose
Em uma análise preliminar da reforma tributária, enxergamos o possível impacto como NEUTRO no setor de Papel & Celulose.
Atualmente, as empresas de Papel & Celulose são sujeitas ao pagamento de IRPJ, CSLL, ICMS, PIS, COFINS, IPI e ISS. Apesar disso, o setor se beneficia em PIS/COFINS pela exclusão de ICMS na base de cálculo e pela compra de insumos recicláveis gerando créditos dedutíveis.
Além disso, a estrutura de imposto para o setor usufrui de algumas isenções para projetos no Norte e Nordeste via SUDENE/SUDAM, descontos por doações via Goodwill, e crédito pela exportação de produtos manufaturados pelo programa federal Reintegra. Alguns dos benefícios utilizados podem acabar mudando com a reforma tributária, impactando na dedutibilidade de impostos.
A substituição pela alíquota cheia do IVA pode acabar com os benefícios fiscais que a compra de fibras e aparas recicladas geram, servindo para compensar as contribuições já embutidas no preço dos resíduos comprado a fim de equiparar o pagamento de impostos com a utilização de um insumo reciclado a um não reciclado.
Ainda assim, a redução de 50% da alíquota para bens e serviços do setor florestal, e insumos agropecuários destinados ao consumo humano e de higiene pessoal, podem trazer um reflexo positivo para as empresas de Papel e Celulose, a depender da alíquota definida.